Archive for the Cidadania Category

O silêncio dos justos

Posted in Cidadania, Intervenção Social, Política & Políticos, Violência Urbana on janeiro 7, 2016 by projetomuquecababys

Projeto Muqueca Babys Blog

By Luis Carlos “Rapper” Archanjo

A frase de Martin Luther King: “O silêncio dos justos causa mais barulho que o tumulto dos violentos”, nos remete a luta dos afro-americanos pelos seus direitos civis, diferentemente, ao grito calado na garganta do povo afrodescendente do Brasil que, desde já recebe o recado para o futuro de uma geração de jovens negros, principalmente, a partir da projeção de estudo estatístico – Unicef/UERJ – da morte de 33 mil jovens de 2006 até 2012 por conta da violência urbana, campanha_juventude_negra-300x225sem que se ouça qualquer contra-argumento de comoção pública na busca de “rotas de fuga” da circunscrição qual são alvos fáceis de dados de vidas humanas na mira da violência numa clara condescendência dos justos para tal escalabro da condição humana. Qual opção se enquadra ao seu ponto de vista como causa principal para a projeção de um futuro tão sombrio para a infância…

Ver o post original 18 mais palavras

O olhar do professor sobre o aluno pode construir ou determinar a sua trajetória escolar positiva ou negativa?

Posted in Cidadania, Educação, Enquetes, Grupo Sensação, Intervenção Social, Sociedade with tags , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , on junho 18, 2015 by projetomuquecababys

By Luis Carlos “Rapper” Archanjo

1 – INTRODUÇÃO

Do trabalho como educador social na parceria escola pública e Organizações Não Governamentais (ONGs) no contra turno da educação básica foram muitas as vivências e experiências educativas não formais. Hoje, na condição de licenciando em Pedagogia, ainda, com muitas perguntas para o entendimento da relação cognição/afetividade (Brest, 2009; Ladson-Billings, 2008) como fator motivacional de políticas educacionais como os Parâmetros Curriculares Nacionais – PCN´s (Brasil, 1977) e literatura de autores referenciados para desenvolver hipótese com embasamento necessário a delinear, dar significado acadêmico, contribuir para o conjunto de reflexões do fazer pedagógico vivido por docentes e discentes não autores ou pesquisadores autores com referências pessoais comuns àqueles das classes populares na sala de aula de educação básica da escola pública marcada pelo fracasso escolar. O ponto de partida é fruto das considerações do fracasso escolar da Dissertação de Sirino (2002) sobre o discurso do aluno no olhar de mão dupla da relação pedagógica docente/discente traduzida em “enquete” ou “survey” levado às redes sociais relacionadas à educação. Portanto, fornecer informação relevante da sua condição para outros coletivos, ou suscitar outras representações sociais,[1] humanas e culturais que os toquem tão perto, obrigatoriamente provoca reflexões, posicionamentos e revisões de percurso nos aspectos metodológicos de planos, planejamento e avaliação com ênfase no currículo (Apple, 1982; Arroyo, 2011).

1.1 – Apresentações do tema

A observação do professor (a) na centralidade da ação pedagógica do ponto de vista de experiências socioeducativas identificadas na racionalidade contracultural de coletivos docentes com olhares diferenciados para cultura, classe, raça, conhecimento, faz do trabalho lócus para socializar fontes diversificadas de conhecimentos na contramão do projeto de sociedade definido em propostas segregadoras cultuadas nas escolas, redes, diretrizes e normas aceitas de forma acrítica. Reconhecer o currículo como território de disputa (Arroyo, 2004) entre o real pensado, conceitualizado, teorizado e o direito a entender o real vivido e seus múltiplos e tensos significados implica em demonstrar e discutir essa ausência na neutralidade de transposições didáticas para experiências tão humanas e desumanas de coletivos silenciados, pedagogicamente. Dialogar com autores para questões como: Até que ponto a dificuldade de “ver” e se “posicionar” perante as questões étnico-raciais está relacionada à formação do professor? Por que as características biológicas têm caráter central para olhares em autoclassificação e heteroclassificação racial, percepção, autopercepção e heteropercepção na relação docente/discente? Nesse sentido, autores pesquisadores da questão racial (Cavalleiro, 1988, 2000; Pinto, 1999; Oliveira, 2001; Santos, 2005) colaboram. Minayo, (1992) embasa as considerações sobre isenção científica e aproximações da condição humana e questões éticas na reflexão para o desenvolvimento de uma consciência crítico-reflexiva e transformadora, onde a alfabetização em valores humanos cria as habilidades sociais necessárias para trocas interpessoais sadias no intramuros da educação básica pública.

1.2 – Questões norteadoras 

Como as diferenças sociais e raciais são contempladas no currículo?

Que lugar os conhecimentos cotidianos dos professores, dos alunos ou de outros autores sociais vêm ocupando o contexto escolar?

 1.3 – Objetivos 

1.3.1 – Geral 

Compreender a afetividade entre professor e aluno a influenciar a qualidade da educação, cogitar outros olhares para concepções bipolares, hierarquizantes e segregadoras, colaborar com informações relevantes sobre a realidade social do aluno, tanto quanto exemplificar formas exitosas de gestão escolar (Lück, 2000; Coelho, 2008) para “escolas efetivas” e modos de articular o saber cotidiano e conhecimento sistematizado da escola (Arroyo, 2004). 

1.3.2 – Objetivos específicos

Identificar o quanto atitudes, expectativas e sentimentos derivados da história pessoal influenciam o modo como o ser humano interpreta e organiza as experiências, as pistas e os estímulos de trocas com o meio, com os outros e consigo mesmo (Cavalleiro, 2000).

1.4 – Justificativa 

A vulnerabilidade social como palavra de ordem não dá identidade às principais vítimas da vida precária e o desencontro com o ensino/aprendizagem: meninos negros nos anos iniciais (Carvalho, 2004). A coparticipação em afazeres domésticos ou no complemento da renda familiar em responsabilidades adultas por si só desmistifica a falta de vontade para a avaliação do juízo professoral desconhecedor desses fatores a afetar sua escolarização. 

1.5– Procedimentos metodológicos

A etnografia (Gutierrez, 2004) está relacionada com ir a algum lugar para observar, interagir, explorar. Diferentemente da etnografia tradicional, a netnografia não exige a presença física do pesquisador. Mediado por ferramentas, ambientes e prática construída no ciberespaço, a netnografia ou etnografia virtual faz uso de abordagem quantitativa e qualitativa para desenvolver a percepção do sentido da tecnologia e dos espaços culturais que são por ela estudados.  A tabulação de resultado obtido de enquete ou “survey” contribui qualitativa e quantitativamente para socializar e sugerir outras abordagens sobre o olhar positivo ou negativo do “juízo professoral bourdieano[2]” (Catani, 2002) na relação docente/discente para classes populares. Em anexo: quadro de acessos e tabulação de opções.

2 – VIVÊNCIAS E  EXPERIÊNCIAS EDUCATIVAS VIRTUAIS

2.1 – A formação reflexivo-investigatória.

O convívio na educação não formal e o estágio obrigatório na educação formal foi momento de perceber que contingências da vulnerabilidade social imbricadas em fatores múltiplos privam meninos (as) de situações emuladoras de aptidões motoras e cognitivas comuns de ambiente educador. O entendimento dessas carências como fator de desencontro com o saber sistematizado nas séries iniciais, entre elas a coparticipação já mencionada, e nos casos com histórico de violência doméstica retirando-os do convívio familiar e encaminhadas para instituições tuteladoras como os abrigos, por exemplo, por si só é um convite a mudar olhares. Nos desdobramentos da história pessoal destes está a integração, sem maiores questionamentos de seus saberes prévios, ao ensino regular pelos vários caminhos de proteção integral à criança e ao adolescente. Por que o imperativo da lei à frente da promoção de condicionamentos preparatórios comuns aos seus pares com histórico de trajetória escolar precoce não mobiliza opiniões contrárias? Como tirá-los da situação excludente de classes superlotadas e da insensibilidade porquanto da prioridade ao cumprimento de ordenamentos legais pelo sistema, a falta de atenção individualizada externada na desatenção do aluno (a) provocada pela sensação de não enquadramento externada na apatia ou na inconstância comportamental em desacordo com padrões conformados nos demais da classe, aborrecendo-os?

Reconhecer a pertinência da pesquisa de Cardoso (2004) e transformar tal dado em questão norteadora a motivar a busca de outras considerações teórico-metodológicas e conceituais instrumentalizando olhar com capacidade de ver além daquilo que lhe é dado para interpretar, interpelar e inferir sobre a relação pedagógica com os elementos aqui expostos. Nesse sentido, ao longo do desenvolvimento pesquisadores autores com recortes múltiplos na educação: afetivo-emocional e cognitivo, currículo, questões raciais contribuem. Mesmo que utilizando referenciais de pesquisas de campo que ensejam componentes raciais na subjetividade de proposições e estratégias do “currículo oculto”, não é objetivo desse trabalho monográfico o aprofundamento em estudos sobre raça ou preconceito racial. Mas, sim, investigar como o juízo professoral define o fazer docente que avalia e exclui em julgamento imparcial que penaliza apenas o aluno já excluído socialmente. Portanto, trazer a teoria e a prática exitosas para debater sobre tal contexto significa demonstrar a existência de modos de interpelar os seus saberes prévios em nome da criação de pontes tirando-os do fosso traduzido em devaneios da apatia ou posturas questionáveis da inconstância comportamental.

A Pedagogia como ciência da educação se auxilia de outras ciências para investigar a realidade educacional possibilitando criar interdisciplinaridade promotora de melhoras no processo ensino/aprendizagem. Para Macedo (2009), fomos concebidos como seres que objetivam pelo argumento, somos animais conceituais e agimos mediados por conceitos. Ser formando em proposta político, filosófico, didático-pedagógico, reflexivo-investigatório[3] com conhecimentos formativos necessários a explorar autores e textos referenciados por academicismo que os conforma como fonte de consulta bibliográfica é conferir credibilidade e clareza à intencionalidade de considerações argumentativas na consecução do propósitos em situar o leitor, justificar posicionamentos, expor objetivos, entre outras recomendações para a confecção de artigo acadêmico. Assim, pesquisar é compreender uma dada realidade e poder conferir nesta mesma realidade na condição de “ser da mesma natureza do objeto pesquisado e, ao mesmo tempo, uma parte de sua observação” (MINAYO, 1992), “pois nenhuma pesquisa é sempre sem valores iniciais, crenças, concepções e pressuposições condutoras a respeito da matéria que está em investigação” (Sirotnik, 1991, p. 241 apud LADSON-BILLINGGS, 2008, p. 165).

Quadro com quantitativo participante[4] mensal e anual de acessos e tabela com participação em survey ou enquete levado a internautas de redes sociais interessadas em socializar e debater assunto relacionado à educação em pesquisa netnográfica é exemplo de prática da educação virtual. Ao provocar mudanças no ambiente educativo com a entrada de ferramentas tecnológicas propiciando a flexibilidade de aulas tele transmitidas, formas síncronas e assíncronas de interações, busca de informações entre as muitas mudanças no método, na técnica e estratégias para apropriar, socializar, arquivar, tratar informações cria novos parâmetros de se conceber educação. Segundo Lévy, desde há muito tempo a escola perdeu a função de formar cidadãos críticos e, cada vez mais através das mídias somos informados do curso do mundo. De acordo com o filósofo:

Novas maneiras de pensar e de conviver estão sendo elaboradas no mundo das telecomunicações e da informática, pois a era da informática, com seus métodos e equipamentos capazes de processar e transmitir informações é um campo de novas tecnologias intelectuais, aberto, conflituoso e parcialmente indeterminado (PIERRE LÉVY, 1999, p. 7-9)..

Assim como Lévy, Silva (1995) aponta a necessidade de a escola rever posições para lidar com o novo cenário cultural representado pela difusão e generalização de novas mídias dando voz e vez para outros espaços de poder, que não os dominantes, para a afirmação e narrativas e discursos alternativos de grupos subjugados socialmente. Para Silva:

Tais transformações não podem ser interpretadas no registro conservador do pânico moral e da visão patologizante que vê a ampliação da influência da cultura popular e o predomínio de novos meios e conteúdos como uma ameaça a tradicionais valores e capacidades supostamente mais universais, humanos e superiores (SILVA, 1995, p. 198)..

A sociedade virtual, caracterizada pelo uso de sons e imagens como uma dos principais meios para se veicular mensagens, certamente abarca o audiovisual da narrativa fílmica se pensado como caminho de reflexão sobre o olhar na educação como variável importante do fenômeno educativo. “Na centralidade da cultura contemporânea por suas características plurais, a mídia, urde o tecido da vida cotidiana, modelando opiniões e comportamentos, fornecendo o material com que as pessoas forjam sua identidade” (Kellner, 2001, p. 9 apud TERUYA et al., 2011). Pela sua capacidade em agregar fontes diversas de conhecimento, essa forma de dialogar com a realidade pode fundamentar ações educativas comprometidas com a construção de uma educação em valores humanos. É apontada pelos Estudos Culturais[5] como perspectiva para o debate de questões sociais e, ao mesmo tempo, atender a diversidade cultural da escola e ajudar a romper as barreiras disciplinares.

2.2 – A Pedagogia do olhar.

O subtítulo é um fragmento do pensamento do escritor Rubens Alves nas suas considerações sobre o olhar na educação e a educação do olhar. O vídeo, com referências da importância do educador ensinar o aluno a olhar o mundo e interpretá-lo, sintetiza a amplitude dos estudos culturais em reconhecer modos híbridos na produção de conhecimento relevante conforme a transcrição a seguir: “Já li muitos livros sobre psicologia da educação, sociologia da educação, filosofia da educação, mas por mais que me esforce, não consigo me lembrar de qualquer referência à educação do olhar ou à importância do olhar na educação” (RUBENS ALVES, 2011). O filme Prova de Fogo – Uma história de Vida serve como metáfora explicativa do  entrecruzamento de conhecimentos necessários a inserir o leitor no diálogo com os autores consultados para ratificar teor acadêmico ao trabalho. Como primeiro momento para focar o olhar como instrumento decisório no percurso discente fica a cena em que há o impasse entre o futuro orientador, professor com PhD em Literatura, com convicções pedagógicas embasadas em valores de afetividade, consciência social e étnico-racial versus o julgamento da professora quanto à aluna possuir ou não potencial para ir além da condição de vencedora no micro universo escolar. Mesmo externando competências intelectuais percebe-se a indecisão discente na representante da escola pública em exposição a nível nacional no concurso de “soletramento” e o possível confronto com pares herdeiros de capital cultural com referências em escolas que traduzem a excelência da educação americana. Superando os impeditivos de determinações sociais até transformar-se em representação emblemática de superação às determinações sociais há todo um simbolismo a ser apropriado por escolares que se veja espelhado na controversa educação popular. A citação de William E. B. Du Bois, primeiro afro-americano a possuir de título de PhD na Universidade de Harvard, é a contribuição do diretor no diálogo qual o mentor pede a protagonista que leia o pensamento do sociólogo sobe o medo e questões da autopercepção negativa, implícito na citação, demonstrando a importância do entendimento do poder das palavras e da importância de estudo do que escreveram homens que fizeram o uso das palavras para mudar o mundo, como Martin Luther King, Ghandi, John F. Kennedy e Nelson Mandela etc.

No enquadro da câmera em focar a participação e a contribuição direta ou indireta de todos do seu meio social em nome de valores de pertencimento até o final feliz e a consagração na soletração da palavra “amor”, há na produção cinematográfica elementos suficientes para o debate de quanto urge a educação formal desvencilhar-se de amarras e cristalizações traduzidas em maneiras de lhe dar identidade dominante. Utilizar tal recurso para demonstrar que escola persiste em caminhos que a inviabilizam em tocar mais profundamente na dimensão afetiva como lugar de força propulsora para mecanismos cognitivos que levam alunos das classes populares a outros patamares em conhecimentos, atitudes e aptidões atende objetivos que expressam o desejo de ultrapassagens de sua imagem associada ao desinteresse ou falta de vontade em se educar. Portanto, desencadear a intersubjetividade promovida pelo audiovisual na partilha de consensos sobre o olhar docente atuando negativa ou positivamente na trajetória discente popular cumpre objetivos do trabalho monográfico em fazer da realidade ficcional fonte de conhecimento relevante.

Cinelli (2003), na dissertação sobre o uso do vídeo no ensino busca considerações teórico-conceituais em autores que questionam a escola do século XXI que pretende educar as crianças com instrumentos e sistemas que tiveram validade  há 50 anos, porém suplantadas pela técnica contemporânea. A expressão é de McLuhan (1969, p. 120 apud CINELLI, 2003, p. 14): “a criança de hoje cresce sem parâmetros convencionais, porque vive em dois mundos, e nenhum dos dois a ajuda crescer”. Explica ele: […] substituirão na escola as lições, os braços  cruzados, as memorizações, os exercícios mortos, enquanto fora da escola haverá uma avalanche de imagens, ilustrações e de cinema. A interação de culturas em conflito provoca indecisão e angústia. Em acordo com o princípio freireano de educação como ato político Kellner (2003, p.127 apud TERUYA, p. 3059) propõe o modelo de diálogo do educador brasileiro no ensino de um alfabetismo crítico das narrativas midiáticas, como um excelente meio de fazer com que os/as estudantes se vejam em representações e simbolismos identificados nas múltiplas dimensões da linguagem fílmica criando pontes para que falem sobre sua cultura e experiência para articular e discutir a opressão e a dominação cultural.

2.3 – O binômio cognição e afetividade na educação.

Nas suas colocações, autores referenciados para o diálogo com o binômio em questão é possível elencar repertório de componentes relacionados à diversidade étnico-racial em articulação com objetivos e conteúdos a serem trabalhados em alguns Temas Transversais[6], especialmente Ética e Pluralidade Cultural (Pinto, 1999, p. 205). No texto da Introdução aos PCN´s consta que a comunicação propiciada nas atividades em grupo levará os alunos a perceberem a necessidade de dialogar, resolver mal-entendidos, ressaltar diferenças e semelhanças, explicar e exemplificar, apropriando-se de conhecimento. O estabelecimento de condições adequadas para a interação não pode estar pautado somente em questões cognitivas. Os PCN´s assinalam para aspectos emocionais e afetivos em igual relevância aos cognitivos, principalmente para os alunos prejudicados por fracassos escolares ou que não estejam interessados no que a escola pode oferecer. As questões étnico-raciais são contempladas no texto sobre interação e cooperação:

A afetividade, o grau de aceitação ou rejeição, a competitividade e o ritmo de produção estabelecido em grupo interferem diretamente na produção do trabalho. Ou seja, a disponibilidade cognitiva e emocional dos alunos para a aprendizagem é fator essencial para que haja interação cooperativa, sem depreciação do colega por sua eventual falta de informação ou incompreensão. Aprender a conviver em grupo supõe um domínio progressivo de procedimentos, valores, normas e atitudes (BRASIL, 1977, p. 64)..

Assim como há ambiente calmo e tranquilo mediado pelo bom entrosamento docente/discente favorecendo o ensino/aprendizado, também há aquele em que o tempo de permanência do estudante no interior da escola é pontuado por processos de interiorização de comportamentos de baixa estima por conviver cotidianamente com atitudes preconceituosas ou racistas de estereótipos vindo de colegas de classe ou até mesmo de professores insensíveis às consequências de tal desrespeito às diferenças raciais. A discussão sobre as relações étnicas representa uma questão necessária para a promoção de uma educação igualitária, compromissada com o desenvolvimento de todos os cidadãos.

O universo escolar de crianças afro-brasileiras e afro-americanas ambientado em literatura na perspectiva de intelectuais negros atentos á questão racial é a contribuição da Coleção Cultura Negra e Identidades, pela Editora Autêntica. Com Conselho Editorial constituído de eminentes representantes da intelectualidade negra brasileira, em cujo catálogo está o trabalho da escritora afro-americana Gloria Ladson-Billings sobre o ensino bem sucedido de crianças afro-americanas. Para a autora, tal estágio de qualidade no ensino perpassa por ações aparentemente não educacionais, tais como sorrir para o aluno ou mostrar desaprovação estão engajados em uma definição mais ampla de pedagogia. Ou seja, um olhar, um sorriso, um gesto, uma palavra, pode ter significação de ensino culturalmente relevante ou uma perspectiva assimilacionista[7]. De acordo com essa abordagem, o papel do professor é assegurar que os alunos se ajustem à sociedade.  “E se o professor tem baixas expectativas sobre os alunos, o lugar onde o professor acredita que os alunos devem “se encaixar” está nos patamares mais baixos da sociedade.” (LADSON-BILLINGS, 2008, p. 39-40). A colocação nessas faixas mais baixas tende a significar menos atenção e instrução individualizada pelo  professor. Numa espécie de profecia auto-realizável, esses alunos que tiveram pouca instrução atuam em níveis mais baixos.  Sua habilidade de ascender além desses níveis é prejudicada porque tem pouca atenção. “Dessa forma prosseguem um ciclo de desempenho escolar pobre iniciado por um preconceito e predisposição de um professor com respeito a eles” (Ibidem, p. 38). O foco na percepção que a criança tem de si e dos outros é especialmente importante porque os profissionais de educação muitas vezes apresentam sentimentos de baixa estima em relação ao seu próprio trabalho (Foster, 1986, p. 297-298 apud LADSON-BILLINGS, 2008).

Brust (2009), em seu trabalho monográfico sobre a afetividade no processo de aprendizagem nos anos iniciais do ensino fundamental coloca o quanto a escola deve participar da construção da personalidade, e o professor deve conhecer cada um de seus alunos, tratando-os como seres humanos com limitações e dificuldades. Do mesmo modo que Antunes (2006, p. 5 apud BRUST, 2009, p. 24) reflete sobre a necessidade do “amor”, Maldonado (1994) aborda o medo e a desconfiança como fatores que dificultam o relacionamento interpessoal, assinalando que o amor pode estar escondido em camadas de mágoa medo, tristeza, ressentimento, decepção, vergonha e raiva.

O desencontro dos sujeitos da educação dá-se principalmente por desconhecimento ou conceitos formados sobre a procedência do aluno, a falta de habilidades emocionais impossibilitando a empatia na relação docente/discente e consciência crítica para buscar abordagens como a Ética da Alteridade, por exemplo, que orienta a aceitação da diferença como princípio capaz levar o ser humano a se ver no lugar do outro e, assim, reorientar concepção de educação como espaço de exclusão. Ou adotar como princípio educativo a ação transformadora, no sentido freireano, que exige-se daqueles que vivenciam o dia a dia da sala de aula uma revisão no olhar pelo que a prática nascida desse tipo de posicionamento, mesmo que inconsciente, contribui para reforçar permanências que impossibilitam grupos historicamente subjugados a ascenderem socialmente via educação.

Brust busca em Woolfolk (2000) a explicação para a incapacidade do professor em  reconhecer a dinâmica do comportamento humano e, por isso, faz interpretações equivocadas quanto aos seus alunos. Esses comportamentos internos (emoções, sentimentos, valores, pensamentos) e de movimento acabam sendo observados e interpretados como indisciplina. Essas situações provocam nos alunos atitudes controversas: Desse modo:

Os professores são a melhor fonte de ajuda par a os alunos que enfrentam problemas emocionais e interpessoais. Quando os alunos têm uma vida familiar caótica e imprevisível eles precisam de estruturas firmes e consistentes, apliquem as regras firme, mas não punitivamente, respeitem os alunos e mostrem uma preocupação genuína com o seu bem-estar. Como professor, você pode estar disponível para conversar sobre problemas pessoais sem exigir que seus alunos o façam (Woolfolk, 2000, p.47 apud BRUST, 2009, p. 25)..

Para a autora, pelo fato da escola não ser apenas um ambiente de aprendizagem cognitiva, Dias (2007 apud BRUST, 2009, p. 29) assinala que os currículos escolares brasileiros deveriam abordar a afetividade e defender uma educação compromissada com a formação de pessoas livres, autônomas, responsáveis e amorosas, porém o imaginário docente está em melhoria das salas de aula, bibliotecas, laboratórios, materiais pedagógicos, equipamentos de informática e audiovisuais. Ressalta que numa perspectiva piagetiana, o desenvolvimento da criança é inseparável do conjunto de relacionamentos afetivos sociais e morais que constituem a vida na escola. Portanto, a relação indissociável entre cognição e afetividade precisa ser reforçada diariamente, pois o aspecto afetivo além de influenciar o desenvolvimento intelectual, ele pode acelerar ou diminuir o ritmo de desenvolvimento da criança.

Reconhecer no trabalho de autores selecionados para refletir a inter-relação das tantas confirmações de que a escola é lugar para se problematizar a realidade em nome da promoção de outros olhares na relação pedagógica carente de se traduzir em ambiente seguro de alunos calmos e tranquilos que constroem uma autoimagem positiva, participam efetivamente das atividades propostas e contribuem para o atendimento de objetivos educativos é uma verdade a ser perseguida no saber fazer do educador da escola básica pública. Por falta de uma leitura atenta sobre o ambiente percorrido por antolhos de preconceitos, estereótipos e a falta de um olhar com maior acuidade para posturas arredias e promover mudanças comportamentais é comum o aluno rejeitar o professor e a disciplina por ele ministrada, perder o interesse em frequentar escola, entre outras motivações levando-o à evasão escolar. “O professor que possui a competência afetiva é humano, percebe o seu aluno em suas múltiplas dimensões, complexidade e totalidade.” (Ribeiro; Jutras, 2006 apud BRUST, 2009, p. 30). 

3 – O CURRÍCULO COMO TERRITÓRIO DE DISPUTA 

3.1 – A visão de aluno da escola básica pública no imaginário docente.

O discurso do aluno como ponto de partida para a busca de respostas à interrogação tema nos questiona se a presença deste é cada vez mais notada nas escolas por que nos obrigam a enxerga-los? A questão iniludível passa a ser se os vemos ou como os vemos. Em nome de outro olhar sobre os educandos a escola deve proporcionar um espaço de reflexão sobre a vida do aluno como um todo, contribuindo para o desenvolvimento de uma consciência crítica e transformadora? Prossegue Arroyo (2004): Reconhecer que como profissionais estávamos preocupados em conhecer conteúdos de nossa docência e seus métodos e processos de avaliação. Não deixaremos essas preocupações, mas se impõem outras: conhece melhor os educandos (as). Fomos formados para olhar os educandos? Todos e todas nos parecem iguais, mudam cada ano, mas nosso olhar pode ser genérico, distante e superficial. A estas observações de alguns docentes reagem outros: nem todos têm esse olhar distante e impreciso. Por que nosso olhar os reduz a alunos-problema, desatentos, carente e até violentos? Uma professora impressionada comentou: Por que com tanta rapidez adjetivamos nossos alunos? Houve consensos sobre visão tão negativa: esses nomes, adjetivos e classificações revelam que o imaginário escolar e docente paira uma visão bastante negativa dos alunos. A visão torna mais negativa quanto mais “carente”, mais pobre são as comunidades e as famílias. A visão tão negativa que as elites têm do povo teria moldado o imaginário escolar e docente? Esta pergunta resultou bastante incômoda. De fato ninguém do coletivo pertencia às elites. Muitos sabiam que eles mesmos vinham de famílias populares ou bem próximas. Aí que a pergunta resultava incômoda: como reproduzir um olhar tão negativo sobre os alunos estando tão próximos na origem e nos salários? Ao registrar falas de interações com coletivos preocupados como os alunos são representados, com que imagens são vistos na diversidade de olhares docente Arroyo diz:

Mapear, explicitar e sistematizar essa diversidade de olhares está sendo uma preocupação de muitas escolas: se falamos deles e o que falamos, se nosso olhar é “positivo” ou “negativo”, se os ignoramos ou se não podem ser ignorados, se os compreendemos ou condenamos etc. Vai se tornando necessário explicitar as diversas tendências pedagógicas que habitam nas escolas e que refletem a diversidade de olhares. Tendências que às vezes dialogam ou se ignoram, e que os alunos e suas condutas põem em confronto (ARROYO, 2004, p. 54-58).

Os diálogos transcritos de obra do autor nos leva naturalmente a conclusões de que o olhar idealizado, romântico, bondoso e dócil da infância adolescência tão presente nas metáforas da pedagogia não aparece nos nomes e adjetivos com que os alunos são identificados e chama a atenção é que as imagens da infância mudam dependendo dos grupos sociais e raciais a que as crianças pertencem. Assim sendo, pode-se concluir que o pensamento a respeito dessa infância popular é menos romântico, menos puro e angelical.

Das considerações de Marturano e Borges (2012) sobre a alfabetização em valores humanos como perspectiva pedagógica para temas tabus permeados pelo “currículo oculto” provocando conflitos e tensões nas trocas sociais vem o questionamento sobre considerar a entendimento de que atitudes, expectativas e sentimentos derivados da história pessoal influenciam o modo como o ser humano interpreta e organiza as experiências, as pistas e os estímulos ambientais? Entretanto, tal interrogação faz emergir o paradoxo de quanto à natureza humana com aproximações e a cientificidade da Pedagogia com a impessoalidade e neutralidade necessária de ciência que se auxilia de outras ciências para melhorar a qualidade do ensino aprendizagem faz análises para questões como: Até que ponto a dificuldade docente de “ver” e se “posicionar” perante as questões étnico-raciais produzindo  os fenômenos educacionais recortados está relacionado a vivencias e experiências pessoais das varias dimensões da condição humana do professor? Por que as características biológicas têm caráter central para olhares em autoclassificação e heteroclassificação racial, percepção, autopercepção e heteropercepção na relação docente/discente?

“Diante do outro deslizamos o olhar ou o vemos com antolhos. O olhar dicotômico é consequente da subjetividade expressa no rosto do outro, porque o rosto e o olhar do outro nos aborda e interpela eticamente, não suportamos a sua fome de justiça. Frente ao rosto do outro nos refugiamos na segurança de nossa morada” (MIRANDA, 2008, p. 17).

3.2 –  As questões étnico-raciais na sala de aula da educação básica pública brasileira.

Antes de tolerar, respeitar e admitir a diferença é preciso explicar como ela é ativamente produzida. A diversidade biológica pode ser um produto da natureza, o mesmo não se pode dizer da diversidade cultural. Uma pedagogia cuja matriz teórica seja a problematização da identidade e da diferença tem a obrigação de ir além de benevolentes ações de bondade. “Tem de colocar em seu centro uma teoria que permita não simplesmente reconhecer e celebrar a diferença e a identidade, mas questioná-la” (Silva, 2009, p. 100 apud TERUYA et al. 2011).

A Carta de Cavalleiro (2000) ao Excelentíssimo Senhor Presidente da República Federativa Brasileira em data comemorativa do aniversário de morte de Zumbi dos Palmares trás elementos contundentes sobre a realidade de crianças negras inseridas no ensino brasileiro. Segundo a autora, nada justifica que o Estado colabore para fragilizar a vida emocional e psíquica de crianças negras, propiciando uma educação que enseja uma violência simbólica, quando não física, contra elas no cotidiano escolar. Sim, a violência diuturna sofrida pelas crianças negras no espaço escolar pode, metaforicamente, se comparada ao apedrejamento físico, visto que o racismo e seus derivados as amordaça. Assim, emocionalmente desprotegidas em sua pouca idade, as crianças passam a perseguir um ideal de “brancura” impossível de ser atingido, fazendo-as mergulhar em um estado latente, intenso e profundo de insatisfação e estranhamento quando em autopercepção.

Segundo Cavalleiro (1988), no tocante a educação infantil há um número reduzido de pesquisas que têm como preocupação a diversidade étnica na sociedade e, diante disso, as relações interpessoais estabelecidas nesse nível escolar. As pesquisas já realizadas confirmam a existência de problemas decorrentes do racismo, preconceito e discriminação étnica, destacando a existência destas nas trocas relacionadas entre os vários sujeitos da comunidade escolar. Desses relacionamentos foram selecionados aspectos importantes como, por exemplo: Expressão verbal – fala positivamente valorativa (elogios) ou negativamente valorativa (depreciativas) – explícita ou implicitamente sobre algum indivíduo,  sobre sua cultura ou sobre o grupo étnico. Prática não verbal – atitudes que demonstrassem aceitação ou rejeição do contato físico proposto pelas crianças e seus professores – através do abraço, beijo, ou olhar e comportamentos que evidenciassem as tentativas de proximidade ou afastamento entre indivíduos. Prática pedagógica das professoras – se positiva, negativa ou invisível, no que diz respeito aos materiais utilizados (cartazes, livros, revistas, desenhos,  ou outro meio qualquer) em relação á variedade étnica brasileira.

Na pesquisa de Santos (2005) sobre a relação racial entre negros e não negros em escolas públicas de Cáceres no Mato Grosso. Conforme Silva (2001 apud SANTOS, 2005), a povoação do Mato grosso do Sul se deu marcadamente pelos nativos (índios de várias etnias); migrantes vindos, principalmente, de Minas Gerais e São Paulo; negros africanos e mestiços (livres e escravos) trazidos pelos migrantes povoadores, segundo dados. A pesquisa revelou a existência de uma opinião generalizada, entre os alunos, sobre a inferioridade do negro e a superioridade do branco. ”Desde muito cedo o preconceito é incutido nas crianças, de tal forma que seu sistema ideológico racial, mesmo nas séries do Ensino Fundamental, é tão concatenado quanto o de um adolescente entre 17 e 18 anos.” (Figueira 1990, p. 67 apud SANTOS, 2005, p. 49). Após os resultados da pesquisa revelou-se que o preconceito racial demonstrado pelos alunos encontra respaldo no comportamento dos professores. Também observou que s professores mantinham e difundiam o preconceito racial entre os alunos, tanto por omissão como por manifestações racistas, ou ainda, “por desconsiderar a questão, tratando-a como um problema menor ou inexistente, na contramão da afetuosidade  mediando à relação discente/docente para a formação de personalidades sadias e capazes de aprender” (Capelatto, p. 14 apud BRUST, 200, p. 29),

Toda aprendizagem está impregnada de afetividade, num processo vinculador entre ensinante e aprendente. Corroborando com esta afirmação, Vygotsky (1991, p. 54 apud BRUST, 2009, p. 26) destaca a importância das interações sociais ressaltando a ideia da mediação e da internalização que ocorre de um intenso processo de interação entre pessoas. La Taille (2006. p. 108, apud MARTURANO; BORGES, 2012, p. 53) define seis sentimentos que ele chama de cimento afetivo que une as pessoas ao seu entorno social: empatia, amor e medo, confiança, indignação e culpa”.

A reflexão de Fleuri (2001) sobre a perspectiva intercultural nas práticas educacionais como caminho de proposições de novas estratégias relacionais entre sujeito e diferentes grupos, promovendo a construção de identidades sociais e o conhecimento das diferenças, ultrapassa a educação multicultural, na medida em que reconhece o valor intrínseco de cada cultura e defende o respeito recíproco e de interação entre diferentes grupos. Estas relações produzem mudanças em cada indivíduo, favorecendo a consciência de si e reforçando a própria identidade. Estereótipos e preconceitos de relações de sujeito ou de exclusão são questionados, e até mesmo superados, na medida em que sujeitos diferentes se reconhecem a partir de seus contextos, de suas histórias e de suas opções. A perspectiva intercultural de educação, enfim, implica em mudanças profundas na prática educativa, de modo particular na escola. “Pela necessidade de oferecer oportunidade educativa a todos, respeitando e integrando a diversidade de sujeitos e de seus pontos de vista” (Fleuri, 2001, p. 79 apud WELTER; TURRA, 2003, p. 186).

A Ética da Alteridade de Lévinas e questões subjetivas sobre se ver no olhar do outro segundo acepções da centralidade egoísta transformada em alteridade plural compondo princípios de educação em valores humanos poderia contribuir na desconstrução de barreiras constituídas no quadro de desencontros provocados pela não aceitação das diferenças sociais e raciais? A incorporação da alfabetização em valores humanos no currículo de formação como estratégia para reeducar a sensibilidade do juízo professoral quanto à centralidade da dimensão biológica da condição humana, certamente seria um instrumento poderoso de constituição de realidades educacionais? Portanto, lugar para acolher questionamentos e posicionamentos em torno da capacidade do olhar do professor em captar, prever, antecipar ou projetar situações, fatos, momentos que representam acolhimento à condição de ser em desenvolvimento na condição de criança, adolescentes e jovens nos mais diversos contextos da sua presença em processo de ensino e aprendizagem formal. Para Oliveira (2011:

[…] Embora saibamos que seja impossível uma escola igual para todos, acreditamos que seja possível à construção e uma escola que reconheça que os alunos são diferentes, que possuem uma cultura diversa e que repense o currículo, a partir da realidade existente dentro de uma lógica de igualdade e direitos sociais. Assim, podemos deduzir que a exclusão não é só econômica, ou seja, a origem pobre e a étnico-racial contam..

3.3 – Por um currículo com mais humanidade.

Algumas considerações da escola como espaço de exclusão provoca a análise do verbo conviver significando aceitar as diferenças qual a escola ainda não aprendeu a lidar por falta de autonomia educativa que ultrapasse o currículo como lugar que se configura as ações de conceber, selecionar, produzir, organizar, institucionalizar, implementar e dinamizar saberes e conhecimentos, valores constituídos na relação com o conhecimento eleito formativo do quadro de recortes acima elencados. Nesse sentido, Giroux questiona a função social do professor como um intelectual a serviço das escolas como locais econômicos, culturais e sociais inexoravelmente atrelados às questões de poder e controle. Isso significa que as escolas fazem mais do que repassar de maneira objetiva um conjunto comum de valores, formas de conhecimento, práticas de linguagens relações e valores sociais que são particulares da cultura mais ampla. Ou seja, ” introduzem e legitimam formas particulares de vida pessoal, pois no seu interior se disputa formas de autoridade, tipos de conhecimento e, formas de regulação moral e versões do passado e do futuro devem ser legitimadas e transmitidas aos estudantes” (GIROUX, 1997, p. 162).

Segundo Apple (2004) parte do seu livro tem base em uma crítica ao liberalismo como modelo para as políticas sociais e para a teoria e práticas educacionais, tanto nos Estados Unidos como em qualquer outro país, os resultados têm sido o desmantelamento das políticas da democracia social que vem geral beneficia trabalhadores, pessoas de cor e mulheres. […] “tentativas de cortar liberdades adquiridas têm sido associadas às necessidades, os medos e as esperanças de muitos grupos e pessoas que se sentem ameaçadas durante uma época de crise na economia, nas relações de autoridade, na família, na escola e em outros aspectos da vida social” (APPLE, 2004, p. 26). Apple questiona que um dos papéis da escola é, também, oferecer bases significativas para um trabalho “contra hegemônico”. Aprender como utilizar o conjunto de conceitos contra hegemônico é o primeiro passo se quisermos progredir no reconhecimento dos modos contraditórios pelos quais a educação funciona em nossa sociedade, “pois as palavras formam ideias e ideias são armas: espalhá-las em contexto autoritário é um ato subversivo, às vezes perigoso e ainda assim totalmente essencial” (APPLE, 2004, p.30). Para a escola cuja prática seletiva silencia sobre as diferenças sociais e raciais transformadas em diferenças escolares é preciso que repense o currículo e as considerações ideológicas de Apple a partir da realidade existente dentro de uma lógica de igualdade e de direitos sociais, pois há uma estreita relação entre a origem pobre, mas também pela origem étnico-racial de maioria de alunos da rede pública de educação.

