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O olhar do professor sobre o aluno pode construir ou determinar a sua trajetória escolar positiva ou negativa?

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By Luis Carlos “Rapper” Archanjo

1 – INTRODUÇÃO

Do trabalho como educador social na parceria escola pública e Organizações Não Governamentais (ONGs) no contra turno da educação básica foram muitas as vivências e experiências educativas não formais. Hoje, na condição de licenciando em Pedagogia, ainda, com muitas perguntas para o entendimento da relação cognição/afetividade (Brest, 2009; Ladson-Billings, 2008) como fator motivacional de políticas educacionais como os Parâmetros Curriculares Nacionais – PCN´s (Brasil, 1977) e literatura de autores referenciados para desenvolver hipótese com embasamento necessário a delinear, dar significado acadêmico, contribuir para o conjunto de reflexões do fazer pedagógico vivido por docentes e discentes não autores ou pesquisadores autores com referências pessoais comuns àqueles das classes populares na sala de aula de educação básica da escola pública marcada pelo fracasso escolar. O ponto de partida é fruto das considerações do fracasso escolar da Dissertação de Sirino (2002) sobre o discurso do aluno no olhar de mão dupla da relação pedagógica docente/discente traduzida em “enquete” ou “survey” levado às redes sociais relacionadas à educação. Portanto, fornecer informação relevante da sua condição para outros coletivos, ou suscitar outras representações sociais,[1] humanas e culturais que os toquem tão perto, obrigatoriamente provoca reflexões, posicionamentos e revisões de percurso nos aspectos metodológicos de planos, planejamento e avaliação com ênfase no currículo (Apple, 1982; Arroyo, 2011).

1.1 – Apresentações do tema

A observação do professor (a) na centralidade da ação pedagógica do ponto de vista de experiências socioeducativas identificadas na racionalidade contracultural de coletivos docentes com olhares diferenciados para cultura, classe, raça, conhecimento, faz do trabalho lócus para socializar fontes diversificadas de conhecimentos na contramão do projeto de sociedade definido em propostas segregadoras cultuadas nas escolas, redes, diretrizes e normas aceitas de forma acrítica. Reconhecer o currículo como território de disputa (Arroyo, 2004) entre o real pensado, conceitualizado, teorizado e o direito a entender o real vivido e seus múltiplos e tensos significados implica em demonstrar e discutir essa ausência na neutralidade de transposições didáticas para experiências tão humanas e desumanas de coletivos silenciados, pedagogicamente. Dialogar com autores para questões como: Até que ponto a dificuldade de “ver” e se “posicionar” perante as questões étnico-raciais está relacionada à formação do professor? Por que as características biológicas têm caráter central para olhares em autoclassificação e heteroclassificação racial, percepção, autopercepção e heteropercepção na relação docente/discente? Nesse sentido, autores pesquisadores da questão racial (Cavalleiro, 1988, 2000; Pinto, 1999; Oliveira, 2001; Santos, 2005) colaboram. Minayo, (1992) embasa as considerações sobre isenção científica e aproximações da condição humana e questões éticas na reflexão para o desenvolvimento de uma consciência crítico-reflexiva e transformadora, onde a alfabetização em valores humanos cria as habilidades sociais necessárias para trocas interpessoais sadias no intramuros da educação básica pública.

1.2 – Questões norteadoras 

Como as diferenças sociais e raciais são contempladas no currículo?

Que lugar os conhecimentos cotidianos dos professores, dos alunos ou de outros autores sociais vêm ocupando o contexto escolar?

 1.3 – Objetivos 

1.3.1 – Geral 

Compreender a afetividade entre professor e aluno a influenciar a qualidade da educação, cogitar outros olhares para concepções bipolares, hierarquizantes e segregadoras, colaborar com informações relevantes sobre a realidade social do aluno, tanto quanto exemplificar formas exitosas de gestão escolar (Lück, 2000; Coelho, 2008) para “escolas efetivas” e modos de articular o saber cotidiano e conhecimento sistematizado da escola (Arroyo, 2004). 

1.3.2 – Objetivos específicos

Identificar o quanto atitudes, expectativas e sentimentos derivados da história pessoal influenciam o modo como o ser humano interpreta e organiza as experiências, as pistas e os estímulos de trocas com o meio, com os outros e consigo mesmo (Cavalleiro, 2000).

1.4 – Justificativa 

A vulnerabilidade social como palavra de ordem não dá identidade às principais vítimas da vida precária e o desencontro com o ensino/aprendizagem: meninos negros nos anos iniciais (Carvalho, 2004). A coparticipação em afazeres domésticos ou no complemento da renda familiar em responsabilidades adultas por si só desmistifica a falta de vontade para a avaliação do juízo professoral desconhecedor desses fatores a afetar sua escolarização. 

1.5– Procedimentos metodológicos

A etnografia (Gutierrez, 2004) está relacionada com ir a algum lugar para observar, interagir, explorar. Diferentemente da etnografia tradicional, a netnografia não exige a presença física do pesquisador. Mediado por ferramentas, ambientes e prática construída no ciberespaço, a netnografia ou etnografia virtual faz uso de abordagem quantitativa e qualitativa para desenvolver a percepção do sentido da tecnologia e dos espaços culturais que são por ela estudados.  A tabulação de resultado obtido de enquete ou “survey” contribui qualitativa e quantitativamente para socializar e sugerir outras abordagens sobre o olhar positivo ou negativo do “juízo professoral bourdieano[2]” (Catani, 2002) na relação docente/discente para classes populares. Em anexo: quadro de acessos e tabulação de opções.

2 – VIVÊNCIAS E  EXPERIÊNCIAS EDUCATIVAS VIRTUAIS

2.1 – A formação reflexivo-investigatória.

O convívio na educação não formal e o estágio obrigatório na educação formal foi momento de perceber que contingências da vulnerabilidade social imbricadas em fatores múltiplos privam meninos (as) de situações emuladoras de aptidões motoras e cognitivas comuns de ambiente educador. O entendimento dessas carências como fator de desencontro com o saber sistematizado nas séries iniciais, entre elas a coparticipação já mencionada, e nos casos com histórico de violência doméstica retirando-os do convívio familiar e encaminhadas para instituições tuteladoras como os abrigos, por exemplo, por si só é um convite a mudar olhares. Nos desdobramentos da história pessoal destes está a integração, sem maiores questionamentos de seus saberes prévios, ao ensino regular pelos vários caminhos de proteção integral à criança e ao adolescente. Por que o imperativo da lei à frente da promoção de condicionamentos preparatórios comuns aos seus pares com histórico de trajetória escolar precoce não mobiliza opiniões contrárias? Como tirá-los da situação excludente de classes superlotadas e da insensibilidade porquanto da prioridade ao cumprimento de ordenamentos legais pelo sistema, a falta de atenção individualizada externada na desatenção do aluno (a) provocada pela sensação de não enquadramento externada na apatia ou na inconstância comportamental em desacordo com padrões conformados nos demais da classe, aborrecendo-os?

Reconhecer a pertinência da pesquisa de Cardoso (2004) e transformar tal dado em questão norteadora a motivar a busca de outras considerações teórico-metodológicas e conceituais instrumentalizando olhar com capacidade de ver além daquilo que lhe é dado para interpretar, interpelar e inferir sobre a relação pedagógica com os elementos aqui expostos. Nesse sentido, ao longo do desenvolvimento pesquisadores autores com recortes múltiplos na educação: afetivo-emocional e cognitivo, currículo, questões raciais contribuem. Mesmo que utilizando referenciais de pesquisas de campo que ensejam componentes raciais na subjetividade de proposições e estratégias do “currículo oculto”, não é objetivo desse trabalho monográfico o aprofundamento em estudos sobre raça ou preconceito racial. Mas, sim, investigar como o juízo professoral define o fazer docente que avalia e exclui em julgamento imparcial que penaliza apenas o aluno já excluído socialmente. Portanto, trazer a teoria e a prática exitosas para debater sobre tal contexto significa demonstrar a existência de modos de interpelar os seus saberes prévios em nome da criação de pontes tirando-os do fosso traduzido em devaneios da apatia ou posturas questionáveis da inconstância comportamental.

A Pedagogia como ciência da educação se auxilia de outras ciências para investigar a realidade educacional possibilitando criar interdisciplinaridade promotora de melhoras no processo ensino/aprendizagem. Para Macedo (2009), fomos concebidos como seres que objetivam pelo argumento, somos animais conceituais e agimos mediados por conceitos. Ser formando em proposta político, filosófico, didático-pedagógico, reflexivo-investigatório[3] com conhecimentos formativos necessários a explorar autores e textos referenciados por academicismo que os conforma como fonte de consulta bibliográfica é conferir credibilidade e clareza à intencionalidade de considerações argumentativas na consecução do propósitos em situar o leitor, justificar posicionamentos, expor objetivos, entre outras recomendações para a confecção de artigo acadêmico. Assim, pesquisar é compreender uma dada realidade e poder conferir nesta mesma realidade na condição de “ser da mesma natureza do objeto pesquisado e, ao mesmo tempo, uma parte de sua observação” (MINAYO, 1992), “pois nenhuma pesquisa é sempre sem valores iniciais, crenças, concepções e pressuposições condutoras a respeito da matéria que está em investigação” (Sirotnik, 1991, p. 241 apud LADSON-BILLINGGS, 2008, p. 165).

Quadro com quantitativo participante[4] mensal e anual de acessos e tabela com participação em survey ou enquete levado a internautas de redes sociais interessadas em socializar e debater assunto relacionado à educação em pesquisa netnográfica é exemplo de prática da educação virtual. Ao provocar mudanças no ambiente educativo com a entrada de ferramentas tecnológicas propiciando a flexibilidade de aulas tele transmitidas, formas síncronas e assíncronas de interações, busca de informações entre as muitas mudanças no método, na técnica e estratégias para apropriar, socializar, arquivar, tratar informações cria novos parâmetros de se conceber educação. Segundo Lévy, desde há muito tempo a escola perdeu a função de formar cidadãos críticos e, cada vez mais através das mídias somos informados do curso do mundo. De acordo com o filósofo:

Novas maneiras de pensar e de conviver estão sendo elaboradas no mundo das telecomunicações e da informática, pois a era da informática, com seus métodos e equipamentos capazes de processar e transmitir informações é um campo de novas tecnologias intelectuais, aberto, conflituoso e parcialmente indeterminado (PIERRE LÉVY, 1999, p. 7-9)..

Assim como Lévy, Silva (1995) aponta a necessidade de a escola rever posições para lidar com o novo cenário cultural representado pela difusão e generalização de novas mídias dando voz e vez para outros espaços de poder, que não os dominantes, para a afirmação e narrativas e discursos alternativos de grupos subjugados socialmente. Para Silva:

Tais transformações não podem ser interpretadas no registro conservador do pânico moral e da visão patologizante que vê a ampliação da influência da cultura popular e o predomínio de novos meios e conteúdos como uma ameaça a tradicionais valores e capacidades supostamente mais universais, humanos e superiores (SILVA, 1995, p. 198)..

A sociedade virtual, caracterizada pelo uso de sons e imagens como uma dos principais meios para se veicular mensagens, certamente abarca o audiovisual da narrativa fílmica se pensado como caminho de reflexão sobre o olhar na educação como variável importante do fenômeno educativo. “Na centralidade da cultura contemporânea por suas características plurais, a mídia, urde o tecido da vida cotidiana, modelando opiniões e comportamentos, fornecendo o material com que as pessoas forjam sua identidade” (Kellner, 2001, p. 9 apud TERUYA et al., 2011). Pela sua capacidade em agregar fontes diversas de conhecimento, essa forma de dialogar com a realidade pode fundamentar ações educativas comprometidas com a construção de uma educação em valores humanos. É apontada pelos Estudos Culturais[5] como perspectiva para o debate de questões sociais e, ao mesmo tempo, atender a diversidade cultural da escola e ajudar a romper as barreiras disciplinares.

2.2 – A Pedagogia do olhar.

O subtítulo é um fragmento do pensamento do escritor Rubens Alves nas suas considerações sobre o olhar na educação e a educação do olhar. O vídeo, com referências da importância do educador ensinar o aluno a olhar o mundo e interpretá-lo, sintetiza a amplitude dos estudos culturais em reconhecer modos híbridos na produção de conhecimento relevante conforme a transcrição a seguir: “Já li muitos livros sobre psicologia da educação, sociologia da educação, filosofia da educação, mas por mais que me esforce, não consigo me lembrar de qualquer referência à educação do olhar ou à importância do olhar na educação” (RUBENS ALVES, 2011). O filme Prova de Fogo – Uma história de Vida serve como metáfora explicativa do  entrecruzamento de conhecimentos necessários a inserir o leitor no diálogo com os autores consultados para ratificar teor acadêmico ao trabalho. Como primeiro momento para focar o olhar como instrumento decisório no percurso discente fica a cena em que há o impasse entre o futuro orientador, professor com PhD em Literatura, com convicções pedagógicas embasadas em valores de afetividade, consciência social e étnico-racial versus o julgamento da professora quanto à aluna possuir ou não potencial para ir além da condição de vencedora no micro universo escolar. Mesmo externando competências intelectuais percebe-se a indecisão discente na representante da escola pública em exposição a nível nacional no concurso de “soletramento” e o possível confronto com pares herdeiros de capital cultural com referências em escolas que traduzem a excelência da educação americana. Superando os impeditivos de determinações sociais até transformar-se em representação emblemática de superação às determinações sociais há todo um simbolismo a ser apropriado por escolares que se veja espelhado na controversa educação popular. A citação de William E. B. Du Bois, primeiro afro-americano a possuir de título de PhD na Universidade de Harvard, é a contribuição do diretor no diálogo qual o mentor pede a protagonista que leia o pensamento do sociólogo sobe o medo e questões da autopercepção negativa, implícito na citação, demonstrando a importância do entendimento do poder das palavras e da importância de estudo do que escreveram homens que fizeram o uso das palavras para mudar o mundo, como Martin Luther King, Ghandi, John F. Kennedy e Nelson Mandela etc.