Segundo Coelho (2008), pensar no estudo de autores que tomam como base nos resultados de aferições externas para avaliar a qualidade do ensino na educação básica do país, permitindo, assim, a proposição de políticas e práticas que aumentam a qualidade da educação, onde o construto “qualidade de ensino” é retomado como estando associado à qualidade do professor, definida principalmente pelas práticas pedagógicas, como mais relevantes que o nível de formação do professor ou o desempenho deste em exame de certificação. Os componentes de “boa escola” identificados no estudo “Aprova Brasil” são: boas práticas pedagógicas, professores comprometidos e qualificados, participação ativa dos alunos, gestão democrática e parcerias externas. O resultado confirma que bons professores tendem a ser efetivos para obter maior desempenho de estudantes de todos os níveis de habilidade e, embora a qualidade do professor pareça não se relacionar com os graus avançados de formação ou de certificação: “é a experiência que importa, principalmente no primeiro ano de trabalho docente” (COELHO, 2008, p. 247). Tão somente o enfrentamento dos desafios de um currículo com reconhecimento da diversidade; inserção de grupos excluídos; nascido da prática participativa do planejamento em acordo com as características necessárias a formação do comportamento crítico; consubstanciado no desenvolvimento das competências lógica, linguística e moral; e articulado entre elaboração de propostas curriculares no âmbito de políticas públicas e a realidade concreta da escola pode ensejar a ressignificação.

Os conteúdos e organizados nos cursos de formação tendem a ser descontextualizados, como se existissem por si próprios, em vista do que adquirem características artificiais. Não parecem referir-se a situações reais e concretas e, por isso, deixam de interessar aos gestores como algo referente à sua prática. Diante de tal situação, é muito difícil manter o interesse, a motivação e o envolvimento dos cursistas no desenvolvimento das aulas. Quando eles não se veem em relação ao objeto do curso, não veem a realidade concreta e objetiva da sua ação e não conseguem construir imagens em relação às questões tratadas, desligam-se de acompanhar as aulas e, portanto de aprender (LÜCK, 2000, p. 31).

Na leitura de Arroyo (2004) ou na acepção bourdieana de educação para as classes populares do nosso tempo marcado pelas propriedades mutantes do ambiente escolar o despreparo docente para criar situações pedagógicas com o quadro de expressões culturais que se confrontam na sala de aula tem seu entrave na falta de parâmetros em conteúdos com maior poder de mediação com os saberes trazidos de suas concretudes para uma realidade idealizada e cega para tantas carências humanas e materiais saltando aos olhos. A prática docente que não consegue contribuir em nome de perspectivas menos excludentes para tais depreciações gera frustração, sensação de incapacidade, e de certa forma o faz refém na impotência de sua própria prática e das necessidades do aluno.

No estágio obrigatório na Educação Infantil e Gestão Escolar realizado na Escola Municipal X, que atende alunos de entorno circunscrito pela “geografia da violência” foi possível vivenciar o desenvolvimento de experiência exitosa de articulação de conhecimentos e autonomia de gestão escolar pública. Ao analisar pontos fortes, oportunidades, fraquezas e ameaças na escola foram elencadas, principalmente, as situações que levam aos processos de evasão para estabelecer-se projetos para permanência do aluno. Para dar identidade ao Projeto Político Pedagógico (PPP) foi pensado planejamento em torno do tema: “Gentileza gera gentileza“. Ou seja, todos contribuindo a partir de uma nova consciência social e cultural marcada pela não violência, pela cooperação, pela sociedade sem defecção e pela convicção que outro mundo é possível. Essa cultura implica na introdução de elementos de justiça social, satisfação das necessidades básicas e dignidade para planejar sua vida e da sua família com liberdade e, sobretudo, com expectativa de poder concretizar o seu projeto de vida pela educação.

Tal identidade no PPP tem alicerce na justiça e na cooperação, pois atitudes de cooperação e tratamento pulam muros e chegam aos responsáveis. Se a equipe acredita que os alunos são capazes de produzir bons resultados eles avançam e, com isso, se motivam a aprender mais, se ninguém lhes der créditos, novos desafios, e, pelo contrário lhes oferecer somente as contradições da escola podem até desistir dela. É no cumprimento dele quando a imagem de uma escola se renova e a participação envolve toda comunidade escolar e, naturalmente, indicadores de aprendizagem melhoram, as notas de avaliação e as taxas de aprovação subam e os índices de evasão caiam. Colaborar no entendimento de que a educação é para todos sem discriminação, mesmo na complexidade do nosso tempo de incertezas, e que a afetividade é, amiúde, ignorada e não trabalhada, transformando-se em raiva, indisciplina e respeito, provoca a evasão escolar e o descompromisso com a aprendizagem. Conforme estudos da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial da Presidência da República – SEPPIR/PR[8], no ano de 2010, 50% nas mortes por homicídio era de jovens com idade de 15 a 29 anos, com pouca escolaridade, e entre esses, 75% são negros.

Para Catani 2002, a escola, ao ignorar desigualdades culturais entre crianças de diferentes classes sociais ao transmitir os conteúdos que opera, bem como os seus métodos e técnicas e os critérios de avaliação que utiliza, favorece os mais favorecidos e desfavorece os mais desfavorecidos. “Em outras palavras, tratando os educandos, por mais desiguais que sejam eles de fato, como iguais em direitos e deveres, o sistema é levado a dar sua sanção às desigualdades diante da cultura” (Bourdieu, 1988, p. 53 apud CATANI, 2002).

Para Arroyo (2004), reconhecimento e identificação na educação tem uma força poderosa e incisiva, emancipatória ou discriminatória. Também pode ser compreendida em níveis variados e múltiplos: nível ideológico e político, institucional, estrutural e subcultural. Como docentes analfabetos digitais preparam situações didático-pedagógicas para discentes nativos digitais que seja uma leitura atualizada de mundo com capacidade de dialogar com as TICs? Como avaliar crianças saídas de realidades tão desumanas com os mesmos instrumentos avaliativos e métodos de pressupostos teórico-conceituais de estudiosos do desenvolvimento humano como foco nos eventos genéticos até os processos culturais, desde os fisiológicos até as interações sociais, com os padrões de adaptação sendo entendidos mediante interações dos níveis internos e externos dos indivíduos? Como avaliar com os saberes da cultura da escola estruturas levadas a exaustão de aprendizagens para mentes e vontades tão infantis em responsabilidade adulta na luta pela sobrevivência? As responsabilidades quais são expostas em suas vivências antecipadas da vida adulta por si só desmistifica as falas de falta de força de vontade.

A desconstrução da autoimagem da docência como lugar de transmissão do pensamento dominante em nome de olhares que contemplem formas de se estar no mundo, mais justo e igualitário, mais humano, e menos segregado coaduna com a percepção de Arroyo (2011, p. 62) quando diz: “Reeducar nosso olhar, nossa sensibilidade para com essas crianças-alunos pode ser de extrema relevância na formação de um docente-educador”.  Ou Arroyo (2011, p.128-129) quando escreve: “Falamos como se fosse um absurdo receber e cuidar de corpos famintos nas escolas.” Por que essas reações? Por que identificamos nossa função não com alimentar corpos, mas com alimentar mentes de crianças, adolescentes e jovens famintos de conhecimento. Num malabarismo imaginário cindimos o ser humano em corpo e mente, e nos reservamos o trato de mentes incorpóreas. Haveria ainda uma explicação para essa dificuldade de assumir a educação de seres corpóreos: a condição biológica dos alunos não resolvida se defronta com o cognitivismo e intelectualismo abstrato que vem dominando os currículos e a cultura escolar e docente nas últimas décadas. Portanto, urge levar ao currículo vozes dissonantes de coletivos preocupados com dimensões que contra argumentam com a cientificidade, a neutralidade e a, impessoalidade em nome da subjetividade e objetividade para a construção de intersubjetividade representativa de suas existências humanas, alimentação, teto, educação,  saúde, valores, lutas por terra, culturas, saberes, identidades, território, direitos.

Os currículos, sendo fiéis a critérios de validade e de racionalidade, têm de ignorar não apenas outros modos de pensar, outros saberes e leituras de mundo, mas têm de ignorar os sujeitos desses outros modos de pensar. Ignorar, ocultar, tratar como inexistentes para a história intelectual os coletivos populares (ARROYO, 2011, p. 141). 

3 – CONCLUSÕES FINAIS

Dialogar com pesquisadores autores instrumentalizados de teorias, conceitos e métodos das ciências sociais que auxiliam a pedagogia na sua condição de ciência capaz de problematizar a realidade educacional fornecendo o conjunto de saberes técnicos procedimentais para o trabalho exploratório/investigatório na busca de elementos para criar conhecimentos com coerência e relevância teórico-conceitual ou do aporte de pesquisa empírica na busca em perceber para além das obviedades de visões de mundo postas nas formas de dar identidade à escola cumpre objetivos pedagógicos e filosóficos de aprendizados cumulativos na condição de licenciando em Pedagogia.  A questão norteadora foi respondida ao longo de trajeto construído segundo parâmetros necessários a conformar o trabalho monográfico em artigo acadêmico com credibilidade e cientificidade proclamadas por normas técnicas, procedimentos, modelos e padrões em que exemplos de vivências e experiências elencadas da concretude de seus sujeitos com o devido embasamento teórico promoveram a compreensão de que o currículo ao dar identidade à escola e a ação educativa inviabiliza um olhar mais complacente para acomodar a realidade social do aluno interferindo na qualidade da sua vida acadêmica.

Para desvelar o olhar que influencia a percepção docente como uma variável capaz de explicitar fenômenos educacionais em que meninos negros são as principais vítimas de processos de desescolarização, certamente as constatações trazidas do trabalho de pesquisas de autores e pesquisadores debruçados sobre a relação pedagógica pelo ângulo da questão racial escolhidos contribuem em informações com a credibilidade necessária. Os dados coletadas com cientificidade e coerência aprovada pela comunidade acadêmica nos leva ao entendimento de que as questões étnico-raciais visíveis e/ou na subjetividade do currículo oculto precisa habitar a sala de aula em debates francos pelo que os estereótipos, os isolamentos, o imperativo da lei acima de questões humanas precisam de outros tratamentos na composição de objetivos, metas, programas, estratégias e metodologias que traduz a intencionalidade formativa de ser humano do   Projeto Pedagógico.

Com referencial de diferentes abordagens teórico-metodológicas explicativos da realidade escolar com suas transformações e adaptações influenciando o ser humano, onde crianças, adolescentes e jovens e a sua condição de ser em formação suscita a presença adulta para orientá-los, implica no entendimento de que a escola e a família conjuntamente são referenciais a municiá-los em alfabetização precoce em valores humanos pelo que a barbárie se impõe na indiferença ao outro do nosso tempo de tecnologias da informação e da comunicação virtualizando as relações e nos privando de sentimentos grupais.

Como a vida em sociedade é estabelecida por dinâmicas determinadas por questões que na maioria das vezes estão relacionadas ao lugar social, impossibilitando num primeiro momento outros horizontes diferentes da concretude instalada, as oportunidades oferecidas pela escola passam a ser cruciais em tal contexto. Como a segunda em importância, entre os vários espaços de trocas interpessoais, a escola pública precisa rever os alicerces da sua base afetivo-emocional quando avalia por ferramentas culturais de pertencimento. Portanto, os dados transcritos de pesquisas empíricas que se efetivam em falas sobre percepção, autopercepção, tanto quanto de autoclassificação e heteroclassificação racial buscou conhecer o quanto a relação cognição e afetividade sofre influencia direta ou indiretamente dessas variáveis, já que funcionam como força de aproximação ou defecção em nossa desigual sociedade de classes.

Concomitante a nossa formação social e a maior presença de população negra nos estratos ditos inferiores ou de grupos subjugados provocando determinações em formas de viver que impossibilita os de sonhar pela educação porquanto os objetivos educacionais da literatura formativa pertencer somente à transformação retórica. Espero que o material utilizado represente a totalidade da intencionalidade pretendida, onde textos de autores das diversas áreas do conhecimento dialogaram com os objetivos, as questões norteadoras e justificativas elencados, que podem compor o repertório de intelectuais orgânicos preocupados em debater, inferir, interferir, reconhecer ou investigar a nossa diversidade multicultural e plurirracial não configurada no currículo. Problematizar o currículo em nome de vozes dissonantes, no sentido contra hegemônico gramsciano, significa praticar princípio freireano de oposição a formas antipedagógicas de perpetuar identidades coletivas negativas e inferiorizadas.

Socializar a produção científica de pesquisadores autores com olhares próximos da concretude dos filhos das classes populares e com capacidade para transpor o currículo oculto e enxergar a subjetividade da relação pedagógica, assim como a experiência exitosa de Gestão Escolar com autonomia para pensar Projeto Pedagógico para acomodar manifestações culturais identitárias feitas por adolescentes e jovens sobre a vida comunitária e sobre a relação com a escola significa eleger novos formadores de opinião. Tais modos de demonstrações de nossas existências é lugar para encontrar interrogações seríssimas sobre nossa condição de seres humanos, como também é dizer que existe preocupação de coletivos orientados em ultrapassar transformações retóricas e dar voz para coletivos subjugados.

Assim sendo, o desejo de investigar e revelar situações cotidianas da relação pedagógica capazes de contribuir com novos conhecimentos sobre como se dá o “juízo professoral” que dirige o olhar negativo ou positivo do professor passa pela alfabetização em valores humanos em nome de outra identidade da escola, diferentemente daquela de professores com antolhos que adjetivam o imaginário intramuros escolar, transpõe muros e habitam o imaginário coletivo. Contextualizar o entendimento de que valores dominantes do currículo a criar a exclusão dentro e fora da escola e, de modo seletivo em meninos negros nas séries/anos iniciais da educação básica impedindo-os de sonhar outras narrativas de história de vida que não as dos desdobramentos de futuro com perfil em grupos estatísticos de vítimas da violência urbana,  por exemplo, é a contribuição maior desse trabalho monográfico.

ANEXO A

QUADRO 1

O quadro quantitativo, assim como a tabela com o registro de participação em enquete ou survey, foi gerado pelo registro visualizações de site[9] com referência internacional em profissionalismo e uso de recursos diferenciais no gerenciamento de conteúdo para web. Assim sendo, transcrever resultado mensal e anual de acessos de internautas e escolha de opções interrogativas de interessados em participar diretamente, socializar, se informar ou debater assuntos relacionados à educação e entre esses as causas do fracasso escolar instalado na educação básica da escola pública brasileira garante a credibilidade necessária para justificar a intencionalidade dos dados como suporte para escolha de título do Trabalho de Conclusão de Curso. Outra maneira de demonstrar que o tema mobiliza a atenção de internautas de redes sociais com interesses afins em educação, estudantes da modalidade on-line, etc., entendido aqui como fato a ser apenas mencionado, seriam os Termos do Motor de busca pelo que esta fermenta possibilita categorizar usuários com maior ou menor conhecimento de terminologias relacionadas à educação. Segue quadro demonstrativo:

 

Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez Total
2010 193 153 54 91 165 157 212 91 1.116
2011 84 163 254 152 176 137 110 175 240 347 353 144 2.335
2012 81 137 472 372 369 323 215 190 261 269 282 88 3.059
2013 75 78 188 75 56 92 48 73 119 104 165 43 1.148
2014 49 53 187 191 153 75 36 872

 ANEXO B

TABELA 1

Interrogações extraídas de texto sobre as “As Causas do Fracasso Escolar” da Dissertação de Sirino (2002) sobre o fracasso escolar a partir do discurso do aluno transformada em postagem e levada às redes sociais relacionadas à educação, principalmente. Na tabela abaixo as doze (12) interrogações objetivas e subjetivas definidas como “ponto de partida” da monografia, pois o tema do Trabalho de Trabalho de Conclusão de Curso foi definido em acordo com a opção interrogativa com maior número de consensos.

AS CAUSAS DO FRACASSO ESCOLAR

1- O vínculo negativo entre a escola e a criança provoca reações de pavor e temor em se expor por medo de errar e ser humilhado?
2- Sobre a criança-aluno recaem olhares negativos, assim professores “vão empurrando” esses alunos ou então “deixando-os de mão”?
3- O olhar do professor sobre o aluno pode construir a sua trajetória escolar positiva ou negativa?
4- A falta de vínculo entre o professor e o aluno para facilitar a aprendizagem?
5- O que se cultiva no ambiente escolar é o medo e a insegurança?
6- As mães veem seus filhos como portadores de qualidades, vontades, curiosidades que a escola nem sempre leva em consideração?
7- A falta de diálogo entre os sujeitos do processo cultural por n motivos do distanciamento entre a escola, a família e a comunidade?
8- A baixa qualidade do ensino, as práticas educativas excludentes, o despreparo e as constantes trocas e falta de professores?
9- O desconhecimento do saber do aluno, as ideias preconcebidas quanto à proveniência social e de sua família produz uma experiência escolar pobre?
10- A falta de condições para contribuir com o conteúdo escolar do filho levando a família a assumir a culpa por sua exclusão, isentando a escola de suas responsabilidades sociais e educativas?
11- As dificuldades de relacionamento do professor com os alunos, com os pais dos alunos, com a instituição escolar e com as mudanças na política educacional?
12- As relações estabelecidas na escola manifestam sentimentos de inferioridade, inadequação, incompetência e não pertencimento que se mesclam com sentimentos de poder e querer?

Total: 241 (de uma a três opções de escolha por participante).

[1] A teoria das representações sociais centra-se na à análise da construção e transformação do conhecimento social e tenta elucidar como a ação e o pensamento se interliga na dinâmica social.

[2] Este relacionado à classificação ou desclassificação escolar, conforme a avaliação do sistema escolar estruturado em juízo de valor que pode valorizar, ou não, a intimidade do indivíduo (agente) com o saber. A forma que seus pensamentos e ações compactuam com a forma de pensar da instituição escolar, pode contribuir para as desigualdades sociais.

[3] O processo de formação deve dotar os professores de conhecimentos, habilidades e atitudes para desenvolver profissionais reflexivos ou investigadores. Nesta linha, o eixo fundamental do currículo de formação do professor é o desenvolvimento da capacidade de refletir sobre a própria prática docente, com o objetivo de aprender a interpretar, compreender e refletir sobre a realidade social da docência. […]. Mas o professor não deve refletir unicamente sobre a sua prática, mas sua reflexão atravessa as paredes da instituição para analisar todo Tipo de interesses subjacentes à educação, à realidade social com objetivo concreto de obter a emancipação das pessoas (IMBERNÓN, 2002, p. 39-40).

[4] Quadro e tabela com o acesso mensal e anual no endereço da web:
< https://projetomuquecababys.wordpress.com/2010/05/06/as-causas-do-fracasso-escolar/  >

[5] Os pesquisadores dessa área buscam compreender as intersecções entre cultura, indivíduo e sociedade. Alguns trabalhos questionam as fronteiras entre alta cultura e cultura de  massa ou comercial, investigam os processos de produção da cultura, abordam objetos culturais híbridos, configurações indenitárias de grupos socialmente marginalizados e trocas culturais que deles advêm. Enfatizam,  também, o rompimento das barreiras disciplinares que possibilitam transitar por diferentes áreas de conhecimento, tendo em vista que uma determinada disciplina não abarca todas as possibilidades de apreender um objeto a ser conhecido.

[6] Brasil, 1977ª, p. 65-71

[7] Cabe aqui esclarecer que a educação assimilacionista está relacionada ao estilo de ensino que funciona sem considerar as características culturais específicas do aluno.

[8] Pesquisa de opinião pública nacional sobre a violência contra a juventude negra no Brasil. Mais informações no endereço da web: < http://www.seppir.gov.br/arquivos-pdf/pesquisa-datasenado >

[9]  < https://projetomuquecababys.wordpress.com/  >

ESTATÍSTICAS do Projeto Muqueca Babys
< https://wordpress.com/my-stats/?view=table >

REFERÊNCIAS BIBLIOFRÁFICAS

APPLE, Michael Whitman. Ideologia e currículo. São Paulo: Brasiliense, 2004.

ARROYO, Miguel Gonzáles. Imagens quebradas – Trajetórias e tempos de alunos e mestres. 6ª Ed. Vozes, Petrópolis: 2004.     ISBN  978-85-326-3071-1

________________________. Currículo, território em disputa. Petrópolis: Vozes, 2011.        ISBN 978-85-326-4083-3

BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais – Introdução aos parâmetros curriculares nacionais. Secretaria de Educação Fundamental. Brasília: MEC/SEF, 1977. 126 p.
Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/livro01.pdf&gt;
Acesso em: 23/09/2012.

BRUST, Josiane Regina. A influência da afetividade no processo de aprendizagem de crianças nos anos iniciais do ensino fundamental. UEL – Universidade Estadual de Londrina, 42 f. TCC (Trabalho de Conclusão de Curso) – Centro de Educação, Comunicação e Artes, Londrina: 2009.
Disponível em: <http://www.uel.br/ceca/pedagogia/pages/arquivos/JOSIANE%20REGINA%20BRUST.pdf&gt;
Acesso em: 26/06/2012.

CARVALHO, Arlete Maria de; FARIA, Moacir Alves de. A construção do afeto na educação. Revista Eletrônica Saberes da Educação, FAC São Roque, v. 1, n. 1, São Paulo: 2010.
Disponível em: <http://www.facsaoroque.br/novo/publicacoes/pdfs/arlete.pdf     >
Acesso em:

CATANI, Afrânio Mendes. A sociologia de Pierre Bourdieu (ou como um autor se torna indispensável ao nosso regime de leituras). Educ. Soc. V. 23, n. 78, Campinas: abr./2002.          ISSN 0101-7330
Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-73302002000200005&gt;
Acesso em: 25/03/2011.

CAVALLEIRO, Eliane dos Santos. Do silêncio do lar ao silêncio escolar – racismo, preconceito e discriminação na educação infantil. USP – Universidade de São Paulo, Dissertação (Mestrado) – Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Educação da USP, São Paulo.

­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­____________________________. Por um estado que proteja as crianças negras do apedrejamento moral no cotidiano escolar. Cata ao Excelentíssimo Presidente da república Federativa do Brasil, nov./2010.

CINELLI, Nair pereira Figueiredo. A influência do vídeo no processo de aprendizagem. 72 f. Dissertação, programa de Pós-Graduação em Engenharia da Produção, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis: 2003.
Disponível em: <http://coral.ufsm.br/tielletcab/Nusi/HiperV/Biblio/PDF/8160.pdf&gt;
Acesso em: 15/07/2013

COELHO, Maria Inês de Matos. Vinte anos de avaliação da educação básica no Brasil: aprendizagens e desafios. Ensaio: Avaliação de Políticas Públicas em Educação, v. 16, n° 59, p. 229-258, Rio de Janeiro: abr./jun. 2008.

GIROUX, Henry, A. Os professores como intelectuais. São Paulo: Artmed, 1997.             ISBN 9798573073019

GUITIERREZ, Suzana de Souza. A etnografia virtual na pesquisa de abordagem dialética em redes sociais online.

UFRS – Universidade Federal do Rio Grande do Sul: 2004.
Disponível em: <http://32reuniao.anped.org.br/arquivos/trabalhos/GT16-5768–Int.pdf&gt;
Acesso em: 17/08/2012.

<http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0104-40362008000200005&script=sci_arttext&gt;
Acesso em: 11/10/2013

LADSON-BILLINGS, Gloria.  Os guardiões dos sonhos – O ensino bem-sucedido de crianças afro-americanas. Tradução – Cristina Antunes, Coleção Cultura Negra e Identidades, Minas gerais: Autêntica, 2008
ISBN 978-85-7526-299-3

LÜCK, Heloísa. Perspectivas da Gestão Escolar e implicações quanto à formação de seus gestores. Em Aberto, Brasília, v. 17, n. 72, p.11-13, fev./jun. 2000.
<http://pt.scribd.com/doc/52607994/Heloisa-Luck&gt;
Acesso em: 29/04/2012.

MACEDO, Roberto Sidnei. Currículo – Campo, Conceito e Pesquisa. 3ª Edição, Editora Vozes, Petrópolis: 2009.      ISBN 9788532634436        .

MARTURANO, Edna Maria; BORGES, Dâmaris Simon Camelo. Alfabetização em valores humanos – um método para o ensino de habilidades sociais. São Paulo: Summus Editorial, 2012.                ISBN  978-85-323-0791-0

MINAYO, Maria Cecília de Souza. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. Caderno de Saúde Pública, vol. 8, n. 3, Rio de Janeiro: jul./set. 1992.
Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0102-311X1992000300013&script=sci_arttext&gt;
Acesso em: 10/09/2011.

MIRANDA, José Valnei Albuquerque. Ética da Alteridade na Educação. 188 f.  Tese de Doutorado – Universidade Federal do Rio grande  do Sul. Faculdade de Educação. Programa de Pós-graduação em Educação, Porto Alegre: 2008.
Disponível em: http://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/14654/000658924.pdf?sequence=1
Acesso em: 109/08/2014

OLIVEIRA, Eliana. Identidade, intolerância e as diferenças no espaço escolar: questões para debate. Revista Espaço Acadêmico, Ano I, n. 07, Dezembro/2001.
Disponível em: <http://www.espacoacademico.com.br/007/07oliveira.htm&gt;
Acesso em: 23/07/2009.

PINTO, REGINA, Pahin. Diferenças étnico-raciais e formação de professor. Cadernos de Pesquisa, n. 108, nov./1999.
Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/cp/n108/a09n108.pdf&gt;

PROVA DE FOGO – Uma história de vida. Direção: Doug Atchison, Título Original: Akeelah and the Bee, País de Origem: EUA, Gênero: Drama, Tempo de Duração: 112 minutos. Ano de Lançamento: 2006.

RUBENS ALVES. Pedagogia do olhar. 2011.
Disponível em: <http://pt.slideshare.net/joserosafilho/pedagogia-do-olhar-rubem-alves&gt;
Acesso em: 25/06/2011

SANTOS, Ângela Maria dos. Vozes e silêncio do cotidiano escolar: análise das relações sociais entre alunos negros e não negros em duas escolas públicas do município de Cárceres. UFMT – Universidade Federal do Mato Grosso, Dissertação (Mestrado), programa de Pós-Graduação em Educação do Instituto de Educação, Cuiabá-MT: 2005.
Disponível em: <http://www.bdae.org.br/dspace/bitstream/123456789/1676/1/tese.pdf&gt;
Acesso em: 26/06/2012

SILVA, João Paulo Souza. A relação professor/ aluno no processo de ensino e aprendizagem. Revista Acadêmica, nº 25, Setembro/2005, Mensal.     ISSN   15196186
Disponível em: <http://www.espacoacademico.com.br/052/52pc_silva.htm&gt;
Acesso em: 25/10/2012

SIRINO, Maria de Fátima. Repensando o fracasso escolar: reflexões a partir do discurso do aluno. Dissertação (Mestrado) Programa de Pós-Graduação em Ciências |Humanas – Psicologia da Faculdade de Ciências e letras, UNESP, São Paulo: 2002.
Disponível em: <http://www.bv.fapesp.br/pt/publicacao/84869/repensando-o-fracasso-escolar-reflexoes-a-partir-do-discurso/ 

TERUYA, Tereza Kazuko; LUZ, Márcia Gomes Eleutério da; MORAES, Denise Rosana da Silva; WALKER, Maristela Rosso. Narrativa fílmica no contexto escolar: O contador de histórias. X Congresso Nacional de Educação – I Seminário Internacional de Representações Sociais, Subjetividade e Educação – SIRSSE, PUC-Paraná: 2011.
Disponível em: <http://educere.bruc.com.br/CD2011/pdf/5284_2503.pdf&gt;
Acesso em: 01/07/2013

WELTER, Tânia; TURRA, Neide Catarina. Espaços culturais nas escolas públicas negados ou silenciados? Uma abordagem à diversidade. Ponto de Vista, UFSC, n. 05, p. 179-189, Florianópolis: 2003.
Disponível em: <https://periodicos.ufsc.br/index.php/pontodevista/article/view/1250&gt;
Acesso em: 30/03/2013 t

BLACK IS BEAUTIFUL – A importância da cor da pele

Posted in Cidadania, Cinema, Educação, Política & Políticos, Sociedade, Violência Urbana with tags , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , on janeiro 28, 2015 by projetomuquecababys

By Luis Carlos “Rapper” Archanjo

Luis Carlos "Rapper" Archanjo

Luis Carlos “Rapper” Archanjo

Os grandes jornais da mídia nacional e internacional perdendo espaço para a notícia comentada e compartilhada por internautas preocupados em efetivar posicionamento a favor ou contra, curtidas por simpatizantes interligados por interesses afins em debates interativos socializando conteúdos de toda natureza; a promoção de mobilizações da militância via redes sociais como exemplos de uso da acessibilidade como instrumento a favor dos sem mídia diz por si só que é possível convergir atenções, pontos de vista diletantes, considerações mais embasadas de abordagens em pressupostos com o respaldo de estatuto de cientificidade capaz de promover dois temas bastante controversos do nosso tempo que ainda não provocaram a devida mobilização interativa: conflitos raciais e intolerância religiosa. Nesse sentido, os afro-americanos afirmam mais uma vez a vocação em ser modelo ou espelho para aqueles da diáspora africana ao eleger o seu primeiro presidente negro, cuja campanha pautou-se no uso do poder infocomunicacional da internet e da web 2.01 como fator decisivo para adentrar aos lares americanos de todas as cores. Segundo a Unesco, a defesa da educação digital deve ser parte da formação de qualquer cidadão, em qualquer nação, no sentido de fomentar o direito à informação e a liberdade de expressão como instrumentos de construção e sustentação democrática, e pela qual indivíduos e organizações estão sendo confrontados com a necessidade de empregar um conjunto de habilidades e competências requeridas para usar diferentes tipos de informação, serviços e produtos, bem como interagir socialmente através dos meios eletrônicos.

Contribuição atualizada da emblemática mobilização afro-americana do passado, quando na busca pelos direitos civis de ir e vir em solo americano, as recentes manifestações dos negros indo a ruas com gritos de ordem contrários aos casos de uso excessivo ou letal contra cidadãos desta etnia, principalmente, diz o quanto a luta pelo direito a outro tratamento diferentemente do vigor que acaba em morte para jovens ou adultos, por agentes do Estado quando no cumprimento da lei, se faz também pela motivação maior de ser parte de contexto vitimizado por tal discrepância no tratamento de situações sociais conflituosas. Lembrada pelos sete de artigos e de ter sofrido apenas 27 emendas desde a sua promulgação em 1787, há 227 anos, a Constituição Americana fixa somente princípios gerais, enquanto a brasileira, de 1988, com apenas 22 anos, é programática, e, por isso já foi emendada mais de 60 vezes. O que nos difere dos americanos é o tempo histórico de poucas conquista sociais, a não ser a luta para consolidar direitos civis e políticos. Promulgada na quarta geração de direitos (civis, políticos, sociais e difusos, como ambientais, do consumidor e as políticas afirmativas ou de quotas), a nossa Carta Magna exige uma melhor disciplina sobre uma série de direitos, especialmente os direitos humanos. Nesse sentido, as especificidades de interesses difusos se fazendo presente no exercício democrático de questionar e propor juridicamente mudanças no texto de lei seja porque ela contém desigualdades, ou não cumpre a contento a salvaguarda de direitos inalienáveis de pessoas e grupos marginalizados, cabe na busca de mudanças na legislação brasileira de modo a atender a falta de representatividade no legislativo e no judiciário. No Brasil, desde a Constituição Cidadã de 1988, a iniciativa popular está proclamada no Art. 61, parágrafo 2°, e é o instrumento pelo qual faculta, a qualquer cidadão, a feitura de lei, seja ela complementar, seja ela ordinária. Ou seja, o artigo diz respeito à representação política da população, por meio de entidades representativas da vontade de fração do eleitorado e, onde consta que a iniciativa popular como instrumento de democracia participativa pode desencadear ações em nome de um novo direito ao possibilitar o povo interferir diretamente na criação legislativa. Portanto, fazer desse instrumento jurídico poderosíssimo um caminho para corrigir as desigualdades perpetradas por interesses historicamente estabelecidos pela ideia reinante de uma minoria, tuteladores, que se autoproclama representantes das reivindicações de restante da população, de mundo pautado por transformações na sociedade e no Estado, traz a tona problema relacionado à concepção tradicional de democracia representativa e a tendência dos partidos políticos em monopolizar a ação política, favorecendo a formação de oligarquias a partir de comitês dirigentes altamente burocratizados. Some-se a isso a influência do poder econômico e de toda sorte de grupos particulares sobre os partidos políticos e estes aparecerão mais como bloqueadores do que como canalizadores da vontade popular. Resumindo: possuímos ferramentas jurídicas de mudanças, todavia falta utilizá-las com mais frequência, para o nosso próprio bem, o bem coletivo, imprescindíveis na construção se uma sociedade livre, justa e solidária; erradicação da pobreza, da marginalização de pessoas e grupos; redução das desigualdades sociais e regionais; e, por fim, sair do âmbito de uma minoria e promover o bem de todos, sem distinções de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.  “Especialmente a partir do século XIX, enveredamos pelo caminho dos partidos políticos. E chegamos a um ponto em que o partido não é mais um representante do povo, ele é um substituto do povo, e aquilo que se propunha como democracia degenerou em partidocracia.” (Bobbio, 1986, p. 61 apud RIBEIRO, 2007, p. 7).

A xenofobia para com o êxodo humanitário de africanos subsaarianos ou não, e/ou no próprio limite fronteiriço, assim como no período de formação dos Estados Europeus a partir do século XVI, com políticas anti-imigratória, ou a ação intimidatória por grupos racistas ancorados no legislativo e no judiciário como lugar para a ação de partidos da extrema-direita com práticas do nacionalismo chauvinista, o racismo, e o ódio aos imigrantes, sobretudo “extra-europeus” – e os ciganos (o povo mais velho da Europa), a islamofobia, a misoginia, o autoritarismo, o desprezo pela democracia, a euro fobia; os ataques terroristas fora ou dentro do solo europeu, entre outras informações que são exemplos de posicionamentos ideológicos movidos por sentimentos de amor aos iguais ou desprezo ao outro por causa da cor da pele e religião transformando cidadãos de qualquer parte do mundo em alvos fáceis de barbáries com maior ou menor crueldade. Causa e efeito de características que diferem e determinam genética, cultural e economicamente seres humanos e se faz fator relevante no constructo social na importância da cor da pele, o lugar social é exemplo de contra argumento do pensamento bourdieano de como parâmetros de maior ou menor valia para a condição humana em processos de locomoção, mobilidade social, exercício plena da cidadania, entre outras tantas variáveis de impedimentos para certos grupos humanos tem raiz nos desdobramentos do histórico de subjugação e escravidão do homem pelo homem quando na vitória sobre o inimigo, e a sua re-significação até o nosso tempo de distinções em inferioridade ou superioridade de classificação racial determinada pela exterioridade fenotípica e pelo acesso a educação. Num segundo plano a opção religiosa e depois as minorias sem aproximações com valores estabelecidos em acordo com os modismos de tempo imagético a inferir posicionamentos e/ou julgamentos no tabuleiro de xadrez das relações sociais e raciais, que por uma ordem natural entrecruza às controvérsias a questão religiosa como parte indissociável dos conflitos porquanto da estreita relação entre intolerância, educação, raça e religião. O direito a educação, a liberdade de expressão, entre as muitas maneiras do efetivo exercício pleno da cidadania passa pelo direito à informação.

Fazer uso da prática e da teoria apreendida no estudo das ciências sociais como caminho para o reconhecimento como sujeito com as competências e habilidades necessárias para a ação educadora é, também, aplicar tal conhecimento no sentido freireano de educar como ato político movido por convicções próprias da história pessoal em justificar direcionar, explicitar, contextualizar e questionar as bases de sustentação de posicionamento de neutralidade ou pró ao instituído nas relações raciais e os reflexos dessas polêmicas desdobrando-se em exercícios infantis da ignorância adulta no extra e no intramuros das salas de aula do nosso país. A partir de considerações em pesquisa bibliográfica referenciada por academicismo que lhe confira credibilidade e, ao mesmo tempo fazer uso de conteúdos com mediação interativa possibilitada pelas linguagens audiovisuais de mundo em que as dinâmicas por imagens e sons vêm substituição à estática de argumentos pautados somente na subjetividade de discursos saídos de observações ou imersões em contexto sem autorias próprias, verdadeiramente identificadas com o recorte da realidade objeto de estudo, espero que o texto cumpra a contento a intencionalidade pretendida. Exemplo de aplicabilidade desse tipo de narrativa é a  interessante experiência  documental sobre maquiagem para contextualizar a percepção de brancos e negros nas relações raciais rotineiras comuns à vida urbana. Realizada por programa da TV francesa, no ano de 2007, ‘Dans la peau d’un Noir” (Sob a pele de um negro), qual há a transformação de uma família negra em “branca” e outra branca em “negra”, com o objetivo em acompanhar o dia a dia de situações concretas de como se dá os processos de maior ou menor valia, subentendido em atitudes, posicionamentos, tratamentos vivenciado por voluntários transformados por uma segunda pele durante uma semana. A troca de identidade étnica para atividades como buscar um apartamento para alugar, ida a shoppings, lojas de artigos caros, comprar carro etc. Mais do que mostrar a incrível capacidade de modificação estética pela maquiagem, o experimento vislumbra mostrar o quanto a aparência (meramente superficial) pode influenciar nas interações sociais.

Questionar o legado positivista que ainda hoje contamina o olhar acadêmico para com outros saberes significa entender como mais significativo a articulação entre teoria e realidade na construção de narrativa sobre fenômenos humanos qual o observado se entenda como objeto do conhecimento, tanto quanto o observador compreenda as especificidades em ser da mesma natureza do objeto de estudo. Pensar concepções de entendimento do “outro”, que não somente aquelas fruto da capacidade de abstração para inferir sobre a diversidade humana produzindo verdades sem o contra argumento de experiências e vivências in natura com estruturação semântica e enunciação representativa da cosmovisão do diferente para a apreciação de iguais entre si, pode ser comparado a atitude etnocêntrica de  subvalorizar qualquer outro conhecimento que questiona a ordem de saber referenciado pelo diploma, que caracteriza os espaços de poder sem a diversidade indagada pela professora e pesquisadora Fúlvia Rosenberg ao falar da ausência afro-brasileira nos cursos de graduação e pós-graduação. Tais observações é exemplo do quanto urge a maior presença de intelectuais orgânicos com embasamento teórico-conceitual de programa educacional com capacidade de dar vez e voz via academicismo de cânones com poder de persuasão em contradizer verdades questionáveis, tanto quanto identificar métodos e práticas que propiciem às gerações trabalhadoras rotas de fuga da subalternidade intelectual tutelatória, com fins práticos, do sujeito cognoscente e questões relativas à individualidade e de vontade própria quando se tem o labirinto de complexidade do comportamento humano como objeto de análise.

Questionar o posto sobre as questões étnico-raciais a partir do entendimento da ideologia por trás do até então socializado e a reinante desinformação a respeito do refutado pelas ciências humanas do século XXI, traduz o quanto o processo de comunicação está inscrito numa teia de relações sociais onde se almeja sempre que ela seja instrumental para a reprodução social, fazendo com determinado saber possa ser ideologizado, reforçando-se assim a dominação de classe, gênero, etnia ou geração. Assumir o princípio freireano de educação transformadora significa buscar a franqueza de argumentos possíveis de convocar, provocar, contra argumentar e produzir conhecimento pedagógico para abordagens capazes de promover a reeducação de atitudes, valores, o diálogo, a negociação e interação entre diferentes culturas, e o tema não nos remeta a palavras como hipocrisia e covardia. Tais considerações interrogam-nos: Nós, brasileiros, somos ou não um povo racista?