No enquadro da câmera em focar a participação e a contribuição direta ou indireta de todos do seu meio social em nome de valores de pertencimento até o final feliz e a consagração na soletração da palavra “amor”, há na produção cinematográfica elementos suficientes para o debate de quanto urge a educação formal desvencilhar-se de amarras e cristalizações traduzidas em maneiras de lhe dar identidade dominante. Utilizar tal recurso para demonstrar que escola persiste em caminhos que a inviabilizam em tocar mais profundamente na dimensão afetiva como lugar de força propulsora para mecanismos cognitivos que levam alunos das classes populares a outros patamares em conhecimentos, atitudes e aptidões atende objetivos que expressam o desejo de ultrapassagens de sua imagem associada ao desinteresse ou falta de vontade em se educar. Portanto, desencadear a intersubjetividade promovida pelo audiovisual na partilha de consensos sobre o olhar docente atuando negativa ou positivamente na trajetória discente popular cumpre objetivos do trabalho monográfico em fazer da realidade ficcional fonte de conhecimento relevante.

Cinelli (2003), na dissertação sobre o uso do vídeo no ensino busca considerações teórico-conceituais em autores que questionam a escola do século XXI que pretende educar as crianças com instrumentos e sistemas que tiveram validade  há 50 anos, porém suplantadas pela técnica contemporânea. A expressão é de McLuhan (1969, p. 120 apud CINELLI, 2003, p. 14): “a criança de hoje cresce sem parâmetros convencionais, porque vive em dois mundos, e nenhum dos dois a ajuda crescer”. Explica ele: […] substituirão na escola as lições, os braços  cruzados, as memorizações, os exercícios mortos, enquanto fora da escola haverá uma avalanche de imagens, ilustrações e de cinema. A interação de culturas em conflito provoca indecisão e angústia. Em acordo com o princípio freireano de educação como ato político Kellner (2003, p.127 apud TERUYA, p. 3059) propõe o modelo de diálogo do educador brasileiro no ensino de um alfabetismo crítico das narrativas midiáticas, como um excelente meio de fazer com que os/as estudantes se vejam em representações e simbolismos identificados nas múltiplas dimensões da linguagem fílmica criando pontes para que falem sobre sua cultura e experiência para articular e discutir a opressão e a dominação cultural.

2.3 – O binômio cognição e afetividade na educação.

Nas suas colocações, autores referenciados para o diálogo com o binômio em questão é possível elencar repertório de componentes relacionados à diversidade étnico-racial em articulação com objetivos e conteúdos a serem trabalhados em alguns Temas Transversais[6], especialmente Ética e Pluralidade Cultural (Pinto, 1999, p. 205). No texto da Introdução aos PCN´s consta que a comunicação propiciada nas atividades em grupo levará os alunos a perceberem a necessidade de dialogar, resolver mal-entendidos, ressaltar diferenças e semelhanças, explicar e exemplificar, apropriando-se de conhecimento. O estabelecimento de condições adequadas para a interação não pode estar pautado somente em questões cognitivas. Os PCN´s assinalam para aspectos emocionais e afetivos em igual relevância aos cognitivos, principalmente para os alunos prejudicados por fracassos escolares ou que não estejam interessados no que a escola pode oferecer. As questões étnico-raciais são contempladas no texto sobre interação e cooperação:

A afetividade, o grau de aceitação ou rejeição, a competitividade e o ritmo de produção estabelecido em grupo interferem diretamente na produção do trabalho. Ou seja, a disponibilidade cognitiva e emocional dos alunos para a aprendizagem é fator essencial para que haja interação cooperativa, sem depreciação do colega por sua eventual falta de informação ou incompreensão. Aprender a conviver em grupo supõe um domínio progressivo de procedimentos, valores, normas e atitudes (BRASIL, 1977, p. 64)..

Assim como há ambiente calmo e tranquilo mediado pelo bom entrosamento docente/discente favorecendo o ensino/aprendizado, também há aquele em que o tempo de permanência do estudante no interior da escola é pontuado por processos de interiorização de comportamentos de baixa estima por conviver cotidianamente com atitudes preconceituosas ou racistas de estereótipos vindo de colegas de classe ou até mesmo de professores insensíveis às consequências de tal desrespeito às diferenças raciais. A discussão sobre as relações étnicas representa uma questão necessária para a promoção de uma educação igualitária, compromissada com o desenvolvimento de todos os cidadãos.

O universo escolar de crianças afro-brasileiras e afro-americanas ambientado em literatura na perspectiva de intelectuais negros atentos á questão racial é a contribuição da Coleção Cultura Negra e Identidades, pela Editora Autêntica. Com Conselho Editorial constituído de eminentes representantes da intelectualidade negra brasileira, em cujo catálogo está o trabalho da escritora afro-americana Gloria Ladson-Billings sobre o ensino bem sucedido de crianças afro-americanas. Para a autora, tal estágio de qualidade no ensino perpassa por ações aparentemente não educacionais, tais como sorrir para o aluno ou mostrar desaprovação estão engajados em uma definição mais ampla de pedagogia. Ou seja, um olhar, um sorriso, um gesto, uma palavra, pode ter significação de ensino culturalmente relevante ou uma perspectiva assimilacionista[7]. De acordo com essa abordagem, o papel do professor é assegurar que os alunos se ajustem à sociedade.  “E se o professor tem baixas expectativas sobre os alunos, o lugar onde o professor acredita que os alunos devem “se encaixar” está nos patamares mais baixos da sociedade.” (LADSON-BILLINGS, 2008, p. 39-40). A colocação nessas faixas mais baixas tende a significar menos atenção e instrução individualizada pelo  professor. Numa espécie de profecia auto-realizável, esses alunos que tiveram pouca instrução atuam em níveis mais baixos.  Sua habilidade de ascender além desses níveis é prejudicada porque tem pouca atenção. “Dessa forma prosseguem um ciclo de desempenho escolar pobre iniciado por um preconceito e predisposição de um professor com respeito a eles” (Ibidem, p. 38). O foco na percepção que a criança tem de si e dos outros é especialmente importante porque os profissionais de educação muitas vezes apresentam sentimentos de baixa estima em relação ao seu próprio trabalho (Foster, 1986, p. 297-298 apud LADSON-BILLINGS, 2008).

Brust (2009), em seu trabalho monográfico sobre a afetividade no processo de aprendizagem nos anos iniciais do ensino fundamental coloca o quanto a escola deve participar da construção da personalidade, e o professor deve conhecer cada um de seus alunos, tratando-os como seres humanos com limitações e dificuldades. Do mesmo modo que Antunes (2006, p. 5 apud BRUST, 2009, p. 24) reflete sobre a necessidade do “amor”, Maldonado (1994) aborda o medo e a desconfiança como fatores que dificultam o relacionamento interpessoal, assinalando que o amor pode estar escondido em camadas de mágoa medo, tristeza, ressentimento, decepção, vergonha e raiva.

O desencontro dos sujeitos da educação dá-se principalmente por desconhecimento ou conceitos formados sobre a procedência do aluno, a falta de habilidades emocionais impossibilitando a empatia na relação docente/discente e consciência crítica para buscar abordagens como a Ética da Alteridade, por exemplo, que orienta a aceitação da diferença como princípio capaz levar o ser humano a se ver no lugar do outro e, assim, reorientar concepção de educação como espaço de exclusão. Ou adotar como princípio educativo a ação transformadora, no sentido freireano, que exige-se daqueles que vivenciam o dia a dia da sala de aula uma revisão no olhar pelo que a prática nascida desse tipo de posicionamento, mesmo que inconsciente, contribui para reforçar permanências que impossibilitam grupos historicamente subjugados a ascenderem socialmente via educação.

Brust busca em Woolfolk (2000) a explicação para a incapacidade do professor em  reconhecer a dinâmica do comportamento humano e, por isso, faz interpretações equivocadas quanto aos seus alunos. Esses comportamentos internos (emoções, sentimentos, valores, pensamentos) e de movimento acabam sendo observados e interpretados como indisciplina. Essas situações provocam nos alunos atitudes controversas: Desse modo:

Os professores são a melhor fonte de ajuda par a os alunos que enfrentam problemas emocionais e interpessoais. Quando os alunos têm uma vida familiar caótica e imprevisível eles precisam de estruturas firmes e consistentes, apliquem as regras firme, mas não punitivamente, respeitem os alunos e mostrem uma preocupação genuína com o seu bem-estar. Como professor, você pode estar disponível para conversar sobre problemas pessoais sem exigir que seus alunos o façam (Woolfolk, 2000, p.47 apud BRUST, 2009, p. 25)..

Para a autora, pelo fato da escola não ser apenas um ambiente de aprendizagem cognitiva, Dias (2007 apud BRUST, 2009, p. 29) assinala que os currículos escolares brasileiros deveriam abordar a afetividade e defender uma educação compromissada com a formação de pessoas livres, autônomas, responsáveis e amorosas, porém o imaginário docente está em melhoria das salas de aula, bibliotecas, laboratórios, materiais pedagógicos, equipamentos de informática e audiovisuais. Ressalta que numa perspectiva piagetiana, o desenvolvimento da criança é inseparável do conjunto de relacionamentos afetivos sociais e morais que constituem a vida na escola. Portanto, a relação indissociável entre cognição e afetividade precisa ser reforçada diariamente, pois o aspecto afetivo além de influenciar o desenvolvimento intelectual, ele pode acelerar ou diminuir o ritmo de desenvolvimento da criança.

Reconhecer no trabalho de autores selecionados para refletir a inter-relação das tantas confirmações de que a escola é lugar para se problematizar a realidade em nome da promoção de outros olhares na relação pedagógica carente de se traduzir em ambiente seguro de alunos calmos e tranquilos que constroem uma autoimagem positiva, participam efetivamente das atividades propostas e contribuem para o atendimento de objetivos educativos é uma verdade a ser perseguida no saber fazer do educador da escola básica pública. Por falta de uma leitura atenta sobre o ambiente percorrido por antolhos de preconceitos, estereótipos e a falta de um olhar com maior acuidade para posturas arredias e promover mudanças comportamentais é comum o aluno rejeitar o professor e a disciplina por ele ministrada, perder o interesse em frequentar escola, entre outras motivações levando-o à evasão escolar. “O professor que possui a competência afetiva é humano, percebe o seu aluno em suas múltiplas dimensões, complexidade e totalidade.” (Ribeiro; Jutras, 2006 apud BRUST, 2009, p. 30). 

3 – O CURRÍCULO COMO TERRITÓRIO DE DISPUTA 

3.1 – A visão de aluno da escola básica pública no imaginário docente.

O discurso do aluno como ponto de partida para a busca de respostas à interrogação tema nos questiona se a presença deste é cada vez mais notada nas escolas por que nos obrigam a enxerga-los? A questão iniludível passa a ser se os vemos ou como os vemos. Em nome de outro olhar sobre os educandos a escola deve proporcionar um espaço de reflexão sobre a vida do aluno como um todo, contribuindo para o desenvolvimento de uma consciência crítica e transformadora? Prossegue Arroyo (2004): Reconhecer que como profissionais estávamos preocupados em conhecer conteúdos de nossa docência e seus métodos e processos de avaliação. Não deixaremos essas preocupações, mas se impõem outras: conhece melhor os educandos (as). Fomos formados para olhar os educandos? Todos e todas nos parecem iguais, mudam cada ano, mas nosso olhar pode ser genérico, distante e superficial. A estas observações de alguns docentes reagem outros: nem todos têm esse olhar distante e impreciso. Por que nosso olhar os reduz a alunos-problema, desatentos, carente e até violentos? Uma professora impressionada comentou: Por que com tanta rapidez adjetivamos nossos alunos? Houve consensos sobre visão tão negativa: esses nomes, adjetivos e classificações revelam que o imaginário escolar e docente paira uma visão bastante negativa dos alunos. A visão torna mais negativa quanto mais “carente”, mais pobre são as comunidades e as famílias. A visão tão negativa que as elites têm do povo teria moldado o imaginário escolar e docente? Esta pergunta resultou bastante incômoda. De fato ninguém do coletivo pertencia às elites. Muitos sabiam que eles mesmos vinham de famílias populares ou bem próximas. Aí que a pergunta resultava incômoda: como reproduzir um olhar tão negativo sobre os alunos estando tão próximos na origem e nos salários? Ao registrar falas de interações com coletivos preocupados como os alunos são representados, com que imagens são vistos na diversidade de olhares docente Arroyo diz:

Mapear, explicitar e sistematizar essa diversidade de olhares está sendo uma preocupação de muitas escolas: se falamos deles e o que falamos, se nosso olhar é “positivo” ou “negativo”, se os ignoramos ou se não podem ser ignorados, se os compreendemos ou condenamos etc. Vai se tornando necessário explicitar as diversas tendências pedagógicas que habitam nas escolas e que refletem a diversidade de olhares. Tendências que às vezes dialogam ou se ignoram, e que os alunos e suas condutas põem em confronto (ARROYO, 2004, p. 54-58).