O planejamento curricular como lócus de permanências para impedimentos à autonomia docente e a inviabilizar a aplicação do aprendido na formação da competência praxiológica do pedagogo em sua totalidade nos leva a interrogação de até quando o pensamento dos “herdeiros bourdieano”2 forjará corpos e mentes com conteúdos questionáveis de mudanças na insensibilidade para com a infância negra, principalmente. Assim sendo, pensar-se na formação ou na educação continuada de profissionais de educação segundo o acima exposto é propor alterações no quadro de palavras comuns ao repertório de esquivas do absenteísmo, na adjetivação explicitada por Arroyo (2011), na reinante visão acrítica, despolitizada com o tema em questão ou na postura míope quando na concretude do exercício docente e a existência ou não de preconceito ou discriminação entre os pares no nível básico de ensino público, primeiramente.

TICs – Informação versus conhecimento

Desde os anos 90, com a ascensão das ciências da vida, com destaque para a Genética, os estudos de mapeamento do Genoma Humano ocupa destaque nos principais debates científicos até os dias atuais, colocando novas questões que, para além das especificidades disciplinares, exigem o enfrentamento de tema tabu que é a questão racial, entre outros temas com implicações transversais às diferentes disciplinas. Assim como há o antagonismo racial preto versus branco por conta do legado teórico de cientificidade e do discurso descritivo da pseudocientificidade dos séculos passados ao estabelecer os pressupostos para definir raças superiores e inferiores, há, também, a questão racial motivada por fatores étnicos e místicos no antagonismo racial de negros versus negros. Por exemplo, em algumas regiões da África Subsaariana os casos de albinismo, consequente de ausência de pigmento na pele, nos cabelos e olhos devido a uma deficiência na produção de melanina pelo organismo, tem chamado a atenção do mundo para a “caçada” quais os portadores dessa doença congênita vêm sofrendo em países do leste africano, principalmente na Tanzânia. Em algumas regiões do interior são tidos como pessoas demoníacas e perigosas. Nestes países, alguns acreditam que poções feitas com o uso de partes do corpo dos albinos trariam sorte e riqueza, tanto quanto o uso em bruxarias é outra prática recorrente. Apesar das dificuldades em prender e condenar os culpados, os ativistas persistem na luta para combater o preconceito, a ignorância e na promoção dos direitos dos albinos para que não sejam dizimados por força do pensamento místico provocado pela cor da pele dos portadores da doença. O clássico “Hotel Ruanda” é a representação máxima de africanos dizimando africanos, em números catastróficos, em guerras étnicas. Os genocídios provocados em nome da “limpeza étnica” dizem o quanto a crise identitária configurada do legado do pós-colonialista, após décadas sob o jugo europeu e ações maniqueístas de privilegiar etnias, de tanto tempo alijado da liberdade e dignidade essenciais à construção identitária autônoma, o sujeito localizado na transição do regime colonial para o status de independente do neocolonialismo e fronteiras artificiais se veria em ferrenha luta com seus iguais, e sob a influência de novos impérios econômicos como instrumento de joguete político internacional, em um mundo polarizado entre as forças capitalistas e socialistas. Hoje,  fome, guerras civis provoca o massacre entre cristão e muçulmanos, epidemias, questões ambientais concomitante a exploração egoísta da riqueza do subsolo africano como petróleo, ouro, diamante e o coltan. Na centralidade do genocídio ruandense, o último mineral foi chamado de ouro negro nos anos 90. Mistura de dois minérios, a columbita e a tantalita, do primeiro é extraído o nióbio e do segundo o tântalo. Ambos com características únicas para a produção de materiais utilizados em dispositivos tecnológicos de vanguarda e portáteis, tais como telemóveis, laptops, GPS, televisores de plasma, satélites, entre outros.

Informação compartilhada nas mídias sociais e divulgada nos jornais de grande circulação mundo afora, a polêmica em torno do projeto artístico do norueguês-sudanês Mohamed Ali Fadlabi e o sueco Lars Cuzner, residentes em Oslo, na Noruega. A proposta dos artistas é discutir o racismo e seus desdobramentos até o século XXI a partir de uma vila que, há exatos cem anos, expôs um grupo de oitenta senegaleses. Criada em 1914, na Noruega, chamada de Kongolandsbyen (Vila do Congo), fez parte da programação para comemorar o centenário da Constituição (1814) do país. É oportuno, também, fazer o registro da reprodução de uma tribo congolesa no pavilhão da Bélgica, durante a feira Mundial ou Expo 58, em Bruxelas, em 1958. No mesmo molde dos zoológicos convencionais para espécies animais, os zoos humanos do século XIX e XX travestidos de “exposições étnicas” trataram seres humanas como se fossem atrações, e desse modo legitimar a presença europeia em suas colônias. Nos Estados Unidos fica lembrança da história de enjaulamento do pigmeu Mbuti congolês Oto Benga, e sua polêmica exibição no Zoológico do Bronx, Nova York, em 1906, como parte da mostra projetada para demostrar os conceitos da evolução humana e racismo científico ou racialismo.

Ao reviver essas páginas não viradas da história da humanidade, o trabalho dos artistas suscita, principalmente, aos profissionais de educação menos neutralidade no tocante aos conflitos infanto-juvenis em torno das relações raciais, já que no papel do educador está a mediação/transmissão de conhecimentos, não só do recorte de relevância dos historiadores, do histórico da humanidade às gerações vindouras. Nesse sentido, as ferramentas informacionais oferecido pelas mídias educativas pode ser um grande fator de aproximação de gerações, construção de contextos imagéticos de modo a criar  pontes necessárias a conceituar o pensamento abstrato de identidade, raça ou etnia, racismo, preconceitos. Ou seja, atualmente as pessoas aprendem e tomam conhecimento do que está acontecendo no mundo através das mídias oferecidas pelas tecnologias da comunicação e da informação – TIC´s, que transforma a acessibilidade na busca de informações em um problema para educadores despreparados em transformar informação em conteúdos significativos com o uso imagens e sons antenados com formas de se estar em mundo de gerações de nativos digitais a espera de mediação docente possuidora de academicismo pedagógico com domínio das ferramentas multimídias síncronas ou assíncronas; fazer uso da plurilinearidade e da multimodalidade comuns ao hipertexto como elemento potencializador do ato de ler e escrever, compor estratégias e recursos didáticos-pedagógicos de maneira a acomodar  avanços, recuos, transversalidade e multidisciplinaridade; para ilustrar conteúdos teóricos-conceituais de difícil entendimento. A incorporação das novas tecnologias no dia dia da sala de aula de escola do século XIX e professores do século XX é imprescindível para educação em sincronia com os modos de produção, exposição ou transmissão de conteúdos comuns às gerações sintonizados com a  acessibilidade  como meio de conceber educação no século em curso. Portanto, a escola precisa se descolonizar de suas origens para representar a história e a potencialidade da cultura e  populações brasileira, conforme afirmação do professor Cesar Nunes da Unicamp em debate sobre a Formação Humana Integral  na Contemporaneidade, durante o 2° Seminário Internacional de Educação Integral em Jornada Ampliada,em Brasília (DF), em 2013.

A polêmica performance artística com atores negros em um “zoológico humano” foi cancelada em Londres depois de protestos realizados na noite de abertura. No evento chamado Exhibit B, os atores apareciam em jaulas, presos a correntes ou portando aparatos para

exhibit-bdomesticar a “fera africana”. Ou seja, um quadro atualizado das “repugnantes atitudes” referentes à raça negra durante a era colonial. Assim, planejar e conceber e avaliar conteúdos educativos interativos facilitadores na construção, desconstrução e reconstrução de conceitos abstratos de difícil entendimento, de exemplificação de conhecimentos da história da humanidade produzidos pelas ciências sociais é um caminho a ser perseguido pelos profissionais de educação ainda não familiarizados com a aplicabilidade de procedimentos didático-pedagógicos sintonizados com paradigmas formativos possibilitados pelas tecnologias infocomunicacionais complementando habilidades e competências quando necessário for: confrontar, convocar, provocar, refutar, socializar, contextualizar e debater no plano das ideias, pressupostos, hipóteses, capazes de contribuir com aproximações, até que sejam mínimos os pontos discordantes que inviabilizam historicamente a promoção de relações raciais sadias, por exemplo. Ao dimensionar o papel e o alcance ideológico das mídias fica a pergunta de quanto a realidade virtual, e a capacidade de nos levar a um espaço digital paralelo, pode ser usada para fins de estímulo a uma paz universal ou instigar o instinto selvagem latente em cada ser humano ao fomentar criações imagéticas cinematográficas de jogos interativos inferindo a vida real em confronto virtual consumado em barbáries para com pseudo-inimigos representativos de grupos na “escuridão econômica” alardeada por Mandela, entre outros pensadores de renome preocupados com futuro da economia globalizada e processos comunicativos entre povos e nações, no livro “No final do século – Os principais pensadores do nosso tempo”.

Um caminho para o docente contribuir em nome de crenças pessoais na contramão do discurso dominante ou de produzir debates que não levem às tergiversações de sempre seria este se apropriar de conteúdos divulgados no campo da sociobiologia3 e das pesquisas biológicas da genética molecular, por exemplo, a produzir dados capazes de refutar a, ainda, persistente crença de que as raças humanas possuem diferenças biológicas substanciais o profissional de educação sai da zona de conforto que a não discussão do tema racial provoca na ação docente insensível aos estigmas sofridos pelos alunos negros em vivências e experiências diárias com os estereótipos afetando o processo de construção de identidade, autoestima. Ao pesquisar a sequenciação do genoma humano, a biologia molecular permite um exame detalhado da correlação entre a variação genômica humana, a ancestralidade biogeográfica4 e a aparência física das pessoas. Os estudos em questão corroboram em confirmar “o quanto as teorias racialistas, com maior ou menor cientificidade, foram usadas para justificar discriminação, exploração e atrocidades ao privilegiar culturas, línguas, crenças e diferenciar grupos estética e economicamente” (Azevedo, 1991 apud PERNA; BIRCHAL, 2005/2006).

PEDAGOGIA EAD – vivências e experiências com educação ONLINE

A formação em Pedagogia e sua condição de ciência da educação que se apropria de conhecimentos das várias ciências para auxiliá-la em fundamentar seu estatuto de cientificidade promoveu-me o discernimento que o educador pode conformá-la promotora de processos de formação de ser humano que melhor atenda as especificações laborais, sociais e emocionais de determinado tempo, constituindo sujeitos e gerações com os conhecimentos técnico-científicos, políticos, filosóficos essenciais ou com relevância de percurso formativo expressivo de interesses ocultos ou explícitos de transmissão do pensamento dominante ou torna-la instrumento de transformação social para grupos subjugados. Consoante aos conhecimentos adquiridos no curso de formação em pedagogia, acenar com referências relevantes para o trato dessa temática tão importante na formação teórica e prática docente e, assim, chamar a atenção para uma maior suscetibilidade para com os casos que afetam o emocional da criança negra, e o constrangimento com estereótipos não seja visto como coisa corriqueira do cotidiano escolar e não necessite de outro tratamento que não seja o medo de abordagem mais consciente de existência de preconceito racial na sala de aula. Portanto, a pertinência do tema racial na grade curricular, em acordo com as Diretrizes Curriculares nacionais – DCN´s, os Parâmetros Curriculares nacionais – PCN´s, a Lei 10.639/03 entre os documentos oficiais que orientam e procuram dar visibilidade para os mecanismos de permanência de certos grupos na base da pirâmide social. Portanto, no quadro de desigualdades sociais instituídas em acordo com regras de relações étnico-raciais assimétricas de nossa formação pluriétnica significa enfoques da existência e o consequente debate na formação e na prática docente, de suas causas e efeitos no desempenho educacional de crianças negras em face de naturalização do racismo: “Munanga (2005), Gomes (2005), Cavalleiro (2001), Guimarães (1999 e 2008)” (SILVA; FALCÃO; MOURA, 2005).

Entre essas ciências está a psicologia para explicar motivações, compulsões e fracassos, entre os muitos fatores da história pessoal a determinar a maior ou menor valia do ser humano. Pensar na condição humana segundo maior ou menor valoração consoante a cor da pele significa um olhar aprofundado de como foi estabelecido tal distinção. Segundo fontes bibliográficas, para entender como ainda no terceiro milênio o privilégio da cor se sustenta é preciso debruçar sobre os pressupostos de homem, de ser humano e de sociedade em que tal distinção valorativa da cor da pele fundou-se. A história do racismo através dos séculos pode ser conferida no documentário Racismo – Uma história, da BBC de Londres. Descobertas recentes na área da neurobiologia, que segundo o sociólogo Antônio Damásio “não só pode nos ajudar na compreensão da condição humana, mas que, ao fazê-lo, pode nos ajudar a compreender os conflitos sociais e contribuir para sua diminuição” (Damásio, 1998 apud PENA; BIRCHAL. 2005/2006, p. 18), e da genética humana confirmaram não haver geneticamente raça humana distinguível. Portanto, extraído o pretexto pseudocientífico para permanência do status quo dominante, todo e qualquer embate da questão étnico-racial limita-se ao terreno ideológico. As considerações pertinentes à importância da cor da pele como condição meritocrática para as benesses de qualidade de vida sem os imprevistos quais sofrem aqueles classificados fora de padrão de racionalidade que cria as condições desfavoráveis ou obstruem processos de mobilidade e justiça social para certos grupos, impedindo-os do exercício pleno das várias dimensões da vida humana em sociedade.  A inspiração para dar vida ao aqui exposto tem ponto de partida na postagem levada às redes sociais em Junho/2009, quando postei sinopse sobre a curta metragem “O xadrez das cores”, de Marcos Schiavon, com patrocínio da Petrobras, onde faço menção, an passant, do livro Preto e Branco: a importância da cor da pele, do jornalista e ex-professor Marco Frenette, porém na ocasião da publicação no Projeto Muqueca Babys Blog não vislumbrava a necessidade de fazer uso da narrativa fílmica em abordar como privilégios ou condições de vida desfavoráveis distinguem-se pela cor da pele e, dessa maneira chamar a atenção do leitor e, ao mesmo tempo, convidá-lo a sair da superficialidade insensível para um maior aprofundamento do debate sobre os percalços e reflexos na vida escolar da criança-aluno (a) marcado (a) por estigmas sociais imputados historicamente à raça negra, inclusive levando-as a não aceitação dos traços negroides, por exemplo.

A desqualificação ou despersonalização midiática como mais um recurso de construção e desconstrução estética, geralmente para atender interesses de uma minoria, com poder econômico, pode veicular a ideologia do projeto de sociedade que mais atenda a objetivos para manutenção do status quo posto como modelo a ser seguido, onde quem não corresponde às especificidades é circunscritos em aspectos hediondos, desumanizados ou demonizados. Porém, por um processo natural tais adjetivações acabam por provocar a visibilidade de grupos sociais insurgentes para com a ordem estabelecida quando estes na busca de igualdade de tratamento se utilizam de recursos comuns àqueles dos tantos registros de mudanças na dinâmica social provocada pela falta de justiça social e equanimidade fruto da ganância aliada a atitude etnocêntrica como causas principais de permanência da desigualdade entre os homens em conflitos raciais.

A centralidade da cor da pele como objeto de conhecimento é um campo de estudo bastante controverso, e, por se tratar de fatos da condição humana trás em si a incompletude do homem como no princípio freireano que questiona a coisificação do homem pelo homem. A mídia quando deixa de cumprir o seu papel de informar em nome de uma educação planetária para a paz e construtora de identidade sem qualquer tipo de distinção, baseada na liberdade, no diálogo nascido de relações dialéticas consciência-mundo alimenta o que o casal de psicólogos afro-americanos Kenneth Brancroft Clark e Mamie Clark5, conhecidos pelos estudos, com bonecas, sobre as atitudes das crianças relativamente à raça, denominaram auto-ódio. Assim como Piaget, as teorias de foram em grande parte baseadas em estudos e observações de seus filhos ao lado de sua esposa. O casal Clark, a partir do interesse da esposa pela psicologia do desenvolvimento e trabalho em creche, e para onde levou os filhos após conhecer o trabalho dos psicólogos Ruth e Gene Horowitz sobre a auto identificação em crianças pequenas, teve como consequente desta experiência  a inspiração da esposa para a sua tese. Da parceria do casal na condução das pesquisas com os filhos, na creche, Mamie concluiu sua dissertação, com o título “Mudanças nas habilidades mentais primárias com a idade”. O grande feito do primeiro negro e negra a obter o doutoramento em psicologia naquele país foi a participação do marido no caso Brown versus Board of Education of Topeka, traduzido como Negros versus Conselho de Educação, quando pela primeira vez num tribunal americano estudos de ciência social, nomeadamente o relatório de 1950 sobre discriminação racial escrito por Clark, foi admitido como forte prova num julgamento onde este testemunhou como perito em casos de desagregação social em várias escolas.

Vídeos correlatos: CNN – Teste das bonecas e as relações raciais

Da percepção de que a avaliação do Estado não estava correta ao analisar os problemas educacionais de crianças afro-americanas, rotulando-as como possuidoras de retardo mental, Clark buscou provar através de experimentos com bonecas de que essas crianças tinham QI acima dessa classificação, pois este entendia a segregação social como causa para a guerra de gangue, pobreza e baixo desempenho acadêmico das minorias. Este foi o pontapé inicial para o trabalho de sua vida e deixa para os nossos dias contribuições significativas da psicologia do desenvolvimento. Segundo  teorias do psicólogo a partir de estudos baseados em que a segregação das crianças negras influenciava no seu psicológico, concluiu que o convívio com tais dilemas provocava uma espécie de auto-ódio porquanto da desqualificação estética, da demonização, da desumanização induzindo-as a não se olharem como bonitas, bondosas ou inteligentes. Para o sociólogo, o racismo ocular, como mostrar pessoas brancas adjetivadas ao contrário das pessoas negras e o consequente sucesso pessoal na vida adulta induz aos negros tornarem-se adultos com baixa estima e recusar o pertencimento à etnia negra. Ou seja, o racismo ocular e auditivo com que as crianças negras crescem, diuturnamente, no mundo todo, faz com que adoeçam psicologicamente e, desse adoecimento psicológico que habita o corpo negro temos a “negação” de si mesmo e de seus iguais. Dos trabalhos publicados destacam-se Prejudice your Child (1955), Dark Ghetto (1965), A Possible Reality (1972), Pathos of Power (1974).

PALAVRAS-CHAVE: arma contra o racismo?

A leitura do livro também me levou a rememorar momentos idos da adolescência quando o agora escrito transcreve um pouco das vivências e experiências como discente e educador social alheio à questão racial nas relações da sala de aula, porém consciente das características em que se dá a nossa divisão social de classes. Estar atento em contextos marcados por atitudes e procedimentos que denotam haver uma linha divisória porquanto da cor da pele a definir econômica, estética e socialmente posturas relacionais que resultam em risos e lágrimas para crianças e adolescentes é fazer da percepção de mundo fonte inesgotável de compreensão sociológica sem as tergiversações comuns a pontos de vistas inflamados de defensores politizados por discursos acadêmicos entre iguais, ou mesmo por dissidentes defensores da causa negra representando-os na luta emblemática por reconhecimento segundo a simbologia abolicionista daqueles na luta contra a opressão qual sofrem os descendentes de africanos trazidos ao novo mundo e o transmitido nos livros sobre a trajetória e o papel social do negro desde o Brasil Colônia até os dias atuais.

Período marcado pela passagem da infância em escola pública em bairro periférico, Muqueca, para a adolescência em escola particular situada em rua representativa do poder local de cidade do interior do Rio de Janeiro. Portanto, espaço de convivência com parcela de filhos da elite e, também, lugar para os primeiros aprendizados de que uma proposta educativa integradora perpassa por n fatores de objetivos, missão, filosofia do planejamento do grupo gestor. No meu caso específico, fica presença de uma Diretora representando a tradição familiar para a condução do percurso educativo de parte de herdeiros dos postos chave em continuidades de valores que caracterizam a relação social e cultural herdada do ciclo do café. O convívio pacífico com as diferenças produzidas pela separação natural de adolescentes saídos de mundos distintos, porquanto da condição econômica de bolsista pelo “Sistema S”, da cor da pele, de ser filho de operário da indústria, do lugar social, criou a ambiência necessária de relação pedagógica sem interferência de variáveis características do conflito de classes produzindo desatenção, desmotivação, desequilíbrio emocional ao longo dos anos dessa etapa da educação básica. Na contramão do que ora questiono para o dia a dia de crianças e adolescentes estigmatizadas pelas estereotipias do racismo sofrido diuturnamente, recebi a aquiescência de Diretora sensível e fiel a princípios humanizadores e o consequente trabalho de reforço da autoestima de um bolsista para o enfrentamento às adversidades postas às crianças-adolescentes negros em argumentos como: peito erguido, olhos nos olhos, atitude cortês, usar a melhor roupa, regras de etiqueta, como educação complementar para representar a escola em proposta tecnicista de empregabilidade para menor – aprendiz. Como, também, até tal estágio da adolescência ficaram as coisas da fé e palavras-chave de lições diárias de mãe, que mesmo sem diplomas da educação formal conseguia transmitir a sapiência de aprendizado das regras da vida necessários ao convívio harmonioso com o lado bom ou o ruim do mundo, sem, entretanto, deixar de acreditar nas coisas do coração mesmo nos momentos mais difíceis.

A segunda etapa da educação básica foi momento de colocar em prática as lições da vida familiar e o apreendido da visão transcendental da Diretora na primeira etapa. Período de colocar em prática, por exemplo, estratégias de superação frente ao ruído de questões étnico-raciais interferindo em objetivos pessoais e a necessidade de não perder o foco e superar a insensibilidade humana para com um adolescente negro, de 15 anos, em ambiente corporativo de multinacional com presença de estrangeiros e entre estes aquele que me despertou para as diferenças da cor da pele e de quanto o assimilado de lições dos níveis  de educação anteriores contribuiu em respostas para o futuro do agora Pedagogo e o propósito em abordar na primeira pessoa tema tão relevante e, ao mesmo tempo, fora das pautas de deliberações mais profundas de causas e efeitos do valor da cor da pele no emocional de crianças e adolescentes afro-brasileiros em face do tema ainda ser tratado como tabu na educação como um todo.

Notícias dos Estados Unidos sobre a mobilização da população negra em protestos contra a morte de jovens afro-americanos; o genocídio da juventude negra brasileira; as leis anti-imigratórias na Europa; as questões de gênero da mulher negra mundo afora são alguns dos temas em que a descendência africana é colocada em cheque quanto à possibilidade do exercício da verdadeira cidadania; ou seja, o direito de ir e vir sem constrangimento, igualdade de condições nas várias dimensões da vida social, afetiva e laboral entre os muitos exemplos de impedimentos a uma qualidade de vida que não seja aquela abaixo da média quais passam aqueles fora do padrão referenciado pela mídia. Portanto, podem ser alocados nos casos emblemáticos de menos valia qual sofre o cidadão cuja epiderme não apresenta o padrão midiático simbólico de poder econômico, cultural e estético, mesmo com as devidas exceções. Logicamente que mudanças na lógica excludente reinante significam a busca de diálogo baseado em trocas relacionais sem qualquer tipo de distinção, ensejada na liberdade, dialogicidade e conscientização de teoria do conhecimento nascida de relações dialéticas consciência-mundo. Como reverter o quadro de invisibilidade de discurso orgânico com academicismo representativo de falas de grupos subjugados capazes de embate no plano das ideias, onde acontecem as verdadeiras mudanças? Assim sendo, mudanças nos espaços de poder apontam naturalmente ao legado de Paulo Freire, dado o seu caráter de relevante importância na atualidade, como referência para processos humanizadores de ser humano na sua incompletude e diz o quanto o diálogo é condição obrigatória da gênese do processo educativo; ou seja, “através de uma relação dialógica o ser humano se descobre e toma consciência de sua objetividade diante da vida” (AZEVEDO, 2010, p. 38).

Para Azevedo, a gênese ideológica de Paulo Freire, isto é, a percepção das fontes filosóficas que o grande educador Brasileiro bebeu, como por exemplo: Tristão de Atayde, Jaques Maritan e o neotomismo, o personalismo de Mounier, o existencialismo de Kierkegaard, a existência concreta de Marcel, a incompletude do ser humano de Heidegger, a relação dialógica de Karl Jasper, o neomarxismo de Eric Fromm e a educação como política, de Gramsci.  Os conceitos de Freire representam a busca de uma educação que visa a construção do conhecimento a partir da liberdade e da própria pessoa, provoca e convoca a todos para o caráter emergencial do diálogo das raças em nome de outro amanhã para as gerações vindouras.  Para Freire a educação é o caminho para libertar o homem oprimido dessa realidade desumanizante, desta coisificação, dessa situação de objetos, de menos para ser mais, isto é, adquirir a própria dignidade humana perdida, realizar a sua vocação histórica tornou-se o objeto principal e o ideal de luta (Jorge, 1999, p. 24 apud AZEVEDO, 2010, p. 38).palavras-chave2

Com certeza esse histórico de experiência e vivências com a educação não formal, informal e formal como educador social em projetos sociais e a licenciatura em Pedagogia orientou consciente e/ou inconscientemente a busca de conceitos e teorias de abordagens que determinaram modos de proceder buscando a aplicabilidade do conhecimento amealhado de informações das várias ciências que a auxilia. Assim como a compilação de dados de observações empíricas de pesquisadores debruçados sobre as questões étnico-raciais, contribuiu para responder muitas perguntas ao longo dos períodos de formação. Pensar na referência bibliográfica para perguntas já respondidas e na educação continuada para responder antigas e novas interrogações traduz de quanto o auxílio das ciências sociais em práxis fundada no estudo,  compreensão e aplicação teórico-conceitual  pode contribuir no entendimento e resolução de conflitos para interações sociais marcadas por fatores identitários como cor, raça, gênero, principalmente quando estas se dão em ambientes onde existe a falta de sensibilidade dissidente para atitudes adultocêntricas no tratamento com a criança-aluno negro.

Ao longo de anos e períodos de aprendizagens cumulativas na busca de respostas para muitas indagações a licenciatura em Pedagogia foi lugar de encontro com pressupostos teórico-conceituais imprescindíveis ao entendimento de fatos observáveis ou da complexidade biológica do ser humano produzido pelas ciências humanas para responder indagações sobre se estar no mundo e, nesse sentido a vasta leitura de material bibliográfico produziu respostas, tanto quanto perguntas novas como a transcrita de texto sobre dificuldades didático-pedagógicas no ensino de ciências sociais: A paixão pela busca de conhecimento não seria a melhor herança que a universidade poderia oferecer aos seus alunos?  A menção dessa interrogação se faz relevante porque representa o meu desejo de escrever na primeira pessoa sobre os motivos de buscar o embasamento do curso para responder as muitas perguntas em torno da educação de crianças e adolescentes egressos das classes operárias e as causas e feitos do fracasso escolar instalado na relação pedagógica destes. O encontro prazeroso com disciplinas que foram reveladoras na consecução de intencionalidade formativa para compreender, contextualizar, explicitar, exemplificar, aproximar teoria e prática em argumentação capaz de traduzir  objetivos em contribuir direta ou indiretamente em outras dinâmicas dessa relação por si só dizem de quanto o binômio cognição/emoção é fator preponderante para uma melhor qualidade na educação dessas crianças-adolescentes alunos da educação básica pública do país.

Como disciplina que instrumentaliza o aluno universitário para o entendimento de um projeto de pesquisa, a disciplina Pesquisa e Prática em Educação – PPE proporciona a acessibilidade às ferramentas para a análise da realidade concreta dos sujeitos da educação, por exemplo, e, assim, possibilita-nos vê-los segundo parâmetros do legado de observações fornecido pela consulta bibliográfica de pesquisadores consagrados como ponto de partida na compreensão de possíveis pormenores identificados na coleta de dados quando da ação para refutar, confirmar ou conformar novos conhecimentos sobre o objeto de conhecimento. Ter como princípio norteador dimensões humanas negativas ou positivas advindas de conhecimentos, já existentes, no histórico da humanidade significa estar no mundo constantemente em autoquestionamento para uma análise com as isenções necessárias a um exame imparcial da realidade recortada como objeto de estudo. O autor do texto em questão faz considerações sobre a Universidade proporcionar o desenvolvimento, pelos alunos, de ciências sociais, de um conjunto de habilidades intelectuais: aperfeiçoar a capacidade de leitura, de análise e síntese, de abstração, de imaginação e criatividade sociológica, de trabalhar em equipe, de compreender as razões dos outros, de reflexão e de disciplina intelectual etc. O autor, também, considera como efeitos quase inevitáveis desse processo de desenvolvimento de habilidades intelectuais, emocionais e sociais: a consciência crítica, o desenvolvimento da cidadania, visão humanística, a postura ética, o desenvolvimento da personalidade. Portanto, a pedagogia construtivista propõe que a educação consiste em fazer criadores, inventores, inovadores, não conformistas. O conhecimento é produzido pelo próprio sujeito que vai desenvolvendo a capacidade de compreender e reelaborar as ideias existentes. É na ação prática sobre o objeto do conhecimento que o indivíduo aprende a verdade.

RACIALISMO: O racismo científico

Buscar no livro de Frenette o seu entendimento de que o mundo é constituído por diferentes raças merece uma reflexão do trabalho de pesquisa sobre o histórico da humanidade a partir da gênese do racionalismo no século XVI, com a formação dos Estados Nacionais Europeus coaduna com o acima exposto de que cada um pode ser sujeito do seu conhecimento e, desse modo contribuir para a sua verdade e a verdade de outros. Para ele, é o momento em que começam a enfatizar as diferenças linguísticas e históricas internas até a expansão para terras ultramares das conquistas europeias. Uma corrente de historiadores entende as teorias iluministas como ponto de partida em que as doutrinas racialistas beberam na fonte e, assim, criaram as bases para as hipóteses raciais e construção do preconceito para com outras raças consideradas inferiores. Entre os enunciados iluministas da base fundante de correntes de pensadores que estabeleceram as teorias científicas que marcaram o século XVIII como o momento que definiu a diferença entre os homens como justificativa para as atrocidades e extermínio para com aqueles com características fenotípicas fora do padrão estético europeu, estabelecido como parâmetro classificatório homens e subespécies de homens. Entre os pensadores iluministas que consubstanciaram as inverdades refutadas pela biologia genética sobre o determinismo biológico está a adoção do pensamento de Voltaire, pelos racialistas, ao optarem pela tese poligenista como explicativa da submissão humana, 34 anos antes de Lineu dividir a humanidade em raças superiores e inferiores ao reforçar e legitimar o estatuto de cientificidade das considerações raciais do pensador iluminista e, assim, fornecer um modelo científico para a sua reificação. Modelo que pregava haver diferentes origens para o ser humano, dividindo-os em inferiores que não progridem, não desenvolvem talentos, nem sociedades; e superiores que consideram que as características intelectuais e morais de um dado grupo, são consequências diretas de suas características físicas ou biológicas.

A ideologia iluminista, interpretada segundo correntes na direção para concretização das promessas de igualdade com a efetivação dos direitos naturais e universais de todos  e na outra mão da via dupla do iluminismo o posicionamento daqueles que rejeitavam os princípios iluministas e propiciou o surgimento das teorias racialistas, divididas entre “poligenistas”6 e monogenistas pra explicar o surgimento da raça humana. Até então o racialismo não era ainda racismo, pois as diferenças biológicas ainda não eram consideradas definitivas para a evolução humana, pois o objetivo dos iluministas era encontrar um sistema de valores universais, que pudesse ser estabelecido para todas as raças. Foi na França do século XVIII que surgiram as traduções de pensamento que influenciaram a definição classificatória das raças em inferiores e superiores.

Com bases fundadas na argumentação em defesa da melhor explicação para a divergência quanto à origem do homem, os desdobramentos na busca de explicação plausível é onde pesquisadores da corrente evolucionista buscavam entender a história humana através de critérios físicos e biológicos, assim como o meio e a raça. A sua teoria baseava-se em dois modelos de pensamento: o lógico, do civilizado; e o pré-lógico, do primitivo. No entanto, mesmos os mais ferrenhos é capaz de admitir erros em sua ciência interpretativa tal como quando o observador é enganado pelo estilo do cabelo do sujeito, por exemplo, realizando então um procedimento inteiramente subjetivo, influenciado pelos preconceitos do interpretador, conhecimento prévio sobre o examinado etc. Carlos Lineu (1707-1776) buscou formular uma teoria científica sobre a divisão da humanidade em raças. Considerando o “pai da taxonomia genética”7, sugeria a divisão da humanidade em quatro raças, como um sistema de classificação humana. Para Silva (2006), o racionalismo, com os iluministas, definia raça como um grupo humano cujos membros possuíam características físicas comuns. Tal teoria voltou-se para a crença de que a raça não era apenas definida física, mas moralmente, bem como as diferenças psíquicas acarretavam diferenças mentais hereditárias. Assim a distinção do mundo em raças correspondia à divisão do mundo em culturas e o comportamento do indivíduo era definido pelo grupo social ao qual ele pertencia. . Entre as tradições que influenciaram a definição de raça como um sistema de classificação estava a Historia Natural, que daria origem no século XIX, a Antropologia Física, ciência responsável pelas teorias racialistas.

Criada, ainda no final do século XVIII, a frenologia influenciou muitos pensadores sociais, entre os quais o criador do Positivismo, Auguste Comte. Hoje, porém, desacreditada, pretendia as características psicológicas de cada raça com ba nas medidas e no tamanho do cérebro. Forneceu os fundamentos que influenciaram as teorias eugênicas sobre raças superiores nos séculos XIX e XX, assim como a medicina e a criminologia, que tem na obra do italiano Cesare Lombroso (1835-1909), por exemplo, sua maior influência. Lombroso, criador da Antropologia Criminal, defendia que a criminalidade era uma questão biológica e hereditária, e poderia ser identificada pela utilização da frenologia. Sucessora da frenologia, a craniologia, foi influente durante a era vitoriana para justificar o racismo, a colonização e a dominação de raças inferiores, tais como os “irlandeses” e tribos negras da África.  Classificados de acordo com o grau de prognatismo (um avanço relativo anterior do maxilar em relação à mandíbula) ou ortognatismo. Tipos raciais com tais características eram ditos prognáticos, tal como os macacos e chipanzés, de modo que eles eram considerados como sendo mais próximos a estes animais do que aos demais europeus com características físicas do anglo-saxão como parâmetro. O antropólogo britânico John Beddoe, por volta de 1885, desenvolveu o “Índice de Negrescência”, baseado no qual ele estudou os irlandeses como um tipo de raça branca africanóide ao comparar a similaridade crânia irlandesa ao do homem pré-histórico cro-magnon.

A antropometria institui a documentação das características de criminosos para propósito de identificação, a qual está em uso até os nossos dias. Entretanto, elas não foram usadas para a avaliação psicológica do criminoso. Na década de 30 a antropologia criminal do italiano Lombroso caracteriza maxilares, tamanho das mãos, detalhes faciais e muitos juízes ordenavam a realização de análises antropométricas lombrosinas dos réus em processos criminais, que posteriormente eram usados pela acusação em julgamentos. Outro parente da frenologia foi a tipologia inventada no século XX pelo psiquiatra alemão Ernest Kretschmer. Seu esquema para a classificação da personalidade era baseado no tipo físico e como eles eram correlacionados com características psicológicas básicas. Um uso infame bem conhecido da antropometria foi feito pelos antropólogos e médicos nazistas, os quais, no Ministério do Interior e no Burô para o Esclarecimento da Política Populacional e Bem-Estar Racial, propuseram a do crânio. “Nesse período a certificação craniométrica oficial tornou-se obrigatória por lei e era realizada por centenas de institutos e especialistas na Alemanha” (SEBBATINI, 1977).

Em meados do século XIX, o conceito de raça migrou das ciências naturais para as ciências sociais e humanas, Com a publicação de Charles Darwin, em 1859, o desenvolvimento da teoria evolucionista a partir daí o racionalismo ganha novas perspectivas como chamado “darwinismo social8 que lastreado nas novas teorias da evolução das espécies e na seleção natural armava não só a diferença de raça humana, mas a superioridade de umas sobre as outras. Período em que seres humanos eram e expostos à visita pública em zoológicos humanos. No final do século XX, estudos biológicos cada vez mais aderiram à hipótese de que não existem raças na espécie humana. Geneticistas de todo o mundo têm derrubado a crença de que se podem definir geneticamente as diferenças raciais na humanidade. Nas ciências sociais demoram mais para contestar esse conceito. Ou seja, rala existe como um discurso social e não como realidade psicológica. Para Silva (2006), essa percepção leva ao entendimento de que raça pode ser entendida como um qualitativo de desigualdade social ou de identidade cultural. A desqualificação dos critérios biológicos para a compreensão das diferenças entre os diversos grupos humanos historicamente separados por parâmetros naturais e biológicos representam a base explicativa de superioridade e inferioridade entre nações e grupos humanos.

Ao escrever a obra Descent of Man, and Selection in Relation (A descendência do homem e a seleção em relação ao sexo), em 1871, Charles Darwin, procurou estender também aos seres humanos os mesmos princípios da seleção natural tratados em sua obra origem das espécies (1859). Contudo, pensar que o ser humano pudesse descender de um animal inferior era geralmente considerado um abuso par a visão de mundo de uma Inglaterra vitoriana (Mayr, 1988, p. 691; Bowler, 1989, p. 22 apud DEL CONTI, 2008). Com o propósito de aplicar pressupostos da teoria de deu primo ao ser humano, Francis Galton (1822-1911), em 1833, reunindo expressões gregas cunhou o termo “eugenia” ou “bem nascido” (Black, 2003, p. 56 apud DEL CONTI, 2008). A partir deste momento, eugenia passou a indicar as pretensões galtianas de desenvolver uma ciência genuína sobre a hereditariedade humana que pudesse, através de instrumentação matemática e biológica, identificar os melhores membros – como se faria com cavalos, cães, porcos ou qualquer outro animal – portadores de melhores características, e estimular a sua reprodução, bem como encontrar os que representavam características degenerativas e, da mesma forma, evitar que reproduzissem (Stepan, 1991, p. 1 apud DEL CONTI, 2008). Como ciência da hereditariedade, a eugenia no final do século XIX ainda carecia de elementos mais sólidos, visto que as próprias teorias correntes até o final do século eram totalmente especulativas (Kevles, 2002, p. 3 apud DEL CONTI, 2008).

Influenciado pelo trabalho do “primo”, Charles Darwin, em seus estudos sobre pangênese, aceita até o século XIX para explicar a hereditariedade dos caracteres – inclusive dos adquiridos -, os conhecimentos produzidos da parceria entre os primos influenciou um grupo de indivíduos conhecidos como “biometristas”, preocupados em encontrar regularidades estáticas que pudessem indicar a prevalência de certas características em um dado conjunto populacional a partir das características que os progenitores e os seus ancestrais transmitiram à prole (Cowan, 1972, p. 512 apud DEL CONTI, 2008). Porém, somente com a chegada de outras duas teorias foi que a teoria da herança galtiana ofereceu um procedimento objetivo que, pela utilização de instrumental laboral e matemático/estatístico, pudesse identificar as unidades responsáveis por determinadas características e criar procedimentos de controle reprodutivo selecionadores das características que representariam o melhoramento genético do ser humano. A primeira contribuição veio do pensamento do inglês Herbert Spencer (1820-1903), que contribuiu com as noções de existência de um processo evolutivo teleológico, no sentido de uma direção progressiva a que tudo no universo estaria submetido, e de existência de unidades fisiológicas que registrariam as modificações, transmitindo-as às próximas gerações (Homes, 2000, p. 6-7 apud DEL CONTI, 2008). E, depois o reforço do trabalho do biólogo alemão August Wieman (1834-1915), ao diferenciar as células somáticas das células germinativas, contribuiu no sentido de reservar somente aos processos biológicos a possibilidade de transmissão de características. As mudanças ocorriam no soma (corpo) e não incorporadas ao material genético não poderiam ser transmitidas à nova geração (Bowler, 1989, p. 251 apud DEL CONTI, 2008). Para Galton, a união regulamentada cientificamente, assim como a seleção do preconceito dos nossos dias, seria o aspecto da vida social através do qual se poderia estabelecer uma linha demarcatória em relação aos diferentes tipos de pessoas. Com isso, poder-se-ia não somente discriminar espaços sociais, mas também estabelecer um programa de intervenção como propósito se estabelecer quis características seriam científica e politicamente favorecidas. 