Os diálogos transcritos de obra do autor nos leva naturalmente a conclusões de que o olhar idealizado, romântico, bondoso e dócil da infância adolescência tão presente nas metáforas da pedagogia não aparece nos nomes e adjetivos com que os alunos são identificados e chama a atenção é que as imagens da infância mudam dependendo dos grupos sociais e raciais a que as crianças pertencem. Assim sendo, pode-se concluir que o pensamento a respeito dessa infância popular é menos romântico, menos puro e angelical.

Das considerações de Marturano e Borges (2012) sobre a alfabetização em valores humanos como perspectiva pedagógica para temas tabus permeados pelo “currículo oculto” provocando conflitos e tensões nas trocas sociais vem o questionamento sobre considerar a entendimento de que atitudes, expectativas e sentimentos derivados da história pessoal influenciam o modo como o ser humano interpreta e organiza as experiências, as pistas e os estímulos ambientais? Entretanto, tal interrogação faz emergir o paradoxo de quanto à natureza humana com aproximações e a cientificidade da Pedagogia com a impessoalidade e neutralidade necessária de ciência que se auxilia de outras ciências para melhorar a qualidade do ensino aprendizagem faz análises para questões como: Até que ponto a dificuldade docente de “ver” e se “posicionar” perante as questões étnico-raciais produzindo  os fenômenos educacionais recortados está relacionado a vivencias e experiências pessoais das varias dimensões da condição humana do professor? Por que as características biológicas têm caráter central para olhares em autoclassificação e heteroclassificação racial, percepção, autopercepção e heteropercepção na relação docente/discente?

“Diante do outro deslizamos o olhar ou o vemos com antolhos. O olhar dicotômico é consequente da subjetividade expressa no rosto do outro, porque o rosto e o olhar do outro nos aborda e interpela eticamente, não suportamos a sua fome de justiça. Frente ao rosto do outro nos refugiamos na segurança de nossa morada” (MIRANDA, 2008, p. 17).

3.2 –  As questões étnico-raciais na sala de aula da educação básica pública brasileira.

Antes de tolerar, respeitar e admitir a diferença é preciso explicar como ela é ativamente produzida. A diversidade biológica pode ser um produto da natureza, o mesmo não se pode dizer da diversidade cultural. Uma pedagogia cuja matriz teórica seja a problematização da identidade e da diferença tem a obrigação de ir além de benevolentes ações de bondade. “Tem de colocar em seu centro uma teoria que permita não simplesmente reconhecer e celebrar a diferença e a identidade, mas questioná-la” (Silva, 2009, p. 100 apud TERUYA et al. 2011).

A Carta de Cavalleiro (2000) ao Excelentíssimo Senhor Presidente da República Federativa Brasileira em data comemorativa do aniversário de morte de Zumbi dos Palmares trás elementos contundentes sobre a realidade de crianças negras inseridas no ensino brasileiro. Segundo a autora, nada justifica que o Estado colabore para fragilizar a vida emocional e psíquica de crianças negras, propiciando uma educação que enseja uma violência simbólica, quando não física, contra elas no cotidiano escolar. Sim, a violência diuturna sofrida pelas crianças negras no espaço escolar pode, metaforicamente, se comparada ao apedrejamento físico, visto que o racismo e seus derivados as amordaça. Assim, emocionalmente desprotegidas em sua pouca idade, as crianças passam a perseguir um ideal de “brancura” impossível de ser atingido, fazendo-as mergulhar em um estado latente, intenso e profundo de insatisfação e estranhamento quando em autopercepção.

Segundo Cavalleiro (1988), no tocante a educação infantil há um número reduzido de pesquisas que têm como preocupação a diversidade étnica na sociedade e, diante disso, as relações interpessoais estabelecidas nesse nível escolar. As pesquisas já realizadas confirmam a existência de problemas decorrentes do racismo, preconceito e discriminação étnica, destacando a existência destas nas trocas relacionadas entre os vários sujeitos da comunidade escolar. Desses relacionamentos foram selecionados aspectos importantes como, por exemplo: Expressão verbal – fala positivamente valorativa (elogios) ou negativamente valorativa (depreciativas) – explícita ou implicitamente sobre algum indivíduo,  sobre sua cultura ou sobre o grupo étnico. Prática não verbal – atitudes que demonstrassem aceitação ou rejeição do contato físico proposto pelas crianças e seus professores – através do abraço, beijo, ou olhar e comportamentos que evidenciassem as tentativas de proximidade ou afastamento entre indivíduos. Prática pedagógica das professoras – se positiva, negativa ou invisível, no que diz respeito aos materiais utilizados (cartazes, livros, revistas, desenhos,  ou outro meio qualquer) em relação á variedade étnica brasileira.

Na pesquisa de Santos (2005) sobre a relação racial entre negros e não negros em escolas públicas de Cáceres no Mato Grosso. Conforme Silva (2001 apud SANTOS, 2005), a povoação do Mato grosso do Sul se deu marcadamente pelos nativos (índios de várias etnias); migrantes vindos, principalmente, de Minas Gerais e São Paulo; negros africanos e mestiços (livres e escravos) trazidos pelos migrantes povoadores, segundo dados. A pesquisa revelou a existência de uma opinião generalizada, entre os alunos, sobre a inferioridade do negro e a superioridade do branco. ”Desde muito cedo o preconceito é incutido nas crianças, de tal forma que seu sistema ideológico racial, mesmo nas séries do Ensino Fundamental, é tão concatenado quanto o de um adolescente entre 17 e 18 anos.” (Figueira 1990, p. 67 apud SANTOS, 2005, p. 49). Após os resultados da pesquisa revelou-se que o preconceito racial demonstrado pelos alunos encontra respaldo no comportamento dos professores. Também observou que s professores mantinham e difundiam o preconceito racial entre os alunos, tanto por omissão como por manifestações racistas, ou ainda, “por desconsiderar a questão, tratando-a como um problema menor ou inexistente, na contramão da afetuosidade  mediando à relação discente/docente para a formação de personalidades sadias e capazes de aprender” (Capelatto, p. 14 apud BRUST, 200, p. 29),

Toda aprendizagem está impregnada de afetividade, num processo vinculador entre ensinante e aprendente. Corroborando com esta afirmação, Vygotsky (1991, p. 54 apud BRUST, 2009, p. 26) destaca a importância das interações sociais ressaltando a ideia da mediação e da internalização que ocorre de um intenso processo de interação entre pessoas. La Taille (2006. p. 108, apud MARTURANO; BORGES, 2012, p. 53) define seis sentimentos que ele chama de cimento afetivo que une as pessoas ao seu entorno social: empatia, amor e medo, confiança, indignação e culpa”.

A reflexão de Fleuri (2001) sobre a perspectiva intercultural nas práticas educacionais como caminho de proposições de novas estratégias relacionais entre sujeito e diferentes grupos, promovendo a construção de identidades sociais e o conhecimento das diferenças, ultrapassa a educação multicultural, na medida em que reconhece o valor intrínseco de cada cultura e defende o respeito recíproco e de interação entre diferentes grupos. Estas relações produzem mudanças em cada indivíduo, favorecendo a consciência de si e reforçando a própria identidade. Estereótipos e preconceitos de relações de sujeito ou de exclusão são questionados, e até mesmo superados, na medida em que sujeitos diferentes se reconhecem a partir de seus contextos, de suas histórias e de suas opções. A perspectiva intercultural de educação, enfim, implica em mudanças profundas na prática educativa, de modo particular na escola. “Pela necessidade de oferecer oportunidade educativa a todos, respeitando e integrando a diversidade de sujeitos e de seus pontos de vista” (Fleuri, 2001, p. 79 apud WELTER; TURRA, 2003, p. 186).

A Ética da Alteridade de Lévinas e questões subjetivas sobre se ver no olhar do outro segundo acepções da centralidade egoísta transformada em alteridade plural compondo princípios de educação em valores humanos poderia contribuir na desconstrução de barreiras constituídas no quadro de desencontros provocados pela não aceitação das diferenças sociais e raciais? A incorporação da alfabetização em valores humanos no currículo de formação como estratégia para reeducar a sensibilidade do juízo professoral quanto à centralidade da dimensão biológica da condição humana, certamente seria um instrumento poderoso de constituição de realidades educacionais? Portanto, lugar para acolher questionamentos e posicionamentos em torno da capacidade do olhar do professor em captar, prever, antecipar ou projetar situações, fatos, momentos que representam acolhimento à condição de ser em desenvolvimento na condição de criança, adolescentes e jovens nos mais diversos contextos da sua presença em processo de ensino e aprendizagem formal. Para Oliveira (2011:

[…] Embora saibamos que seja impossível uma escola igual para todos, acreditamos que seja possível à construção e uma escola que reconheça que os alunos são diferentes, que possuem uma cultura diversa e que repense o currículo, a partir da realidade existente dentro de uma lógica de igualdade e direitos sociais. Assim, podemos deduzir que a exclusão não é só econômica, ou seja, a origem pobre e a étnico-racial contam..

3.3 – Por um currículo com mais humanidade.

Algumas considerações da escola como espaço de exclusão provoca a análise do verbo conviver significando aceitar as diferenças qual a escola ainda não aprendeu a lidar por falta de autonomia educativa que ultrapasse o currículo como lugar que se configura as ações de conceber, selecionar, produzir, organizar, institucionalizar, implementar e dinamizar saberes e conhecimentos, valores constituídos na relação com o conhecimento eleito formativo do quadro de recortes acima elencados. Nesse sentido, Giroux questiona a função social do professor como um intelectual a serviço das escolas como locais econômicos, culturais e sociais inexoravelmente atrelados às questões de poder e controle. Isso significa que as escolas fazem mais do que repassar de maneira objetiva um conjunto comum de valores, formas de conhecimento, práticas de linguagens relações e valores sociais que são particulares da cultura mais ampla. Ou seja, ” introduzem e legitimam formas particulares de vida pessoal, pois no seu interior se disputa formas de autoridade, tipos de conhecimento e, formas de regulação moral e versões do passado e do futuro devem ser legitimadas e transmitidas aos estudantes” (GIROUX, 1997, p. 162).

Segundo Apple (2004) parte do seu livro tem base em uma crítica ao liberalismo como modelo para as políticas sociais e para a teoria e práticas educacionais, tanto nos Estados Unidos como em qualquer outro país, os resultados têm sido o desmantelamento das políticas da democracia social que vem geral beneficia trabalhadores, pessoas de cor e mulheres. […] “tentativas de cortar liberdades adquiridas têm sido associadas às necessidades, os medos e as esperanças de muitos grupos e pessoas que se sentem ameaçadas durante uma época de crise na economia, nas relações de autoridade, na família, na escola e em outros aspectos da vida social” (APPLE, 2004, p. 26). Apple questiona que um dos papéis da escola é, também, oferecer bases significativas para um trabalho “contra hegemônico”. Aprender como utilizar o conjunto de conceitos contra hegemônico é o primeiro passo se quisermos progredir no reconhecimento dos modos contraditórios pelos quais a educação funciona em nossa sociedade, “pois as palavras formam ideias e ideias são armas: espalhá-las em contexto autoritário é um ato subversivo, às vezes perigoso e ainda assim totalmente essencial” (APPLE, 2004, p.30). Para a escola cuja prática seletiva silencia sobre as diferenças sociais e raciais transformadas em diferenças escolares é preciso que repense o currículo e as considerações ideológicas de Apple a partir da realidade existente dentro de uma lógica de igualdade e de direitos sociais, pois há uma estreita relação entre a origem pobre, mas também pela origem étnico-racial de maioria de alunos da rede pública de educação.

Segundo Coelho (2008), pensar no estudo de autores que tomam como base nos resultados de aferições externas para avaliar a qualidade do ensino na educação básica do país, permitindo, assim, a proposição de políticas e práticas que aumentam a qualidade da educação, onde o construto “qualidade de ensino” é retomado como estando associado à qualidade do professor, definida principalmente pelas práticas pedagógicas, como mais relevantes que o nível de formação do professor ou o desempenho deste em exame de certificação. Os componentes de “boa escola” identificados no estudo “Aprova Brasil” são: boas práticas pedagógicas, professores comprometidos e qualificados, participação ativa dos alunos, gestão democrática e parcerias externas. O resultado confirma que bons professores tendem a ser efetivos para obter maior desempenho de estudantes de todos os níveis de habilidade e, embora a qualidade do professor pareça não se relacionar com os graus avançados de formação ou de certificação: “é a experiência que importa, principalmente no primeiro ano de trabalho docente” (COELHO, 2008, p. 247). Tão somente o enfrentamento dos desafios de um currículo com reconhecimento da diversidade; inserção de grupos excluídos; nascido da prática participativa do planejamento em acordo com as características necessárias a formação do comportamento crítico; consubstanciado no desenvolvimento das competências lógica, linguística e moral; e articulado entre elaboração de propostas curriculares no âmbito de políticas públicas e a realidade concreta da escola pode ensejar a ressignificação.