FULVIA ROSENBERG: É preciso mais negros na universidade para ampliar seu espaço social 

A professora e pesquisadora Fúlvia Rosenberg em entrevista sobre a falta de negros nas universidades, e como ações afirmativas contribuem em desvelar alunos com maior mérito acadêmico para assentar os cursos de pós-graduação, por exemplo. Ao questionar o “racismo institucional” da sociedade brasileira em entrevista concedida ao Jornal Opção, após participar de mesa-redonda no segundo Simpósio de Ciências Sociais, promovido pela Faculdade de Ciências Sociais da Universidade Federal de Goiás, em resposta a uma questão sobre cotas e ações afirmativas cita, por exemplo, a falta de mecanismos para a permanência daqueles que conseguem terminar a escola pública e passar pelo filtro da universidade e a ausência da diversidade de suas experiências de vida e olhar de sua formação nos movimentos sociais e que é um desafio para a universidade, por conta das experiências de vida e de olhar que têm para as questões sociais e políticas. Para Fúlvia, a ação afirmativa não é sobre a cor da pele, mas, sim de uma universidade de experiência de vida que trás novidades para este espaço de poder. Diz ela: é muito fácil ser competente entre quatro paredes, sem desafios. Mas a minha competência aumenta consideravelmente se eu balanço os conhecimentos estabelecidos. Logicamente que o posicionamento da pesquisadora está atento à oposição natural para colocações que ferem a ordem natural estabelecida de tratamento acadêmico para temas polêmicos, mesmo que por caminhos com a necessária consistência acadêmica em sustentar contraposições pautadas em academicismo capaz de abordagens que possibilitam aproximações mais realísticas na observação de aspectos do fenômeno em estudo pelo que a mesma natureza do observador pode inferir se descontado o rigor científico e a isenção metodológica, diferentemente do produzido segundo fontes abstratas de referente bibliográfico ou deduções nascidas fora da concretude sobre a qual se está produzindo conhecimento.

Para Rubens Alves, a primeira tarefa da educação é ensinar a ver.  Ou seja, desenvolver habilidade e sensibilidade sobre o sentido das palavras e nos ensinar a ver melhor o mundo e as questões da ideologia dominante no oculto e no explícito em técnicas e procedimentos envolvidos nas situações didático-pedagógicas, filosóficas e políticas de planejamento curricular, onde se cumpre a base comum e se elege o que é relevante ou o que deve ficar fora da parte diversificada, como instrumento poderoso de constituição de realidades educacionais ao conceber, selecionar, produzir, organizar, institucionalizar, implementar, dinamizar saberes, crenças, atitudes, conhecimentos, atividades, competências e valores configurados por processos e construções constituídos na relação com o conhecimento eleito como formativo, ideologicamente organizados, orientados e, ao mesmo tempo, ferramenta de empoderamento político-social. Nesse sentido, educação é um conceito amplo que se refere ao processo de desenvolvimento omnilateral da personalidade, envolvendo a formação de qualidades humanas, físicas, morais, intelectuais, “estéticas”, tendo em vista a orientação da atividade humana na sua relação com o meio social, num determinado contexto de relações sociais.

Na disciplina de PPE, aprendi que toda pesquisa não é um fim em si mesmo ou nas considerações finais. Assim sendo, o trabalho de pesquisa, mesmo que cumprido todos os passos necessários reafirmar ou estabelecer um novo paradigma, deixa em aberto espaço para outros questionamentos e respostas não percebidos ou explícitos para estudos posteriores devido a questões técnicas que cercam a construção de um trabalho de pesquisa acadêmico, como: respeito ao número de laudas impossibilitando o desenvolvimento a contento de posicionamento sobre determinada característica do objeto do conhecimento. Quando nas primeiras correções de construção da Monografia ou Trabalho de Conclusão de Curso – TCC, – “O olhar do professor sobre o aluno pode construir e determinar a sua trajetória escolar negativa ou positiva?” -, ao fazer referência sobre possível causa do fracasso escolar, a professora orientadora solicitou mais  clareza sobre o escrito do entendimento de como se dá o fracasso escolar consequente de interferências da questão racial na psique da criança negra, principalmente para meninos negros nos primeiros anos da educação básica pública. Como exemplo citei “Carta da pesquisadora afro-brasileira Eliane Cavalleiro“, endereçada ao Excelentíssimo Senhor Presidente da República Brasileira, sobre a mão do Estado a fragilizar a vida emocional e psíquica da criança negra, propiciando uma educação que enseja uma violência simbólica, quando não física, contra elas no ambiente escolar. Trazer, a posteriori,  referências de responsabilidades à privá-los de uma maior dedicação aos estudos pode ser entendido pelas  lentes de Arroyo (2011), quando o autor descreve fatos do cotidiano comunitário fora do alcance do olhar professoral incapaz de superar os limites estabelecidos pela relação pedagógica a negligenciar a possibilidade de traduzir em potencialidades intelectual os recursos cognitivos engendrados por crianças e adolescentes “na luta diária  por sobrevivência, que por si só desmistificam a falta de vontade e não cabem na imagem infantilizada sobre suas vivências e experiências antecipadas em afazeres da vida adulta para mentes e vontades tão infantis fora da relação pedagógica na educação básica da escola pública”.  Certamente o livro Imagens Quebradas – Trajetórias e tempos de alunos e mestres, de Miguel Arroyo, poderá ser esclarecedora a leitura do Capítulo 2, com o subtítulo “Outro olhar sobre o educando”, entre outros subtítulos e títulos de como se dá a relação pedagógica docente versus discente nos dias atuais e os muitos relatos da atitude agressiva de aluno para com o professor.

Para Arroyo (2011), se os professores exigem que os alunos respeitem a imagem dos mestres, estes também terão de começar por rever a imagem que se fazem dos alunos educando. Como os vemos? Que sabemos de suas trajetórias humanas? Como vivem os seus tempos? Se reconhecermos que os alunos (as) não são os mesmos teremos de perguntar-nos como são, como os sentimos. As respostas a estas questões não são de cada professor (a), são dos coletivos profissionais. Dessas respostas dependerá como interpretaremos suas condutas, como equacionaremos nossa docência. A seguir algumas interrogações transcritas da obra de Arroyo (2011, p. 58) a partir de menção de material escrito em seus cadernos de anotações com depoimentos obtidos em interações diversas com grupos de professores: Um grupo constatou que recentemente que recentemente o olhar é menos escolar e mais social, até mais moral. Os nomes mais frequentes são: alunos violentos, marginais, drogados….Uma imagem que reflete uma inferioridade social e moral. Uma professora impressionada comentou: “que visão tão negativa!”. Houve consenso: esses nomes, adjetivos e classificações revelam que no imaginário escolar e docente paira uma visão bastante negativa dos alunos. Perguntei se alguém lecionava na escola privada, se a visão dos alunos era a mesma. O debate foi bem acalorado. A visão é proporcional ao grau de carência do discente, isto é, quanto mais pobres são as comunidades e as famílias, maior é a negatividade do olhar docente. A visão tão negativa que as elites têm do povo teria moldado o imaginário escolar e docente? Essa pergunta resultou bastante incomoda. De fato ninguém do coletivo pertencia às elites. Muitos (as) sabiam que eles mesmos vinham de famílias populares ou bem próximas. Aí que a pergunta resultava incomoda: como reproduzir um olhar tão negativo sobre os alunos populares estando tão próximos na sua origem e nos seus salários? Compartindo com muitos deles a condição social? Apenas reproduzimos uma visão negativa que faz parte da cultura escolar e docente? Talvez, mas as consequências podem ser desastrosas para nós e, sobretudo, para as crianças, adolescentes, jovens e adultos populares com que lidamos.

Nesse sentido Arroyo (2004, 2011) é fonte inesgotável de experiências sociais identificadas com a racionalidade contra cultural de coletivos docentes com olhares diferenciados para cultura, classe, raça, conhecimento. Ao escrever esta postagem posso fazer a complementariedade explicativa impossibilitada por normas textuais, mas que a condição do trabalho de pesquisa não ser um fim em si mesmo permite partilhar, a posteriori, supressão do texto de pensamento transcrito de leitura do livro Preto e branco, a importância da cor da pele. A contribuição de Frenette (2000), tem prefácio do cantor Lobão, que ao falar sobre a obra escreve: […] o autor golpeia uma cultura sub-réptica e velada, e chega, assim, à raiz de um racismo amornado por séculos de miscigenação através da subjugação e da violência. Esse trabalho de arqueologia emocional e psicológica é o fio condutor do livro, e evidencia, de forma dolorosa e contundente, que todos nós – de uma maneira ou de outra – fazemos parte dessa história vergonhosa. “O que vem a tona é um sentimento de que ninguém é totalmente inocente.” Na narrativa do livro, o autor relata o aprendizado da primeira infância, que chama de curso básico de racismo e o desenvolvimento da limitação mental a impedir de ver seus colegas negros além da cor de suas epidermes. Assim, ao mesmo tempo em que se tornava prisioneiro da própria mediocridade, a qual era diariamente insuflada pelos adultos que deveriam estar lhe educando para a paz e para a solidariedade. “Forçava as crianças negras a minha volta a se aprisionarem em seu mundo de incompreensão”. “Gostávamos de ter sempre um pretinho por perto para nos sentirmos melhor do que ele”.Mais de uma vez, em minha duvidosa inocência infantil fiquei contente em perceber que tinha ferido a autoestima de uma criança negra”. Inconscientemente mostrava aos adultos que estava aprendendo direito a arte da discriminação. Arte que eles dominavam à perfeição, e que se esforçavam magnificamente para passa-la a contento para suas crianças (FRENETTE, 2000, 22-23).

Assim como a citação de carta endereçada ao Excelentíssimo Presidente no corpo do texto, a menção, a posteriori, de trecho do livro de Arroyo (2011), outra possível resposta suscitada no trabalho monográfico seria a do subtítulo “Vidas Brancas” a respeito de como acontece “a devastação psicológica que leva às crianças negras ao autoquestionamento e rejeição das características negroides devido aos séculos de imposição de padrões de beleza europeu”.  Também na concepção de Frenette, a beleza, a despeito de sua relatividade, é um instrumento de comparação; um valor fundamental em qualquer cultura. A beleza confere uma inquestionável dignidade ao seu portador. Por isso, desde tempos remotos, sabe-se que toda dominação de uma raça ou etnia deve trazer, no meio de seu aparato repressivo um processo de aviltamento do subjugado que passa, necessariamente pela depreciação estética. Foi da utilidade prática dessa constatação que surgiu, a partir do período dos “grandes descobrimentos”, a necessidade de o mundo branco europeu afirmar ostensivamente a “feiura” física e moral do negro. Tornado peça fundamental de uma economia alicerçada no comércio e tráfico de escravos, foi vetada ao negro a possibilidade de ser considerado belo. Enquanto, por outro lado, os eclesiásticos afirmavam que preto não tinha alma, impedindo-o de alcançar essa coisa altamente questionável chamada “beleza interior”, por outro, a sociedade laica europeia completava o trabalho desmerecendo a cor da pele e os traços físicos dos escravos, suas manifestações culturais, religiosa e artística. Esse discurso de estereotipia aportou em nossas terras quatro décadas após nosso descobrimento; época do início da estruturação civil e econômica do Brasil. Em todo esse período colonial, essa desestruturação emocional do subjugado se fez tão necessária como a repressão física e o controle social, pois ela aliviava a consciência do dominador, na medida em que se convencia de estar oprimindo seres inferiores em cultura, inteligência, espiritualidade e em beleza. ‘Era o “belo europeu” dominando a “fera africana”’ (Ibidem, p. 59-60).

PERCEPÇÃO DA DIFERENÇA – Negros versus brancos na escola

A relação entre negros e brancos da nossa pseudodemocracia racial é o tema na coleção Percepção da Diferença. Negros e Brancos na Escola, composta dos seguintes volumes:

1 – Percepções da Diferença – Autora: Gislene Aparecida dos Santos Neste volume são discutidos aspectos teóricos gerais sobre a forma como percebemos o outro. Para além de todas as diretrizes pedagógicas, lidar com as diferenças implica uma predisposição interna para repensarmos nossos valores e possíveis preconceitos. Implica o desejo de refletir sobre a especificidade das relações entre negros e brancos e sobre as dificuldades que podem marcar essa aproximação. Por isso é importante saber como, ao longo da história da humanidade, construiu-se a ideologia de que ser diferente pode ser igual a ser inferior.

2 – Maternagem. Quando o bebê pelo colo – Autoras: Maria Aparecida Miranda e Marilza de Souza Martins Esse volume discute o conceito de maternagem e mostra a sua importância para a construção da identidade positiva do bebê e das crianças negras. Esse processo iniciado na família, continua na escola por meio da forma como a professora e educadores da educação tratam as crianças negras, oferecendo-lhes carinho e atenção.

3 – Moreninho, neguinho, pretinho. Autor: Luiz Silva – Cuti Esse volume mostra como os nomes são importantes e fundamentais no processo de construção e apropriação da identidade de cada um. Discute como as alcunhas e os xingamentos são tentativas de “desconstrução/desqualificação” do outro, e apresenta razões pelas quais os professores devem “decorar” os nomes de seus alunos.

4 – Cabelo bom. Cabelo Ruim: Autora: Rosangela Malachias Muitas vezes, no cotidiano escolar, as crianças negras são discriminadas negativamente por causa do seu cabelo. Chamamentos pejorativos como “cabeça de fuá”, “cabelo pixaim”, carapinha, são naturalmente proferidos pelos próprios educadores, que também assimilaram estereótipos relativos à beleza. Neste volume discute-se a estética negra, principalmente no que se refere ao cabelo e às formas como os professores podem descobrir e assumir a diversidade étnico-cultural das crianças brasileiras, principalmente s negras.

5Professora, não quero brincar com aquela neguinha! Autoras: Roseli Figueiredo Martins e Maria Letícia Puglisi Munhoz Esse volume trata das maneiras como os professores podem lidar com o preconceito das crianças que se isolam e se afastam das outras por causa da cor/raça.

6 – Por que riem da África? Autora: Dilma Melo Silva Muitas vezes crianças bem pequenas já demonstraram preconceito em relação a tudo que é associado à África: música, literatura, ciência, indumentária, culinária, arte…culturas. Neste volume discute-se o que pode haver de preconceituoso em rir desses conteúdos. Apresentam=se ainda elementos que permitem uma nova abordagem do tema arte e africanidades em sala de aula.

7 – Tímidos ou indisciplinados? Autor: Lúcio Oliveira Alguns professores estabelecem uma verdadeira díade no que diz respeito á forma como enxergam seus alunos negros. Ora os consideram tímidos demais, ora indisciplinados demais. Neste volume discute-se o que há por trás da suposta timidez e da pretensa indisciplina das crianças negras.

8 – Professora, existem santos negros. Histórias de identidade religiosa negra. Autora: Antônia Aparecida Quentão Neste volume se discutem aspectos do universo religioso dos africanos da diáspora mostrando a forma como a religião negra, transportada para a América, foi reconstituída de modo a estabelecer conexões entre a identidade negra de origem e a sociedade à qual esse povo deveria se adaptar. São apresentadas as formas como a população negra incorporou os padrões do catolicismo à sua cultura e como, por meio deles, construiu estratégias de resistência e de manifestação de sua religiosidade.

9 – Brincando e ouvindo histórias. Autora: Sandra Santos Este volume apresenta sugestões de atividades, brincadeiras e histórias que podem ser narradas às crianças da educação infantil e também aspectos da história da diáspora africana em território brasileiro, numa visão diferente da abordagem realizada pelos livros didáticos tradicionais. Mostra o quanto de contribuição africana existe em cada gesto da na população nacional multiétnica como exemplos de ações, pensamentos, formas de agir e de observar o mundo. Serve não só aos educadores no ambiente escolar, Mas também ao lazer doméstico, no auxílio de pais e familiares interessados em ampliar conhecimentos e tornar mais natural as reações das crianças que começam perceber a sociedade e o seu papel dentro dela.

10 – Eles têm a cara preta. Vários autores Esse exemplar apresenta práticas de ensino que foram partilhadas com aproximadamente 300 professores, gestores e agentes escolares da rede municipal de educação de São Paulo. Trata-se da Formação de Professores intitulada “Negras Imagens”. Educação, mídia e arte: alternativas à implementação da lei 10.639/03, elaborada e coordenada por pesquisadores do NEINB/USP simultânea e complementarmente ao projeto Percepções da Diferença. Negros e brancos na Escola.

DEMOCRACIA RACIAL: Racismo à brasileira?

Em concordância com as palavras de Frenette, o abordado na coleção acontecerá quando a criança deixar a proteção do interior de sua casa e de sua família, para ir se socializar em escolas em que a maioria das crianças e do corpo docente – quando não a totalidade – é branca. E, por serem brancos, além de despreparados, seus professores acabam sendo insensíveis aos problemas de ordem racial que esperam pelo (a) pretinho (a) no ambiente escolar. Esses condutores do saber veem o mundo ao seu redor a moda do sistema óptico da rã, que só capta imagens daquilo que está em movimento ostensivo diante de seu campo visual. “Para as rãs, imobilidade significa inexistência” (Ibidem, p. 62). E caso a criança vitimada resolva desabafar, ao voltar indignada e magoada das injúrias do recreio, esbarrará de novo na implacável figura do “professor rã”: sujeito estatutário, míope às matizes epidérmicas, armado de perigosos livros didáticos e, totalmente alheios aos problemas das cores. Das suas rememorações como profissional de educação, o jornalista narra fatos que agravam ainda mais o quadro da madorra moral e intelectual do professor alienado e entra no terreno minado que é o período de florescimento da sexualidade da criança corresponder ao período escolar. É justamente nesse ambiente que a criança-adolescente negra vai querer exercitar seus novos sentimentos. Ela vai perceber, então, que sua cor também é um empecilho para a vida amorosa e o primeiro beijo. Consequente da intrínseca relação beleza, cor da pele, autoestima, o autor cita, e ao mesmo tempo responde a justificativa, já mencionada, do TCC quanto aos danos psicológicos na psique da criança negra quando relata o desabafo de meninos (as) ofendidos que dariam tudo para mudar a cor da pele, assim como meninas choram histericamente ao ouvir, em tom de conciliação, a afirmação de que ela é mesmo preta, e não branca. “Tinha uma menina que adorava colocar um pano na cabeça, prendê-lo atrás das orelhas, e fazer aquele movimento característico de quem está jogando os cabelos para trás” (Ibidem, p. 63).

Por tudo isso, vê-se que o discurso de“fealdade negra”10  dentro da questão racial brasileira não é uma invenção acadêmica, fruto de um exercício intelectual estéril, mas uma realidade muito desagradável e perniciosa que dificulta o surgimento, nos negros atingidos, de um elemento fundamental para uma vida emocional sadia: amor por si próprio. Nesse sentido, fica a lição do orgulho afro-americano, nos Estados Unidos da década de 60, onde surge a nova ideia de que negro também é belo – Black is Beautiful -, contrariando os modelos propostos pelos filmes de Hollywood, começa a ser propagada pelo país através de um estilo próprio dos negros se vestirem e se pentearem e, sobretudo, no mundo das artes. Uma das ações emblemáticas desse movimento foi a transformação de garotas de rua em artistas para o Dance Theater of Harlem, por Arthur Mitchell ao fundir os passos do balé europeu ao som de tambores africanos. Jovens afro-americanos adotaram nomes de origem africana e vestiram um tipo de indumentária chamada “dashiki” ou bata africana. Tornou-se popular um estilo de cabelo chamado “afro” ou “black power”, que foi usado até por jovens brancos, encantados pela novidade exótica. De repente, o slogan mais ouvido nos EUA foi “black is beautiful”.

Todo povo elege os temas de sua história que são especialmente comprometedores e complexos e, após esta eleição, os transforma em tabus, desenvolvendo mecanismos de defesa contra indivíduos e grupos minoritários que queiram arrancar – para efeito de pesquisa e compreensão do problema, e busca de possíveis soluções – os encardidos curativos que tampam as feridas do passado. O corpo social, na ânsia de paz e tranquilidade, reorganiza e revaloriza suas experiências coletivas (e também suas esperanças) a partir de um encobertamento das realidades mais desagradáveis. É por isso que o Brasil, o último país do mundo a abolir a escravidão, ainda nega a questão racial o status de questão nacional. No plano individual essa operação psíquica de fuga é denominada pela psicanálise de “Unterdrückung”; “forçar para baixo”, “empurrar para o subsolo”. No entanto, segundo Frenette, o custo do alívio psicológico de empurrar o problema para debaixo do tapete é ter de distorcer violentamente a nossa própria percepção de realidade. Ao fazer vista grossa para o racismo, e ao formular as mirabolantes explicações pseudo-sociológicas para permanências na crueza do preconceito racial, a sociedade brasileira está apenas retardando o reconhecimento de uma verdade inquestionável: a existência de muitos milhões de brasileiros brancos que detestam os negros e que preferem um negro morto de que conviver com a presença negra fazendo parte da brancura de suas famílias.

Por trás dessas ideias, meados do século XIX (1853), o Conde francês Joseph Arthur de Gobineau, Em sua obra Essai sur linégalité de races, (Ensaio Sobre a Desigualdade das Raças Humanas), publicada em quatro volumes, em 1853, considerada a “bíblia do racismo moderno”, e que deflagrou a era do chamado racialismo ou racismo científico. Ele elaborou uma teoria classificatória da humanidade, onde a raça ariana ocupava o topo da hierarquia social. Os miscigenados, por não serem puros de sangue não teriam ordenação na sua teoria, eles seriam inclassificáveis pela ambivalência. Assim sendo, não havia como criar critérios para se classificar, nomear e ordenar com cientificidade a mestiçagem.  Ministro da França no Brasil e “conselheiro” de D. Pedro II, Gobineau via o Brasil como um país sem futuro devido a grande quantidade de pretos e miscigenados. Defendia que o país precisava branquear (se livrar dos negros). Brancura perseguida como caminho para disfarçar o complexo de pertencimento aos povos do mundo novo e, portanto, classificado segundo o racialismo ou racismo científico em estágio civilizatório pré-lógico. As ideias racistas do conde francês culminaram com a eugenia e a tese nazista/facista de superioridade ariana, e influenciaram a nossa intelectualidade nacional do século XX. Da articulação entre intelectuais racistas e aliados políticos criou-se as bases que conduziram a “Política Nacional de Embranquecimento”, com a imigração europeia, japonesa e uma abolição da escravidão feita de forma a empurrar a população negra para às margens das estradas, mantendo-a em condições de extrema pobreza até que se extinguissem devido à mortalidade infantil, desnutrição, doenças, mazelas sociais e também através de sucessivas miscigenações (Fernandes, 1978ª, p. 255-256 apud TAVOLARO, 2013, p. 22).

Será que os eventos da pós-abolição da escravidão em 1888 representou realmente um avanço rumo a uma democracia racial, ou foi apenas um ato da manobra política para tirar a população negra liberta do ônus do Estado brasileiro, pois a doutrina da democracia racial isentava a política do estado ou o racismo informal de qualquer responsabilidade adicional pela situação de abandono deste contingente populacional, e até mesmo colocava esta responsabilidade diretamente nos ombros dos próprios afro-brasileiros. Se os negros fracassaram em sua ascensão social, isso evidentemente foi por sua própria culpa, pois essa sociedade não reprimiu ou obstruiu de modo algum o seu progresso. Ou seja, a realidade de pobreza e marginalidade dos negros não era vista como uma refutação da ideia de democracia racial, mas sim como uma confirmação da preguiça, da ignorância, da estupidez, da incapacidade etc., o que impedia ao negro de aproveitar as oportunidades a ele oferecidas pela sociedade brasileira. Em suma, “o restabelecimento da ideologia da vadiagem” (Andrews, 1988, p. 209-210 apud TAVOLARO, 2013). O autor contra argumenta o pensamento de Florestan Fernandes sobre a democracia racial pós-abolição ao questionar o pensamento de que com esse feito o Brasil passou a ser uma terra sem impedimentos legais e institucionais para a ascensão social do negro porquanto da igualdade racial, onde o preconceito e as discriminações são reduzidos. Sustenta-se que há igualdade de oportunidades, podendo o negro disputar de iguais condições com os demais cidadãos o ingresso aos bens sociais e matérias (essa enunciação da democracia racial por Florestan Fernandes, O mito da democracia racial, citado por George R. Andrews, Negros e Brancos em São Paulo (1888-1988), Bauru, EDUSC, 1988, p. 203).

Para consubstanciar o seu entendimento Andrews busca explicação no posicionamento de intelectuais como Sergio Buarque de Holanda e Francisco Weffort e o argumento de que tal política racial é uma integração aos equívocos da própria experiência republicana. A partir da leitura de obra do historiador brasileiro, após a queda da República, o mesmo resumiu a experiência republicana da democracia racial no Brasil como sendo sempre um lamentável mal-entendido, por entender esse movimento como uma tentativa da aristocracia rural e semifeudal, ao importar as teses racistas do século XIX, em acomodar, onde fosse possível, os seus direitos e privilégios. A essa tentativa de acomodação o cientista político Francisco Weffort descreve como um “legado de equívocos”, em que a hierarquia e o privilégio eram defendidos em nome da democracia e da igualdade. O conceito de democracia racial reflete ao mesmo tempo esse legado de equívocos e é parte integral dele. Resumindo: A República tanto estabeleceu o ideal de participação política democrática quanto negou na prática; a democracia racial desempenhou um papel similar a hierarquia racial, justificando e defendendo a realidade da desigualdade social ao invocar o oposto. Estava claro para todos que os negros continuavam a ocupar uma posição rebaixada e subordinada na sociedade brasileira.

Florestan Fernandes elenca as três formas da utilidade prática do mito: Primeiro Mito: atribui a incapacidade ou a irresponsabilidade do negro os seus dramas humanos entendidos pelos dois pensadores como caminho para justificar os índices insofismáveis de desigualdade econômica, social e política na ordenação das relações sociais. Segundo Mito: isenta o branco de qualquer obrigação, responsabilidade ou solidariedade moral de alcance social ou de natureza coletiva perante os efeitos sociopáticos da espoliação abolicionista do negro e do mulato. Na interpretação de Andrews a nossa democracia racial é um arranjo para a perpetuação da desigualdade racial e social. Terceiro Mito: Revitaliza a técnica de focalizar e avaliar as relações sociais entre negros e brancos através de exterioridades ou aparências dos ajustamentos raciais, formando uma consciência falsa da realidade racial brasileira. Essa técnica não teve apenas utilidade imediata, pois as condições necessárias para sua exploração prática foi implantou de tal maneira que se configurou como elo em duas épocas sucessivas da história cultural das relações étnico-raciais na cidade. Em consequência também concorreu para difundir e generalizar a consciência falsa da realidade racial, suscitando todo um elenco de convicções etnocêntricas. O pensamento reinante sobre o negro e a não existência de problemas de justiça social, excetuando-se o que foi resolvido pela revogação do estado servil e pela universalização da cidadania “pressupõe que o corolário segundo o qual a miséria, a prostituição, a vagabundagem, a desorganização da família etc., seriam efeitos residuais transitórios a serem tratados pelos meios tradicionais e superados por mudanças qualitativas espontâneas” (Torres, 1956, op. cit. P. 96 apud TAVOLARO, 2013).

“Essa situação de abandono condenara o negro a eliminação no mercado competitivo de trabalho ou, no mínimo, ao aviltamento de sua condição conduziu-o ao desajustamento econômico, à regressão ocupacional e ao desequilíbrio social.” (Fernandes, 1978ª, p. 42-32 apud TAVOLARO, 2013, p. 21). Tal pensamento sobre a presença negra na sociedade brasileira manteve-se hegemônico até os anos 30. Mesmo com os pressupostos do discurso intercultural, o reflexo de tais ideias racistas continua influenciando políticas oficiais discriminatórias por um bom tempo. No Decreto-Lei 7967/1945, cuidando da política migratória, dispôs que o ingresso de imigrantes dar-se-á tendo em vista a necessidade de preservar e desenvolver, na composição étnica da população, as características mais convenientes de sua ascendência europeia. Prova cabal dos reflexos dessa política de embranquecimento da população no passado, com desdobramentos na relação social nos nossos dias, é o resultado do trabalho de pesquisa junto às penitenciárias brasileiras, e notícia veiculada no jornal Causa Operária, coluna Opinião, em 23/11/2014. A matéria assinada por Luiz Carlos Valois Juiz de Direito, Mestre e Doutorando em Direito Penal pela Universidade de São Paulo – USP, membro da Associação Juízes para a Democracia e da Law Enforcement Against Prohibition – LEAP, Associação de Agentes da Lei Contra a proibição das Drogas, ao pesquisar processos por tráfico de drogas pelos fóruns do país, recentemente esteve em Porto Alegre e duas coisas o deixaram bastante intrigado. A primeira é a posição dos promotores de justiça no exercício da atividade de acusação aos narrar o fato criminoso na denuncia. Chamou-lhe a atenção o costume estranho de anexar as fotos dos acusados em todas as denúncias. Segundo o juiz, estranho porque o que se deveria julgar é apenas o ato e não a pessoa, sendo que a figura daquele cidadão a ser julgado pode exercer influência desnecessária no processo. Como exemplo cita o professor Salomão Shecaira, da USP, conta em seu livro Criminologia, que um juiz napolitano conhecido como conhecido como Marquês de Moscardi, julgava os seus réus com base na aparência e, assim, teria criado a regra de que “na dúvida entre dois presumidos culpados, condena-se o mais feio”. Porém, a segunda coisa que o intrigou se apresenta mais séria.

O Rio Grande do Sul é conhecido pela predominância de pessoas brancas, algumas louras de olhos claros, sejam pela imagem exposta pela mídia, numa simples busca no Google, e é esta a impressão também quando chegamos ao Fórum ao prestar atenção no entra e sai de advogados. Ate ai tudo bem, pois a nossa colonização se deu de forma realmente diferenciada, mas ao olhar as fotos juntadas nos processos pelos promotores tive um susto: a maioria esmagadora dos acusados é negra. Prossegue ele: O racismo no Brasil sempre foi de intricada definição, encoberto por muitos e dissimulado por grande parte da população, e eu precisaria ir à Porto Alegre para constatar que q guerra ás drogas e o Direito Penal como um todo tem servido como forma de “apartheid”. Basta entrar em qualquer penitenciária brasileira para se perceber o contraste entre a cor da pele dos encarcerados e a cor da pele dos que estão nos shoppings. Contudo, nunca é fácil comprovar isso com estatísticas. Muitos são fichados, catalogados como brancos, mas são morenos, mulatos. Nos processos que pesquisei isso acontecia também, pois alguns eram visivelmente negros e constavam na denúncia como brancos. Posso até estar sendo injusto com os promotores gaúchos, porque eles podem muito bem estar querendo mostrar justamente o racismo dos policiais que prendem mais negros do que brancos, certamente com maioria negra, como traficantes de droga, embora nada leve à conclusão da existência dessa crítica sócia nas denúncias. De qualquer forma, o péssimo hábito do Ministério Público de Porto Alegre acabou ajudando em minha pesquisa, porque cada vez fica mais claro que a guerra às drogas está a permitir uma discricionariedade enorme ao poder de polícia, ao poder da polícia da rua. “A guerra às drogas é racista”. Talvez não precisemos de mais estatísticas. Negros pobres são traficantes. Enquanto brancos ricos são soltos como usuários, tudo com base no julgamento feito na rua e ratificado pelo Poder Judiciário.

Para finalizar fica a reflexão de quanto ainda prevalecem as técnicas do passado escravocrata, engendradas para que os afro-brasileiros libertos permaneçam sob a égide das fatalidades do destino e suas amarras impossibilitando-o de apropriar-se do modelo diaspórico afro-americano como espelho de ideal de luta para pretensões libertas em sentido amplo da palavra ou, reconhecer verdades nas palavras de Florestam Fernandes quando diz: Os efeitos culturais e psicossociais do abandono pós-abolição foi totalmente desfavorável ao negro porque uma vez destituídos da autonomia social os negros teriam continuado a se perceber através das lentes e expectativas dos brancos. Além disso, o fato dos padrões de relações raciais elaborados sob a égide da escravidão e da dominação senhorial terem se perpetuado na sociedade de classes, sem que esta última trouxesse qualquer ameaça à posição do branco na estrutura de poder, impediu o florescimento de uma modalidade de resistência aberta, consciente e organizada, que colocasse negros, brancos e mulatos em posições de luta (Fernandes, 1978a, p, 250 apud TOVOLATO, 2013, p. 21). Ademais, a persistência da extrema desigualdade social (própria do regime escravocrata) em sua sociedade republicana (formalmente pautada na igualdade jurídica) engendrou um dos mais poderosos mitos modernos: o mito da democracia racial. Fazendo uso prático da ideologia da democracia racial e seus mecanismos de despolitização da massa negra, a permanência destes na base da pirâmide se sustenta no discurso que dá às desigualdades raciais uma roupagem de diferença de classe e quando não desmobilizar, a de isolar os negros politicamente. Ao se referir aos movimentos de protesto negro do início dos anos trinta como caso ilustrativo de tal isolamento, Hasenbalg, afirma que: “Esses movimentos ou se defrontavam com a indiferença dos brancos ou então eram condenados como expressões de ‘intolerância e racismo negro que ameaçavam a paz e a ordem social’” (Hasenbalg, 1979, p. 244 apud TOVOLARO, 2013, p. 23).

É, também, de Lilia Gonçalves Magalhães Tavolaro, para a Revista Pesquisas e Debates em Ciências Sociais, da Universidade Federal de Goiás – Sociedade e Cultura -, com o título: Raça, classe e cultura no contexto das políticas de ação afirmativa: um esforço teórico-prático a respeito da raça, o texto em que a autora se propõe a discutir três questões caras ao debate sociológico em torno das chamadas “questões raciais” e, de algum modo, retomadas no contexto da implementação das políticas de cotas no Brasil: a relação entre raça e classe; a interface de raça com cultura/etnia; e o status de raça como categoria social e conceito analítico. Nesse sentido, em suas considerações finais, a socióloga afirma que qualquer experiência fenomenológica é capaz de atestar a força do racismo na sociedade brasileira contemporânea, experiência esta que se confirma a cada dado estatístico referente à enorme desvantagem dos negros no que tange à sua posição socioeconômica, bem como o seu acesso à educação, saúde, emprego etc. Trata-se de uma ordem racista pautada na ideia de que pessoas com uma determinada aparência, fenótipo, ou herança genética, são naturalmente inferiores. A digressão sobre as três questões caras ao pensamento teórico social relativo à chamada questão racial, é o esforço da PhD em sociologia em elaborar um discurso teórico crítico da raça que cumpra com o seu objetivo de interpretar e explicar o fenômeno da raça sem que se reproduza a respeito dela concepções de senso comum. Contudo, ressalta que a elaboração de um discurso teórico crítico da raça em um contexto marcado pela urgência da elaboração e implementação de políticas capazes de combater o racismo de forma eficaz e duradoura constituí uma tarefa das mais difíceis, já que implica também em desconstruir, ao menos do ponto de vista analítico, aquele que constituí consequência e principal pilar de sustentação do racismo e das identidades raciais dentro da ordem racista, ou seja, a raça.

[1] Web 2.0 – Em 2004, a empresa O´Reilly designou o termo Web 2.0 para uma segunda geração de comunidades e serviços na plataforma Web, onde a ideia é que o ambiente online se torne mais dinâmico e que os usuários colaborem para a organização de conteúdo. Ou seja, tem essencialmente a ver com ambientes propícios à criação e manutenção de redes sociais abertas ou fechadas, públicas ou privadas.  (O´REILLY, 2005, p.3).

[2] Herdeiros bourdieanos – Segundo estudos etnográficos de Bourdieu e Passeron, no livro Os Herdeiros, a escola transforma as desigualdades sociais (culturais) em desigualdades escolares. Isto é: “Os estudantes mais favorecidos, não só devem ao meio de origem os hábitos, o treino e as atitudes que lhes são mais úteis nas tarefas escolares, mas herdam também saberes, gostos, cuja credibilidade escolar, embora indireta, não deixa de pautar-se sobre esses conhecimentos, desfavorecendo aqueles não possuidores desse capital cultural.” Para alguns a cultura escolar é idêntica à cultura da família enquanto que para outros representa uma aculturação.

[3] Sociobiologia – Essa disciplina científica propõe que comportamentos e sentimentos animais, também existentes nos seres  humanos, como o altruísmo e a agressividade, são em parte derivados da genética e não são apenas culturais ou socialmente adquiridos. Esse tipo de afirmação causou grande controvérsia no cenário intelectual, e até hoje divide os pesquisadores. Entretanto, boa parte das críticas são interpretações errôneas da teoria, muito confundida com o darwinismo social.

[4] Ancestralidade biogeográfica – Baseia-se no estudo d informação de 190 marcadores do DNA, selecionados para distinguir entre cinco populações de referências ancestrais: Europa, leste Asiático, África Ocidental. América Nativa e Subcontinente Indiano. Esses marcadores estão distribuídos pelos 22 pares de cromossômicos. Através da aplicação desse tipo de teste permite-se saber qual a percentagem genética que o DNA de uma pessoa possui de cada uma das populações ancestrais, traçando o seu perfil genético.

[5] Kenneth Brancroft Clark e Mamie Clark – Pioneiros em estudos psicológicos com o uso de bonecas, The Experiment Clarck Boneca (1939), onde pediram crianças negras para escolher entre um a boneca preta e uma boneca branca depois de uma determinada pergunta. As bonecas eram iguais, exceto para sua cor de pele. O estudo levou a conclusão que a maioria das crianças negras associava características positivas à boneca branca.

[6] Poligenistas – Vem do segundo o livro do Gênese, na Bíblia, sobre os filhos de Noé: Cam (raça negra), Sem (raça amarela) e Jafé (raça branca). Em Cam está a explicação para a raça negra quando este viu Noé nu e bêbado e contou para seus irmãos, zombando do pai. Ao saber disso, Noé amaldiçoou Cam e o condenou, assim como toda a sua descendência, à servidão. Os escravocratas, avidamente adotaram uma identificação dos africanos com os descendentes de Cam, uma cômoda justificativa religiosa para a escravidão, embora na própria Bíblia não haja nenhuma referência à cor de Cam ou qualquer descrição de seus descendentes.

[7] Taxonomia ou Zoologia Sistemática – É a ciência que classifica os seres vivos. A primeira tentativa de se classificar milhões de espécies de seres vivos do planeta aconteceu há três séculos antes de Cristo quando Aristóteles classificou os animais “com sangue vermelho” e “sem sangue vermelho”. No século XVII surge o conceito de espécie introduzido pelo naturalista John Ray, considerado o pai da história natural inglesa. No século seguinte, os seres vivos começaram a ser classificados de acordo com sua história evolutiva e desenvolvimento embriológico até que, em 1735, Carl Von Linné (1707-1778), mais conhecido como Lineu, publica Systema Naturae, onde trata dos reinos animal, mineral e vegetal agrupando os seres vivos (plantas e animais) em classes, ordens, gêneros e espécies. Para classificar plantas e animais, Lineu adotou um primeiro nome em latim para indicar o gênero e um segundo para indicar a espécie.