Os conteúdos e organizados nos cursos de formação tendem a ser descontextualizados, como se existissem por si próprios, em vista do que adquirem características artificiais. Não parecem referir-se a situações reais e concretas e, por isso, deixam de interessar aos gestores como algo referente à sua prática. Diante de tal situação, é muito difícil manter o interesse, a motivação e o envolvimento dos cursistas no desenvolvimento das aulas. Quando eles não se veem em relação ao objeto do curso, não veem a realidade concreta e objetiva da sua ação e não conseguem construir imagens em relação às questões tratadas, desligam-se de acompanhar as aulas e, portanto de aprender (LÜCK, 2000, p. 31).

Na leitura de Arroyo (2004) ou na acepção bourdieana de educação para as classes populares do nosso tempo marcado pelas propriedades mutantes do ambiente escolar o despreparo docente para criar situações pedagógicas com o quadro de expressões culturais que se confrontam na sala de aula tem seu entrave na falta de parâmetros em conteúdos com maior poder de mediação com os saberes trazidos de suas concretudes para uma realidade idealizada e cega para tantas carências humanas e materiais saltando aos olhos. A prática docente que não consegue contribuir em nome de perspectivas menos excludentes para tais depreciações gera frustração, sensação de incapacidade, e de certa forma o faz refém na impotência de sua própria prática e das necessidades do aluno.

No estágio obrigatório na Educação Infantil e Gestão Escolar realizado na Escola Municipal X, que atende alunos de entorno circunscrito pela “geografia da violência” foi possível vivenciar o desenvolvimento de experiência exitosa de articulação de conhecimentos e autonomia de gestão escolar pública. Ao analisar pontos fortes, oportunidades, fraquezas e ameaças na escola foram elencadas, principalmente, as situações que levam aos processos de evasão para estabelecer-se projetos para permanência do aluno. Para dar identidade ao Projeto Político Pedagógico (PPP) foi pensado planejamento em torno do tema: “Gentileza gera gentileza“. Ou seja, todos contribuindo a partir de uma nova consciência social e cultural marcada pela não violência, pela cooperação, pela sociedade sem defecção e pela convicção que outro mundo é possível. Essa cultura implica na introdução de elementos de justiça social, satisfação das necessidades básicas e dignidade para planejar sua vida e da sua família com liberdade e, sobretudo, com expectativa de poder concretizar o seu projeto de vida pela educação.

Tal identidade no PPP tem alicerce na justiça e na cooperação, pois atitudes de cooperação e tratamento pulam muros e chegam aos responsáveis. Se a equipe acredita que os alunos são capazes de produzir bons resultados eles avançam e, com isso, se motivam a aprender mais, se ninguém lhes der créditos, novos desafios, e, pelo contrário lhes oferecer somente as contradições da escola podem até desistir dela. É no cumprimento dele quando a imagem de uma escola se renova e a participação envolve toda comunidade escolar e, naturalmente, indicadores de aprendizagem melhoram, as notas de avaliação e as taxas de aprovação subam e os índices de evasão caiam. Colaborar no entendimento de que a educação é para todos sem discriminação, mesmo na complexidade do nosso tempo de incertezas, e que a afetividade é, amiúde, ignorada e não trabalhada, transformando-se em raiva, indisciplina e respeito, provoca a evasão escolar e o descompromisso com a aprendizagem. Conforme estudos da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial da Presidência da República – SEPPIR/PR[8], no ano de 2010, 50% nas mortes por homicídio era de jovens com idade de 15 a 29 anos, com pouca escolaridade, e entre esses, 75% são negros.

Para Catani 2002, a escola, ao ignorar desigualdades culturais entre crianças de diferentes classes sociais ao transmitir os conteúdos que opera, bem como os seus métodos e técnicas e os critérios de avaliação que utiliza, favorece os mais favorecidos e desfavorece os mais desfavorecidos. “Em outras palavras, tratando os educandos, por mais desiguais que sejam eles de fato, como iguais em direitos e deveres, o sistema é levado a dar sua sanção às desigualdades diante da cultura” (Bourdieu, 1988, p. 53 apud CATANI, 2002).

Para Arroyo (2004), reconhecimento e identificação na educação tem uma força poderosa e incisiva, emancipatória ou discriminatória. Também pode ser compreendida em níveis variados e múltiplos: nível ideológico e político, institucional, estrutural e subcultural. Como docentes analfabetos digitais preparam situações didático-pedagógicas para discentes nativos digitais que seja uma leitura atualizada de mundo com capacidade de dialogar com as TICs? Como avaliar crianças saídas de realidades tão desumanas com os mesmos instrumentos avaliativos e métodos de pressupostos teórico-conceituais de estudiosos do desenvolvimento humano como foco nos eventos genéticos até os processos culturais, desde os fisiológicos até as interações sociais, com os padrões de adaptação sendo entendidos mediante interações dos níveis internos e externos dos indivíduos? Como avaliar com os saberes da cultura da escola estruturas levadas a exaustão de aprendizagens para mentes e vontades tão infantis em responsabilidade adulta na luta pela sobrevivência? As responsabilidades quais são expostas em suas vivências antecipadas da vida adulta por si só desmistifica as falas de falta de força de vontade.

A desconstrução da autoimagem da docência como lugar de transmissão do pensamento dominante em nome de olhares que contemplem formas de se estar no mundo, mais justo e igualitário, mais humano, e menos segregado coaduna com a percepção de Arroyo (2011, p. 62) quando diz: “Reeducar nosso olhar, nossa sensibilidade para com essas crianças-alunos pode ser de extrema relevância na formação de um docente-educador”.  Ou Arroyo (2011, p.128-129) quando escreve: “Falamos como se fosse um absurdo receber e cuidar de corpos famintos nas escolas.” Por que essas reações? Por que identificamos nossa função não com alimentar corpos, mas com alimentar mentes de crianças, adolescentes e jovens famintos de conhecimento. Num malabarismo imaginário cindimos o ser humano em corpo e mente, e nos reservamos o trato de mentes incorpóreas. Haveria ainda uma explicação para essa dificuldade de assumir a educação de seres corpóreos: a condição biológica dos alunos não resolvida se defronta com o cognitivismo e intelectualismo abstrato que vem dominando os currículos e a cultura escolar e docente nas últimas décadas. Portanto, urge levar ao currículo vozes dissonantes de coletivos preocupados com dimensões que contra argumentam com a cientificidade, a neutralidade e a, impessoalidade em nome da subjetividade e objetividade para a construção de intersubjetividade representativa de suas existências humanas, alimentação, teto, educação,  saúde, valores, lutas por terra, culturas, saberes, identidades, território, direitos.

Os currículos, sendo fiéis a critérios de validade e de racionalidade, têm de ignorar não apenas outros modos de pensar, outros saberes e leituras de mundo, mas têm de ignorar os sujeitos desses outros modos de pensar. Ignorar, ocultar, tratar como inexistentes para a história intelectual os coletivos populares (ARROYO, 2011, p. 141). 

3 – CONCLUSÕES FINAIS

Dialogar com pesquisadores autores instrumentalizados de teorias, conceitos e métodos das ciências sociais que auxiliam a pedagogia na sua condição de ciência capaz de problematizar a realidade educacional fornecendo o conjunto de saberes técnicos procedimentais para o trabalho exploratório/investigatório na busca de elementos para criar conhecimentos com coerência e relevância teórico-conceitual ou do aporte de pesquisa empírica na busca em perceber para além das obviedades de visões de mundo postas nas formas de dar identidade à escola cumpre objetivos pedagógicos e filosóficos de aprendizados cumulativos na condição de licenciando em Pedagogia.  A questão norteadora foi respondida ao longo de trajeto construído segundo parâmetros necessários a conformar o trabalho monográfico em artigo acadêmico com credibilidade e cientificidade proclamadas por normas técnicas, procedimentos, modelos e padrões em que exemplos de vivências e experiências elencadas da concretude de seus sujeitos com o devido embasamento teórico promoveram a compreensão de que o currículo ao dar identidade à escola e a ação educativa inviabiliza um olhar mais complacente para acomodar a realidade social do aluno interferindo na qualidade da sua vida acadêmica.

Para desvelar o olhar que influencia a percepção docente como uma variável capaz de explicitar fenômenos educacionais em que meninos negros são as principais vítimas de processos de desescolarização, certamente as constatações trazidas do trabalho de pesquisas de autores e pesquisadores debruçados sobre a relação pedagógica pelo ângulo da questão racial escolhidos contribuem em informações com a credibilidade necessária. Os dados coletadas com cientificidade e coerência aprovada pela comunidade acadêmica nos leva ao entendimento de que as questões étnico-raciais visíveis e/ou na subjetividade do currículo oculto precisa habitar a sala de aula em debates francos pelo que os estereótipos, os isolamentos, o imperativo da lei acima de questões humanas precisam de outros tratamentos na composição de objetivos, metas, programas, estratégias e metodologias que traduz a intencionalidade formativa de ser humano do   Projeto Pedagógico.

Com referencial de diferentes abordagens teórico-metodológicas explicativos da realidade escolar com suas transformações e adaptações influenciando o ser humano, onde crianças, adolescentes e jovens e a sua condição de ser em formação suscita a presença adulta para orientá-los, implica no entendimento de que a escola e a família conjuntamente são referenciais a municiá-los em alfabetização precoce em valores humanos pelo que a barbárie se impõe na indiferença ao outro do nosso tempo de tecnologias da informação e da comunicação virtualizando as relações e nos privando de sentimentos grupais.

Como a vida em sociedade é estabelecida por dinâmicas determinadas por questões que na maioria das vezes estão relacionadas ao lugar social, impossibilitando num primeiro momento outros horizontes diferentes da concretude instalada, as oportunidades oferecidas pela escola passam a ser cruciais em tal contexto. Como a segunda em importância, entre os vários espaços de trocas interpessoais, a escola pública precisa rever os alicerces da sua base afetivo-emocional quando avalia por ferramentas culturais de pertencimento. Portanto, os dados transcritos de pesquisas empíricas que se efetivam em falas sobre percepção, autopercepção, tanto quanto de autoclassificação e heteroclassificação racial buscou conhecer o quanto a relação cognição e afetividade sofre influencia direta ou indiretamente dessas variáveis, já que funcionam como força de aproximação ou defecção em nossa desigual sociedade de classes.

Concomitante a nossa formação social e a maior presença de população negra nos estratos ditos inferiores ou de grupos subjugados provocando determinações em formas de viver que impossibilita os de sonhar pela educação porquanto os objetivos educacionais da literatura formativa pertencer somente à transformação retórica. Espero que o material utilizado represente a totalidade da intencionalidade pretendida, onde textos de autores das diversas áreas do conhecimento dialogaram com os objetivos, as questões norteadoras e justificativas elencados, que podem compor o repertório de intelectuais orgânicos preocupados em debater, inferir, interferir, reconhecer ou investigar a nossa diversidade multicultural e plurirracial não configurada no currículo. Problematizar o currículo em nome de vozes dissonantes, no sentido contra hegemônico gramsciano, significa praticar princípio freireano de oposição a formas antipedagógicas de perpetuar identidades coletivas negativas e inferiorizadas.

Socializar a produção científica de pesquisadores autores com olhares próximos da concretude dos filhos das classes populares e com capacidade para transpor o currículo oculto e enxergar a subjetividade da relação pedagógica, assim como a experiência exitosa de Gestão Escolar com autonomia para pensar Projeto Pedagógico para acomodar manifestações culturais identitárias feitas por adolescentes e jovens sobre a vida comunitária e sobre a relação com a escola significa eleger novos formadores de opinião. Tais modos de demonstrações de nossas existências é lugar para encontrar interrogações seríssimas sobre nossa condição de seres humanos, como também é dizer que existe preocupação de coletivos orientados em ultrapassar transformações retóricas e dar voz para coletivos subjugados.

Assim sendo, o desejo de investigar e revelar situações cotidianas da relação pedagógica capazes de contribuir com novos conhecimentos sobre como se dá o “juízo professoral” que dirige o olhar negativo ou positivo do professor passa pela alfabetização em valores humanos em nome de outra identidade da escola, diferentemente daquela de professores com antolhos que adjetivam o imaginário intramuros escolar, transpõe muros e habitam o imaginário coletivo. Contextualizar o entendimento de que valores dominantes do currículo a criar a exclusão dentro e fora da escola e, de modo seletivo em meninos negros nas séries/anos iniciais da educação básica impedindo-os de sonhar outras narrativas de história de vida que não as dos desdobramentos de futuro com perfil em grupos estatísticos de vítimas da violência urbana,  por exemplo, é a contribuição maior desse trabalho monográfico.