[8] Darwinismo social – Baseado aplicação da teoria de Darwin nas sociedades humanas. Descreve o uso dos conceitos de  luta pela existência e sobrevivência dos mais aptos para justificar políticas que não fazem distinção entre aqueles capazes de sustentar a si mesmo e aqueles incapazes de se sustentar. Conceito adotado no contexto de competitivo do capitalismo Laissez-faire; como também motivou, de forma similar, as ideias de eugenia, racismo, o autoritarismo facinazista e na luta entre grupos e etnias nacionais.  O termo foi popularizado em 1944 pelo historiador americano Richard Hofstadter, mas atualmente, por causa das conotações negativas da teoria do darwinismo social, especialmente após as atrocidades da Segunda Guerra Mundial.

 [9] Fealdade negra – Feiura ou fealdade é uma característica de um ser vivo, cuja aparência é desagradável à vista e resulta numa avaliação altamente desfavorável.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AZEVEDO, José André de. Fundamentos Filosóficos da Pedagogia de Freire. Akrópolis, Umuarama, v. 18, n. 1, p. 34-37, Jan/Mar, 2010. Disponível em: <http://revistas.unipar.br/akropolis/article/viewFile/3115/2209&gt; GIAROLA, Flavio Raimundo. Racismo e teorias do século XX – principais noções e balanço histórico. Disponível em: <http://www.historiaehistoria.com.br/materia.cfm?tb=alunos&id=313&gt; Acesso em: 08/01/2015. MANDELA, Nelson et al. No final do século – Reflexão dos maiores escritores do nosso tempo. Ediouro Publicações S.A, Rio de Janeiro, 1998. PENA, Sergio D. J.; BIRCHAL, Telma S. A inexistência biológica versus a existência social de raças humanas: pode a ciência instruir o etos social. Revista USP, São Paulo, n. 68, p. 10-21, Dezembro/Fevereiro 2005/2006. Disponível em: <http://www.usp.br/revistausp/68/02-sergio-telma.pdf&gt; Acesso em: 05/01/2015. RIBEIRO, Helcio. A iniciativa popular como instrumento da democracia. Dissertação de Mestrado, Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. 2007. Disponível em:          <http://www.mackenzie.br/fileadmin/Graduacao/FDir/Artigos/helcioribeiro.pdf&gt; Acesso em: 21/01/2015. RIOS, Roger Raupp. A política brasileira de embranquecimento – uma visão jurídica. Juiz da 10ª Vara, Rio grande do Sul, 16/12/2001. (Retirado dos autos de sentença judicial referente a crime de racismo). Disponível em: <http://movimentoafro.amazonida.com/branqueamento.htm&gt; Acesso em: 02/01/2015. SABBATINI, Renato M. E. Frenologia: a história da localização cerebral. Cérebro & mente, Março/1977. Disponível em: <http://www.cerebromente.org.br/n01/frenolog/frenologia_port.htm&gt; Acesso em: 08/01/2015. SILVA, Kalina Vanderlei; SILVA, Maciel Henrique. Dicionário de conceitos históricos. Editora Contexto, São Paulo: 2006. Disponível em: <http://pt.slideshare.net/benjoinohistoria/dicionrio-de-conceitos-histricos&gt; Acesso em 12/01/2015. SANTOS, Gislene Aparecida dos. Percepções da Diferença. Coleção Percepção da Diferença – Negros e Brancos na Escola. Vol. 1. 2007. Disponível em: < http://www.usp.br/neinb/wp-content/uploads/NEINB-USP-VOL-1.pdf&gt; Acesso em: 18/01/2015.  _____________________________ A invenção do ser negro. Editora da Pontifícia Universidade católica de São Paulo – EDUC, São Paulo: 2002. Disponível em: <https://www.passeidireto.com/arquivo/1764631/-a-invencao-do-ser-negro- > Acesso em: 20/01/2015.  TAVOLARO, Lília Gonçalves Magalhães; Sergio Barreiro de Faria. Raça e a “Tese da excepcionalidade brasileira”: uma reflexão à luz das ações afirmativas. Revista de estudos e Pesquisas sobre as Américas, vol. 7, n.° 1/2013. Disponível em: < http://periodicos.unb.br/index.php/repam/article/view/9590 > Acesso em: 12/01/2015. ____________________________ Raça, classe e cultura no contexto das políticas de ação afirmativa: um esforço teórico-prático a respeito da raça. Sociedade e Cultura, Goiânia, v. 13, n. 2, p. 287-298, jul./dez. 2010. Disponível em: < http://www.revistas.ufg.br/index.php/fchf/article/view/13432/8670&gt; Acesso em:09/01/2015.

FABIO LEÃO: entre o crime e o Ringue

Posted in Cidadania, Cinema, Intervenção Social, Sociedade, Violência Urbana with tags , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , on novembro 5, 2014 by projetomuquecababys

http://canalbrasil.globo.com/programas/cinejornal/videos/3205739.html

  • Filme / Documentário
  • Nome Original:  Entre o Crime e o Ringue
  • Direção:  Paulo Thiago
  • País:  Brasil
  • Ano: 2013
  • Cor:  Colorido
  • Classificação:  Programa permitido para menores acompanhados dos pais

Fábio Leão é um consagrado nome do MMA. O longa-metragem apresenta a trajetória vitoriosa do protagonista, que entrou para o mundo do crime quando jovem, mas superou os obstáculos através do esporte.

By Cristiane Soares e Érica Fernandes (Texto Adaptado)

O nome de Jesus não está apenas estampado no peito do lutador Fábio Leão, mas na transformação de vida que tem demonstrado em cada ringue que entra para lutar. E de lutas ele entende muito bem, é tricampeão Carioca de kickboxing, vicecampeão de Muay Tai, medalha de prata em kickboxing no Pan Americano e no Sul-afriano. Mas de todas essas vitórias, ele afirma que ter conhecido Jesus é a maior de todas. Foi Cristo que o fez vencer as drogas, a criminalidade e o tornou um homem referencial para “gregos e troianos”. Uma história como essa não poderia ficar guardada e nem ficará. Em 2014, ela vai virar filme e livro. Mas, enquanto a vida do lutador Fábio não está nas telas do cinema, você pode conferir aqui no Lagoinha.com, em detalhes, mais um milagre de Jesus.

“Nasci e cresci em uma favela localizada na zona oeste do Rio de Janeiro, atualmente conhecida como comunidade Villa Kennedy. Quando tinha seis meses de idade, o meu pai foi assassinado e, nesta época, minha mãe e minha tia saíam para trabalhar e me deixavam com a minha avó, que cuidava de mim, da minha irmã e de mais três primos. Com o passar do tempo, fui crescendo e levando uma vida normal como a de qualquer criança. Porém, certo dia vi que em uma praça a 50 metros da minha casa, local onde funcionava uma das bocas de fumo do bairro, havia traficantes fazendo “papel de governantes”. Eles supriam necessidades dos moradores da comunidade, inclusive as da minha família, e isso fez com que eu começasse a idolatrá-los. Então, cresci acreditando que o errado era certo. Com a idade de 10 anos, já era fã do Bruce Lee, apaixonei-me pelas artes marciais e comecei a praticar Karatê. No entanto, a fim de conseguir dinheiro para manter-me no esporte, comecei a fazer furtos em supermercados e, aos 13 anos, já pertencia a uma quadrilha que praticava assalto à mão armada. Para minha infelicidade, aos 17, fui baleado numa troca de tiros com a polícia e, a minha avó, pessoa quem eu tanto amava, ao saber da notícia, entrou em profundo desgosto e sofreu um infarto, que a levou a óbito. E aos 19, fui preso. Porém, mesmo vivendo uma vida conturbada, nunca deixei totalmente as artes marciais. Na verdade, ela estava dividida entre o crime e o ringue.

No meu sexto ano de cumprimento de pena, fui transferido para Penitenciária Moniz Sodré, situada no Complexo de Gericinó, em Bangu, no Rio de Janeiro, onde conheci o diretor Gilson Nogueira, primeiro homem usado por Deus para transformar minha vida. Ele viu que, no passado, eu era lutador, e me propôs dar aulas de artes marciais dentro da prisão. Como havia sido condenado a 17 anos, mais do que depressa, fiz as contas e constatei que em vez de eu sair em 2014, sairia em 2010. Sendo assim, aceitei o convite. Mas para que eu tivesse essa oportunidade, o que reduziria a minha pena, o diretor colocou uma condição: fazer uma oração antes e após de cada aula. Naquele momento, respondi que isso era inviável, pois não sabia rezar. Contei a ele que minha família era da umbanda; e que minha vida tinha sido entregue em um terreiro de macumba. O diretor não ligou para o fato e disse que era para eu falar com Deus da forma que sabia, pois Ele me ouviria. Também me disse que DeusPenitenciária Muniz Sodre escolheu as coisas loucas desse mundo para confundir as Sem entender direito o que ele me dizia, questionei: “Doutor, o senhor é crente?”. Ele me respondeu que era cristão, pastor evangélico e que tinha a certeza de que Jesus Cristo é o único que poderia transformar a vida de qualquer ser humano da face da terra. A partir dessa ocasião, aprendi a orar o Pai Nosso e durante três meses fiz essa oração em todos os momentos em que dava as aulas. Porém, certo dia, um traficante chegou até mim e questionou-me até quando eu iria ficar só na oração do Pai Nosso, pois Deus já devia estar enfadado. Ainda com ar de questionamento, ele me pediu que falasse um versículo da Bíblia. Respondi que não sabia e pedi que ele me dissesse um. Ele, então, disse a passagem bíblica João 8.32: “Conhecereis a Verdade e Ela vos libertará”. Sem entender nada, perguntei: “Que verdade é essa?” Ele me disse que a verdade é a Palavra de Deus e me perguntou se eu não tinha uma Bíblia. Eu respondi que não tinha e ele me chamou de maluco por estar em uma prisão, sem ter uma Bíblia. Irritado o indaguei quem era ele pra falar de mim, já que era traficante e matava mais do que a AIDS.

Lembro-me, que naquele instante, ele me disse que havia nascido em lar evangélico, mas que estava afastado dos caminhos do Senhor. Também enfatizou que só Jesus transforma vidas e que Ele usa quem quer, na hora que quer e da maneira que quer. Esse traficante foi o segundo homem usado por Deus, dentro da prisão, para mudar a minha história. Passado uns dias, quando minha mãe, minha esposa e minha filha foram me visitar, solicitei a elas que, no próximo encontro, levassem uma Bíblia. Como minha mãe era macumbeira, ficou assustada com aquele pedido, mas mesmo assim atendeu à minha solicitação. A partir desse dia, comecei a ler a Palavra de Deus e dentro da prisão tive um encontro verdadeiro com nosso Senhor e Salvador, Jesus Cristo. A pior cadeia não é a dos muros e das grades e, sim, a que encontramos, aqui, do lado de fora: a cadeia do preconceito, da dúvida, da rejeição, do descrédito e do NÃO. Quando sai da prisão, já não estava mais só, pois Cristo havia entrado em minha vida. Sabia que se eu me esforçasse, tomasse as atitudes corretas e não desistisse dos meus sonhos, eles seriam e serão realizados. Em Felipenses 4.13, o Senhor nos diz: “Tudo posso naquele que me fortalece”. Sendo assim, em Cristo Jesus, somos mais do que vencedores. É preciso somente ter força, fé e foco. Não desistam, entreguem o seu caminho ao Senhor, confia nele e o mais ele fará.

Tinha certeza que o meu fim seria como a de todos que cresceram no crime comigo. Imaginava que seria assassinado; que morreria com doenças como tuberculose, AIDS; ou que ficaria entrevado numa cadeira de rodas. A minha mudança de vida atribuo ao meu salvador, Jesus Cristo; ao amor e à perseverança da minha mãe, que faleceu quando ainda estava preso; da minha esposa, que está ao meu lado desde os meus 13 anos de idade; e da minha filha Hillary, de 14 anos, que durante 10 anos me visitou no Complexo Penitenciário de Bangu. A minha vida foi totalmente transformada após ter conhecido Jesus. Fui nomeado pelo secretário de Estado de Administração Penitenciária, Coronel Cesar Rubens, como servidor público (cargo de confiança). Atualmente, possuo a mesma carteira dos guardas penitenciários; e não só ministro aulas de artes marciais, mas também prego a Palavra de Deus em oito penitenciárias, onde foram instaladas academias de lutas. Sei que o propósito de Deus em minha vida é fazer com que, por meio das artes marciais, pessoas sejam evangelizadas e levadas ao arrependimento de seus pecados.

Sou grato a Deus pela oportunidade em ser um obreiro-evangelista. Também, juntamente com o pastor Alexandre Esquerdo, lidero um projeto na comunidade da Vila Kennedy, local onde nasci, cresci e resido. Por meio da Palavra de Deus e do esporte, estamos conseguindo ganhar muitas vidas para Jesus. Na comunidade, sempre ministramos o tripé em que o homem deve estar firmado: Deus, família e trabalho, o que já tem fabio-leão-editadaproduzido ótimos resultados: 17 homens que saíram da prisão, hoje, estão vivendo das artes marciais; jovens estão deixando o crime e as drogas; e mulheres de detentos têm seguido o exemplo da minha esposa, que também é obreira da igreja, em não abandonar o marido na prisão. Outro milagre que Deus tem feito na minha vida é um filme de ficção, baseado em fatos reais. Ele está previsto para ser lançado até o final de 2014. O ator global, Thiago Martins, é quem irá compor o meu personagem. Sou um homem liberto das drogas; que foi usado pelo Espírito Santo para ganhar a alma da minha mãe para Jesus; que contou com visitas à penitenciária da própria juíza que me condenou a 17 anos de prisão; e que viveu e ainda viverá muitos milagres. Eu sou e para sempre serei um eterno aprendiz de Deus, que decidiu crer, obedecer e a praticar os mandamentos do Senhor.”

Disponível em: < http://www.lagoinha.com/ibl-vida-crista/fabio-leao-um-lutador-que-venceu-a-vida/ >
Acesso em: 05/11/2014

By Paloma Silbar

As artes marciais deram um novo rumo para a vida conturbada de Fábio Leão. Desde a infância na Vila Kennedy que o lutador se viu dividido entre “o crime e o ringue”. Foi na última ida para a prisão que a grande mudança aconteceu. “Eu recebi a oportunidade da minha vida dentro do sistema penitenciário”, afirma Fábio.

No reino animal, o leão é apelidado de “rei da selva”, por estar no topo da cadeia alimentar. Como simbologia, sua imagem é associada à força, orgulho e liderança. A história de Fábio Leão aponta as influências do sobrenome em seu destino. O menino que “sempre quis ter autoridade e ser líder”, encontrou dois caminhos que atendiam às suas expectativas: o tráfico de drogas e as artes marciais. A vida o fez perambular por estes mundos distintos durante anos, até que Fábio se decidiu por um dos lados: escolheu a luta.

Fábio foi criado na Vila Kennedy, favela da zona oeste carioca. Na juventude começou a se envolver com o crime e chegou às lideranças do tráfico local, ao mesmo tempo que praticava artes marciais. Entre idas e vindas da prisão, o lutador se tornou campeão brasileiro, mas não suportou a perda do campeonato mundial, voltando a se envolver com o crime e com as drogas. Mas uma outra vitória estava por vir: Fábio passou a dar aulas na prisão e conseguiu reduzir sua pena. Foi dentro do sistema penitenciário que se tornou amigo de um antigo desafeto: a juíza Telma Fraga.

A vida que o esperava fora da cadeia era muito diferente da que ele deixou pra trás. Também não era o mesmo homem que aos vinte e poucos anos tinha sido condenado a 17 anos de prisão. Fábio retomou a carreira de lutador e passou a se envolver em projetos sociais. Ao invés de abandonar de vez a prisão, resolveu que ainda tinha uma missão a cumprir ali dentro e continuou dando aulas para os detentos. Também não se esqueceu dos seus anos de infância e passou a dar aula de artes marciais para crianças da Vila Kennedy.

Essa história de superação através do esporte foi contada em inúmeras reportagens de grandes emissoras, como a Globo, SBT e Record. Fábio já perdeu as contas  de quantas entrevistas deu para revistas, TVs e sites. E o sucesso não para por aí. A vida do lutador da Vila Kennedy vai se tornar um filme com a direção de Paulo Thiago. O título mais cogitado para o longa-metragem é “Fábio Leão: entre o crime e o ringue”. Fábio revelou que seu papel será feito por um ator global, mas deixou seu nome em suspense.

A entrevista aconteceu na própria Vila Kennedy, numa academia em que Fábio dá aula. Durante nossa conversa, a “celebridade” local era cumprimentada por vários alunos. Fábio falou de crime, artes marciais, cadeia, drogas, família, UPP e religião.

Como foi a sua infância na Vila Kennedy?

Eu fui nascido e criado na Vila Kennedy, que sempre foi um bairro liderado pelo tráfico de drogas. O maior poder aqui nunca foi o poder público. Na época, em 82 ou 83, o traficante ajudava os moradores, comprava remédios, alimentos, fazia churrasco, festas das crianças. Na pracinha que é a 50 metros da minha casa, onde eu jogava bola de gude e soltava pipa, rolava o tráfico. Eu cresci vendo os traficantes fazendo papel de governantes. Eu acabei acreditando que o errado era o certo, porque eu via os caras com cordão de ouro, cheio de mulher bonita, carros do ano e fazendo papel de Robin Hood, roubando dos ricos e dando pros pobres. Quando eu tinha 10 anos, eu lembro que morreu um dos líderes do tráfico. No enterro tinha três ônibus lotados e um montão de mulheres brigando por um cara que já tava morto. Eu, com 10 anos, pensei: “Eu vou ser mais sinistro que esse cara. No meu enterro vai ter cinco ônibus e mais mulher brigando por causa de mim, porque eu vou ajudar mais gente, vou roubar mais, vou matar mais e eu vou ser mais respeitado do que ele.” Ali eu comecei a ter os traficantes como ídolos.

E pelas artes marciais, quando você começou a se interessar?

Quando eu era criança, na televisão, passava muitos filmes do Bruce Lee. Como eu sempre fui hiperativo, eu via um golpe e queria dar nos meus colegas. Aí eu comecei a fazer karatê com um professor que dava aula de graça numa associação de moradores. Eu comecei a ter dois ídolos: o líder do tráfico e meu professor. De dia eu ficava na rua fazendo avião e comprando quentinha pros caras da boca. Só que de noite eu tava dentro da academia, aprendendo artes marciais. Então a minha mente, com 12 anos, ficou confusa. Do lutador eu gostava das medalhas, da disciplina do esporte, da reverência do aluno com o mestre. Aquilo me chamou tanta atenção quanto um traficante. Eu sempre quis ter autoridade e ser um líder e ali eu tinha com dois segmentos. Eu treinei dois anos de caratê e o professor parou de dar aula pra trabalhar num emprego de segurança à noite. Depois disso, eu fiquei só no crime.

Com 12 anos você ficava o dia inteiro na rua. E como ficava a escola?

Eu fiz até a oitava série, mas eu só ia pra escola pra agradar minha mãe. Já não entendia mais nada, só vivia na rua. Eu ia com revólver pra escola e enquadrava os chamados nerds: “Faz minha prova aí, se não o bagulho vai ficar doido pra você”.

E hoje, você não sente falta de ter tido essa educação escolar?

Por incrível que pareça, dentro da prisão eu me tornei mais culto. Às vezes, eu conversando aqui, falo palavras que eu aprendi nos livros da biblioteca da prisão.

Você começou a fazer assaltos bem jovem. Como você se sentiu no seu primeiro assalto?

Eu me senti poderoso, acima de tudo, o dono do mundo. Quando eu botei o revólver na cara da atendente no balcão, ela abriu a porta pra mim e falou “pode levar tudo que você quiser”. No cofre tinha dinheiro que eu nunca vi na vida. Eu, um garoto de 13 anos, tinha dinheiro pra comprar carro, moto, mas não podia, porque fazia isso escondido da minha mãe e da minha vó. O dinheiro que eu peguei eu gastei em três meses em farra, bebida, maconha e cocaína.

Quando você foi preso pela primeira vez, qual foi a sua impressão do sistema penitenciário brasileiro?

Com 19 anos de idade eu cheguei dentro de uma cela na Polinter, na Praça Mauá, e encontrei condições sub-humanas. Dentro de uma cadeia que dava pra 20 pessoas morarem, tinham 110 homens. Muitos com tuberculose, doenças de pele e vírus da AIDS. Eu botei na minha cabeça que as piores coisas do mundo são: fome, guerra e cadeia, porque eu já vivi isso tudo. Eu já passei dificuldades de não ter alimentos na minha casa, eu já me envolvi numa guerra porque tinha que roubar pra me sustentar. E a guerra leva o homem pra morte ou pra cadeia. Eu parei na cadeia pela permissão de Deus. E dentro da cadeia eu falei que nunca mais voltaria pro crime, porque eu nunca mais queria cair num lugar daquele.

Mas você acabou voltando pro crime. Você não ficou com medo de ser preso de novo?

Não pensa que eu saía e voltava direto pro crime não. Eu cheguei a trabalhar em algumas multinacionais, só que eu nunca ficava mais de três meses, que era o prazo da experiência. Eu chegava lá era o mesmo papo “Fábio, você é um excelente funcionário, mas a nossa empresa não admite pessoas que passaram pelo sistema prisional”. Aquilo ali era como se fosse um nocaute pra mim. Eu saía chorando e com a certeza de que a única saída pra minha vida era ser bandido. Ou eu vou ficar velhinho na cadeia, ou eu vou morrer trocando tiro. Eu falava: “Poxa, se eu tô te pedindo um emprego é porque eu não quero voltar pro crime. No crime eu ganho cinco mil por semana, eu tô me sujeitando aqui pra ganhar um salário mínimo. Se alguém vir roubar, eu tenho coragem de te defender. Se sumir alguma coisa aqui, o maior suspeito vai ser eu. Vou ser o leão de chácara, não vou deixar sumir nada”.

Em entrevista pra Revista Trip você disse que se sentia diferente dos “outros caras”. Por quê?

Mesmo morando na Vila Kennedy eu usava meu dinheiro pra surfar, voar de asa delta e viajar pela Região dos Lagos. Meu sonho é ir pra Fernando de Noronha. Eu gosto de mergulhar, de lutar, de esporte radical. Eu nunca gostei de falar “eu sou bandido”. Mas a ostentação de querer ter um tênis da nike, umaqualand no braço, um cordão de 100 gramas, isso aí que me levou pro crime: falta de informação, ostentação de poder e as dificuldades da vida de um favelado. E de você vê a sua mãe abrir um armário e chorar porque não tem uma comida pra fazer e ali, a 50 metros, ter uns caras com mochilas cheias de dinheiro.

Como você chegou às lideranças do tráfico de drogas na Vila Kennedy?

Eu fazia clonagem de carro. Por exemplo, eu via uma Hilux preta, eu mandava roubar uma igual. Aí a gente modificava o chassi do carro roubado pro carro real, um clone. Só que a gente pegava esses carros e mandava pro Paraguai e trocava por armas e drogas. Foi quando eu comecei a liderar. Eu comecei a abastecer as bocas de fumo da Vila Kennedy, Mangueira, Jacaré, Manguinhos, da facção criminosa que predomina aqui, que eu não vou falar o nome porque já tem muita propaganda. Eu trocava um carro por 30, 40 quilos de cocaína.

Você fazia o papel de abastecedor do tráfico…

O nome no crime é matuto, que é o cara que fornece drogas pras bocas de fumo. Ali eu cheguei a ter casa de praia, carro importado, tudo que você pode imaginar. Só que eu queria comprar um carro, mas não podia ir na agência, porque tava com mandato de prisão. Pra comprar um cordão de ouro eu tinha que mandar o vendedor ir até a favela. Eu tinha uma casa aqui na Vila Kennedy com três quartos, suíte, piscina e sauna e era o único lugar que eu não podia ir. Tinha também uma casa em Iguaba, que na época eu comprei por 70 mil. Eu ganhava de cinco a dez mil por semana, e já não roubava mais.

Então você estava com uma situação financeira muito acima dos outros moradores da Vila Kennedy…

Mas aí eu comecei a fazer aquele papel que aqueles traficantes fizeram comigo quando eu era novo. Eu comecei a fazer compras pra moradores necessitados, a dar cestas básicas, a comprar remédios. E eu ainda tinha um sonho: quando eu morrer, pelo que eu faço, vai uns cinco ônibus no meu enterro. Eu ainda continuei com aquilo na cabeça.

Por que alguém sonha com o momento da morte?

É porque eu convivia com a morte. Eu sabia que o meu futuro seria a cadeia ou a morte, porque é o normal na vida de um bandido. Aquilo já fazia parte da minha vida, era o natural, era igual à lei da física: tudo que sobe, desce.

O que aconteceu com o dinheiro e imóveis que você foi adquirindo?

Eu tive que vender tudo. Uma vez indo daqui pra casa de praia, um X9 me cagoetou, eu fui pego pela polícia e perdi pra eles de uma vez só mais de 100 mil. A minha casa de praia de Iguaba e a minha casa de três quartos na Malvina eu tive que vender pra pagar os policiais. Quando a minha cadeia deu 17 anos, eu tive que vender o restinho pra pagar os advogados. Do crime, a única coisa que tenho até hoje, é uma bala alojada nas costas. Hoje eu moro na casa da minha falecida mãe, onde eu fui nascido e criado.

Qual foi o papel da religião na sua mudança de vida e saída do crime?

Hoje eu sou cristão. Não sou religioso, eu detesto religiosos. A palavra de Deus é o que eu sigo. A palavra de Deus fala “tudo me é lícito mas nem tudo me convém”. Eu posso ser qualquer coisa, estar em qualquer lugar, sem me prejudicar nem prejudicar o outro. A palavra de Deus diz “Amar a Deus sobre todas as coisas, amar teu próximo como a ti mesmo”. Então, o que eu não quero pra mim eu não posso desejar pra você. Hoje eu não tenho coragem mais de assaltar ninguém, de clonar o carro dos outros, de vender drogas. Porque quantas famílias não foram destruídas com a droga que eu vendi? Hoje eu me arrependo.

Você também foi usuário de droga. Como foi o processo até a dependência química ?

Depois que eu fui campeão brasileiro, eu fui convocado pra ir pro Mundial na Itália. Eu tinha que ter cinco mil dólares pra viajar e, se eu fosse campeão, eu ia ganhar 50 mil. Mas eu não consegui patrocínio. O cara que foi no meu lugar tinha patrocínio, foi campeão, ganhou a bolsa da luta e a carreira dele deslanchou. Eu pensei “era isso é o que ia acontecer comigo. Lutar não dá, realmente eu sou bandido”. Voltei a clonar carro, fazer tudo de novo. Na quarta vez eu já fui preso dependente químico, porque me deu uma depressão por eu não ter ganhado o título mundial e, quando as drogas chegavam na minha mão, eu experimentava. Era cocaína pura, eu tirava uma pedra, amassava e cheirava. A maconha era da melhor qualidade porque eu fazia contato direto com o Paraguai. Eu fiquei dependente muito rápido. Cheguei a ter dois princípios de overdose. Acordei no hospital duas vezes todo entubado. Só que eu nunca gostei de droga porque eu gostava do esporte e de ter meu corpo forte. 

Como nasceu a sua amizade com a juíza Telma Fraga, a mesma que te condenou a 17 anos de prisão?

Quando eu cheguei na prisão, o diretor Gilson Nogueira viu na minha ficha que eu tinha sido campeão brasileiro 15 anos antes. Esse homem foi usado por Deus pra salvar minha vida. Ele falou: “você vai dar aula aqui dentro, vai trabalhar três dias e vai cair um dia da pena. Em vez de você ir embora em 2014, em 2009 você ganha sua liberdade”. Eu comecei a dar aula, parei de usar drogas e de me envolver com o crime através do esporte. Passaram dois meses ele falou pra mim que a juíza Telma Fraga queria me visitar. Eu falei: “meu irmão, eu quero ver o capeta mais não quero ver essa mulher. Foi ela que me condenou a 17 anos de prisão”. Ela chegou dentro da penitenciária e falou “Fábio eu não condenei você e não condenei ninguém. Eu sentenciei o ato cometido. Daqui pra frente eu quero te ajudar”. Na outra semana ela levou o Rogério Minotouro e o Rodrigo Minotauro, dois lutadores famosos, lá na prisão. Os caras montaram uma academia pra mim e mandaram os equipamentos. Eu fiquei treinando quatro anos lá dentro e ganhei a minha liberdade. Quando eu saí ela me chamou pra trabalhar com ela. Eu falei “Como, eu não tenho nem a oitava série completa. A senhora deve ter estudado matérias interplanetárias”. Ela disse: “Você vai ser palestrante motivacional do meu lado, vai contar a sua superação dentro da prisão”. Hoje eu sou palestrante, ela é minha madrinha e minha melhor amiga. Eu não falo que ela é como uma mãe pra mim porque ela é nova, tem 45 anos e é bonita. Eu tenho ela como uma irmã.

Hoje você dá aulas em presídios, é palestrante, é lutador. Como está a sua vida atualmente?

Eu vivo da luta. Sou tricampeão carioca, prata no brasileiro, pan-americano e sul-americano. Tenho 37 anos e luto com garotos de 22 anos. Hoje eu tenho um projeto social na favela em que nasci e fui ameaça pra comunidade. Hoje eu sou funcionário público, nomeado pela SEAP (Secretaria de Estado de Administração Penitenciária), pra multiplicar isso que aconteceu comigo. Eu volto no presídio trabalhando na ressocialização e dando oportunidade pra aqueles homens serem inseridos no mercado da luta. A minha história vai virar um filme de longa metragem, do cineasta Paulo Tiago, que já pegou o distribuidor e agora tá fechando o elenco. Eu não posso falar quem é o ator, só posso falar que é um ator global. Essa história, que vai pro cinema no mundo todo, eu tenho certeza que é pra Deus mostrar que é possível, quando o homem quer. Mas pra tudo isso eu tive que lutar. Hoje a minha maior luta é salvar os meu amigos que ainda tão no crime, salvar essas crianças através dos projetos, pra que eles não sejam atraídos pelo crime como eu fui há vinte anos. Eu mato um leão por dia pra continuar nessa luta. Do projeto que eu tenho 100 crianças, se eu formar um cidadão, pra mim é muito. Hoje o que vale mais pra mim do que dinheiro é o abraço da comunidade na rua. Eu sou visto como um exemplo, a pessoa que tá toda hora em reportagem de televisão. E eu não posso deixar de ressaltar a função muito importante da minha família na minha recuperação. Minha mulher está há 23 anos comigo e me acompanhou dentro de prisão por dez anos, junto com a minha filha. Elas não me abandonaram em momento nenhum. Se elas me abandonassem, eu tenho certeza que eu me enforcaria lá dentro, ou que você não ia tá pegando essa entrevista porque eu ainda ia tá no crime ou dentro da cadeia. Eu vi três homens se enforcarem no sistema penitenciário porque mulher largou, porque a família abandonou e ninguém acreditou mais nele.

Como é dar aula pra presidiários, você consegue manter a disciplina nas aulas?

Os presidiários são muito disciplinados, porque lá eu dou aula num regime de ditadura. Ali eu sou o líder, o que eu falar tá falado. Se faltar três dias, tá cortado. A secretaria exige muitos requisitos. Eles têm que ter bom comportamento e tá estudando dentro da unidade. Eu ensino pra eles como eu aprendi: a filosofia do esporte é o domínio próprio. Quando eu consigo dominar minha raiva eu vou ser uma excelente pessoa na vida e um excelente lutador. Quando você começa a dominar seus medos, seus demônios, suas ansiedades, você tá preparado pra qualquer coisa. Nessa vida a gente tem medo de tudo. Às vezes você sai de casa e não sabe se vai voltar. Na televisão só se vê morte. Mas se você ficar com medo vai pegar uma depressão profunda ou uma síndrome do pânico. As artes marciais ensinam esse enfrentamento pra vida e ensinam a pessoa a cair e levantar. Porque quando você toma um golpe forte você cai, mas você sabe que tem que levantar pra continuar.

Tem muita gente que acha que esse tipo de luta incentiva a violência. O que você acha disso?

Nós estamos quebrando esses paradigmas. Há muito mais índices de contusões sérias em atletas de outras modalidades do que nas artes marciais. No futebol acontecem lesões do cara ter que ficar dois anos sem jogar bola Eu vi numa matéria recente que foram mais de 100 atletas que tiveram morte súbita. Isso porque os clubes estão sendo negligentes nos exames médicos. O atleta de futebol faz anualmente estes exames, na luta fazemos de três em três meses. Eu acho que as artes marciais, o MMA, o vale tudo, o muay tai não são esportes violentos e sim agressivos, como a fórmula 1. Na fórmula 1, o cara tá a 300 por hora e numa curva pode se espatifar e perder a vida. Mas ele tá treinado pra aquilo. O lutador prepara o corpo, a mente e o espírito nos treinamentos físicos. Ele sabe que vai entrar ali com uma pessoa que pode tá tão preparada quanto ele pra aguentar as pancadas. Vãos ser dois profissionais que sabem que vão bater, que vão apanhar, e existem regras. Não vale golpe nas genitais, dedo no olho, puxão de cabelo, alguns tipos de cotoveladas. Se o atleta bater três vezes no chão o árbitro acaba a luta, pois é um sinal de que ele não aguenta mais. Então eu não acho violência porque são duas pessoas preparadas. Violência e covardia é o cara treinar artes marciais e sair na rua pra brigar com pessoas leigas, que não sabem lutar. Mas eu acho que a maior violência acontece no meio da sociedade, que é o trabalhador chegar em casa às 10 da noite e encontrar uma troca de tiros ou as pessoas precisarem de um atendimento médico e morrerem por omissão de socorro.

Você acha que a UPP vai chegar aqui na Vila Kennedy?

Eu acho que a zona oeste vai ter os últimos bairros pacificados. Eu vejo como uma estratégia do poder público. Todos os traficantes das áreas ocupadas pelas UPPs, Cantagalo, Mangueira, Morro do São João, estão se refugiando na zona oeste, principalmente na Vila Kennedy. A Vila Kennedy é um lugar onde vende muita droga e isso desperta a atenção de outras facções. Hoje estamos vivendo numa guerra urbana, não tem mais hora pra acontecer tiro e o policiamento é precário. Agora o porquê eu não sei, é o sistema. Eu acho que enquanto tá morrendo só moradores, o poder público não vai se manifestar. Eu não desejo mal a ninguém, mas tenho certeza que quando morrer um policial aqui dentro eles vão querer colocar uma unidade pacificadora. Será que vendo a comunidade sofrer já não basta? Tá nítido, todas as emissoras falam que a Vila Kennedy precisa. Mas eu acho que eles estão pensando muito nas Olimpíadas e na Copa do Mundo. Como aqui não tem nenhum estádio grande e não vai ter nada dos Jogos Olímpicos, estamos esquecidos. Mas todos nós, cidadãos civilizados e trabalhadores, pagamos pra ter uma segurança melhor.

Você tem algum ídolo nas artes marciais ou no esporte?

O Minotouro e o Minotauro, que entraram no complexo penitenciário sem preconceito nenhum e apostaram na minha recuperação. Hoje, aquela sementinha que eles plantaram na penitenciária Muniz Sodré deu frutos em dez penitenciárias. O projeto “Lutando pela vida” já tem sete egressos, ex-presidiários que estão vivendo das artes marciais. Eu lembro como se fosse hoje a gente batendo num saco de areia e pedra, revestidos por três calças jeans. Através do crédito que eles me deram, 500 homens estão tendo a oportunidade de serem salvos.  É por isso que eu tenho eles como ídolos na luta e de humanidade. Se você vir aqueles dois caras grandes, pesos pesados, vai achar que eles são monstros. Na verdade eles são amores de pessoas e são meus amigos. Eu acho que, se não fosse aquilo, a minha história poderia ser diferente.

Você acha que essa oportunidade dada na prisão mudou sua vida?

Eu recebi a oportunidade da minha vida dentro do sistema penitenciário. Onde eu pensei que tudo tava perdido, onde era o fim, realmente foi o começo. As pancadas que eu tomo no ringue, nenhuma delas são mais fortes que as pancadas que eu tomei da vida. Eu tomei muita pancada da vida e consegui me reerguer. Então não são as pancadas no ringue que vão fazer diferença. Ali é só um esporte, acaba, eu abraço o cara, ele me abraça. Eu quero me deixar como um exemplo de superação, Quando eu cheguei a dependência química, quando eu cheguei ao fundo do poço com 17 anos de prisão, quando falaram que eu era o pior dos homens, que eu era bandido e nunca ia deixar de ser, hoje eu mostro que tudo é possível.

Você passou muitas dificuldades dentro da Vila Kennedy, mas também deve ter tido momentos felizes. Qual é o lado bom de morar numa favela?

A minha mãe sempre falou: “Fábio, nós somos favelados, mas não é por isso que nós temos que ser porcos. Temos que ter higiene, temos que ser educados. Você tem que dá ‘bom dia’ quando entrar num lugar.” Essas coisas eu aprendi com a minha mãe dentro de uma favela, coisas que você vê algumas pessoas com curso superior não fazerem. Hoje eu chego no meio de juízes e desembargadores com um sorriso que eu aprendi dentro da favela. A humildade que eu tenho dentro de mim é porque eu sou favelado, sei as necessidades que todos passam e nem por isso a gente deixa de ser feliz. O favelado é um povo alegre porque as dificuldades ensinam que riqueza não tem nada a ver com felicidade. Se riqueza fosse sinônimo de felicidade eu não via noticiário na televisão que rico se suicidou, que deu tiro na cabeça, que toma remédio de tarja preta.

Você tem vontade de sair da Vila Kennedy pra morar em outro lugar?

Eu não tenho vontade de morar em outro lugar, mas acho que a vida pode me levar a isso. Mesmo assim eu nunca vou deixar de visitar a Vila Kennedy. As bases dos meus projetos sociais vão ser aqui. Nós temos exemplos de pessoas que saíram daqui, que ganharam dinheiro e fama e visitam a Vila Kennedy até hoje: o Toni Garrido e o André Ramiro, do Tropa de Elite. O Toni Garrido deu um depoimento dizendo que tirou a mãe dele daqui só porque a guerra tá demais. Se eu sair é pela falta de segurança. Imagina que a minha filha esteja brincando na rua e acontece uma bala perdida? Eu tendo condição, é claro, eu saio. Mas tudo que eu aprendi, como saber respeitar os outros, tratar o mendigo e o empresário igualmente, eu aprendi na favela. Eu não ia aprender isso se, de repente, eu nascesse numa família rica. Tem muitas famílias ricas que são exemplos de vida, que ajudam muita gente, mas eles não conhecem o valor da vida, nunca sofreram necessidade. A minha base é a Vila Kennedy, é a favela, eu jamais vou negar as minhas origens. Eu posso tá morando na Barra ou em Nova York, se alguém me entrevistar, eu vou dizer que essa minha humildade e o meu bom humor eu aprendi dentro de uma favela.