ANEXO A

QUADRO 1

O quadro quantitativo, assim como a tabela com o registro de participação em enquete ou survey, foi gerado pelo registro visualizações de site[9] com referência internacional em profissionalismo e uso de recursos diferenciais no gerenciamento de conteúdo para web. Assim sendo, transcrever resultado mensal e anual de acessos de internautas e escolha de opções interrogativas de interessados em participar diretamente, socializar, se informar ou debater assuntos relacionados à educação e entre esses as causas do fracasso escolar instalado na educação básica da escola pública brasileira garante a credibilidade necessária para justificar a intencionalidade dos dados como suporte para escolha de título do Trabalho de Conclusão de Curso. Outra maneira de demonstrar que o tema mobiliza a atenção de internautas de redes sociais com interesses afins em educação, estudantes da modalidade on-line, etc., entendido aqui como fato a ser apenas mencionado, seriam os Termos do Motor de busca pelo que esta fermenta possibilita categorizar usuários com maior ou menor conhecimento de terminologias relacionadas à educação. Segue quadro demonstrativo:

 

Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez Total
2010 193 153 54 91 165 157 212 91 1.116
2011 84 163 254 152 176 137 110 175 240 347 353 144 2.335
2012 81 137 472 372 369 323 215 190 261 269 282 88 3.059
2013 75 78 188 75 56 92 48 73 119 104 165 43 1.148
2014 49 53 187 191 153 75 36 872

 ANEXO B

TABELA 1

Interrogações extraídas de texto sobre as “As Causas do Fracasso Escolar” da Dissertação de Sirino (2002) sobre o fracasso escolar a partir do discurso do aluno transformada em postagem e levada às redes sociais relacionadas à educação, principalmente. Na tabela abaixo as doze (12) interrogações objetivas e subjetivas definidas como “ponto de partida” da monografia, pois o tema do Trabalho de Trabalho de Conclusão de Curso foi definido em acordo com a opção interrogativa com maior número de consensos.

AS CAUSAS DO FRACASSO ESCOLAR

1- O vínculo negativo entre a escola e a criança provoca reações de pavor e temor em se expor por medo de errar e ser humilhado?
2- Sobre a criança-aluno recaem olhares negativos, assim professores “vão empurrando” esses alunos ou então “deixando-os de mão”?
3- O olhar do professor sobre o aluno pode construir a sua trajetória escolar positiva ou negativa?
4- A falta de vínculo entre o professor e o aluno para facilitar a aprendizagem?
5- O que se cultiva no ambiente escolar é o medo e a insegurança?
6- As mães veem seus filhos como portadores de qualidades, vontades, curiosidades que a escola nem sempre leva em consideração?
7- A falta de diálogo entre os sujeitos do processo cultural por n motivos do distanciamento entre a escola, a família e a comunidade?
8- A baixa qualidade do ensino, as práticas educativas excludentes, o despreparo e as constantes trocas e falta de professores?
9- O desconhecimento do saber do aluno, as ideias preconcebidas quanto à proveniência social e de sua família produz uma experiência escolar pobre?
10- A falta de condições para contribuir com o conteúdo escolar do filho levando a família a assumir a culpa por sua exclusão, isentando a escola de suas responsabilidades sociais e educativas?
11- As dificuldades de relacionamento do professor com os alunos, com os pais dos alunos, com a instituição escolar e com as mudanças na política educacional?
12- As relações estabelecidas na escola manifestam sentimentos de inferioridade, inadequação, incompetência e não pertencimento que se mesclam com sentimentos de poder e querer?

Total: 241 (de uma a três opções de escolha por participante).

[1] A teoria das representações sociais centra-se na à análise da construção e transformação do conhecimento social e tenta elucidar como a ação e o pensamento se interliga na dinâmica social.

[2] Este relacionado à classificação ou desclassificação escolar, conforme a avaliação do sistema escolar estruturado em juízo de valor que pode valorizar, ou não, a intimidade do indivíduo (agente) com o saber. A forma que seus pensamentos e ações compactuam com a forma de pensar da instituição escolar, pode contribuir para as desigualdades sociais.

[3] O processo de formação deve dotar os professores de conhecimentos, habilidades e atitudes para desenvolver profissionais reflexivos ou investigadores. Nesta linha, o eixo fundamental do currículo de formação do professor é o desenvolvimento da capacidade de refletir sobre a própria prática docente, com o objetivo de aprender a interpretar, compreender e refletir sobre a realidade social da docência. […]. Mas o professor não deve refletir unicamente sobre a sua prática, mas sua reflexão atravessa as paredes da instituição para analisar todo Tipo de interesses subjacentes à educação, à realidade social com objetivo concreto de obter a emancipação das pessoas (IMBERNÓN, 2002, p. 39-40).

[4] Quadro e tabela com o acesso mensal e anual no endereço da web:
< https://projetomuquecababys.wordpress.com/2010/05/06/as-causas-do-fracasso-escolar/  >

[5] Os pesquisadores dessa área buscam compreender as intersecções entre cultura, indivíduo e sociedade. Alguns trabalhos questionam as fronteiras entre alta cultura e cultura de  massa ou comercial, investigam os processos de produção da cultura, abordam objetos culturais híbridos, configurações indenitárias de grupos socialmente marginalizados e trocas culturais que deles advêm. Enfatizam,  também, o rompimento das barreiras disciplinares que possibilitam transitar por diferentes áreas de conhecimento, tendo em vista que uma determinada disciplina não abarca todas as possibilidades de apreender um objeto a ser conhecido.

[6] Brasil, 1977ª, p. 65-71

[7] Cabe aqui esclarecer que a educação assimilacionista está relacionada ao estilo de ensino que funciona sem considerar as características culturais específicas do aluno.

[8] Pesquisa de opinião pública nacional sobre a violência contra a juventude negra no Brasil. Mais informações no endereço da web: < http://www.seppir.gov.br/arquivos-pdf/pesquisa-datasenado >

[9]  < https://projetomuquecababys.wordpress.com/  >

ESTATÍSTICAS do Projeto Muqueca Babys
< https://wordpress.com/my-stats/?view=table >

REFERÊNCIAS BIBLIOFRÁFICAS

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ARROYO, Miguel Gonzáles. Imagens quebradas – Trajetórias e tempos de alunos e mestres. 6ª Ed. Vozes, Petrópolis: 2004.     ISBN  978-85-326-3071-1

________________________. Currículo, território em disputa. Petrópolis: Vozes, 2011.        ISBN 978-85-326-4083-3

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CATANI, Afrânio Mendes. A sociologia de Pierre Bourdieu (ou como um autor se torna indispensável ao nosso regime de leituras). Educ. Soc. V. 23, n. 78, Campinas: abr./2002.          ISSN 0101-7330
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Formação de profissionais que atuam em escolas de educação básica localizada no semiárido brasileiro: uma contribuição aos estudos da alteridade nas políticas públicas

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By Ada Augusta Celestino Bezerra e Margaréte May Berkenbrock  Rosito

Introdução

Acreditar no mundo é o que mais nos falta; nós perdemos completamente o mundo, nos desapossaram dele. Acreditar no mundo significa principalmente suscitar acontecimentos, mesmo pequenos, que escapem ao controle, ou engendrar novos espaços-tempos, mesmo de superfície ou volume reduzidos… É ao nível de cada tentativa que se avaliam a capacidade de resistência ou, ao contrário, a submissão a um controle. Necessita-se ao mesmo tempo de criação e de povo (DELEUZE, 2000, p. 218)..

Este estudo tem como foco, a Educação Contextualizada, uma política pública de convivência, com o semiárido sergipano, no âmbito da administração municipal/estadual/federal, para a educação básica, desenvolvida no período de 1998 a 2004, à luz das categorias: sustentabilidade e alteridade. A proposta de uma Educação para a Convivência com o Semiárido (ECSA), emergiu do comprometimento com as demandas dos movimentos da sociedade civil organizada, visando à superação da dicotomia cidade/campo, para o desenvolvimento da região e do país, favorecendo o sujeito de direitos.

A ECSA, no seio das Organizações não-governamentais (ONGs), em parcerias entre secretarias municipais de educação, movimentos sociais e universidades, as ONGs vêm, nos últimos anos, propondo e realizando diversas experiências que contemplam a proposta do ECSA, em todo o semiárido brasileiro (SAB). O número de entidades que apóiam e já trabalham com essa idéia desencadeou na criação, em 2000, da Rede de Educação do Semiárido Brasileiro (RESAB), como espaço de articulação e mobilização na proposição da ECSA, como política pública e de responsabilidade do Estado.

A proposta da Educação Contextualizada apresenta o desafio de oferecer condições de oportunidades de educação, como um direito humano, tornando-se necessário salvaguardar a diferença e a diversidade, na questão da igualdade. O diferente não significa tratamento diferenciado, de superioridade ou inferioridade; trata-se do respeito às diferenças para a construção da igualdade educacional, seja no campo ou na cidade, o que implica a ética da ‘alteridade’.

Neste estudo, elege-se a educação do campo como direito humano. Tem sua base legal na Constituição Federal, a de 1988. O Art. 1º da Constituição estabelece o estado democrático de direito e refere-se à soberania da nação; à unidade na diversidade; e à cidadania. O pressuposto básico é o exercício de poder, de homens e mulheres, tanto no campo como na cidade, nos termos da Constituição Federal, fortalecendo o Estado de direito, uma vez que todo poder emana do povo que o exerce ou diretamente ou por meio de representantes eleitos.

As políticas públicas do país, em geral, não falam de desigualdades sociais, mas de desigualdades regionais, o que acaba por inviabilizar a discussão da educação como direito de todos. No Brasil, fica difícil construir a igualdade social no campo, considerando-se que não há o reconhecimento das desigualdades, construídas ao longo da história, com uma origem social.

A educação do campo apresenta uma característica particular que é o modelo de “classe multisseriada”, diferente do modelo escolar da cidade. Nas lutas políticas, diferentes setores sociais querem estar presentes e ser reconhecidos; o campo ainda não teve força para assegurar políticas públicas, a cidade ainda é um parâmetro de referência para o campo. O sistema de ensino ainda não reconhece as identidades, na busca de avanços na escrita da educação, como um direito humano que responde a uma necessidade permanente de aprendizagem do homem, apontando a necessidade do reconhecimento para a educação do campo. Nesse âmbito, a investigação inspira-se na premência da necessidade de políticas de reconhecimento para o campo, bem como de construção de uma rede escolar própria para o campo, na defesa da sua identidade, mantendo a relação entre o nacional e o local.

Diante do desafio de relacionar o todo e a diversidade, alguns defendem uma educação calcada na reforma agrária; outros defendem a educação na perspectiva da redistribuição da terra, sempre com o mesmo fundamento básico: a igualdade. O reconhecimento das identidades, por si só, é insuficiente: pode levar a fragmentação da compreensão do ser humano. A condição humana, a realidade humana, tem a igualdade como referência básica. Do ponto de vista educacional, a igualdade está fundada numa relação entre sujeitos, onde cada um se reconhece no outro, esse princípio faz emergir o sentido da alteridade.  Aqui reside a defesa da educação como fundamento do Estado de Direito, sem cair na discussão ideológica que, de fato, é um impedimento para que se garanta a efetividade da educação do campo. Assim, as categorias igualdade, diversidade, diferença e alteridade configuram a reflexão sobre a educação do campo.

A partir da realidade e das especificidades do semiárido, vem-se consolidando essa proposta de educação. Ela visa a possibilitar uma nova percepção sobre a região semiárida, com uma nova organização curricular, pautada no contexto de vida dos alunos, de forma significativa e prazerosa. Ela visa, ainda, à formação continuada dos professores e ela objetiva, sobretudo, a construção de políticas públicas de educação, comprometidas com a inversão dos indicadores de desenvolvimento atuais do semiárido brasileiro, que se têm apresentado como os mais graves do país.

Segundo Heller (2000, 2002), a categoria que iguala os homens é a condição humana. A educação põe em relevo o que cada ser humano tem de particularidade, cada um é um sujeito diferente. Neste trabalho, considera-se o modo de professores, homens e mulheres do campo, produzirem sua existência, confere uma identidade própria, não só aos trabalhadores, mas também ao espaço no qual eles trabalham.

Procedimentos do estudo

Neste estudo, apresenta-se o resultado parcial de uma pesquisa, que vem sendo desenvolvida desde 2006, que analisa falas/histórias de vida dos sujeitos que atuam na educação básica das escolas do campo, para a compreensão da formação de profissionais, a partir de diálogos construídos das lembranças de escolarização. De forma significativa, a formação continuada dos professores objetiva, sobretudo, a construção de políticas públicas de educação, comprometidas com o desenvolvimento do semiárido brasileiro. Estabelece-se como objetivo avaliar a proposta das diretrizes estabelecidas para a Educação Contextualizada.