Disponível em: < http://acervo2.vivafavela.com.br/materias/quando-luta-domou-o-le%C3%A3o >
Acesso em: 05/11/2014

Fúlvia Rosemberg – É preciso mais negros na universidade para ampliar seu espaço social  

Posted in Cidadania, Educação, Intervenção Social, Política & Políticos, Sociedade with tags , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , on setembro 19, 2014 by projetomuquecababys

By Fúlvia Rosemberg

Fulvia RosembergProfessora da PUC-SP; defende ações afirmativas, afirma que Brasil tem racismo historicamente instaurado e diz que livros didáticos deveriam ter avisos sobre “deformações da vida social e política”

Psicóloga e escritora, Fúlvia Rosemberg é uma das maiores autoridades do País nos estudos sobre ações afirmativas e educação infantil. Pesquisadora sênior da Fundação Carlos Chagas (FCC) e professora titular em Psicologia Social da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), ela também é coordenadora do Programa Internacional de Bolsas de Pós-Graduação da Fundação Ford no Brasil. É dessa última atividade que ela fala com prazer em um dos trechos desta entrevista, ao citar o exemplo de Maria das Dores Oliveira Pankararu, que se tornou a primeira indígena brasileira a concluir um doutorado.

Está no âmbito das ações afirmativas o maior foco de atuação da professora, que iniciou seu trabalho voltado para questões da infância e da literatura infanto-juvenil — é uma crítica do sexismo nas obras do gênero e não poupa o trabalho de Monteiro Lobato. “Expressões como ‘macaca’, que ele usava nos textos para se referir a Tia Nastácia, por exemplo, não seriam jamais aceitas hoje em dia.”

A professora rechaça o entendimento do termo “cotas” para a discussão das medidas tomadas para inserção de excluídos em diversos âmbitos da sociedade, como a universidade. Corrigindo o rumo dos questionamentos, introduz a expressão “ações afirmativas”, que engloba um conjunto de mecanismos, inclusive o das próprias cotas raciais — a pesquisadora considera que cotas sociais (por renda) não são suficientes em uma sociedade como a brasileira em que, argumenta, o racismo é “institucional”. Fúlvia Rosemberg concedeu entrevista ao Jornal Opção logo após participar de mesa-redonda no 2º Simpósio de Ciências Sociais promovido pela Faculdade de Ciências Sociais (FCS) da Universidade Federal de Goiás.

Déborah Gouthier — Até que ponto as cotas são essenciais para o acesso ao ensino superior?

Em alguns setores da vida social brasileira e para alguns segmentos sociais, políticas de ação afirmativa são importantes e necessárias. Essas políticas não são sinônimo de cotas, que são apenas uma das estratégias possíveis de ações afirmativas, mas infelizmente a polarização desse debate no Brasil, especialmente na segunda metade da última década, só se referiu a cotas. Como podemos enxergar quais segmentos sociais devem ter essa política para acesso e permanência no ensino superior? A primeira coisa é que há um desejo expresso por certos setores da sociedade de maior democracia nesse acesso, porque nosso processo de seleção para ingresso no ensino superior não é apenas baseado no mérito. É muito interessante olhar a história do vestibular e analisar sua mecânica. Se a seleção fosse unicamente baseada no mérito, por que as notas de corte variam tanto de curso para curso e de universidade para universidade? Quem faz variar essas notas de corte? O mercado da concorrência, da demanda e da oferta. Em seus primórdios, o vestibular foi introduzido no Brasil para acabar com o nepotismo, porque antes o acesso tinha prova oral. E não há nada que possa atrapalhar mais um processo seletivo do que prova oral, já que há apenas uma escuta de alguém. Esse processo seletivo, portanto, precisava de uma chacoalhada. E uma parte importante dessa chacoalhada veio por meio da reivindicação do movimento negro.

O acesso de negros ao ensino superior era e ainda é, de fato, muito reduzido. Nossa pirâmide educacional é uma para brancos e outra para negros, não só em termos de estatísticas gerais, mas também de estatísticas por cursos e por universidades. As melhores universidades brasileiras tinham um acesso muito reduzido de negros — nem vou falar de indígenas, então — e de pessoas egressas do ensino médio na rede pública. Toda vez que eu ia ao exterior e contava sobre a loucura que é a lógica do sistema educacional brasileiro, em termos de privilégios a certos segmentos sociais, as pessoas ficavam realmente muito impressionadas. No Brasil, setores da classe média pagam escola privada até o final do ensino secundário e dão garantia quase total a seus filhos de entrarem em instituições que, em outros países, são caríssimas, mesmo as públicas. Para a gente, o ensino superior público é praticamente gratuito. Há uma reversão da lógica democrática. Dessa forma, alterações nesse acesso eram necessárias e elas vieram de várias formas. A política de cotas é uma delas.

Houve também o ProUni [programa de bolsas do governo federal para estudantes de universidades privadas], uma estratégia que podemos considerar de ação afirmativa, apesar de alguns considerarem que é só um ajuste de imposto [incentivo fiscal], mas que abriu possibilidade para certos segmentos entrarem na universidade particular. Na universidade pública temos, majoritariamente, o sistema de cotas, que ampliou o acesso em um setor da vida social em que este era restrito e era preciso fazer uma mudança rápida. Isso é ação afirmativa: uma correção de desigualdade em setores cujo ingresso teria sido meritocrático e há poucas vagas disponíveis. É importante ressaltar que, antes da questão das cotas raciais, houve uma política para as mulheres em certos âmbitos e ninguém brigou por causa disso. Quando, por exemplo, houve a obrigatoriedade de cotas para o sexo feminino no total de candidaturas dos partidos políticos todo mundo louvou a medida. Por outro lado, quando houve a discussão das cotas para o ensino superior, houve muito estrilo por parte das elites nacionais, por ser um nicho que estas defendem com unhas e dentes. De um modo geral, eu acho que a questão das cotas nas universidades sempre foi um debate mal colocado para a sociedade.

Cezar Santos — Não há um desvio de foco na questão das cotas? Parece-me que o problema é muito mais em relação ao aluno pobre do que em relação ao aluno negro ou indígena.

Déborah Gouthier — Não seria mais necessária uma cota social do que racial?

Vocês se referem à cota econômica, por condição da família da pessoa. Os estudos que têm sido feito, por nós e outras pessoas desde os anos 1970, têm mostrado que a condição econômica não é a única explicação para a desigualdade que observamos no Brasil entre brancos e negros, entendendo-se, por favor, “negros” como “pretos e pardos”. Uma questão muito importante: negro, na minha boca, não é sinônimo de preto.

Cezar Santos — Se no registro de nascimento do pai de um aluno consta “pardo”, esse aluno, então, poderia solicitar uma inscrição ao vestibular pela cota?

Se ele quisesse, sim. O regime para disputar uma vaga por cotas, no Brasil, leva em conta a autodeclaração.

Déborah Gouthier — O que fica mais relativo ainda, não?

Sim. Tudo é relativo. Mas quem disse que tem de ser não relativo? Se neste País até o Imposto de Renda, para o qual há tanta documentação para comprovar, por que esses argumentos afloram assim, nessa questão das cotas? O que é importante, e muito importante (enfática), é colocar muito jovem negro na universidade para ampliar sua visibilidade em espaços sociais, fazendo justiça e tornando-os modelos para as crianças e adolescentes que estão vindo por aí. Ação afirmativa não é uma política para o resto da vida, mas para reverter a lógica do mercado na seleção de candidatos a determinadas posições na sociedade para as quais se tem um reduzido número de vagas, em que a relação oferta–procura é orientada por processos discriminatórios. Achar que a gente vai fazer ação afirmativa para todo o ensino fundamental, por exemplo, é um equívoco, na minha perspectiva, na conceituação de ação afirmativa. É importante, se a universidade é democrática e se o País tem um projeto político de ampliação de competências e acha que essas competências estavam submersas em um processo de seleção antidemocrático — como considero o vestibular — e que há recursos suficientemente fortes para abrir o ensino a ser menos elitista, o País está desenvolvendo esse tipo de política. Poderia se dizer também que as mulheres não precisariam de cotas para representação nos partidos políticos, mas é preciso analisar cada condição. Na questão do ensino superior, nenhuma das universidades que estabeleceu política de ação afirmativa, inclusive via cota, tirou a dimensão do mérito, todas continuam fazendo análise de mérito, mas em um segundo momento. Primeiro, equaliza-se as oportunidades e faço uma justiça de grupo; e, depois, naquele grupo, escolhem-se os melhores. Assim, vão se comparar iguais entre iguais. O que ocorria antes era que se comparavam desiguais.

Cezar Santos — É a questão do mérito individual?

É exatamente isso: a lógica da ação afirmativa é que, em uma primeira fase, haja uma seleção de grupo. Têm-se mais oportunidades porque se pertence àquele grupo, com os requisitos daquele processo seletivo. Ninguém está colocando um negro ou um indígena que não tenha terminado o ensino médio. Esse negro ou indígena já tem um enorme merecimento por ter concluído esse processo. Se ele negro responde aos requisitos legais que são dispostos — como no caso da mulher que é candidata a uma cota política —, a partir desse momento a disputa será pelo mérito. Ou seja, depois de haver a equalização de oportunidades entre os grupos.

Cezar Santos — Há pouco mais de um ano, tive a oportunidade de entrevistar professores da UEG sobre a questão das cotas. Eles foram unânimes em afirmar que os cotistas tinham as piores notas.

É preciso observar os estudos que são feitos nas universidades e não se basear em opiniões pessoais. Na última reunião da Anpocs [Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais], foram apresentadas algumas pesquisas. Na Universidade Federal da Bahia, os resultados são bem outros em relação ao que esses professores da universidade goiana disseram. São avaliações e análises que não se baseiam em achismos. Digo isso até mesmo a partir do programa de ação afirmativa que coordeno e que já concedeu 343 bolsas de mestrado e doutorado, preferencialmente para negros e indígenas nascidos no Norte, Nordeste e Centro-Oeste do Brasil — há programas que são baseados em território, como a França já fez e a Capes [Coordenação de Aperfeiçoa-mento de Pessoal de Nível Superior, órgão do Ministério da Educação que cuida da pesquisa brasileira e da expansão de mestrados e doutorados no País] já faz no Brasil, nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. É um programa internacional que, com o acompanhamento que fazemos, tem uma taxa de sucesso igual ou até melhor do que a da Capes, em relação à desistência, ao tempo médio de titulação em mestrado e doutorado etc. Temos entre os ex-bolsistas a primeira mulher indígena doutora e a segunda pessoa indígena doutora do Brasil. Não se pode imaginar a importância para as meninas e adolescentes indígenas de ver no “Jornal Nacional” a defesa de tese dessa indígena, chamada Maria das Dores Oliveira Pankararu. Aliás, uma tese de doutorado fundamental para quem faz crítica ao sistema de ação afirmativa. Ela fez a recuperação linguística de uma língua que tem 12 falantes para produzir material didático para as crianças nas escolas indígenas poderem dar continuidade a essa língua. Que patrimônio cultural fantástico é a manutenção de uma língua! (enfática)

Roberto Cunha Alves Lima — Na UFG, os estudos mostram que as notas entre cotistas e não cotistas são absolutamente iguais e em muitos cursos os cotistas têm até notas superiores.

O que é preciso observar é que há realmente um risco de pior aproveitamento se não há nenhuma estratégia de manutenção do aluno na universidade, já que os cotistas vêm de grupos socioeconômicos mais pobres, de localidades com menor provisão de transporte público de boa qualidade, de regiões com menor acesso a bibliotecas e de família com menos recursos para ampará-los. Entre as pessoas que chegam por meio de ações afirmativas, há muitas que tiveram origem de sua formação nos movimentos sociais e que são um desafio para a universidade, por conta de suas experiências de vida e do olhar que têm para as questões sociais e políticas. Portanto, quando falo de diversidade por meio de programas de ação afirmativa não é de cor de pele que eu falo, mas de uma diversidade de experiência de vida que traz novidades para a universidade. É muito fácil ser competente entre quatro paredes, sem desafios. Mas a minha competência aumenta consideravelmente se eu balanço os conhecimentos estabelecidos. Desse modo, uma das experiências fortíssimas que tivemos nesse programa que coordeno foi observar como essas pessoas que não tinham assento na pós-graduação brasileira passaram a ter esse assento e trouxeram problemas a ser resolvidos por professores e alunos. Na primeira fase do programa, escolhemos as pessoas que, pela lógica do mercado brasileiro, teriam a menor probabilidade de entrar em uma pós-graduação. Do ponto de vista do mérito, depois de equalizar o grupo, esquecemos que são negros e indígenas. A partir desse grupo, se escolhem as melhores pessoas com maior mérito acadêmico, o mesmo processo do vestibular brasileiro que ocorre por cota. No nosso caso, além da nota pelo projeto, é também ter uma proposta de pesquisa socialmente relevante, como ocorreu com a indígena Maria das Dores.

Cezar Santos — Como profissional da educação, a sra. não acha que exista uma ênfase demasiada no ensino superior? Nos Estados Unidos e em outros países, o ensino técnico é bastante valorizado e a pessoa se realiza profissionalmente com isso.

Vejo dessa forma também. Isso não ocorre só em relação a cursos técnicos. A pirâmide educacional brasileira continua muito distorcida. Apenas 18% das crianças de 0 a 3 anos têm acesso à creche. É a etapa da vida em que há menos acesso ao sistema de ensino, em termos do curso normal de aprendizado. Se fosse eu, Fúlvia, quem pudesse decidir sobre as prioridades na educação, eu daria toda a ênfase nas crianças pequenas. Há muitas distorções no sistema de ensino brasileiro. Por exemplo: tenho certeza de que, se no Brasil o ensino superior tivesse maior presença proporcional de brancos, classe média e classe alta e moradores do Sul e do Sudeste, o ensino técnico valeria menos ainda. Somos uma sociedade tão hierarquizada que iríamos hierarquizar quem tem ensino superior em relação a quem tem ensino técnico, deixando de valorizar estes. Por que há, então, esse temor às cotas? É possível explicar pelo fato de que antigamente, quando se selecionava quem havia concluído o ensino superior, isso não se dava apenas pelo que essa pessoa havia aprendido, por suas competências. Isso indicava também de que família ela vinha, quais eram suas origens, suas aprendizagens, se ela tinha feito intercâmbio ou não. O acesso não era só o conhecimento. Com essa “mistura” maior no ensino superior no Brasil, talvez isso mude um pouco. E talvez seja isso uma das razões de a escola brasileira estar tão atrapalhada, simplesmente por não saber lidar com isso.

“Monteiro Lobato não está acima do bem e do mal”

Cezar Santos — Como está a questão da presença do aluno oriundo de escola pública na universidade pública? Ele continua sendo exceção nesse espaço e tendo de ocupar vagas nas instituições particulares?

O que se observa em várias regiões do País é que houve a abertura a galope de instituições de ensino superior privadas de baixa qualidade e para as quais vão pessoas com menos recursos. No programa de pós-graduação que coordeno, queríamos dar muitas bolsas de estudo para advogados negros e indígenas, mas isso era muito complicado, porque sua formação básica geralmente tinha sido muito ruim nessas universidades particulares de beira de estrada.

Cezar Santos — É então um problema racial e não social?

Há um grupo de pesquisadores e ativistas que considera que não há problema racial no Brasil e que tudo se resolve com a questão da diminuição das desigualdades econômicas. Há outro grupo de pesquisadores, estudiosos, militantes e políticos que considera que, em decorrência do passado escravista e das políticas iniciais de inclusão dos negros na ordem republicana, a condição socioeconômica não explica tudo e que há um racismo estrutural no Brasil que não precisa necessariamente se manifestar no preconceito racial. Ou seja, a sociedade brasileira é organizada, em sua dinâmica, para sustentar e produzir racismo. Não digo que não haja uma dimensão econômica, mas vamos pegar um fato do âmbito da educação: quando ocorreu a proclamação da República, houve uma interdição ao voto do analfabeto. Quando o analfabeto pôde votar no Brasil? Só na década de 1980, antes da nova Constituição de 88. Até a República, quem era analfabeto? A massa negra quase que por completo, porque havia uma proibição de alfabetização de escravos, que, no fundo, era a impossibilidade de alfabetizar negros. Portanto, a lei que proibiu o voto do analfabeto só não era racista na aparência.

Foram 90 anos de interdição de uma massa da população a ter acesso a se expressar politicamente. Nessa massa, de analfabetos, vamos ter fundamentalmente negros. Toda vez que analiso dados, encontro, sempre, um diferencial entre brancos e negros que vai além da questão de diferença de renda. Como outros pesquisadores, atribuo esse diferencial, entre pessoas com a mesma renda familiar, da mesma região, com a mesma idade, às diferenças de raça. Quando falamos de racismo, isso não é relativo exclusivamente ao preconceito racial, mas de um racismo institucional; e não de um racismo só de hoje, mas também de um racismo que se instaurou historicamente e que está sendo sustentado, porque há poucas políticas, de fato, para combater o racismo.

Cezar Santos — Como explicar o fato de que um negro, Machado de Assis, seja considerado o maior escritor brasileiro de todos os tempos e o fundador da Academia Brasileira de Letras?

Existe a teoria dos alpinistas sociais, aqueles que conseguem furar barreiras, aqueles que rompem obstáculos, pessoas brilhantes, são gênios. Mas isso não significa que não haja racismo no Brasil.

Cezar Santos — Mas, então, não cairíamos na questão do mérito pessoal?

De forma alguma. Pergunto a você: quantos Pelés brancos existem no Brasil? As crianças jogavam futebol onde queriam no Brasil e pôde aparecer um Pelé. O que queremos, com a questão das ações afirmativas, é que haja Pelés no plano intelectual, acadêmico e político. Outro exemplo, em relação à questão que você mesmo citou: hoje temos uma presidenta da República no poder. A condição de vida das mulheres se resolveu neste País por causa disso? Pense se uma mulher tem condições de sair sozinha à meia-noite em um bairro de classe média, como é o meu em São Paulo. Eu não saio. É a mesma lógica em relação a Machado de Assis, há algumas circunstâncias muito especiais que favorecem um fato. Outro caso a citar é o do ex-presidente Lula, que tem um passado de família pobre, retirante nordestino, operário. Por causa dele podemos dizer que não há miséria no País e que todos os pobres conseguiriam ser presidente da República? Não. Então, por que para a questão do negro sempre há esse exemplo e para outras categorias sociais isso não acontece?

Déborah Gouthier — A sra. aconselharia as crianças a ler Monteiro Lobato?

Não é uma questão de aconselhar ou não. A questão é: a escola brasileira pública, que usa recursos do Programa Nacional do Livro Didático, pode comprar e distribuir qualquer coisa? Para meus filhos eu dou o que eu quero e não quero ninguém dizendo o que quero dar ou não. Reorientando a pergunta de acordo com o debate que aconteceu, eu diria: o governo brasileiro, que compra e distribui livros gratuitamente com nosso dinheiro, pode comprar e distribuir nas escolas qualquer tipo de literatura sem nenhum controle social? No caso do livro de Monteiro Lobato [“Caçadas de Pedrinho”, que causou polêmica recentemente por considerarem que continha termos racistas], o que houve foi o controle social de um pai negro, cuja questão foi posta ao Conselho Nacional de Educação, que, por sua vez, deu uma resposta interessantíssima e que já estava sendo dada em outras áreas, como a do meio ambiente: continue-se a distribuir o livro, mas com um comentário, que eu já havia sugerido, de forma muito mais radical, quando fazia pesquisas sobre livros didáticos e questões racistas e sexistas — que aquelas expressões de Monteiro Lobato tinham sido escritas em outro tempo histórico e que hoje elas podem ser consideradas racistas.

Cezar Santos — Um comentário que contextualiza o livro.

Exatamente. E um comentário que ajuda a discutir a obra, mas sobre o qual a mídia caiu em cima, como se houvesse uma censura à obra.

Cezar Santos — Mas, então, a sra. daria um livro de Lobato a seus filhos?

Sim, eu dei a eles o que eles quiseram ler. Não tive nenhum problema com relação a isso. Fiz análise de Monteiro Lobato, meu começo de trabalho de pesquisa foi sobre literatura infanto-juvenil e livros didáticos. Se olharmos bem as expressões dos livros dele — falo das obras, não dele —, vemos que ele chama, por exemplo, Tia Nastácia de “macaca”. Quer dizer, é uma figura característica da época dele, mas que hoje não se aceita mais. Quando comecei a fazer pesquisa sobre isso, verifiquei o sexismo nos livros brasileiros, algo que vai de mãos dadas com o racismo. Basta olhar para trás como se aprendia na escola. Se eu fosse do governo brasileiro, poria, na contracapa do livro didático — como se coloca hoje nas carteiras de cigarro, junto àquelas fotos chocantes, a expressão “Este produto faz mal à saúde” — algo como “Atenção professores, famílias e leitores: este material pode conter informações ou deformações da vida social e política”. Fiz essa sugestão há 20, 30 anos, porque é um fato! (enfática) Naquela época, vocês não imaginam como pintavam a sexualidade, por exemplo, nos livros das editoras católicas. Em um livro desses, uma moça adolescente saiu com um rapaz, transou, ficou grávida e o rapaz não a quis. O que ela fez? Suicidou-se. Eu chamei isso de “pedagogia do terror”. Então, não é porque é o Monteiro Lobato ou é isso ou aquilo que se está acima do bem e do mal. A literatura didática, transmitida na escola, é um pouco defasada em relação aos tempos sociais das crianças. Mas Lobato é imexível para determinadas pessoas no Brasil, como possivelmente Machado de Assis.

Cezar Santos — O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) não é uma formulação avançada demais para a realidade brasileira? O que fica como questionamento é que parece que o País não tem estrutura para atendê-lo.

Não sou defensora irrestrita do ECA nem da Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança, mas não pelas razões que são colocadas habitualmente. Há uma defasagem entre a lei e a realidade. Em relação ao que a Cons-tituição de 88 nos prometeu, ainda é necessário implementar algumas coisas. Por exemplo, a igualdade de condições entre homens e mulheres. Temos 120 de história republicana e 70 anos de Ministério da Educação e só houve uma mulher no cargo, que foi Ester Figueiredo, no governo de João Figueiredo [1979-1985]. Por que há essa defasagem? Um dos motivos é que as negociações para encaminhamento das leis omitem contradições e dissensões. Se pesquisarmos os debates da Assembleia Nacional Cons-tituinte, poderemos, com uma lupa dos anos 2000, que as dissensões estavam lá. Mas como queríamos uma palavra de ordem mais unitária, não prestamos atenção nessas dissensões. Pude revisitar os debates da Constituinte em relação às questões da infância. No que diz respeito ao artigo 227 — que vai originar o ECA —, encontro duas posições: uma absolutamente assistencialista e outra de vanguarda, que será vitoriosa na Convenção sobre os Direitos da Criança, segundo a qual a criança é um sujeito de direitos também. Nenhum partido político brasileiro tem, em sua agenda, uma questão específica sobre a infância. Então, como é que o ECA foi aprovado? Ou seja, há uma defasagem muito grande também porque, em relação à legislação, as pessoas atuam mais no plano discursivo do que no plano de prática social. É mais fácil chegar a um acordo negociado na discussão do que na implementação das políticas, quando será preciso, de fato, dos recursos. Ressalto que não estou jogando a Constituição fora; pelo contrário, foi ela que abriu e garantiu as liberdades democráticas neste País. Vivi bem o regime de exceção e digo: ditadura, nunca mais.

Cezar Santos — Mas há exageros evidentes na Constituição, que causam ilusão na cabeça das pessoas. Por exemplo, o direito à moradia está garantido por lei.

A Constituição, o ECA, a Convenção, tudo isso dão um norte e permitem que se lute por aquilo. É uma pena, realmente, que seu conteúdo ainda não tenha sido implementado na prática. Toda a legislação— seja nacional ou internacional, constitucional ou infraconstitucional — ocorre em um contexto político, no qual se têm vários embates. Então, o ECA não é só uma legislação infraconstitucional para crianças e adolescentes; é algo que tem uma parte de diálogo com a dimensão internacional do País. A Constituição e o ECA estão muito colados na Convenção. E quem deu o norte para a Convenção? A guerra fria, o embate entre o Ocidente e o Leste europeu, os primeiros sustentando os direitos civis e os últimos, os direitos sociais. Durante o debate do ECA, havia atores que se digladiavam para conseguir determinadas posições políticas: havia os antigos juízes de menores, interesses latino-americanos muito influentes etc. O que houve no fim da década de 1980 foi tentar articular duas linhas de justiça de complexidade e, talvez, de impossibilidade de ajustamento, que foram a dimensão de proteção e a dimensão de liberdade. Passaram, no plano legal — no ECA, na Convenção e na Constituição —, duas perspectivas que vêm de histórias diferentes e que têm implicações diferentes: os “direitos de” e os “direitos a” — “de” proteção e “à” liberdade. Ora, ao colocar os direitos à liberdade da criança e do adolescente em uma sociedade adultocêntrica e tão desigual quanto a brasileira, a perspectiva de transformação dos direitos em práticas é muito complicada. Como eu, criança, posso exercer o direito à participação social se eu não tenho acesso, em meu bairro, a nenhum equipamento cultural?

Cezar Santos — Como estudiosa da área, o que a sra. apontaria como mais problemático na educação brasileira?

O mais problemático na educação brasileira é seu caráter não democrático, que se manifesta em dois planos: o do acesso e permanência e o da qualidade. Há segmentos sociais que são discriminados — seja por região, local de moradia, por idade, raça, etnia, etc. As desigualdades sociais são observadas na educação e esses segmentos sociais têm menos acesso e menor possibilidade de permanecer e ter sucesso e usufruem de uma educação de pior qualidade. Dessa forma, não vejo possibilidade de melhoria da qualidade da educação sem ampliação dos recursos orçamentários, sem valorização do magistério de forma muito intensa e sem uma valorização mais geral da educação por outros setores que não só os educacionais. Para o sistema educacional melhorar, é necessário que a educação da população, no geral, também esteja melhor. Se a educação da população no geral não melhora, o debate sobre a educação será sempre muito rasteiro e as exigências e metas políticas de melhoria serão também muito rasteiras. Para isso, é preciso também ampliar o orçamento.

Fonte: Jornal Opção
13/9/2014Geledés Instituto da Mulher Negra
Leia a matéria completa em: Geledés manifesta pesar pela morte de Fúlvia Rosemberg – Portal Geledés
Follow us: @geledes on Twitter | geledes on Facebook

“Machuca” e a questão da igualdade na diferença

Posted in Cidadania, Cinema, Educação, Política & Políticos, Sociedade, Violência Urbana with tags , , , , , , , , , , , , , on abril 10, 2014 by projetomuquecababys

 

wellen-hericka   Hérica Wellen*

“Desde quando um branco é amigo de um índio?” Pergunta Silvana no seu característico tom desafiador. “Claro que pode ser. É possível.” Responde Gonzalo. A conversa entre Silvana e Gonzalo sobre a amizade do cavaleiro solitário Zorro e seu companheiro Tonto pode ser vista como uma tentativa de compreender como é possível a amizade deles próprios: Silvana, Gonzalo Infante e Pedro Machuca.

A liberdade da infância, que faz com que qualquer outra coisa seja secundária.

A liberdade da infância, que faz com que qualquer outra coisa seja secundária.

Gonzalo Infante (Matías Quer) e Pedro Machuca (Ariel Mateluna) tornam-se amigos pelas razões que fazem surgir as amizades verdadeiras: interesses comuns, personalidades parecidas e a liberdade da infância, que faz com que qualquer outra coisa seja secundária. O que surpreende nessa amizade é o fato de que essas crianças vivem em mundos completamente diferentes: Gonzalo é de uma família de classe média e vive confortavelmente num bairro nobre de Santiago, no Chile; Pedro, por sua vez, é de uma família extremamente pobre e vive numa casa de um cômodo, construída com pedaços de madeira e papelão.

Essa improvável amizade nasce no Saint Patrick, um colégio católico inglês, frequentado, tradicionalmente, pela elite chilena. Machuca passa a frequentar o colégio quando o reitor – Padre McEnroe (Ernesto Malbran), apoiado por parte dos pais de alunos daquela escola, oferece bolsas de estudo a crianças pobres, buscando uma aproximação entre as crianças que frequentam aquele colégio e aquelas que vivem na periferia do bairro.

Essa iniciativa não se dá arbitrariamente. Padre McEnroe e os pais que o apoiam, entre eles Patricio Infante (Francisco Reyes), pai de Gonzalo, estão vivendo um momento peculiar na história do Chile – o governo de Salvador Allende, que, ao ser eleito

Salvador Allende, que, ao ser eleito democraticamente para a presidência do Chile em 1970, buscou “um caminho chileno para o socialismo” e tomou medidas radicais para superar a desigualdade social naquele país.

Salvador Allende, que, ao ser eleito democraticamente para a presidência do Chile em 1970, buscou “um caminho chileno para o socialismo” e tomou medidas radicais para superar a desigualdade social naquele país.

democraticamente para a presidência do Chile em 1970, buscou “um caminho chileno para o socialismo” e tomou medidas radicais para superar a desigualdade social naquele país.

O filme “Machuca” (2004), conta, pois, a história dessa amizade nascida no ano de 1973; ano em que o governo socialista de Allende sofre ininterruptas sabotagens por parte de empresários chilenos, patrocinados pelo governo estadunidense, numa tentativa de desestabilização de seu governo; tentativa esta denunciada, em vão, por Allende na ONU. Diante da falta de alimentos no país, do aumento do “mercado negro” e do desemprego, a elite chilena passa a sair às ruas pedindo a saída de Allende; essas manifestações entram muitas vezes em confrontos com a população que defende o presidente, deixando o país à beira de uma guerra civil.

A despeito dos protestos e sabotagens da direita, em 1973, Allende é reeleito com 43% dos votos dos chilenos; resta, assim, a seus poderosos opositores, aplicar uma prática que se tornou comum na América Latina naquele período – instalar uma ditadura militar. Dessa forma, o governo socialista de Allende é derrubado pela ditadura sangrenta de Augusto Pinochet, que, durante dezessete anos, matou pelo menos três mil pessoas.

Dirigido por Andrés Wood, “Machuca” se passa nessa conturbada transição. Sem se descuidar de mostrar a violência desse momento, o diretor desenvolve a história com delicadeza e conta com atuações fortes e inesquecíveis, que, muitas vezes, dispensam as palavras.

Como esquecer o olhar de estranhamento de Gonzalo e Pedro, quando se deparam com as realidades tão distintas por eles vivenciadas? Como esquecer a cumplicidade desse mesmo olhar quando se reconhecem como companheiros ou a dor quando sabem que estão se olhando pela última vez? Como esquecer o olhar de desafio de Silvana (Manuella Martelli) frente a uma manifestação de direita? Ou o olhar de esperança de Juana (Tamara Acosta), mãe de Pedro, quando conhece Gonzalo e percebe, na nova amizade de seu filho, um prenúncio de um novo tempo?

Silvana é amiga de Machuca, mora na mesma área, e convive com uma realidade ainda mais difícil. Ela não frequenta nenhuma escola, pois precisa “cuidar de casa”, haja vista o abandono de sua mãe, e ainda ajudar o pai a ganhar algum dinheiro com a venda de bandeirolas nas manifestações, tanto nas manifestações de esquerda, que ela participa ativamente e feliz, quanto nas de direita, que participa a contragosto, pois garante algum dinheiro.

A amizade do trio se fortalece nas vendas de bandeirolas nas manifestações e nos beijos banhados a leite condensado que Silvana troca com os dois meninos à beira do rio. Se, para Pedro, esses beijos são expressões de sua nascente curiosidade sexual; para Gonzalo, eles têm o sabor de uma primeira paixão, que começa a ser correspondida pela altiva Silvana.

Essa paixão sofre um grande golpe, quando, numa das manifestações de direita, por culpa de Pablo (Tiago Correa), o namorado fascista da irmã de Gonzalo, Silvana tem uma séria desavença com Maria Luísa (Aline Küppenheim), mãe de Gonzalo. Essa é a primeira grande barreira que os três amigos enfrentam: a descoberta de que os mundos em que vivem são muito diferentes e se antagonizam; esse embate está arraigado nos que lutam pela manutenção desses mundos e naqueles que visam à sua superação e não há como suprimir esse confronto, porque aquele mundo, para se manter, precisa da dominação desse.

No entanto, esse ódio que predomina entre as classes, mesmo sendo insuperável, não elimina o amor que há entre as pessoas, mesmo que estejam em classes antagônicas. A relação fraterna entre os dois amigos aparece como um importante ingrediente humanista, sentimento que brota mesmo no solo infértil da propriedade privada. Gonzalo ama seus amigos; admira profundamente a coragem e a altivez de Pedro e Silvana. Nessa relação com seus amigos, ele experimenta sentimentos reais que deixou de reconhecer na sua própria família, que vive um momento de mentira e traição.

"Panelaços", uma forma de protesto usada pelos chilenos durante a ditadura militar do país (1973-1990

“Panelaços”, uma forma de protesto usada pelos chilenos durante a ditadura militar do país (1973-1990

Gonzalo testemunha o caso extraconjugal de sua mãe com Roberto (Federico Luppi), um rico empresário que divide sua vida entre Buenos Aires e Santiago e que, nos encontros com Maria Luísa, traz inúmeros produtos e presentes, não só para a amante, como também para o menino, a quem a mãe leva aos encontros. Gonzalo ama sua mãe, e é amado por ela, mas não deixa de sentir asco pela situação a que sua mãe o submete. O menino oscila, então, entre a dura realidade econômica da família de Machuca, e a veleidade de sua mãe.

No entanto, a maior barreira que se interpõe entre os amigos, não é feita de sentimentos, mas é a própria força policial que se instala na ditadura de Pinochet. A intervenção violenta na comunidade onde vivem Pedro e Silvana; e, ainda, a intervenção no colégio Saint Patrick, que se dá, principalmente, com a expulsão dos meninos pobres, daqueles que são filhos de pais comunistas, e com a destituição do Padre McEnroe, que protagoniza uma das mais comoventes cenas do filme, acabam por separar o que sentimentos autênticos haviam unido.

Há um momento do filme em que o pai de Pedro, Ismael (Luís Dubó), ao ser apresentado a Gonzalo por seu filho, cruelmente sentencia: “Sabe onde vai estar o seu amigo daqui a 5 anos? Começando a universidade. E você vai estar limpando banheiros. Em 10 anos ele vai estar trabalhando na empresa do pai. E você continuará limpando banheiros. E, em 15 anos, ele vai ser dono da

A família de Machuca e a dura realidade da classe operária no Chile da ditadura

A família de Machuca e a dura realidade da classe operária no Chile da ditadura

empresa do pai. E você? Adivinhe. Vai continuar limpando banheiros. E ele nem se lembrará de seu nome.”

Numa realidade injusta e desigual como a que se instaurou violentamente no Chile de 1973, é provável que a profecia de Ismael se realize parcialmente e que Gonzalo e Pedro sigam trajetórias extremamente distintas na vida; mas é também provável, e isso fica claro nas últimas cenas de Gonzalo no filme, que ele não esteja totalmente certo e que aquela amizade tenha gerados frutos que nem a força, nem o medo sejam capazes de destruir.

Ficha técnica

Nome: Machuca Nome Original: Machuca Origem: Chile e Espanha Ano de produção: 2004 Duração: 120 min Direção: Andrés Wood

 HÉRICKA WELLEN é Doutora em Educação pela USP.

Disponível em: http://espacoacademico.wordpress.com/2014/04/09/machuca-e-a-questao-da-igualdade-na-diferenca/ Acesso em: 10/04/2014

2013 in review

Posted in Cidadania, Cinema, Educação, Educação Especial, Fome, Intervenção Social, Política & Políticos, Sociedade, Uncategorized, Violência Urbana with tags , , , , , on dezembro 31, 2013 by projetomuquecababys

Principais Visualizações por País por todos dias terminando em 2015-09-22

País Visualizações
Sinal BrasilBrasil 33.410
Sinal Estados UnidosEstados Unidos 2.697
Sinal PortugalPortugal 603
Sinal AngolaAngola 464
Sinal MoçambiqueMoçambique 428
Sinal União EuropeiaUnião Europeia 182
Sinal FrançaFrança 48
Sinal JapãoJapão 45
Sinal Cabo VerdeCabo Verde 42
Sinal Reino UnidoReino Unido 36
Sinal AlemanhaAlemanha 33
Sinal ArgentinaArgentina 32
Sinal ColômbiaColômbia 30
Sinal IndonésiaIndonésia 25
Sinal MéxicoMéxico 24
Sinal EspanhaEspanha 23
Sinal VenezuelaVenezuela 19
Sinal CanadáCanadá 16
Sinal ParaguaiParaguai 15
Sinal SuíçaSuíça 15
Sinal ItáliaItália 11
Sinal IslândiaIslândia 9
Sinal Hong Kong, RAE da ChinaHong Kong, RAE da China 8
Sinal QuêniaQuênia 8
Sinal RússiaRússia 8
Sinal PaquistãoPaquistão 7
Sinal ÍndiaÍndia 7
Sinal NoruegaNoruega 7
Sinal Arábia SauditaArábia Saudita 7
Sinal IsraelIsrael 6
Sinal NigériaNigéria 6
Sinal UruguaiUruguai 6
Sinal TailândiaTailândia 5
Sinal PolôniaPolônia 5
Sinal ChileChile 5
Sinal SuéciaSuécia 5
Sinal Porto RicoPorto Rico 5
Sinal TaiwanTaiwan 5
Sinal Guiné BissauGuiné Bissau 5
Sinal AustráliaAustrália 5
Sinal PeruPeru 4
Sinal IraqueIraque 4
Sinal HolandaHolanda 3
Sinal HungriaHungria 3
Sinal Emirados Árabes UnidosEmirados Árabes Unidos 3
Sinal República DominicanaRepública Dominicana 3
Sinal RomêniaRomênia 3
Sinal NamíbiaNamíbia 3
Sinal ÁustriaÁustria 2
Sinal MoldáviaMoldávia 2
Sinal FilipinasFilipinas 2
Sinal MalásiaMalásia 2
Sinal LuxemburgoLuxemburgo 2
Sinal EquadorEquador 2
Sinal MacedôniaMacedônia 2
Sinal DinamarcaDinamarca 2
Sinal BolíviaBolívia 2
Sinal África do SulÁfrica do Sul 2
Sinal Macau, RAE da ChinaMacau, RAE da China 2
Sinal ZimbábueZimbábue 2
Sinal IrlandaIrlanda 2
Sinal Costa RicaCosta Rica 2
Sinal São Tomé e PríncipeSão Tomé e Príncipe 1
Sinal TurquiaTurquia 1
Sinal Territórios palestinosTerritórios palestinos 1
Sinal VietnãVietnã 1
Sinal AlbâniaAlbânia 1
Sinal NígerNíger 1
Sinal EstôniaEstônia 1
Sinal HaitiHaiti 1
Sinal SenegalSenegal 1
Sinal UcrâniaUcrânia 1
Sinal MarrocosMarrocos 1
Sinal FinlândiaFinlândia 1
Sinal SérviaSérvia 1
Sinal República TchecaRepública Tcheca 1
Sinal GréciaGrécia 1
Sinal Timor-LesteTimor-Leste 1
Sinal PanamáPanamá 1
Sinal Costa do MarfimCosta do Marfim 1
Sinal Burquina FasoBurquina Faso 1
Sinal GabãoGabão 1
Sinal Coreia do SulCoreia do Sul 1
Sinal AfeganistãoAfeganistão

Quem é negro, quem é branco: desempenho escolar e classificação racial de alunos

Posted in Cidadania, Educação, Política & Políticos, Sociedade with tags , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , on outubro 30, 2013 by projetomuquecababys

By Marília Carvalho

Este texto apresenta alguns resultados de uma pesquisa sobre o fracasso escolar de meninos nas quatro primeiras séries do Ensino Fundamental. Partindo da constatação de que os índices de evasão e repetência, em âmbito nacional, têm sido mais altos para as crianças do sexo masculino, em especial os meninos negros, a investigação procura compreender os processos cotidianos que os têm conduzido a um pior desempenho escolar. Com esses objetivos, foi desenvolvido um estudo com o conjunto das crianças e professoras de 1ª a 4ª séries de uma escola pública no Município de São Paulo, entre 2002 e 2003. Foram feitas entrevistas semiestruturadas com as oito professoras de classe e com a coordenadora pedagógica; um questionário de caracterização socioeconômica, preenchido pelas famílias dos alunos e alunas; e um breve questionário de autoclassificação racial, respondido pelas crianças em sala de aula.