A entrevista narrativa foi o procedimento utilizado para a reconstituição da trajetória pessoal e profissional dos sujeitos. A entrevista narrativa, na perspectiva de Jovchelovitch & Bauer (2002, p. 90), compreende as cinco fases: a) Preparação: Exploração do campo: identificação dos sujeitos envolvidos; b) Iniciação: formulação do tópico inicial para narração; c) Narração central: narração livre por parte dos sujeitos; d) Fase de perguntas: questões desencadeadoras formuladas pelo entrevistador; e e) Fala Conclusiva, que inclui perguntas como: O que significou para você o resgate do processo autoformativo, no ato de relatar o reconhecimento da aprendizagem na recuperação de episódios marcantes, como a identificação de pessoas, professores e livros que influenciaram a sua escolha profissional?

A conversa foi gravada e transcrita. A História é constituída por histórias individuais e coletivas. Nesse sentido, ela trabalha com documentos produzidos pela memória dos sujeitos.

Afirma Suárez (2008, p. 110):

Narrar histórias, nas quais os atores educativos encontramse envolvidos na ação, e interpretar essas práticas à luz das narrativas surgem como uma perspectiva peculiar de pesquisa […] que pretende reconstruir, documentar, questio-nar e tornar críticos os sentidos e compreensões pedagógicas que os docentes constroem, reconstroem e negociam quando escrevem, lêem, refletem. E conversam entre colegas sobre suas próprias práticas educativas..

O material analisado das narrativas de professores constitui-se uma analise documental na abordagem hermenêutica, na perspectiva de Gadamer (2007). A compreensão, para Gadamer, é um processo de abertura de horizontes, para encontrar no texto o sentido de algo que diz por si mesmo. Para o autor, toda compreensão tem caráter de aplicação, isto é, há uma pergunta que o texto quer responder. Os conteúdos de sentido se apresentam como algo presente no texto e que necessita ser descoberto (GADAMER, 2007).

Compreensão não significa necessariamente estar de acordo com o que ou quem se compreende, mas pensar e ponderar o que pensa o outro, isto é, os autores e teóricos da educação, os professores entrevistados, desdobrando-se o estudo em explicitações de conceitos, interpretações e apreensões. O falar acontece no dialogo em que é possível a comunicação e a compreensão, constituindo-se o movimento dialógico da construção de sentidos.

Assim, enfatiza-se, neste estudo, a importância da formação continuada, ressaltando o desafio, no processo do relato de experiências, bem como as narrativas das histórias de vida/entrevista registram a aprendizagem da vida pessoal e da vida profissional. As referências contidas, nas entrevistas narrativas e nos percursos formativos, porque contêm experiências de vida, revelam formas para compreender a formação, os saberes e as aprendizagens da profissão do educar no campo.

Fundamenta-se a análise das entrevistas dos sujeitos deste estudo, no conceito de biografização, na perspectiva de Delory-Momberg (2008); é um trabalho que partilha experiências formativas na vida-formação, engloba formas mentais, verbais, comportamentais, centradas no social e em histórias onde os indivíduos se inserem. Assim, supõe que a produção dos modos de vida cotidiana se encontra nas histórias de vida e nos modos de narração. Recordar a própria vida é fundamental para nosso autoconhecimento, fortalecendo ou recapturando a autoconfiança (DELORY-MOMBERG, 2008).

A pesquisa coloca em evidência a exigência metodológica de pensar as facetas existenciais da identidade, com uma abordagem que remete a múltiplas referências, que integram os diferentes registros do pensar humano (crenças científicas, religiosas, esotéricas).

Pergunta-se: em que tipo de fala (teoria ética) está fundamentada a prática em educação do campo? Que discurso e que ética estão sendo teorizadas e manifestadas em sala de aula? Porventura, serão discursos antagônicos de éticas reducionistas ou discursos que revelam uma prática excludente? Como construir a escola inclusiva, se, geralmente, professores e alunos são excludentes em suas interações e ferem a ética do diferente?

Como no processo metonímico: analisa-se a parte para se chegar ao todo. A partir dos relatos individuais, conhecem-se os aspectos culturais de determinadas regiões. As histórias individuais manifestam a história da comunidade e as representações sobre o indivíduo, fornecidas por ele próprio, são representações culturais.

O trabalho de pesquisa é realizado, a partir dos relatos de vida, efetuados na perspectiva de evidenciar e questionar heranças, continuidades e rupturas, projetos de vida, múltiplos recursos, ligados às aprendizagens da experiência. Estes relatos caracterizamse pela reflexão, a partir de uma descrição da própria formação. Eles permitem que se tenha a medida das mutações sociais e culturais nas vidas singulares e as relacionarem com a evolução dos contextos de vida do profissional de Educação do campo.

 A ética da alteridade

Alteridade é uma categoria ampla e utilizada em contextos diversos como: pedagogia, psicologia, sociologia, filosofia, economia, cristianismo, holismo e espiritismo, dentre outros. Etimologicamente, significa colocar-se no lugar do outro na relação interpessoal – com consideração, valorização e identificação – e dialogar com esse outro. A prática da alteridade está conectada aos relacionamentos entre indivíduos e grupos culturais, religiosos, científicos, étnicos, etc. Na relação entre os sujeitos, estão presentes aspectos holísticos da complementaridade e da interdependência, no modo de pensar, de sentir e de agir, onde o nicho ecológico e as experiências particulares são preservados e considerados, sem que haja a preocupação com a sobreposição, assimilação ou destruição dessas. Esta investigação privilegia o sentido social, econômico e também pedagógico da alteridade.

No final da década de 1980, Oliveira (1988) denunciava o Welfare State (Estado/Providência), que se constituíra, desde as décadas anteriores, no padrão de financiamento público da economia capitalista, com a contrapartida social: medicina socializada, educação universal gratuita e obrigatória, previdência social, seguro-desemprego, subsídios para transporte, benefícios familiares (quotas para auxílio-habitação, salário família, hoje podemos falar também das bolsas-família, bolsas-escola, crescentes nos últimos anos etc.) e dos subsídios para o lazer, que representam salário indireto e contemplam progressivamente desde as classes médias até o assalariado de nível mais baixo.

Esse modelo ainda inclui recursos para ciência e tecnologia, subsídios para a produção, sustentação da competitividade das exportações. Os juros subsidiados para setores de ponta fortalecem poderosos setores estatais produtivos, cristalizam a ampla militarização, sustentam a agricultura e o mercado financeiro e de capitais através de bancos e/ou fundos estatais. Tais juros intervêm na circulação monetária de excedentes, pelo open market, e mantêm a valorização dos capitais pela via da dívida pública, dentre outros.

Este pode ser sintetizado na sistematização de uma esfera pública onde, a partir de regras universais e pactadas, o fundo público, em suas diversas formas, passou a ser o pressuposto do financiamento da acumulação de capital, de um lado, e, de outro, do financiamento da reprodução da força de trabalho, atingindo globalmente toda a população por meio dos gastos sociais. […] O padrão de financiamento público do Estado-Providência é o responsável pelo continuado déficit público nos grandes países industrializados. É este padrão que está em crise, e o termo “padrão de financiamento público” é preferível aos termos usualmente utilizados no debate, tais como “estatização” e “intervenção estatal” (OLIVEIRA, 1988, p. 8)..

Ao falar da crise do Estado/Providência, de fundo ideológico, Oliveira (1988) indica como consequência, a “crise fiscal do Estado” (o que um ganha é o que o outro perde). Nos termos de O’Connor (1973), esta crise é fruto da disputa entre fundos públicos destinados à reprodução do capital e aqueles que financiam a produção de bens e serviços sociais públicos, já no contexto da internacionalização produtiva e financeira da economia capitalista.

Embora Oliveira (1988) considere a construção da esfera pública e a democracia representativa como irmãos siameses, reconhece que o Estado de Bem-Estar não deixou de ser um Estado classista, instrumento poderoso para a dominação de classe, razão pela qual não se confunde com o Estado marxista “comitê executivo da burguesia”; é o Estado que Poulantzas chamou de “condensação das lutas de classe”. Nesse contexto destaca-se como:

[…] característico da construção da esfera pública: a construção e o reconhecimento da alteridade, do outro, do terreno indevassável de seus direitos, a partir dos quais se estruturam as relações sociais. […] o resultado surpreendente é que a esfera pública e a democracia contemporânea afirmam, de forma mais peremptória que em qualquer outra época da história, a existência dos sujeitos políticos e a prevalência de seus interesses sobre a pura lógica do mercado e do capital (OLIVEIRA, 1988, p. 14).

As relações entre as classes sociais não mais buscam a anulação da alteridade, mas somente se perfazem numa per equação – mediada pelo fundo público – em que a possibilidade da defesa de interesses privados requer desde o início o reconhecimento de que os outros interesses não apenas são legítimos, mas necessários para a reprodução social em escala ampla. […] tanto a esfera pública como seu corolário, a democracia representativa, afirmam as classes sociais como expressões coletivas e sujeitos da história (OLIVEIRA, 1988, p. 12).

Nesse sentido, emerge a importância dos partidos políticos, cuja função, em tese, não é a de identificar-se com determinada classe social, mas sim, com modos de processar essa relação social de preservação da alteridade, a partir do que se fala de esquerda ou de direita. Para Oliveira (1988) a crítica da direita e a passagem à ação, na linha das políticas thatcheristas e reaganianas, dirigiu-se aparentemente ao Estado Moloch, embora seu objetivo fosse dissolver as arenas específicas de confronto e negociação. Isto ocorreu para deixar o espaço aberto a um Estado Mínimo, livre de todas as peias estabelecidas no nível de cada arena específica da reprodução social, o que considera uma verdadeira regressão. Assim, busca-se a manutenção do fundo público como pressuposto apenas para o capital e, não, como o discurso da direita afirma: redução do Estado em todas as arenas.

É típico da reação thatcherista e reaganiana o ataque aos gastos sociais públicos que intervêm na nova determinação das relações sociais de produção, enquanto o fundo público aprofunda seu lugar como pressuposto do capital: veja-se a irredutibilidade da dívida pública nos grandes países capitalistas, financiando as frentes de ponta da terceira revolução industrial (OLIVEIRA, 1988, p. 12). 
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Para além desse sentido socioeconômico e político da alteridade, Emmanuel Lévinas (1997) propõe uma ética que se opõe à ética individualista na qual se funda o anti-humanismo contemporâneo. Essa nova ética, da alteridade, volta-se para o outro, como prioridade sobre o eu, valorizando a subjetividade e a ontologia. Nesse contexto, a ética também é uma prática encarnada; é vida e não um discurso vazio; é interiorizada. A ética é incorporada e vivida, por isso criam-se laços que não se separam nem se rompem. O autor defende a ética como filosofia primeira, dialogando com filósofos como Husserl e Heidegger (apud LÉVINAS, 1997), ultrapassando-os, uma vez que ambos não abrem mão da supremacia do sujeito. Para Lévinas (1997), o movimento em direção à alteridade do mundo, ou à intencionalidade, habita o coração da consciência; a correlação sujeito-objeto dá-se no nível da consciência e vai além, pois deve vir da exterioridade, enquanto autêntica transcendência, a qual é manifestada no rosto do outro. A interioridade e a individualidade emergem da concreta relação do eu com um mundo exterior, concreto, real, palpável. Cada ser é totalmente separado do outro (psiquismo/egoísmo): daí, surge a necessidade do outro. Para que possa acolher o outro, é preciso estar mergulhado no mundo ma-terial, concreto, econômico, e ser indivíduo singular; é pela via da “alterpercepção”, do estar no mundo, que se torna possível perceber o outro. É aí que se sobressai a função social e pedagógica da escola.

Lévinas (1997) supera o intelectualismo e fala de uma intencionalidade da encarnação, do ser erigido como corpo sobre um mundo de felicidade e sensibilidade; para ele, a consciência não encarna, mas é antes uma desencarnação. A morada para o corpo é a referência para ele, para o mundo e do mundo para a morada. É a casa que propicia o acolhimento necessário para que a natureza humana possa ser representada e trabalhada (ser cidadã). É na família (familiaridade), com o choque do rosto, que irrompe a necessidade, o trabalho como ação do corpo, visando ao provimento material na exterioridade. Nesse processo, desejo e necessidade podem se confundir na busca do gozo (felicidade).

[…] o eu é antes de tudo constituído pela separação, é vivido antes que representado e erguer-se a partir de uma verdadeira exterioridade. Tal experiência, quando acumulada pode propiciar abertura para o entendimento de que o outro lhe falta. É da alteridade que irrompe um apelo heterônimo que o ser e o saber não podem circunscrever apelo que incessantemente transgride os parâmetros ontológicos pelo questionamento que introduz e pela exigência que exprime. O eu percebe-se criticado e investido pela alteridade irredutível, a partir daí será possível criar o humanismo do outro homem, com relações melhores e instaurar o humano como reino do Bem para além do ser (LÉVINAS, 1997, p. 15-16).

Nessa perspectiva, considera-se que a práxis pedagógica, em todas as áreas do conhecimento, está fundamentada na possibilidade de que esta seja a ética capaz de dar conta das relações humanas. Assim, a ética da alteridade é, na prática, o respeito pelo diferente, considerando que o rosto do outro nos convoca, nos interpela e nos convida, revelando no rosto do outro o seu infinito. O outro é decisivo para minha identidade; é no seu rosto que muitas vezes encontro a minha própria identificação. A prática da escola excludente choca-se com este paradigma: é preciso ensinar a apreender o sentido e o infinito no rosto do outro; esta é a ética da alteridade: os alunos aprendem a respeitar o outro, a ver e perceber o rosto do outro.

Educar hoje não é mais doutrinar e excluir o diferente, porque se centra em um comportamento e uma atitude ética de alteridade, de modo a buscar a superação dos preconceitos em favor da solidariedade e do profundo respeito ao diferente, ao outro. Trata-se de uma ética empática que estabelece relações de inclusão.

Nesse contexto, emerge outra categoria básica: a autoridade. Como pode um professor fazer juízo de valor e definir o que é e o que não é? Com que autoridade? Quando o seu discurso estiver embasado numa ética reducionista, certamente a sua prática pedagógica de ensino-aprendizagem será excludente do diferente. Todavia, se o seu discurso e vivência tiverem como parâmetro uma epistemologia da ética da alteridade, a sua prática pedagógica será libertadora em relação aos estereótipos, prejulgamentos, preconceitos e exclusão do diferente, pois sua prática dar-se-á face a face, olho no olho, tendo como resultado o respeito pelo outro como ser humano único e especial. Trata-se, antes de tudo, de uma questão de paradigmas. Os alunos percebem se o professor é coerente ou não, se está fazendo um bom trabalho ou se é um professor mal resolvido… Fazer uma reflexão e uma autoavaliação é fundamental para que o professor possa rever seu discurso, sua postura ética e, consequentemente, sua prática pedagógica. A coerência entre teoria e prática é fundamental na educação. O grande desafio é formar uma consciência crítica “autoconsciente” e “alterconsciente”, e estabelecer uma coerência entre a epistemologia da ética da alteridade e a prática desta ética no cotidiano das relações interpessoais, seja dentro da comunidade escolar ou nas diferentes esferas da própria vida. Desse modo, vem à tona a questão da autonomia e da “heteronomia”.

No contexto do Estado, a autoridade se constitui em categoria delicada. O Estado acaba assumindo uma autoria, um apossamento, um lugar de paternidade na sociedade. A identidade do Estado brasileiro, como requisito básico da sua autoridade, o tem desvelado como autoritário e como avalista de um modo especial de produção da existência. A negação do outro, da coautoria, torna-se cada vez mais presente no autoritarismo do Estado, no exercício dessa alteridade que pode ser dita como de classe. No plano individual do professor, a questão da alteridade também é delicada, sob a ótica da pretensa autoridade daquele que fala em lugar do outro.

É indiscutível o fato de que vivemos na companhia de outras pessoas e não sozinhos. A realidade é este mundo material, onde criamos a linguagem, a ética, a moral. Quando o outro se revela através do rosto e da linguagem, cabe-nos conservar ou rejeitar esta exterioridade. Esta forma de o outro buscar o meu reconhecimento, de manifestar-se de maneira incógnita, Lévinas (1997) chama de “enigma”. Nessa perspectiva, todo falar é enigma, que diz respeito à subjetividade, abertura original ao outro, base da ética da alteridade, na relação professor-aluno e aluno-aluno.

A ética da alteridade condena a segregação, a exclusão, os preconceitos e prejulgamentos, e contempla o acolhimento do outro, a solidariedade, a diversidade e a justiça, não apenas como um discurso retórico, mas como atitude moral de comprometimento com o diferente.

 Formação continuada, alteridade e biografização: as vozes dos sujeitos do semiárido

A história de vida narrada é, assim, uma mediação de conhecimento de si, em sua existencialidade, que oferece à reflexão de seu autor, oportunidades de tomada de consciência sobre seus diferentes registros de expressão e de representações de si, assim como sobre as dinâmicas que orientam a formação.

Isso fica evidenciado na narrativa da professora:

Eu nasci aqui mesmo; a casa de meu pai é aí; aqui no povoado. É aqui no povoado mesmo. Passei um bom tempo me arrastando pelo chão por causa da paralisia. Tive […] três anos de idade me deu paralisia. Aí voltei a ficar no chão, aí fiquei até meus doze anos me arrastando pelo chão. Aqui, me arrastando pelo chão. Depois com o passar do tempo, eu via minhas irmãs ia pras festas com meu pai, minha mãe dizia: – minha fia faça um jeito de caminhar, com uma muleta, que é isso que você faz também. E eu assim, tinha vontade e tinha medo de cair. Era. Depois aí começou, minha mãe mandou fazer a muleta e comecei a andar e caia muito, muito. Aí agora, eu digo: – Agora eu quero estudar! Aí meu pai: É mais estudar não, uma coisa dessas! Pra que estudar? Eu comecei a estudar assim, na idade dos 12 anos. Comecei a estudar com 12 anos. Meu pai não deixou antes. Aí ele, ah, mas não queria de jeito nenhum que eu estudasse. Minha mãe, não: – não minha filha vá! Aí me colocou no colo e foi levar no colégio. O colégio era ali, ficava próximo. Aí os primeiros dias ela foi me levar, depois aí eu ia com meus irmãos. Caía, aí só tinha um irmão meu, voltava e dizia: – eu vou pegar a bichinha, eu vou levantar […] (MOAP, 2006).

Convém destacar que a relação com o corpo constitui-se um pilar incontestável dos processos de formação e de criação coletiva do sentido, do conhecimento e da saúde; a relação com o corpo restitui as capacidades de aprender, adaptar e reagir. Portanto, desenvolver as competências perceptivas e de atenção, para aprender, compreender e agir, torna-se inevitável em um procedimento experiencial utilizado nas práticas biográficas.

Segundo Ricoeur (1995), o corpo é o lugar onde habita e se exprime esse grande querer, que não é fruto de determinismos. Ele é movido pela vontade a qual o anima e guia nas decisões. Ou seja, uma forma de vontade em movimento, uma vontade que move o corpo que age: moção voluntária provocada por um querer mestre de seu corpo; corpo que motiva o querer se possui esse corpo. A vontade anima o corpo e baseia o agir pensado.

Os alunos das escolas do campo têm muito interesse; existe interesse […] Só que falta um pouquinho de acompanhamento em casa dos pais eles vão para as reuniões, mas às vezes passamos uma tarefa e volta da mesma forma, de certa forma eu entendo porque tem pais que não foram à escola aí não tem como ajudar seu filho na tarefa aí a gente faz reunião pede para que eles ao menos incentive que aquela tarefinha que foi para casa ele sabe responder se os pais incentivarem em casa. A gente dialoga sobre a carência que a nossa escola tem a gente fica só debatendo assim se tivesse mais o meu aluno teria mais conhecimento poderia melhorar na educação só que aqui a gente tem que ser mais criativo tem que criar se tivesse mais material o meu aluno ia ter mais aproveitamento. Eu trabalho na prática não só na teoria porque quando eu era aluna gostaria que meu professor trabalha-se assim e não tive essa oportunidade, mas como Deus me deu essa oportunidade de ser educadora eu vou realizar meu sonho que eu gostaria de ter com os meus alunos que considero como filhos eles são bem cuidados, os pais amam. A educação do campo precisa de material para gente trabalhar com nossos alunos e para que o nosso aluno perceba que a escola é valorizada uma escola com vida porque uma escola que é organizada tem bons materiais para poder trabalhar, eles vão ficar mais a vontade, incentiva mais porque eles vão querer aprender a ter curiosidade. As escolas do campo estão muito carentes (GGA, 2007).

Na narrativa fica evidenciada a preocupação com as matérias externas para que ocorra uma formação adequada. No entanto, há menção aos aspectos internos de transformação dos sujeitos expostos às transformações provocadas pelo processo ensino e aprendizagem. Nesse sentido, cabe ressaltar a necessidade da compreensão do conceito de acompanhamento dos processos formativos. Passeggi (2008) recorre a Jeanne-Marie Rugira para falar da relação com o corpo e com a sensorialidade na história de vida: por uma abordagem somatopedagógica do acompanhamento. Questiona o lugar da relação com o corpo e com a sensorialidade, na perspectiva do acompanhamento e no seio de um processo de pesquisa e formação em intervenção psicossociológica. Nesse contexto, a autora fala da atenção à percepção, como um trajeto formador entre o ver e o agir, na intervenção psicossociológica. As ações de formar, intervir ou fazer pesquisa, em psicossociologia, consistem em percorrer caminhos que vão de possibilidades em possibilidades, caminhos que levam ao desvelamento do sentido, por meio da aprendizagem da atenção, da percepção, da reflexão, do diálogo e da compreensão de si, dos outros e do mundo. Para acompanhar as pessoas trabalhando no processo de mudanças, é preciso aprender e formar-se para ver (apreensão visionária da atividade).

Esse projeto de reeducação implica, para o professor, o esforço para fazer tudo para despertar, mobilizar e desenvolver a atenção dos seus estudantes. Desse modo, ele rompe com a atitude de abordar a sua experiência, no âmbito da realidade. Essa educação da atenção somente é possível, de fato, se o estudante for colocado em uma situação que não faça parte do seu cotidiano, porque são não naturalistas, porque não se parecem, de forma alguma, com aquelas da vida corrente. É através desse quadro extracotidiano que a pessoa aprende a captar, em tempo real, na sua experiência, a articulação entre o sentir e o pensar, quer dizer, a interação recíproca entre a percepção e o pensamento. Começa-se, então, a aprender a deixar-se pensar, ou deixar-se refletir em vez de pensar ou refletir a propósito de um conteúdo particular cuidadosamente escolhido.

Existe algo que marcou minha vida; fico muito emocionada principalmente esse ano com o programa onde estou agora ele exige muito de você, quando você é policiada procura fazer o melhor e as outras séries que eu já peguei no município era uma coisa aleatória você não tinha acompanhamento eu ia alfabetizar as crianças, mas não tinha como me nortear para indicar você deve fazer isso ou aquilo e agora sim. Logo quando entrei, eles acham quem você tem que ter 100% na questão da leitura com os alunos e eu fiquei imaginando 100% perfeito é muito difícil, mas por incrível que pareça tem 2 meses e a cada dia que saio da sala de aula eu saio emocionada porque tem crianças que estão avançando de uma forma que quando você ver que é você, porque o programa acredita muito em você professor agora eu já vi que se você quer consegue, mas nesse caso eu pensei que tinha que fazer milagre, mas os alunos se interessam e tem crianças que você ver nos olhos o pedido de socorro e quando você chega pelo menos na metade daquele ponto que você quer chegar você se sente tão gratificada. O primeiro passo é você ter ligação de afetividade com seu aluno porque são crianças com idade/série complicada são crianças tipo as escampadas aí joga lá para o programa que segura a barra você já entra na sala de aula com aquela visão as crianças escampadas da escola, eu já entrei com medo, mas quando você tem aquela relação de efetividade tudo se acalma o primeiro passo é por aí, através disso você consegue desenvolver tudo e muito mais. Tem crianças que são carentes de um abraço, pegar de mão, olhar carinhoso […] (JPF, 2007).

De fato, a ação e a interação, no cerne do trabalho biográfico, representam um caminho para sentir-se e compreender-se. O procedimento biográfico passa por uma pedagogia corporificada. Uma prática que visa à relação do sujeito com sua experiência, seu projeto e seu processo. A relação com o corpo sensível bem como a atualização das capacidades de atenção, perceptivas e reflexivas constituem as condições prévias à enunciação biográfica. A relação com o seu corpo e com o movimento interno é o suporte primeiro do processo de transformação e de prática biográfica na formação, na pesquisa e na intervenção. A relação com o corpo dá uma consciência em movimento. Uma consciência que traz em si um potencial de percepção, de ação, de qualidade de expressão que pede apenas para se manifestar, bastando que uma atenção treinada se detenha sobre ela.

Todo lugar tem um menino que é diferente. Mas aí com jeito, a gente vai e leva […] certo, certo. Eles estudam e ficam na mesma coisa […] É tanto que às vezes, se em casa ele ouviu uma coisa diferente, ele diz: – Não, olhe, não é assim não mãe. É assim que minha professora disse… Não é assim não, a gente tem que fazer assim […] Outro dia mesmo eu avisei que não podia perder aula, porque se perde aula, aí… O dinheiro da bolsa escola […] Perde, perde a bolsa escola. Aí um chegou em casa falou, todos chegaram em casa falaram aos pais, aí teve um […] Teve um que chegou e falou: – não, não é assim não. Você vai pra roça e não precisa ir pra escola, não é assim não, isso é conversa dela. Ai ele disse: – não pai, não é assim. Na escola a professora falou que nós temos que ir pra escola, não pode perder, porque se nós perder, vai também perder a bolsa escola nossa (MOAP, 2006).

A abordagem biográfica permite, nos dois sentidos do termo, “conhecer com a experiência”. Para Passeggi (2008), o sujeito é considerado “ator de sua vida”, construindo seus conhecimentos e suas representações, em resposta às situações problemáticas encontradas; a via privilegiada é a da sua apropriação da capacidade de produzir sentido, interrogando-se sobre si mesmo e sobre a sua situação, via trabalho reflexivo, permitindo-lhe o trabalho de narração e de troca a partir de sua história pessoal. Nesse sentido, o mover no coração da ação e do diálogo é uma via para a compreensão do outro e de si.