Aqui discutimos especificamente as diferenças entre a classificação racial dos alunos feita pelas professoras (heteroatribuição) ou por eles mesmos (autoatribuição), procurando evidenciar em que medida a classificação feita pelas professoras está relacionada ao desempenho escolar das crianças.

O conceito de “raça” adotado é o de “raça social”, conforme explicitado por Antônio Sérgio Alfredo Guimarães, isto é, não se trata de um dado biológico, mas de “construtos sociais, formas de identidade baseadas numa ideia biológica errônea, mas eficaz socialmente, para construir, manter e reproduzir diferenças e privilégios” (1999, p. 153). Para esse autor, se a existência de raças humanas não encontra qualquer comprovação no bojo das ciências biológicas, elas são, contudo “plenamente existentes no mundo social, produtos de formas de classificar e de identificar que orientam as ações dos seres humanos” (idem). Ou, nas palavras de Tereza Cristina Araújo (1987), a raça pode ser concebida como “um fato social, referido aos significados atribuídos pelas pessoas a atributos físicos e que servem para demarcar indivíduos e grupos, como uma percepção social que categoriza” (p. 15).

No contexto brasileiro – e em diversos países da América Latina – a classificação racial apoia-se tanto na aparência (características fenotípicas, como a cor da pele ou o tipo de cabelo) e na ascendência, quanto no status socioeconômico da pessoa. Fúlvia Rosemberg (1998) destaca que, diferentemente da classificação norte americana, baseada exclusivamente em regras de descendência e que gera um sistema rígido e dicotômico, a classificação racial no Brasil é fluida e variável, com a “possibilidade de passagem da ‘linha de cor’ em decorrência da combinação fenotípica e do status social do indivíduo” (p. 74).

Assim, a cor seria apenas um dos elementos de que se lança mão na construção social das relações raciais. Para Araújo, a cor, no Brasil é “uma metáfora, a categoria mais frequentemente acionada para demarcar diferenças e desigualdades com base na raça” (1987, p. 15). Dessa forma, utilizamos neste estudo uma classificação por cor, baseada nas categorias usadas pelo IBGE, e também seu agrupamento em termos mais propriamente raciais: um grupo de “negros”, composto por aqueles classificados como pretos ou como pardos e um de “brancos”.

Frente à complexidade do processo de classificação assim constituído, é preciso atentar, como nos indica Araújo, para a situação social específica em que ele se desenrola e que lhe confere significado: a percepção social da cor e a escolha e/ou atribuição de categorias de cor é uma operação complexa que envolve não apenas uma apreensão de características fenotípicas, aqui imbuídas de valor e carregadas de significado, mas em que as categorias compõem um sistema e esta operação se processa num contexto de interação social. (1987, p.15).

Ideias semelhantes estão presentes num estudo de Edward Telles e Nelson Lim (1998), baseado num survey de âmbito nacional do Instituto Data Folha, de 1995, que incluía tanto a autoclassificação por cor quanto a classificação pelo entrevistador, cuja análise foi retomada e ampliada posteriormente por Telles (2003). Estes autores enfatizam o quanto critérios “não físicos” afetam as características raciais dos brasileiros, que devem ser tomadas não como fatos objetivos e inquestionáveis, mas como um sistema cambiante, sujeito à percepção social, na qual o status socioeconômico tem um peso considerável. Eles nos mostram que, na determinação das diferenças de classificação entre entrevistadores e entrevistados da pesquisa Data Folha  que analisaram, ao lado da renda do entrevistado também tinham influência significativa sua escolaridade, a moradia em cada uma das regiões fisiográficas do país e em zona urbana ou rural (p. 470). Mas sem dúvida é pertinente o comentário feito por Edith Piza e Fulvia Rosemberg (2002, p. 104), a partir do mesmo survey do Instituto Data Folha, quando lembram que também devem ser consideradas características dos entrevistadores, em especial sua cor ou raça, já que se trata de uma relação. Essas autoras lamentam que não haja dados disponíveis a respeito, embora se afirme que esses entrevistadores eram em sua maioria brancos e de média ou alta escolaridade. Enfim, Telles (2003) chama nossa atenção para o fato de que, apesar da discriminação e desigualdade raciais dependerem da classificação racial feita por terceiros, isso raramente é considerado nas análises sociológicas, sendo a raça normalmente tomada como fixa ou essencial: “Embora a sociologia moderna amplamente aceite a ideia de que o conceito de raça é construído socialmente e é portador de ambiguidades, raramente essa ideia é incorporada na análise sociológica.”  (p. 113).

No campo educacional, um exemplo de pesquisa em que essa complexidade do processo de atribuição racial foi considerada em toda sua ampla gama de consequências é a dissertação de mestrado de Eliana de Oliveira (1994). Interessada nas relações raciais no âmbito das creches diretas do município de São Paulo, a autora colocou-se como um primeiro objetivo descrever a composição racial do conjunto de crianças ali atendidas, e para tanto lançou mão de fotos de uma amostra de crianças de diferentes equipamentos, que foram classificadas, cada uma, por duas funcionárias do sistema municipal de creches. Na análise dos resultados, Oliveira atentou para as características tanto das crianças classificadas (sexo e idade) quanto das classificadoras, em especial seu sexo, sua autoatribuição de cor e sua função nas creches. A principal conclusão, no que tange a esse aspecto, foi de que “observa-se uma tendência de as pessoas que se autoclassificam como brancas apresentarem as maiores proporções na atribuição da cor branca às crianças fotografadas”, em comparação às proporções apresentadas por pessoas autoclassificadas como pretas ou como pardas (p. 25).

As reflexões desse conjunto de autores, desenvolvidas para pensar a escala macro das estatísticas colhidas através de pesquisas quantitativas ou amostragens, parecem ser também úteis em escala cotidiana, qualitativa. Esse enfoque permite uma ênfase especial na produção de significados associados a características fenotípicas e a atribuições raciais, assim como nas inter-relações através das quais emergem as classificações de cor e de raça. Diferentemente da perspectiva da maioria desses estudos, porém, não se trata aqui de encontrar “a verdadeira cor” de uma criança, nem de minimizar as discrepâncias entre diferentes classificações, mas, ao contrário, o interesse maior é localizar e qualificar essas diferenças e tentar apreender os significados escolares e de gênero que se articulam à categorização racial, sem perder de vista, ao mesmo tempo, as determinações socioeconômicas.

Quem são as crianças com problemas escolares?

A pesquisa aqui descrita teve como foco as oito classes de 1ª a 4ª séries da escola investigada, num total de 243 crianças. Desde 1999, a escola adotara o sistema de avaliação por conceitos com dois ciclos no ensino fundamental (de 1ª a 4ª e de 5ª a 8ª séries), ao final dos quais poderia haver retenção. Existia um sistema de recuperação paralela ao longo do ano, chamado de “oficinas de reforço”, que, nas primeiras séries, era oferecido pelas professoras de classe aos alunos que elas próprias indicavam.

Os alunos e alunas dessas classes estão caracterizados nos Quadros de 1 a 4, em relação aos tipos de problema escolar que apresentavam. A primeira linha de cada quadro traz os dados gerais para as oito classes, considerando o total de 203 crianças que resultou da exclusão daqueles que se autoclassificaram ou foram categorizados pelas professoras como amarelos ou indígenas1. Os conjuntos seguintes foram construídos a partir das indicações das professoras nas entrevistas, quando lhes pedimos que classificassem cada criança de acordo com as categorias de cor utilizadas pelo IBGE (branco, preto, pardo, amarelo ou indígena) e perguntamos: quem eram os alunos ou alunas indicados para o reforço; quem causava problemas de disciplina; e finalmente quem elas elogiariam como bons alunos (as). As crianças que não foram mencionadas compõem o grupo de “não citados”. Deve lembrar que há sobreposições entre os grupos, já que tinham problemas de disciplina tanto algumas crianças indicadas para o reforço como outras elogiadas por seu desempenho.

A renda mensal familiar foi obtida através de questionário respondido pelas famílias e é apresentada com referência ao valor do salário mínimo. Enquanto o sexo das crianças não foi difícil de determinar, sua cor ou raça é considerada aqui, conforme já vimos, como uma “variável dependente”, isto é, como uma classificação ambígua, não fixa e que buscamos estudar exatamente em suas relações com as demais “variáveis”. Procuramos perceber se a classificação de cor ou raça das crianças feita pelas professoras (heteroatribuição) variava conforme seu sexo, sua renda familiar, seu desempenho e comportamento escolares, comparando-a com a classificação feita pelas próprias crianças (autoatribuição), por meio de um breve questionário respondido em classe. E não consideramos qualquer delas como a classificação verdadeira ou mais adequada2.

Lembremos que todos os números aqui são pequenos do ponto de vista estatístico, não se tratando de um estudo quantitativo, mas da análise comparativa de dados, daí a utilidade das porcentagens. Essas proporções devem ser tomadas apenas como indicadores de tendências e é preciso olhar com cautela as pequenas variações.

Um primeiro olhar a esses quadros revela que, dos 203 alunos em questão, 67 estiveram no reforço e 43 tinham problemas de disciplina, num total de 91 crianças com algum tipo de problema escolar. Ao mesmo tempo, 60 crianças foram elogiadas por seu desempenho e 65 não foram mencionadas, seja para elogios seja para queixas.

De forma resumida, podemos afirmar que a renda faz diferença para o desempenho escolar dos alunos dessa escola (Quadro 1), particularmente para aquelas provenientes de famílias com rendimento mensal até cinco salários mínimos: mais da metade (53%) das crianças nesta faixa de renda estavam no reforço, enquanto o mesmo acontecia com apenas 15% daquelas pertencentes a famílias com renda mensal acima de 20 salários mínimos. Quanto à disciplina, porém, a renda não era decisiva e em quase todas as faixas de renda as crianças estavam representadas no grupo com problemas disciplinares em proporções próximas à sua presença na escola3.

Quando consideramos o sexo dos alunos e alunas (Quadro 2), percebemos que é um fator decisivo para ambos os tipos de problema e de forma mais marcante do que a renda tomada isoladamente: enquanto os meninos eram 49% na escola, eles eram 65% no reforço e 71% no grupo com problemas de disciplina. As meninas eram mais elogiadas e menos visíveis que os meninos, compondo 65% do grupo de “não citados”.

Também a raça atribuída pelas professoras correspondia a diferenças significativas na composição do grupo de reforço (Quadro 3): enquanto percebiam 28% de todas as crianças da escola como negras (pretas ou pardas), no reforço essa proporção era de 38%. É também significativamente maior a proporção de alunos percebidos como brancos entre os elogiados (oito pontos percentuais a mais que no conjunto da escola), resultando no fato de que 32% dos classificados como brancos e apenas 21% dos negros tenham recebido elogios. Contudo, no que se refere à disciplina, a percepção era de proporções de negros muito semelhantes no total da escola se entre os alunos com problemas (28 e 29% respectivamente); ou, visto de outra forma, de acordo com a classificação das professoras, exatamente 20% do total de alunos brancos e 20% dos negros eram indisciplinados.

Comparando os Quadros 3 e 4, percebe-se que as professoras tenderam a classificar um número muito maior de alunos como brancos do que eles mesmos o fizeram na autoatribuição de cor (ver também o Quadro 9). Para as educadoras, seriam 136 crianças brancas e 53 negras (pretas ou pardas), enquanto para os alunos e alunas seriam 80 brancos e 109 negros. Além disso, podemos observar que, segundo a autoclassificação, alunos negros e brancos estavam representados no grupo indicado para o reforço em proporções quase equivalentes a seu total na escola. Isto é, de forma diferente à percepção das professoras, para alunos e alunas não havia maior concentração de negros no reforço e apenas pequena diferença nas proporções de crianças não citadas e elogiadas, em relação ao conjunto da escola. No que se refere à disciplina, porém, os alunos autoclassificados como brancos estavam sobre representados em dez pontos percentuais.

O que determinava a classificação racial das professoras?

Nossa hipótese para explicar a classificação racial feita pelas professoras é que, pelo menos no âmbito da escola, a atribuição de raça às crianças teria como referência não apenas características fenotípicas, sexo e nível socioeconômico, elementos  presentes na sociedade brasileira como um todo, mas também seu desempenho escolar. Em pesquisas mais amplas, o nível socioeconômico muitas vezes é auferido através da escolaridade. Ou como em situações comentadas por alguns autores (Pisa / Rosemberg, 2002; Telles, 2003), a escolaridade percebida pelo entrevistador acaba funcionando como indicador de status social e o influencia em sua atribuição de raça ao entrevistado, o que, segundo esses autores, acontece com bastante frequência até mesmo na coleta de informações do Censo, hipoteticamente baseadas na autoatribuição de raça.

No âmbito da instituição escolar, sugerimos que a heteroclassificação de raça seria influenciada pela existência ou não de problemas escolares (disciplinares ou de aprendizagem), considerados como parte constituinte do status da criança, com uma nítida articulação entre pertencimento à raça negra, masculinidade e dificuldades na escola.

No estudo já citado, Telles (2003), utilizando os dados da pesquisa realizada pelo Instituto Data Folha em 1995, mostra que os entrevistadores tenderam a clarear as pessoas com mais anos de escolaridade e concordavam com muito mais frequência com autoclassificação “preto” quando o entrevistado tinha baixa escolaridade (p. 123). No caso de nossas professoras, a hipótese é de que o desempenho escolar cumpra o mesmo papel, como uma promessa de futura escolaridade, mas com o agravante de que elas próprias têm influência decisiva na determinação desse futuro, seja no que se refere às trajetórias escolares, seja na constituição de identidades raciais.

Que tipo de problemas escolares estaria influenciando essa classificação racial feita pelas professoras?

Há uma imagem social da masculinidade negra, presente de forma marcante na mídia brasileira, que a associa a características como violência e agressividade. Também a literatura internacional (Connolly, 1998; Ferguson, 2000) relata com frequência esta associação, por parte do pessoal escolar, entre homens negros, violência e agressividade e indica uma intensa transferência desses estereótipos para os alunos de sexo masculino, transformados em potenciais suspeitos de toda indisciplina. O que nos conduziu a uma expectativa de que as professoras estudadas classificariam um maior número de meninos indisciplinados como negros.

Porém, contrariamente, constatamos que apenas o sexo – e não a raça atribuída pelas professoras nem a renda familiar – era fator decisivo na diferenciação entre o grupo de alunos com problemas disciplinares e o conjunto da escola. Mesmo tomando-se apenas os meninos (Gráfico 1), verificamos que entre os “indisciplinados” estavam praticamente um terço dos meninos vistos como brancos (20 em 63), e também dos classificados como negros (8 em 27). Portanto, há indicações de que, na escola estudada, não havia correlação entre a raça atribuída pelas professoras e a presença de  problemas de disciplina. Devemos destacar, por outro lado, que ambos os problemas – disciplina e desempenho – apareciam correlacionados nas falas da maioria das professoras, com o mau comportamento levando à indicação para o reforço, em meio a uma forte indefinição de critérios de avaliação (4).

Uma classificação racial relacionada ao desempenho escolar                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                 

Para contextualizar a situação encontrada naquela escola, buscamos considerar como as pesquisas de âmbito nacional vêm coletando essas informações. A principal fonte para essas pesquisas é o SAEB (Sistema de Avaliação da Educação Básica), cujo questionário é respondido pelos próprios alunos e apresenta a seguinte questão: “Como você se considera? 1. Branco(a); 2. Pardo(a) / Mulato(a); 3. Negro (a); 4. Amarelo (a); 5. Indígena.” Trata-se, portanto, de autoclassificação, utilizando categorias diferentes daquelas empregadas nos questionários do IBGE no que se refere aos “pretos” e “pardos”, aqui categorizados como “pardo/mulato” e “negro”, o que nos coloca ressalvas a possíveis comparações. Além disso, as análises que encontramos não são suficientemente esclarecedoras. Maria Eugênia Ferrão e colaboradores (2001), por exemplo, analisando os resultados do SAEB de 1999, afirmam que “em todas as regiões, os alunos declarados de raça/cor preta (sic) apresentam desempenho inferior comparativamente aos demais alunos” (p. 29 – supomos que os autores referem-se aos alunos que se assumiram negro (a) na opção de pergunta sobre classificação racial).

Como esses autores não apresentam, pelo menos nos trabalhos a que tivemos acesso, os dados que fundamentam essa informação e como, além disso, são escassos os estudos sobre os resultados do SAEB na 4ª série5, é difícil estabelecer comparações mais detalhadas, para além da constatação de uma maior incidência de problemas de desempenho entre crianças que se autoclassificam como pardas, mulatas, pretas ou negras, do que entre as autoclassificadas como brancas.

Dessa forma, continuamos com nossa pergunta: estariam as professoras entrevistadas neste estudo atribuindo cor e raça a seus alunos influenciadas apenas por suas características fenotípicas, sexo e renda familiar?

No Quadro 9, que compara auto e hetero classificação de cor (considerando três das categorias de cor utilizadas pelo IBGE, quais sejam “branco”, “pardo” e “preto”), observamos, antes de mais nada, que a categoria “preto” foi a menos utilizada, tanto pelas crianças (13), quanto pelas professoras (15). “Branco” foi a classificação majoritária entre as educadoras, alcançando 136 alunos e alunas, mas sendo utilizada apenas por 86 crianças. Finalmente, enquanto para as professoras havia somente 33 crianças “pardas” na escola, para os próprios alunos e alunas, havia 103.6

Na diagonal desse quadro podemos acompanhar a porcentagem de consistência entre hetero e autoatribuição de cor. Quase não há divergências com relação às crianças autoclassificadas como brancas: 93% delas foram classificadas pelas professoras da mesma forma e quanto às restantes houve discordância entre as educadoras, com uma elas escolhendo “branco”. No caso dos “pardos”, a consistência cai para 29% dos casos, o que significa que a maioria das crianças que se auto classificaram como pardas foram classificadas pelas professoras como brancas (51%), um número equivalente a 53 alunos e alunas, ao lado de uma minoria classificada pelas professoras como “pretos” (nove crianças). Já no caso dos “pretos”, houve concordância em quase a metade dos casos (seis num total de 13 autoclassificações). Destaque-se que as professoras classificaram como pretos um número ligeiramente maior (15) que os próprios alunos (13).

As divergências entre as professoras referem-se a alunos que se autoatribuíram à cor branca (seis casos) e principalmente a cor parda (11 casos). O fato dessa divergência ser exceção entre os autoclassificados como pretos (apenas um caso), reforça a ideia de que há consistência na identidade de cor dos poucos alunos “pretos” da escola, indicando que a maior ambiguidade se situa entre alunos que se percebe  como pardos.

Esse fenômeno de forte branqueamento pode ter sido influenciado pela cor das classificadoras. Em suas entrevistas, as oito professoras de classe foram solicitadas a se autoclassificar utilizando as mesmas categorias do IBGE e sete delas se declararam “brancas”. A única a se considerar “parda” (classificada pela entrevistadora como branca) foi aquela que indicou maior número de crianças pardas e pretas ao fazer a classificação, com isso coincidindo em maior proporção com a autoclassificação de seus alunos. Essa professora explicitou como utilizava os mesmos critérios para si e para os alunos:

Eu acho que são poucas categorias pra classificar, devia ter maior variação. Por exemplo, comparando comigo, se eu me chamo de parda, a D. também é parda; o F. é pardo. […] Às vezes eu me lembro da pele, às vezes do cabelo.

Como já comentado acima, Eliana  de Oliveira (1994) encontrou a mesma tendência entre as funcionárias  e creche a quem solicitou que classificassem crianças atendidas nesses equipamentos através de fotografias, com as pessoas autoclassificadas como brancas indicando maior porcentagem de brancos entre as crianças, as pessoas autoclassificadas como pretas indicando maior porcentagem dessa categoria e assim por diante. Devemos considerar que, se havia semelhança com nossa pesquisa pelo fato de serem em sua maioria mulheres adultas atribuindo cor a crianças, havia também a diferença de que, no caso da pesquisa de Oliveira, as funcionárias não trabalhavam diretamente com as crianças classificadas, como faziam nossas professoras. Também é preciso ressalvar que Oliveira compara diferentes classificações externas (heteroatribuições), enquanto aqui comparamos autoclassificações feitas pelos próprios alunos com o olhar de suas professoras. Mas é possível afirmar uma tendência a que mulheres adultas brancas “clareiem” crianças ao classificá-las por cor, pelo menos no que se refere aos “pardos”.

Por outro lado, assim como na amostra estudada por Oliveira (1994), não foi possível identificar qualquer tendência de clareamento ou escurecimento das crianças com relação à sua idade, com as variações entre séries muito mais associadas às características da classificação individual de cada professora do que a uma sequência etária.

De toda forma, parece que era constrangedor ou até mesmo ofensivo, para as professoras, classificar as crianças como pardas ou pretas. A ideia mesma de classificar  seus alunos por cor parecia desconfortável:

São coisas, assim, que a gente…sei lá, você não para muito para pensar. Você não se vê assim. E eu procuro não ver as crianças assim, se é verde, amarelo, azul, branco. Você procura ver crianças, alunos. Daí… meio que dá uma… não sei. Não é uma coisa que eu fico muito procurando: “fulaninho é assim ou assado”. Não sei, é uma coisa que a gente… não é uma coisa que eu fico muito preocupada pensando, que eu me preocupe, não.

Nessa fala aparecem não apenas a diluição das raças em cores neutras do ponto de vista social (verde, azul), mas também a possibilidade – característica da branquitude7 – de não perceber-se a si mesma como um ser “racializado”, com identidade racial (“Você não se vê assim”).

Parece que, para professoras brancas, habituadas a essa postura pretensamente neutra com relação a elas mesmas, o próprio reconhecimento de algum pertencimento racial nas crianças é embaraçoso. Sendo esse pertencimento mais visível frente aos negros e, além disso, tão intimamente associado a características negativas, elas pareciam fazê-lo apenas em último caso, particularmente quando se tratava de “suas crianças”, alunos com quem mantinham relações afetivas e uma convivência estreita, como se tentassem retirá-los desse contexto, poupa-los desses problemas. Esse movimento apareceu em seu extremo no caso de uma professora que não classificou qualquer de seus alunos como “preto” e apenas uma menina como “parda”, tendo se revelado, ao longo da entrevista, profundamente envolvida com sua classe e com grande clareza em seus objetivos pedagógicos e critérios de avaliação.

Em relação ao sexo das crianças (Quadro 11), evidencia-se uma tendência das professoras em clarearem mais as meninas: enquanto 60% delas percebem a si mesmas como negras, para as professoras seriam apenas 26%. No que refere aos meninos, os índices seriam de 55% e 30%, respectivamente. O Quadro 12 reforça essa ideia, mostrando que as professoras concordaram mais com a autoclassificação dos meninos, “clarearam” 28% deles e 37% das alunas e, inversamente, “escureceram” 12% dos meninos, mas apenas 7% das meninas.

Essa tendência foi encontrada em outros estudos, particularmente no que se refere a categoria “preto”. Entre nossos alunos, 23 foram classificados pelo menos por uma professora como “preto” (incluindo-se os casos em que houve discordância entre professoras), sendo 16 do sexo masculino e apenas sete meninas. Nenhuma dessas crianças provinha de famílias com renda mensal superior a 20 salários mínimos e 13 delas pertenciam a famílias que recebiam menos de 10 salários mínimos. Assim, é possível supor que nossas professoras tenham feito o mesmo movimento detectado por Telles na sociedade brasileira como um todo, quando afirma que:

dada a conotação especialmente negativa atribuída ao termo preto e uma maior cordialidade oferecida às mulheres, os brasileiros talvez evitem ofender uma mulher de pele escura de alto status social não classificando-a de preta. (2003, p. 125).

Também a renda tem uma influência marcante na classificação feita pelas professoras. Embora elas tendam a clarear os alunos de todas as faixas de renda em relação a sua autopercepção (Quadro 10), fazem-no de forma mais acentuada conforme se ascende na escala social: a diferença entre a porcentagem de alunos auto e hetero classificados como negros (pretos e pardos) é de 24 pontos na faixa de renda mais baixa (até cinco salários mínimos) e sobe para 40 e 35 pontos nas faixas seguintes. A proporção é de uma hetero atribuição de raça negra para uma e meia autoatribuição na faixa mais baixa de renda, e de uma para três nas faixas intermediárias.

Já entre as crianças provenientes de famílias com renda mensal acima de 20 salários mínimos, enquanto oito delas se autoclassificaram como negras, as professoras classificaram apenas uma (proporção de um para oito). Trata-se de uma menina, auto e heteroclassificada como parda e que foi indicada para o reforço8. Enfim, a comparação entre a classificação das professoras e a autoclassificação dos alunos em cada faixa de renda mostra que elas, dentro da propensão ampla de clarear os alunos, tenderam a diminuir ainda mais a proporção de negros entre os de alta renda e, inversamente, ampliar essa mesma proporção entre os de baixa renda.

As crianças de famílias com renda acima de dez salários mínimos e percebidas como negras são somente dez em toda a escola e são muito visíveis para as professoras: nenhuma delas deixou de ser citada (Quadro 7). No caso dessas crianças, a renda não tem peso suficiente para livrá-las dos problemas de aprendizagem (Gráfico 2): 40% delas (quatro em dez) estão no grupo de reforço, exatamente a mesma proporção (40%) dos alunos de renda baixa classificados pelas professoras como negros. Já para as crianças percebidas como brancas, entre as provenientes de famílias na faixa de renda acima de 10 salários mínimos, 25% estão no reforço e entre as de famílias de renda baixa, 37%, índice muito próximo ao das crianças negras de qualquer renda. Destaquemos ainda que são elogiados como bons alunos 37% dos brancos e apenas 20% dos negros (heteroatribuição) com renda acima de dez salários mínimos.

Essas proporções são bastante eloquentes para nos permitir afirmar que a atribuição de raça feita pelas professoras não se relacionava exclusivamente às características fenotípicas das crianças, a seu sexo e à percepção que tinham quanto à renda de suas famílias, mas também a seu desempenho escolar. Se considerarmos que a avaliação escolar utilizada neste caso é construída pelas próprias professoras, podemos supor tanto que elas tendem a perceber como negras crianças com fraco desempenho, com relativa independência de sua renda familiar, quanto que tendem a avaliar negativamente ou com maior rigor o desempenho de crianças percebidas como negras.

Esse tipo de classificação tem sido encontrado na sociedade brasileira por outros autores. Particularmente o já mencionado estudo de Telles e Lim (1998) aponta que “a desigualdade estimada de renda entre brancos e não brancos no é maior quando se usa a classificação do entrevistador do que quando a autoclassificação é usada” (p. 473), devido ao fato dos entrevistadores “clarearem” pessoas que percebem como de mais alto status e, inversamente, “escurecerem” pessoas às quais atribuem baixo status social.

Se pensarmos que o status da criança no âmbito da escola depende tanto de sua renda familiar quanto de seu desempenho, podemos supor que nossos resultados são paralelos aos encontrados por estes autores, substituindo-se “desigualdade de renda” por desigualdade no desempenho escolar. Então poderíamos supor que a explicação para o fato de a desigualdade de desempenho escolar entre brancos e negros na escola estudada ser maior quando se usa a classificação das professoras do que quando a autoclassificação é usada decorreria tanto de as professoras clarearem crianças de melhor desempenho quanto de, simultaneamente, avaliarem com maior rigor o desempenho de crianças que percebem como negras. Cabe enfatizar que não se trata de acusar as professoras de uma deliberada discriminação racial, mas de perceber como o racismo presente na sociedade brasileira como um todo, se não for combatido por meio de um debate coletivo e de um esforço permanente de autocrítica, penetra também as relações escolares, marcando-as com as mesmas iniquidades que às vezes julgamos distantes do mundo da sala de aula.

1- Em razão das dificuldades das crianças com essas duas categorias, as análises se concentraram nos grupos “branco”, “pardo” e “preto”.

No caso das classes de 3ªs e 4ªs séries, atendidas por duas professoras cada uma, cada criança foi classificada duas vezes, gerando um grupo de “discordâncias”, casos em que as professoras divergiram em relação à cor do aluno. Tomando-se a raça (negro ou branco) foram 14 divergências e, assim, alguns quadros apresentam um total de 189 alunos, excluindo essas crianças.

3 A exceção são as crianças cujas famílias recebiam entre 5 e 10 salários mínimos mensais, sobre representadas em sete pontos percentuais entre os indisciplinados (em relação a sua presença na escola). 

As dúvidas e a insatisfação com os métodos e critérios de avaliação levaram a que fosse aberto um amplo processo de debate no conjunto da equipe escolar ao longo de 2002.

5 Há pouca confiabiliabilidade nos dados coletados no questionário de caracterização que acompanha o teste do SAEB e que é respondido pelas próprias crianças, pois elas muitas vezes não  têm informações sobre a escolaridade dos pais, a renda familiar etc, o que tem levado muitos pesquisadores a trabalharem apenas com os resultados relativos à 8ª série ou ao Ensino Médio.

6 Neste quadro, trabalhamos com o total de 203 alunos, incluindo as crianças de 3ª e 4ª séries, a respeito de cuja cor as professoras da classe divergiram entre si (grupo “discordância”).

7 O termo “branquitude” vem sendo utilizado como tradução de “whiteness” para designar o pertencimento à raça branca.

8  Houve ainda discordância entre professoras com relação a um menino proveniente de família com renda mensal acima de 20 salários mínimos, com problemas de disciplina e elogiado por seu desempenho, classificado por uma delas como branco e pela outra como pardo.

Referências Bibliográficas

ARAÚJO, Tereza Cristina N. A classificação de “cor” nas pesquisas do IBGE: notas para uma discussão. Cadernos de Pesquisa, São Paulo, n. 63, p. 14-15, nov. 1987.

CONNOLLY, P. Racism, gender identities and young children: social relations in a multi-ethnic, inner-city primary school. London: Routledge, 1998. FERGUSON, A. A. Bad boys: public school in the making of black masculinity. The University of Michigan Press, 2000.

FERRÃO, M. E. et al. Política de não repetência e a qualidade da educação: evidências obtidas na modelagem dos dados da 4ª série do Saeb 99. Brasília: MEC/Inep, 2001.

GUIMARÃES, A. S. A. Raça e os estudos de relações raciais no Brasil. Novos Estudos Cebrap. São Paulo, n. 54, p.147-156, jul. 1999.

OLIVEIRA, Eliana de. Relações raciais nas creches diretas do município de São Paulo, São Paulo, PUC-SP, Dissertação/ Mestrado, 1994.

ROSEMBERG, Fulvia. Raça e desigualdade educacional no Brasil. IN: AQUINO, Julio G. (org.) Diferenças e preconceito na escola: alternativas teóricas e práticas, São Paulo, Summus, 1998.

ROSEMBERG, Fulvia / PIZA, Edith. Cor nos censos brasileiros. In: CARONE, I. BENTO, M.A.S. (orgs.), Psicologia social do racismo: estudos sobre branquitude e branqueamento n Brasil, Petrópolis, Vozes, 2002.

TELLES, E. Racismo à brasileira: uma nova perspectiva sociológica. Rio de Janeiro: Relume Dumará, Fundação Ford, 2003.

TELLES, E., LIM, N. Does it matter who answers the race question? Racial classification and income inequality in Brazil. Demography, v. 35, n. 4, p. 465-474nov. 1998.

Tabelas com os números da pesquisa:

QUADRO 1

PROBLEMAS ESCOLARES SEGUNDO RENDA FAMILIAR               (em salários mínimos)

Sem inform.

até 5

5 /10

10 / 20

+ 20

Total

n % n % N % n % n % n %
Escola

11

5

45

22

76

37

45

22

26

13

203

100

Reforço

5

9

24

36

19

28

15

22

4

6

67

100

Disciplina

1

2

8

18

19

44

Q

21

6

14

43

100

N/Citados

6

9

14

21

30

46

11

17

5

6

66

100

Elogiados

0

0

7

12

20

33

16

27

17

28

60

100

QUADRO 2

PROBLEMAS ESCOLARES SEGUNDO O SEXO

MENINOS

MENINAS

TOTAL

n % n % n %
Escola

99

49 104 51 203 100
Reforço

44

66 23 34 67 100
Disciplina

32

71 13 28 45 100
N/Citados

23

35 42 65 65 100
Elogiados

26

43 34 57 60 100

QUADRO 3

PROBLEMAS ESCOLARES SEGUNDO HETEROATRIBUIÇÃO DE RAÇA

BRANCOS

NEGROS

TOTAL

n % n % n %
Escola

136

72 53 28 189 100
Reforço

38

62 23 38 61 100
Disciplina

27

71 11 29 38 100
N/Citados

48

75 16 25 64 100
Elogiados

44

80 11 20 55 100

*Foram retirados 14 alunos de 3ª e 4ª séries, sobre os quais as professoras discordaram.

QUADRO 4

PROBLEMAS ESCOLARES SEGUNDO AUTOATRIBUIÇÃO DE RAÇA

BRANCOS

NEGROS

TOTAL

n % n % n %
Escola

136

72 53 28 189 100
Reforço

38

62 23 38 61 100
Disciplina

27

71 11 29 38 100
N/Citados

48

75 16 25 64 100
Elogiados

44

80 11 20 55 100
*Foram retirados 14 alunos de 3ª e 4ª séries, sobre os quais as professoras discordaram.

QUADRO 7

PROBLEMAS ESCOLARES SEGUNDO RENDA E HETEROATRIBUIÇÃO DE RAÇA

NEGROS

BRANCOS

Sem

Informação

TOTAL

+ de 10 SM até 10 SM + de 10 SM até 10 SM

n

% n % n % n % n %

n

%

Escola

10

5

37 19 56 30 76 40 10 5

189

100

Reforço

4

6

15 23 14 21 28 43 4

6

65

100

Disciplina

4

10

7 18 9 24 18 47 0

0

38

100

N/Citados

0

0

14 22 15 2 29 45 6

9

64

100

Elogiados

2

5 5 12 21 50 14 33 0

0

42

100

*Foram retirados 14 alunos de 3ª e 4ª séries, sobre os quais as professoras discordam.

QUADRO 9

HETEROATRIBUIÇÃO DE COR SEGUNDO AUTOCLASSIFICAÇÃO DE COR

AUTO →

Branco

Pardo

Preto

Total

↓  HETERO

n

%

n % n % n

%

Branco

80

93

53

51

3

23

136

67

Pardo

0

0

30

29

3

23

33

7

Preto

0

0

9

9

6

46

15

16

Discordância *

6

7

11

11

1

6

19

9

Total

86

100

103

100

19

100

203

100

*Alunos sobre os quais os professores discordaram na classificação de cor.

QUADRO 10

RENDA FAMILIAR X AUTO E HETEROATRIBUIÇÃO DE RAÇA

Sem inform.

até 5

5 a 10

10 a 20

+ 20

n

% n % n % n % n

%

AUTO       brancos

2

18

16

35

30

39

21

47

18

69

                   negros

9

82

29

64

46

60

24

63

8

31

HETERO          brancos

4

36

22

49

54

71

32

71

24

92

                   negros

6

54

18

40

15

20

8

18

1

4

          discordância

1

9

5

11

7

9

5

11

1

4

TOTAL

11

100 45 100 76 100 45 100 26

100

QUADRO 11

SEXO X AUTOATRIBUIÇÃO DE RAÇA

BRANCOS

NEGROS

TOTAL

AUTO n % n % n %
Meninos

40

44

50 56 90 100
Meninas

40

40

59 60 99

100

HETERO

n

%

n % n

%

Meninos

63

70

27 30 90

100

Meninas

73

74 26 26 99

100

*Foram retirados 14 alunos de 3ª e 4ª séries, sobre os quais as professoras discordaram.

QUADRO 12

DISCREPÂNCIA ENTRE AUTO E HETEROATRIBUIÇÃO DE COR X SEXO

BRANCOS

NEGROS

TOTAL

n

%

n

%

n

%
Concordância

59

59

58

56

117

58
Prof. clareia

28

28

39

37

67

33
Prof. escurece

12

12

7

7

19

9
TOTAL

99

100

104

100

203

100

Disponível em: http://27reuniao.anped.org.br/gt14/t148.pdf Acesso em 27/10/2013.

 

LEITURA COMPLEMENTAR

 

ALVES, Rubens. Educar. http://www.youtube.com/watch?v=ouFqxPYA8lg&feature=related

ARCHANJO, Luis Carlos “Rapper”. As questões étnico-raciais e a escola inclusiva. https://projetomuquecababys.wordpress.com/2010/11/07/as-questoes-etnico-raciais-e-a-escola-inclusiva/

BRANDÃO, Andre Augusto; MARINS, Mani  Tabet  A. de. Cotas para negros no ensino superior e formas de classificação racial. Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 33, n 1, p. 27-45, jan/abr. 2007. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/ep/v33n1/a03v33n1.pdf Acesso em 30/10/2013.

CANDIDO, Antonio.Antonio Candido indica 10 livros para conhecer o Brasil. Disponível em : https://projetomuquecababys.wordpress.com/2013/05/18/antonio-candido-indica-10-livros-para-conhecer-o-brasil/

CAVALLEIRO, Eliane dos Santos. Do silêncio do lar ao silêncio escolar – racismo, preconceito e discriminação na educação infantil. USP, 1998.  Dissertação (Mestrado) – Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Educação da USP, São Paulo: 1998. Disponível em: http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.do?metodo=apresentar&id=K4763803U5&gt; Acesso em: 03/003/2012.

_____________________________. Por um Estado que proteja as crianças negras do apedrejamento moral no cotidiano escolar. Geledes Instituto da Mulher Negra,  Portal Geledes. Disponível em: http://www.geledes.org.br/em-debate/dia-da-consciencia-negra-por-um-estado-que-proteja-as-criancas-negras-do-apedrejamento-moral-no-cotidiano-escolar-20/11/2010.html

COSTA, Marina Morena. Mau preparo de professor atrapalha o ensino de literatura afro. Disponível em: https://projetomuquecababys.wordpress.com/2010/12/08/mau-preparo-de-professor-atrapalha-ensino-de-literatura-afro/

MUNANGA, Kabengele.O preconceito racial no sistema educativo brasileiro e seu impacto no processo de aprendizagem do “alunado negro IN:Utopia e democracia na Escola Cidadã. Porto Alegre: Editora da Universidade Federal de Rio Grande do Sul – UFRGS: 2000.

OLIVEIRA, Eliana. Identidade, intolerância e as diferenças no espaço escolar: questões para debate, Revista Espaço Acadêmico, Ano I, nº 07, Dezembro/2001.
http://www.espacoacademico.com.br/007/07oliveira.htm

PIERUCCI, Antônio Flavio. Vivendo o preconceito em sala de aula IN:Diferenças e preconceitos na escola alternativas teóricas e praticas. São Paulo: Summus, 1998. REINALDO, Telma Bonifácio dos Santos. Proposta Metodológica para o Ensino de História da África na Educação Básica (Ensino Fundamental Maior), Disponível em: http://www.redem.org/boletin/boletin310110g.php

__________________________.  Ciladas da diferença. Tempo Social, 1990.

RICCI, Rudá. Carta de um professor da rede municipal de Belo Horizonte. Disponível em: http://www.espacoacademico.com.br/arquivo/ricci.htm

SANTOS, Ângela Maria dos. Vozes e silêncio do cotidiano escolar: análise das relações sociais entre alunos negros e não negros em duas escolas públicas do município de Cárceres. UFMT, Dissertação (Mestrado) – Programa de Pós-Graduação em Educação do Instituto de Educação, UFMT, Cuiabá-MT: 2005. Disponível em: http://www.bdae.org.br/dspace/bitstream/123456789/1676/1/tese.pdf Acesso em: 26/06/2012.

SANTOS, Jocélio Teles dos. De pardos disfarçados a brancos poucos claros: classificações raciais no Brasil dos Séculos XVIII-XIX. Revista Afro-Asia, nº 18, CEAO/UFBA – Universidade Federal da Bahia: 1996. Disponível em: http://www.afroasia.ufba.br/pdf/afroasia32_pp115_137_Jocelio.pdf Acesso em: 30/10/2013.

SILVALeandro Assunção. História, Filosofia e Espaços: A Ideia de Ocidente em Oswald SpenglerPrograma de Pós-graduação em História – Mestrado. Universidade do Rio Grande do Norte. Natal, agosto/2008. Dispinível em: http://ftp.ufrn.br/pub/biblioteca/ext/bdtd/LeandroAS.pd

Vozes Reveladas – Sarafina

Posted in Cidadania, Cinema, Dança, Educação, Intervenção Social, Política & Políticos, Sociedade, Trilha Sonora, Violência Urbana with tags , , , , , , , , , , , , , , , , , on outubro 18, 2013 by projetomuquecababys

Dislexia – dificuldade específica nos processamentos da linguagem

Posted in Cidadania, Cinema, Educação, Educação Especial, Intervenção Social with tags , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , on setembro 12, 2013 by projetomuquecababys

By Mônica Abud Perez de Cerqueira Luz

INTRODUÇÃO
Esta pesquisa tem por objetivo geral apresentar o conceito de dislexia e apresentar o seu histórico. Como objetivo específico, identificar a dislexia como um problema de aprendizagem e suas prováveis causas; bem como os seus efeitos no convívio social, que pode levar o disléxico a exclusão. Para tanto, a pesquisa será norteada por Vigotsky, Luvia, Queirós, Gessele e Amartruda.

1. CONCEITUANDO APRENDIZAGEM
Ao estudarmos dislexia, se faz necessário definir o que seria aprendizagem. Consultando o Dicionário Aurélio as definições para o verbo aprender são:

1. tomar conhecimento de;
2. tornar-se capaz de (algo);
3. tomar conhecimento de algo, retê-lo na memória, graças a estudo, observação, experiência, etc.

A aprendizagem é portanto um processo que provoca uma nova modalidade funcional do organismo. O resultado da aprendizagem é assim, uma organização da conduta. Para os autores Gessel e Amartruda “comportamento e conduta são termos
adequados para todas as reações do indivíduo, sejam reflexas, voluntárias, espontâneas ou aprendidas. Assim, o corpo cresce e a conduta evolui”. Gessel e Amartruda (1976), distinguem quatro campos da conduta:

1 -A conduta motriz com suas implicações neurológicas, que é o ponto de partida natural na sua maturação: abrange grandes movimentos corporais; bem como as coordenações motoras mais finas; as reações posturais (sustentar a cabeça, sentar, engatinhar, andar).

2 – A conduta adaptativa voltada a coordenação de movimentos oculares e manuais para alcançar e manipular objetos.

2 – A conduta da linguagem inclui a imitação e a compreensão do que expressar às outras pessoas.

4 – A conduta pessoal-social, que envolve as reações pessoais da criança frente à cultura social do meio em que vive.

Desde o nascimento, a criança passa por uma série de fases que fazem parte do seu amadurecimento neurológico e cognitivo; tornando-a apta a receber sempre mais estímulos e informações oriundos do meio ambiente em que ela se insere.

2. RELAÇÃO ENTRE O DESENVOLVIMENTO E A APRENDIZAGEM

Para Vigotsky (1896-1934), que foi um grande psicólogo russo, as teorias mais importantes referentes à relação entre desenvolvimento e aprendizagem na criança apresentam abordagens diferentes. A primeira abordagem propõe a independência dos processos de desenvolvimento e de aprendizagem. A maturação adequada e o desenvolvimento favorecem a aprendizagem, que vem posteriormente. A segunda abordagem é oposta à anterior e propõe que os processos de desenvolvimento e de aprendizagem ocorrem concomitantemente. A terceira abordagem concilia as duas anteriores. Assim, propõe que a maturação depende do desenvolvimento do sistema nervoso e a aprendizagem já é por si só, um processo de desenvolvimento. Aprendizagem então, vem vinculada ao processo, que leva o desenvolvimento: o indivíduo aprende para se desenvolver.

Para Queirós e Sahrager (1980), aprendizagem é a aquisição de condutas do desenvolvimento que dependem de influências ambientais. O termo desenvolvimento neste contexto é amplo e inclui evolução, maturação e aprendizagem. Para esses autores, as influências ambientais são essenciais para o processo de aprendizagem. Os processos se dividem em quatro:

  • os primários, que permitem a adaptação e sobrevivência da espécie;
  • os secundários, que permitem a utilização de conhecimentos gerais;
  • os terciários, que implicam no uso de símbolos que permitem a transmissão e a recepção dos conhecimentos no processo. Somente os seres humanos têm potencial para os processos terciários de aprendizagem: a língua;
  • os quaternários envolvem a comunicação simbólica e a capacidade de pensar com esses símbolos; criando, inovando. Somente os seres humanos têm potencial para os processos quartenários de aprendizagem: a linguagem.

Assim, língua e linguagem constituem as principais facetas da aprendizagem humana. Desta forma, os problemas de aprendizagem mostram dificuldades nos processos: terciário e quartenário.

3. PROBLEMAS DE APRENDIZAGEM: DIFICULDADE NA LEITURA

A dificuldade para ler é reconhecida como uma das causas determinantes do fracasso escolar e de exclusão social. O leitor deficiente não consegue captar e nem mesmo interpretar os símbolos verbais impressos. Muitos fatores podem produzir leitores com dificuldades: retardamento mental, imaturidade na iniciação da aprendizagem; alterações no estado sensorial e físico; problemas emocionais e dislexia, que é uma disfunção neurológica que afeta basicamente a linguagem, a qualidade de sua motricidade e de suas percepções. As dificuldades de leitura produzem complicações na aprendizagem escolar e muitas vezes inibe ou impede a criança a se desenvolver plenamente do ponto de vista intelectual, social e emocional. A leitura não constitui uma habilidade isolada; pelo contrário, faz parte de um processo lingüístico bastante complexo. Assim, a dificuldade em exercê-la mostra uma deficiência na estrutura e/ou na organização da linguagem em geral.

3.1 Dificuldades de Aprendizagem na Escrita

Trata-se de uma dificuldade significativa somente no desenvolvimento das habilidades relacionadas com a escrita propriamente. A gravidade do problema pode ir de erros na soletração até em erros na síntese; estrutura; pontuação; paragrafação. É importante salientar que existem processos cognitivos envolvidos na escrita: rocesso de planejamento da mensagem; construção sintática; recuperação de elementos léxicos e processos motores que culminariam com a produção da escrita de forma aberta. A escrita é um processo complexo; de construção e que não culmina com aquisição dos simples automatismos gráficos.

4. FATORES GERADORES DE DIFICULDADES DE APRENDIZAGENS: DE LEITURA E DE ESCRITA

Uma das causas mais conhecidas de dificuldades para aprendizagem da leitura e da escrita é a dislexia. No entanto, existem outros “entraves” que podem inviabilizar tais aprendizagens. Dentre todos os observados a incapacidade geral para aprender; a imaturidade na iniciação da aprendizagem da leitura; alterações no estado sensorial e físico; problemas emocionais; vícios de aprendizagem, dentre muitos outros.

5. INFLUÊNCIA DA FAMÍLIA E DA ESCOLA NA APRENDIZAGEM DA LEITURA E DA ESCRITA

Emília Ferreira, em seu livro – Os processos de leitura e escrita: novas perspectivas – escreve:

“A leitura é uma destreza. A escrita é uma destreza. Um dos requisitos prévios para o desenvolvimento de uma destreza é o raciocínio inteligente quanto aos problemas e as tarefas que implicam e ao porquê deles. Para raciocinar de modo efetivo sobre as tarefas de leitura e escrita, as crianças precisam formar conceitos sobre as funções comunicativas e os traços linguísticos da fala e da escrita. A escola influi, favorável ou não no desenvolvimento desse aprendizado. Os métodos de ensino que por ventura obscureçam ou que ocultem estes conceitos inibirão sua formação. Se as escolas empregam métodos e materiais que se ajustam ao desenvolvimento conceptual da criança, as destrezas da leitura/escrita podem desenvolver-se maneira fluida e natural”. (p. 192)

Com essa colocação, Ferreira deixa claro a importância da escola no processo de ensino – aprendizagem. É importante que as crianças que apresentem dificuldade de aprendizagem sejam especialmente atendidas, utilizando métodos e materiais compatíveis com as dificuldades apresentadas. A família exerce papel igualmente importante. Estar atento à criança e às suas dificuldades. Colaborar com o educador, acompanhando, observando. Estando sempre atento ao desenvolvimento da criança e sempre interagindo com a escola, em parceria, buscando facilitar o processo de ensino – aprendizagem da criança.

6. DESVELANDO A DISLEXIA

  • Em 1877, Goi Kussmaul chamou a perturbação da linguagem de cegueira verbal, aos portadores de sintomas de ificuldades de leitura.
  • Em 1887 a palavra dislexia foi sugerida pelo professor Berlin de Stuttgart.
  • Em 1895 Hinshelwood se refere à dislexia como transtorno de origem congênita.
  • Para Morgan, 1886 a dislexia era proveniente do não desenvolvimento de uma área que na época era considerada o centro da leitura (gyrus angularis).
  • Keer em 1895 afirma que na dislexia existe um nível intelectual normal, mas na época, poucos deram importância a esta observação.
  • O. Wernick em 1903 confirmou os estudos de Morgan.
  • Em 1910, Mc Cready colocou a dislexia como problema de linguagem.
  • O psiquiatra e neurologista Samuel T. Orton em 1937 notou que os disléxicos invertiam letras, tanto podia ser sinistra (p por d; p por q) ou vertical (b por q; p por d; n por u). Para ele, a inversão se devia à confusão resultante da falta de dominância hemisférica unilateral.
  • Em 1942, Lydsgaard fez importantes estudos genealógicos para afirmação da herança como fator etiológico.
  • Em 1950, Hallgren fez estudos genéticos, relatando dislexia específica da evolução (onde a criança tem sentidos reservados, possui inteligência mas não tem habilidade para ler).
  • Em 1959, Folch definiu a dislexia como uma assimbolia de grupos e de letras, onde a criança tem preservado seu psiquismo e faculdades intelectuais.
  • Em 1906, Mac Donald Critchley define a dislexia quando ocorrer quatro premissas:

1 – sua persistência na idade adulta;
2 – natureza peculiar dos erros cometidos na leitura e escrita;
3 – incidência familiar de defeito;
4 – associação com outros defeitos de simbolização.

7. DISLEXIA NOS DIAS DE HOJE

Definida como um distúrbio ou transtorno de aprendizagem na área da leitura, escrita e soletração, a dislexia é o distúrbio de maior incidência nas salas de aula. Pesquisas realizadas em vários países mostram que entre 0,5% e 17% da população mundial é
disléxica. Ao contrário do que muitos pensam, a dislexia não é o resultado de má alfabetização, desatenção, desmotivação, condição sócio-econômica ou baixa inteligência. Ela é uma condição hereditária com alterações genéticas, apresentando ainda alterações no padrão neurológico. Por esse múltiplos fatores é que a dislexia deve ser diagnosticada por uma equipe multidisciplinar. Esse tipo de avaliação dá condições de um acompanhamento mais efetivo das dificuldades após o diagnóstico, direcionando-o às particularidades de cada indivíduo, levando a resultados mais concretos. Deve-se ficar alerta se a criança apresentar alguns desses sintomas:

  • Dispersão;
  • Fraco desenvolvimento da atenção;
  • Atraso no desenvolvimento da fala e da linguagem;
  • Dificuldade em aprender rimas e canções;
  • Fraco desenvolvimento da coordenação motora.

7.1 Como é ser disléxico

Dislexia é uma palavra grega que quer dizer distúrbio da linguagem. A falta de informação pode gerar julgamentos errados. Burro, lerdo, vagabundo, folgado, preguiçoso podem ser alguns dos adjetivos empregados injustamente à uma pessoa disléxica. As principais características do problema são dificuldades na leitura, escrita, soletramento de palavras e compreensão do que lê. É um problema que quanto mais cedo for detectado melhor. “Assim há possibilidades de uma intervenção terapêutica e você pode ajudar a criança a se desenvolver melhor, sendo capaz de driblar as dificuldades e desenvolver novas habilidades que possam fazer como que ela não sofra tanto na escola ou em outras situações nas quais dependem da leitura escrita” Mário Ângelo Braggio.

Como é uma síndrome  geralmente  detectada  na  infância, o  papel  do  professor é muito importante, principalmente na fase da alfabetização. Ter o  feeling  de  perceber  algo  errado  com  determinado  aluno  é essencial para evitar traumas futuros. Porém o que  muitas  vezes  acontece é a falta  de  conhecimento  sobre  a  dislexia  que pode trazer avaliações distorcidas. Esse quadro de dificuldade de leitura não tem cura, e acompanha uma pessoa por toda a vida, do  Ensino Fundamental até o Superior. O disléxico tem  um  ritmo  diferente  dos  não disléxicos.  Portanto, evite  submetê-lo a  pressões  de tempo ou competição com os colegas. É importante estimulá-lo e fazer com que acredite na sua capacidade de tornar-se um profissional competente.

CONCLUSÃO

A dislexia, segundo Jean Dubois et alii (1993, p. 197), é um defeito de aprendizagem da leitura caracterizado por dificuldades na correspondência entre símbolos gráficos, às vezes mal reconhecidos, e fonemas, muitas vezes, mal identificados. A dislexia, segundo o lingüista, interessa de modo preponderante tanto à discriminação fonética quanto ao reconhecimento dos signos gráficos ou à transformação dos signos escritos em signos verbais. A dislexia, para a Lingüística, assim, não é uma doença, mas um fracasso inesperado (defeito) na aprendizagem da leitura, sendo, pois, uma síndrome de origem lingüística. As causas ou a etiologia da síndrome disléxica são de diversas ordens. Os padrões de movimentos oculares são fundamentais para a leitura eficiente. São as fixações nos movimentos oculares que garante que o leitor possa extrair informações visuais do texto.

Algumas palavras podem ser fixadas por um tempo maior do que outras. Esse mecanismo faz toda a diferença, pois algo que fuja a isso, poderá causar um tipo de confusão espacial e articulatória que acaba fazendo com que o leitor cometa erros relativos à leitura e à escrita. Tais erros podem se apresentar por diferentes formas e de acordo com o grau da dislexia:

  • A acumulação e persistência de seus erros de soletração ao ler e de ortografia ao escrever ;
  • Confusão entre letras, sílabas ou palavras com diferenças sutis de grafia: a-o; c-o; ec; f-t; h-n; i-j; m-n; v-u etc. ;
  • Confusão entre letras, sílabas ou palavras com grafia similar, mas com diferente orientação no espaço: b-d; b-p; d-b; d-p; d-q; n-u;w-n, a-e;
  • Confusão entre letras que possuem um ponto de articulação comum, e, cujos sons são acusticamente próximos: d-t; j-x; c-g; m-b-p; v-f;
  • Inversões parciais ou totais de sílabas ou palavras: me-em; sol-los; som-mos; sallas; pal-pla.

ANEXO I

DISLÉXICOS FAMOSOS

Aghata Christie, Albert Einstein, Alexander Pope, ,Amy Lowell , Anwar Sadat, Auguste Rodin, Bem Johnson, Beryl Reid (atriz inglesa),  Bruce Jenner, Charles Darwin, Cher (cantora), Darcy Bussel (bailarina inglesa), David Bailey (fotógrafo inglês), David Murdock (financiador), Dexter Manley (jogador de futebol americano profissional), Don Stroud (ator/ campeão mundial de surf), Duncan Goodhew (campeão de natação), Franklin D. Roosevelt, General George S. Patton, George Washington, Greg Louganis, Hans Christian Anderson, Harry Belafonte, Harvey Cushing (pai da cirurgia neurológica moderna), Henry Winkler, Jackie Stewart (piloto de corridas), John Rigby (dono de parque temático), Joyce Bulifant (atriz), Julius Caesar, King Constantine of Greece, Lawrence Lowell , Leonardo Da Vinci, Leslie Ash (atriz inglesa), Lewis Carroll (autor), Lindsay Wagner, Lord Addington, Loretta Young, Margaret Whitton, Margaux Hemmingway, Mark Stewart (ator/ filho de Jackie Stewart), Mark Twain, Michael Barrymore (comediante), Michael Hesetine, Michaelangelo, Napoleon, Nelson Rockefeller , Nicholas Brady (US Secy Treasury), Nicholas Bush (filho do presidente EUA), Nicholas Parsons (ator inglês), Nicola Hicks (escultora inglesa), Oliver Reed (ator inglês), Pablo Picasso.
Paul Stewart (piloto de corridas)

ANEXO II

EDUCACÃO ESPECIAL

LDB 9.394/96

Art. 12 – Os estabelecimentos de ensino, respeitadas as normas comuns e as do seu sistema de ensino, terão a incumbência de:
I – elaborar e executar sua proposta pedagógica;
V – prover meios para a recuperação dos alunos de menor rendimento;

Art. 23 – A  educação básica  poderá  organizar-se em séries anuais, períodos semestrais, ciclos, alternância regular de períodos de   estudos, grupos  não seriados, com  base na  idade, na  competência e em outros critérios, ou por forma diversa de organização, sempre que o interesse do processo de aprendizagem assim o recomendar.

Art. 24 – a) avaliação contínua e cumulativa; prevalência dos aspectos qualitativos sobre os quantitativos e dos resultados ao longo do período.

Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 (ECA)

Art. 53, incisos I, II e III
“a criança  e o adolescente têm direito à  educação, visando ao pleno desenvolvimento de sua pessoa, preparo para o exercício da cidadania e qualificação para o trabalho, assegurando-se-lhes:

I – igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;
II – direito de ser respeitado por seus educadores;
III – direito de contestar critérios avaliativos, podendo recorrer às instâncias escolares
superiores.”

Deliberação CEE nº 11/96

Artigo 1º – “o resultado final da avaliação feita pela Escola, de acordo com seu regimento, deve refletir o desempenho global do aluno durante o período letivo, no conjunto dos componentes curriculares cursados, com preponderância dos aspectos qualitativos sobre os quantitativos e dos resultados obtidos durante o período letivo sobre os da prova final, caso esta seja exigida , considerando as características individuais do aluno e indicando sua possibilidade de prosseguimento de estudos.”

Lei nº 12.524, de 2 de janeiro de 2007

Programa Estadual para Identificação e Tratamento da Dislexia na Rede Oficial de Educação (Projeto de lei nº 321, de 2004 da Deputada Maria Lúcia Prandi – PT)
Dispõe sobre a criação do Programa Estadual para Identificação e Tratamento da Dislexia na Rede Oficial de Educação

O PRESIDENTE DA ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA

Faço saber que a Assembléia Legislativa decreta e eu promulgo, nos termos do artigo 28, § 8º, da Constituição do Estado, a seguinte lei:

Artigo 1º – Fica  o Poder  Executivo  obrigado a implantar o Programa Estadual para Identificação e Tratamento da Dislexia na Rede Oficial de Educação,  objetivando a  detecção  precoce  e  acompanhamento  dos  estudantes  com o distúrbio. Parágrafo único – A obrigatoriedade  de  que  trata  o “caput”  refere-se à  aplicação  de  exame  nos  educandos matriculados na 1ª (primeira) série do Ensino Fundamental, em alunos já matriculados na rede quando da publicação desta lei, e em alunos de qualquer série admitidos por transferência de outras escolas que não da rede pública estadual.

Artigo 2º – O Programa Estadual para Identificação e Tratamento da Dislexia na Rede Oficial de Educação deverá abranger a capacitação permanente dos educadores para que tenham condições de identificar os sinais da dislexia e de outros distúrbios nos educandos.

Artigo 3º – Caberá às Secretarias da Saúde e da Educação a formulação de diretrizes para viabilizar a plena execução do Programa Estadual para Identificação e Tratamento da Dislexia na Rede Oficial de Educação.

Artigo 4º – O Programa Estadual para Identificação e Tratamento da  Dislexia  na Rede  Oficial  de Educação terá caráter preventivo e também proverá o tratamento do educando.

Artigo 5º – As despesas decorrentes da execução desta lei correrão à conta das dotações orçamentárias próprias.

Artigo 6º – O Poder Executivo regulamentará esta lei no prazo de 30 (trinta) dias, a contar da data de sua publicação.

Artigo 7º – Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.

Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo, aos 2 de janeiro de 2007.
RODRIGO GARCIA, Presidente
Publicada na Secretaria da Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo, aos 2 de janeiro de 2007.
Marco Antonio Hatem Beneton , Secretário Geral Parlamentar

Projeto de Lei nº 455/2007 do deputado Alessandro Molon

Dispõe sobre medidas para identificação e tratamento da dislexia na rede estadual de educação e dá outras providências.
Disponível em <http://www.apad-dislexia.org.br/projetos.shtml  >

Art.1º – O Estado adotará medidas para Identificação e Tratamento da Dislexia na Rede Estadual de Educação, objetivando a detecção precoce e acompanhamento dos estudantes com o distúrbio.

Parágrafo único – A efetivação do previsto no caput deste artigo refere-se à realização de exame nos alunos matriculados no 1º ano do Ensino Fundamental, em alunos já matriculados na rede, com o advento desta Lei, e em estudantes de qualquer série admitidos por transferência de outras escolas que não pertençam à rede pública estadual.
Art. 2º – As medidas previstas por esta Lei deverão abranger a capacitação permanente dos educadores para que tenham condições de identificar os sinais da dislexia e de outros distúrbios nos estudantes.
Art.3º – Caberá ao Estado, através de seus órgãos de atuação setorial competentes, a formulação de diretrizes para viabilizar a plena execução das medidas ora asseguradas, criando equipes multidisciplinares com profissionais necessários à perfeita execução do trabalho de prevenção e tratamento.
Parágrafo único – As equipes multidisciplinares responsáveis pelos diagnósticos deverão possuir em sua composição profissionais das áreas de Psicologia, Fonoaudiologia e Psicopedagogia.
Art. 4º – As medidas de que trata esta Lei terão caráter preventivo e também promoverão o tratamento dos estudantes.
Art. 5º – Caberá ao Poder Executivo regulamentar o disposto nesta Lei.
Art. 6º – Esta lei entrará em vigor na data de sua publicação.

JUSTIFICATIVA
A presente proposição baseia-se na Lei Estadual nº 12.524, de 02 de janeiro de 2007, em vigor no estado de São Paulo, originada de iniciativa de semelhante teor de autoria da Deputada Maria Lucia Prandi, com a seguinte justificativa:
Dislexia é derivada de dis = distúrbio e lexia que significa linguagem (grego) ou leitura (latim). Portanto, dislexia é um distúrbio da linguagem e/ou leitura. Talvez por soar como nomenclatura de uma doença, o termo dislexia causa medo especialmente entre os pais que, por falta de informações, muitas vezes acreditam ser o fim do mundo ter um filho disléxico. Pesquisas realizadas em vários países mostram que cerca de 10 a 15% da população mundial é disléxica. Ao contrário do que muitos acreditam, a dislexia não é o resultado de má alfabetização, desatenção, desmotivação, condição socioeconômica ou baixa inteligência. É uma condição hereditária com alterações genéticas, apresentando ainda mudanças no padrão neurológico. Por tudo isso, a dislexia deve ser diagnosticada por uma equipe multidisciplinar. Esse tipo de avaliação dá condições de um acompanhamento pós-diagnóstico mais efetivo, direcionado às particularidades de cada indivíduo. Os sintomas que podem identificar a dislexia, antes de um diagnóstico multidisciplinar, só indicam um distúrbio de aprendizagem.

Identificado o problema de rendimento escolar ou sintomas isolados, que podem ser percebidos na escola ou mesmo em casa, deve-se procurar ajuda especializada. Cabe à uma equipe multidisciplinar, formada por psicóloga, fonoaudióloga e psicopedagoga clínica, iniciar uma minuciosa investigação. Essa equipe deve garantir maior abrangência do processo de avaliação, verificando a necessidade do parecer de outros profissionais, como oftalmologista e neurologista. A identificação do distúrbio não parte da dislexia. Ao contrário, chega-se a ela a partir da exclusão de qualquer outra possibilidade. Caso outro problema seja detectado, deve haver o encaminhamento para o tratamento adequado. Quando a dislexia é identificada começa, então, um acompanhamento cujos métodos irão variar de acordo com os diferentes graus do distúrbio (leve, moderado e severo), podendo levar até cinco anos.
Crianças disléxicas que têm o distúrbio identificado precocemente e dão início ao tratamento, apresentam menor dificuldade ao aprender a ler. Isto evita problemas no rendimento escolar, que levam meninos e meninas a desgostarem de estudar, terem comportamento inadequado e atrasos na relação idade/série. Apesar do Poder Público permanecer de olhos fechados para esta realidade, a dislexia está diretamente relacionada à evasão escolar e à sensação de fracasso pessoal.

Atualmente, a imensa maioria da rede educacional pública e particular não está capacitada para este desafio. Daí a importância de criarmos em nossas escolas um programa efetivo, que capacite professores a identificar estes distúrbios, crie equipes multidisciplinares para realizar uma avaliação precisa e garanta o acompanhamento profissional necessário. Dessa forma, estaremos garantindo que milhões de crianças e jovens em idade escolar tenham condições de corrigir um distúrbio, que restringe sua capacidade de aprendizado. Estaremos abrindo as portas para que eles tenham um futuro sem traumas, de sucesso profissional e com qualidade de vida.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ABARCA, Eduardo Vidal e RICO, Gabril Martinez. Por que os textos são tão difíceis de compreender? As interferências são a resposta. In TEBEROSKY, Ana et al. Compreensão de leitura: a língua como procedimento. Tradução de Fátima Murad. Porto Alegre: Artmed, 2003. p.139-153. (Coleção Inovação Pedagógica, v.7).

ALLIEND, G. Felipe, CONDEMARÍN, Mabel. Leitura: teoria, avaliação e desenvolvimento. Tradução de José Cláudio de Almeida Abreu. Porto Alegre: Artes Médicas, 1987.

BOFARULL, M. Teresa. Avaliação da compreensão da leitura. Proposta de um roteiro de observação. In TEBEROSKY, Ana et al. Compreensão de leitura: a língua como procedimento. Tradução de Fátima Murad. Porto Alegre: Artmed, 2003. p.127-136. (Coleção Inovação Pedagógica, v.7).

CEREZO, Manuel. Persuasores ocultos: os textos publicitários. In TEBEROSKY, Ana et al. Compreensão de leitura: a língua como procedimento. Tradução de Fátima Murad. Porto Alegre: Artmed, 2003. p. 155-165. (Coleção Inovação Pedagógica, v.7).

COLOMER, Teresa, CAMPS, Anna. Ensinar a ler, ensinar a compreender. Tradução de Fátima Murad. Porto Alegre: Artes Médicas, 2002.

CONDEMARÍN, Mabel e MEDINA, Alejandra. A avaliação autêntica: um meio para melhorar as competências em linguagem e comunicação. Tradução de Fátima Murad. Porto Alegre: Artmed, 2005.

CONDEMARÍN, Mabel, BLOMQUIST, Marlys. Dislexia: manual de leitura corretiva. Tradução de Ana Maria Netto Machado. Porto Alegre: Artes Médicas, 1989.

COOTES, Claire e SIMSON, Sarah. O ensino da ortografia a crianças com dificuldades de aprendizagens específicas. In SNOWLING, Margaret e STACKHOUSE, Joy. (orgs.) Dislexia, fala e linguagem: um manual do profissional. Tradução de Magda França Lopes.Porto Alegre: Artmed, 2004. p.183-202.

FULGENCIO, Lúcia, LIBERATO, Yara Goulart. Como facilitar a leitura. São Paulo: Contexto, 1992. (Coleção repensando a língua portuguesa).

GALLEGO, Maria Soledad Carrillo, SERRANO, Javier Marin. Desarrollo metafonológico e adquisición de la lectura: un estudio de entrenamiento. Madrid: CIDE, 1996. (colección investigación, n.122) 23

GARCIA, Jesus Nicacio. Manual de dificuldades de aprendizagem: linguagem, leitura, escrita e matemática. Tradução de Jussara Haubert Rodrigues. Porto Alegre: Artes Médicas, 1998.
.
GOULANDRIS, Nata K. Avaliação das habilidades de leitura e ortografia. In SNOWLING, Margaret e STACKHOUSE, Joy. (orgs.) Dislexia, fala e linguagem: um manual do profissional. Tradução de Magda França Lopes.Porto Alegre: Artmed, 2004, p.91-120.

HANNAVY, Sybil. O desenvolvimento dos pais na ajuda aos filhos na superação das dificuldades de leitura e escrita. In SNOWLING, Margaret e STACKHOUSE, Joy. (orgs.) Dislexia, fala e linguagem: um manual do profissional. Tradução de Magda França Lopes. Porto Alegre: Artmed, 2004. p.227-245.

HATCHER, Peter J. Prática dos vínculos do som na intervenção de leitura com a criança em idade escolar. In SNOWLING, Margaret e STACKHOUSE, Joy. (orgs.) Dislexia, fala e linguagem: um manual do profissional. Tradução de Magda França Lopes. Porto Alegre: Artmed, 2004. p.159-181.

HOUT, Anne Van; ESTIENNE, Françoise. Dislexias: descrição, avaliação, explicação, tratamento. Tradução de Cláudia Schilling. 2ª ed. Porto Alegre: Artmed, 2001.

JAMET, Eric. Leitura e aproveitamento escolar. Tradução de Maria Stela Gonçalves. São Paulo: Loyola, 2000.

JOLIBERT, Josette. Formar crianças leitoras/produtoras de textos. Proposta de uma problemática didática integrada. In TEBEROSKY, Ana et al. Compreensão de leitura: a língua como procedimento. Tradução de Fátima Murad. Porto Alegre: Artmed, 2003. p. 77-92. (Coleção Inovação Pedagógica, v.7).

KLEI, Hanna. Avaliação das dificuldades de linguagem em crianças e em adolescentes. In SNOWLING, Margaret e STACKHOUSE, Joy. (orgs.) Dislexia, fala e linguagem: um manual do profissional. Tradução de Magda França Lopes.Porto Alegre: Artmed, 2004. pp.75-90.

LAYTON, Lyn e DEENY, Karen. Promoção da consciência fonológica em crianças de pré-escola. In SNOWLING, Margaret e STACKHOUSE, Joy. (orgs.) Dislexia, fala e linguagem: um manual do profissional. Tradução de Magda França Lopes.Porto Alegre: Artmed, 2004. pp.143-158.

LECOURS, André Roch; PARENTE, Maria Alice de Mattos Pimenta. Dislexia: implicações do sistema de escrita do português. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997.

MARTINS, Vicente. A dislexia em sala de aula. In: PINTO, Maria Alice (org.). Psicopedagogia: diversas faces, múltiplos olhares. São Paulo: Olho d’Água, 2003.

MORAIS, José. A arte de ler. São Paulo: Unesp, 1996.

MUTER, Valerie. Antevendo as dificuldades de leitura e de ortografia das crianças. In SNOWLING, Margaret e STACKHOUSE, Joy. (orgs.) Dislexia, fala e linguagem: um manual do profissional. Tradução de Magda França Lopes.Porto Alegre: Artmed, 2004. p.43-56.

MUTER, Valerie. Antevendo as dificuldades de leitura e de ortografia das crianças. In SNOWLING, Margaret e STACKHOUSE, Joy. (orgs.) Dislexia, fala e linguagem: um manual do profissional. Tradução de Magda França Lopes. Porto Alegre: Artmed, 2004. p.43-56.

PÉREZ, Francisco Carvajal; GARCÍA, Joaquín Ramos (orgs). Ensinar ou aprender a ler e a escrever? Aspectos teóricos do processo de construção significativa, funcionamento e compartilhada do código escrito. Porto Alegre: Artes Médicas, 2001.

QUINTANAL, José. Tratamento complementar da leitura em sala de aula. Consideração que deve receber em outras áreas que não a de língua. In TEBEROSKY, Ana et al. Compreensão de leitura: a língua como procedimento. Tradução de Fátima Murad. Porto Alegre: Artmed, 2003. p. 45-54. (Coleção Inovação Pedagógica, v.7).

SERRA, Joan; OLLER, Carles. Estratégias de leitura e compreensão do texto no ensino fundamental e médio. TEBEROSKY, Ana et al. Compreensão de leitura: a língua como procedimento. Tradução de Fátima Murad. Porto Alegre: Artmed, 2003. p. 35-43. (Coleção Inovação Pedagógica, v.7).

SNOWLING, Margaret; STACKHOUSE, Joy. (orgs.) Dislexia, fala e linguagem: um manual do profissional. Tradução de Magda França Lopes. Porto Alegre: Artmed, 2004.

SNOWLING, Margaret J. Dislexia desenvolvimental: uma instrodução e visão teórica geral. In SNOWLING, Margaret e STACKHOUSE, Joy. (orgs.) Dislexia, fala e linguagem: um manual do profissional. Tradução de Magda França Lopes. Porto Alegre: Artmed, 2004. p. 11-21.

SNOWLING, Margaret; STACKHOUSE, Joy. Dislexia, fala e língua: um manual do profissional. Tradução de Magda França Lopes. Porto Alegre: Artmed, 2004.

SOLÉ, Isabel. Leitura em educação infantil? Sim, obrigada! In TEBEROSKY, Ana et al. Compreensão de leitura: a língua como procedimento. Tradução de Fátima Murad. Porto Alegre: Artmed, 2003. (Coleção Inovação Pedagógica, v.7). p. 67-76.

SOLÉ, Isabel. Ler, leitura, compreensão: “sempre falamos da mesma coisa?”. In TEBEROSKY, Ana et al. Compreensão de leitura: a língua como procedimento.Tradução de Fátima Murad. Porto Alegre: Artmed, 2003. p. 17-34. (Coleção Inovação Pedagógica, v.7).

STACKHOUSE, Joy. Fala, ortografia e leitura: quem está em risco e por quê? In SNOWLING, Margaret e STACKHOUSE, Joy. (orgs.) Dislexia, fala e linguagem: um manual do profissional. Tradução de Magda França Lopes.Porto Alegre: Artmed, 2004. pp.23-41.

STERNBERG, Robert J; GRIGORENKO, Elena L. Crianças rotuladas: o que é necessário saber sobre as dificuldades de aprendizagem. Tradução de Magda França Lopes. Porto Alegre: Artmed, 2003.

STOTHARD, Susan E. Avaliação da compreensão da leitura. In SNOWLING, Margaret e STACKHOUSE, Joy. (orgs.) Dislexia, fala e linguagem: um manual do profissional. Tradução de Magda França Lopes.Porto Alegre: Artmed, 2004. p.121-141.

TAYLOR, Jane. O desenvolvimento das habilidades de caligrafia. In SNOWLING, Margaret e STACKHOUSE, Joy. (orgs.) Dislexia, fala e linguagem: um manual do profissional. Tradução de Magda França Lopes. Porto Alegre: Artmed, 2004. p.203-225.

TEBEROSKY, Ana et al. Compreensão de leitura: a língua como procedimento. Tradução de Fátima Murad. Porto Alegre: Artmed, 2003. (Coleção Inovação Pedagógica, v.7).

TEBEROSKY, Ana. A iniciação no mundo da escrita. In TEBEROSKY, Ana et al. Compreensão de leitura: a língua como procedimento. Tradução de Fátima Murad. Porto Alegre: Artmed, 2003. p. 57-66. (Coleção Inovação Pedagógica, v.7).

TOLCHINSKY, Liliana; PIPKIN, Mabel. Seis leitores em busca de um texto. In TEBEROSKY, Ana et al. Compreensão de leitura: a língua como procedimento. Tradução de Fátima Murad. Porto Alegre: Artmed, 2003. p. 95-105.

GIL, Rosa; SOLIVA, Maria. Cantos para aprender a ler. In TEBEROSKY, Ana et al. Compreensão de leitura: a língua como procedimento. Tradução de Fátima Murad. Porto Alegre: Artmed, 2003. p.107-125. (Coleção Inovação Pedagógica, v.7).

VANCE, Maggie. Avaliação das habilidades de processamento da fala nas crianças: uma análise de tarefas. In SNOWLING, Margaret e STACKHOUSE, Joy. (orgs.) Dislexia, fala e linguagem: um manual do profissional. Tradução de Magda França Lopes. Porto Alegre: Artmed, 2004. p.57-73

Disponível em: http://www.abpp.com.br/artigos/113.pdf
Acesso em : 12/09/2013.

LEITURA COMPLEMENTAR

James Redford, filho de Robert Redford, possui diploma de Bacharel em escrita criativa e cinema e foi encomendado pelo seu produtor para criar este documentário com base em sua experiência pessoal e os desafios como um pai de uma criança disléxica. James Redford tem uma perspectiva única sobre as lutas que os disléxicos têm. Seu filho, Dylan, foi diagnosticado com a doença, levando Redford e sua esposa para pesquisar o que causa a doença, bem como as vantagens inesperadas que pensar de forma diferente pode ter. James explica que, como muitos disléxicos, Dylan é inteligente, atencioso e intelectualmente curioso – a “big picture” pensador. Mas, com a idade de dez anos, ele mal era capaz de ler e escrever. Dizer que a escola era difícil para ele é além de eufemismo. Dylan é agora um jovem que está encontrando sucesso para si e está prosperando. James Redford explica que há muitas coisas que ele gostaria de ter sabido sobre a dislexia, enquanto Dylan era jovem – coisas que o ajudaram a compreender que sua luta na escola média e baixa não foi o veredicto final sobre sua capacidade ou ambição acadêmica ou intelectual. Quando James Redford foi dada a oportunidade de fazer um filme sobre a compreensão da dislexia, sua missão era simples: fazer o filme que ele desejava que ele poderia ter visto com sua família quando Dylan foi analfabeto funcionai na 4 ª série.

James Redford and family

James Redford and family

THE BIG PICTURE: RETHINKING THE DYSLEXIA é o documentário que analisa os aspectos inesperados de ter dislexia, uma condição que afeta um em cada cinco,segundo algumas estimativas. Pessoas que a têm, incluindo Richard Branson e Gavin Newsom, falar sobre a maneira que ter um cérebro que funciona um pouco diferente afetou suas vidas para melhor, embora travando batalhas diárias com a linguagem, eles e outros tiveram de quebrar o código tradicional, criando maneiras próprias no modo de decifrar o código das letras.

http://www.hbo.com/documentaries/the-big-picture-rethinking-dyslexia/index.html#/documentaries/the-big-picture-rethinking-dyslexia/synopsis.html