Bourdieu (2001), nesse sentido, discute a possibilidade de “ilusão biográfica”, interrogando-se sobre a pertinência da abordagem das histórias de vida. Sublinhase o fato de que os atores sociais estão, geralmente, cegos em relação às determinações sociais que agem sobre eles e à necessidade de encontrar novas formas de intervenção, para tentar melhor compreender os problemas de violências individuais, coletivas, organizacionais e societais com as quais estamos, atualmente, confrontados. É preciso que o pesquisador esteja atento.

É a função social hoje da escola […] A sociedade tem participação geral de dizer o que principalmente no interior a comunidade participa mais porque sim dizendo o que precisa o que ta faltando então eles trazem muita coisa diferenciando escola participa mesmo, a comunidade está sempre participando colocando o que precisa que ta faltando e o que ta deixando de faltar tudo eles coloca. Algumas coisas a gente aqui como secretaria a gente resolve outras não. Porque ai as coisas que não depende da gente a gente não tem como resolver mais o que depende da gente resolve. Então a função da escola juntamente hoje na sociedade é muito pouco principalmente aqui na sede certo, mais a função da escola juntamente com a sociedade é trazer a sociedade para dentro da escola para participar pra participar mais pra ficar mais perto do aluno, incentivar também os seus filhos tudo isso, mais o que a secretaria pode fazer pela escola a gente tem feito. (GPR, 2008)

A evasão tem vários fatores: as pessoas que estudam (EJA) na escola de jovem e adultos muitos deles evadem por conta da chuva eles não volta mais, mais tem muitos alunos que morram aqui mesmo na sede e que evade por conta de já serem alunos é de uma faixa etária já mais elevada e serem de terem reprovado varias vezes na escola normal no ensino normal e por algum motivo e eles sempre não sei por que eles desistem mais o fator principal muitos é assim porque mora no interior e quando começam chover ai eles desistem eles não vem, época de plantio algumas coisas assim ai deixa de estudar por conta disso (GPR, 2008).

Existe uma política desenvolvida para as condições da realidade. Mas existe pras condições agora ta colocando um projeto para os quilombolas que ainda não esta sendo praticado, mas ta sendo colocadas em projeto para os quilombolas, as escolas dos quilombolas também agora já vai começar a ser construído na região dos quilombolas e acredito que este Projeto já deve ta sendo feito agora, mas projeto vai ficar para o próximo gestor (GPR, 2008). Sobre a política de convivência com o semiárido não sei se deu certo… por exemplo, este eu não acompanho, mas conheço, por exemplo, há preparação dos professores entendeu? Hoje 90% têm nível superior isso então a melhora foi em função de tudo isso né é a preparação de professore s escolas melhores, foi criado o ensino fundamental e médio é foi criado o ensino de base que não tenha, nos temos também professores na faculdade entendeu e modo geral melhorou bastante. Entendeu! (SPR, 2008).

Escolhi ser professora porque eu já a exercia antes mesmo de fazer nível médio por necessidade da escola pelo povoado ser pequeno tem muita necessidade de professores fui contratado pela prefeitura e senti a necessidade de aprimorar mais os meus conhecimentos na área quando comecei trabalhava com o prézinho e depois a gente vai percebendo que precisa acompanhar o ritmo do global aí fui para o superior. O professor do campo, ele é esforçado, na sua formação existe muito obstáculo no sentido do interior, às vezes a gente quer até ter outras opções, mas não encontra aqui mesmo é Pedagogia e Pedagogia você tem que encarar gostando ou não quando você se identifica na área… bom quando não você tem que fazer no sentido financeiro porque é pegar ou largar, mas a formação só depende do esforço de cada um (JPF, 2007).

A professora do campo é muito importante; eu acredito que o professor do campo tem assim na verdade uma sabedoria de lidar com aquelas crianças que elas são muito ricas em aprendizagem em experiências eles tem a vivência deles quanto nós estamos na verdade saindo da zona urbana para aprender com eles também a gente não vai apenas ensinar vamos também aprender com os nossos alunos (JBO, 2007).

As representações sociais e histórias de vida de professores da educação básica de escolas do campo de Sergipe permitem o aprofundamento do conhecimento a respeito da sua formação, de suas práticas e influências na formação do cidadão do campo. São também indicativos das implicações da sua convivência com imposições do modo capitalista de produção da existência, muitas vezes, em detrimento da dignidade humana e dos valores ontológicos e sociais do trabalho, não obstante permitam perceber a categoria da alteridade por parte dos professores fortalecendo-se em seu ideário e na prática pedagógica.

A autobiografia docente é sempre uma avaliação de si e dos outros, constituindo-se importante recurso na investigação sobre a formação de professores. As histórias dos homens e mulheres podem ser contadas de maneiras diferentes e referentes a espaços e tempos distintos, indicando sempre um conjunto de contribuições à formação dos indivíduos como seres particulares e ao mesmo tempo genéricos (questão da genericidade), trazendo à tona tradições e as influências das tecnologias socialmente necessárias.

Na modernidade, acabamos deixando o passado para trás, ignorando sua influência na construção do presente e devir. A amostra de retratos de si traz fragmentos das autobiografias, narrativas de professores da educação básica de escolas do campo, coletadas mediante investigação em curso desde 2006, revelando aspectos peculiares da formação de professores. Tais peculiaridades relatadas advêm de outras experiências de vida, de participação em outras instituições sociais, de militância social, ou até da atividade exercida como professores leigos.

Estes relatos peculiares ajudam a sustentar o convívio na sala de aula, sob os pilares de um paradigma que oscila entre o velho e o novo. As imagens tecidas nas narrativas trazem à tona momentos que ocorrem dentro e fora do espaço acadêmico; são histórias de vida, vividas, que ajudam a refletir sobre as mudanças ocorridas na vida, de um modo geral, e, em particular, na vida do professor da educação básica das escolas do campo.

Nas narrativas analisadas, observa-se o quanto há de criança oculta no próprio professor cuja identidade está sempre em formação e como educador, na perspectiva do eterno aprendiz. O professor também precisa de cuidados e educação continuada. Segundo Ostetto e Rosito (2008), para um melhor acompanhamento das crianças, no ensinar-aprender, é importante para o adulto/educador entrar em contato com sua criança oculta, o que é verdadeiro também no campo. No processo educativo-formativo há uma necessidade do adulto/educador reconhecer e cuidar da sua criança oculta, havendo uma junção do passado e presente para o futuro.

A relação homem-universo parece pouco refletida nessas narrativas; a valorização da contextualização evidencia-se em graus diferenciados. A condição humana e a compreensão da relação das partes com o todo e a perspectiva de uma educação planetária parecem ainda pouco presentes no cotidiano da sala de aula. Há poucas menções à conscientização ecológica, visando a uma educação para o melhor relacionamento com o meio ambiente. Esta conscientização seria conveniente em ambos: o campo e a cidade. Pineau (2008) fala da possibilidade de transformar miséria em grandeza; atualizar relações ecossimbióticas do cotidiano; nessa perspectiva o aprender a habitar requer a consciência de que a Terra carece de cuidados para permanecer habitável, sem catástrofes, com o protagonismo vital dos sujeitos em seu cotidiano, ou seja, pelo desenvolvimento aperfeiçoado de autobiografias ambientais.

Nessa perspectiva, pode-se dizer que professores e alunos da educação básica das escolas do campo precisam apreender o risco do planeta inabitável, para facultar a emersão da busca progressiva e consensuada de soluções para resolver os problemas dessas contraditórias relações homem – universo, aprendendo de modo continuado como habitar a Terra sem causar danos a ambas as partes.

As entrevistas narrativas ampliaram a própria formação dos sujeitos pesquisadores, professores abordados, na medida em que proporcionaram a avaliação e a reconstrução de experiências pela via da análise da biografização. Adquire-se expe-riência, a partir de diálogos construídos com questões de formação, a partir das lembranças de escolarização própria e dos alunos. Assim, a entrevista narrativa funcionou como aprendizagem, na trajetória pessoal de cada um, intercambiandose, necessariamente, experiências, aproximando o trabalho didático de pesquisa e remetendo os alunos à percepção de que magistério é uma aprendizagem continua.

A investigação em andamento vem confirmando o que Souza (2008a) aponta: que a biografização é um trabalho que partilha experiências na vida e formação, englobando formas mentais, verbais e comportamentais, centradas no social e em histórias onde os indivíduos se inserem. Dessa forma, a construção biográfica traz conceitos como biografemas que são eventos factuais, mas interagem e articulam estratos variados da experiência biográfica. Para Souza (2008a), a produção dos modos de vida cotidiana encontra-se nas histórias de vida e nos modos de narração. Recordar a própria vida é fundamental para o autoconhecimento, fortalecendo ou recapturando a autoconfiança. A formação é um aprendizado ao longo da vida. As histórias de vida e as entrevistas narrativas elucidam aprendizagens da vida pessoal a profissional. As referências contidas nas entrevistas narrativas e nos modos de formação revelam formas para compreender a formação, os saberes e as aprendizagens da profissão, por conterem experiências de vida e da sua formação.

Aprender a compreender uma subjetividade em ato com algumas condições pedagógicas é uma oportunidade de se perceber, diferentemente, de compreender os outros de uma maneira verdadeiramente renovada, sobretudo, constantemente renovada. É nesse contexto das narrativas autobiográficas, de possibilidade de olhar para si para olhar o outro, que se percebe o sentido da Ética de alteridade, visando à reeducação da atenção, o aprendente vai melhor ver, ouvir, perceber e captar elementos que até então não estavam acessíveis à sua consciência, porque não eram percebidos.

A ética da alteridade tem seu pressuposto fundamentado na heteronomia, sem a exclusão da autonomia; o que importa é a relação ética que fundamenta as ações e o comportamento diante do rosto de outrem e dele para o nosso. O rosto do outro, do excluído, é grito e súplica e é, ao mesmo tempo, exigência e manifestação ética. O rosto do outro nos convoca à alteridade na qualidade de filosofia primeira. É um convite para ouvi-lo. È uma questão muito mais de saber ouvir do que de dar voz ao outro. Para Lévinas (1997), como filosofia primeira, a alteridade se manifesta na ética em sua mais pura essência e forma. Nessa perspectiva, a educação como direito humano, independente do local ou zona de residência, é universal.

A pessoa vai descobrir uma melhor escuta, observação mais aguçada e, sobretudo, uma relação com seu corpo que não suspeitava. Penetra em uma esfera de atividade subjetiva desconhecida, da qual estava privada: descobre que existe em seu corpo. Segundo Josso (2008), existem tantos territórios acessíveis aos sentidos, quanto invisíveis, nos quais as representações simbólicas dão sentido, como topologias experienciais.

Os relatos de vida centrados na formação estão, geralmente, associados a questões de pertencimento e, por consequência, a questões de identidade. Os relatos de vida, centrados sobre a perspectiva das experiências formadoras e fundadoras de nossas identidades em evolução, de nossas ideias e crenças mais estabilizadas, de nossos hábitos de vida e de ser com relação a nós mesmos, aos outros, ao nosso meio humano e natural, têm essa particularidade de serem territórios, por vezes tangíveis e invisíveis, como abertura à alteridade, compreendo-se como ser ético, como ser de alteridade.

Educação e convivência com o semiárido: avaliação do impacto à política pública

Embora preliminar, a investigação realizada, identificou-se ressonância da Educação Contextualizada, como política de convivência com o semiárido sergipano, nos próprios protagonistas e até nas escolas, mas não na condição socioeconômica do município e nas representações dos atuais atores da política municipal de educação. Desse modo, a Educação Contextualizada não se mostrou consolidada no município.

Para ser consistente e sustentável, o desenvolvimento local deve mobilizar e explorar as potencialidades locais e contribuir para elevar as oportunidades sociais, as viabilidades e a competitividade da economia local, assegurando a conservação dos recursos naturais locais, pois estes são vistos como condição para a qualidade de vida da população. O desenvolvimento local propicia mudanças na esfera pública local, construindo uma relativa autonomia das finanças públicas e acumulação de excedentes para investimentos sociais estratégicos no local, contribuindo em ações efetivas de combate ao subdesenvolvimento e ao atraso de localidades periféricas, promovendo uma mudança social no território. Referindo-se à estrutura do desenvolvimento local, Buarque (2002) o organiza em três pilares: organização da sociedade, contribuindo para a formação de capital social local; agregação de valor na cadeia produtiva; e reestruturação e modernização do setor público local, como forma de descentralização das decisões e elevação de eficiência e eficácia da gestão pública local.

Souza (2005) define sustentabilidade como proposta de convivência com o semiárido, que articula as seguintes dimensões do desenvolvimento sustentável: a) social – qualidade de vida, redução da pobreza e da miséria; b) cultural – produção de novas formas de relação que os homens e mulheres estabelecem entre si, e com o meio ambiente natural e social; c) econômica – geração e distribuição de renda mediante alternativas de produção apropriada e solidária; e d) ambiental – uso sustentável, conservação, preservação de recursos naturais, principalmente do bioma caatinga e política -, fortalecimento da sociedade civil e participação cidadã na formulação e conquista de políticas públicas.

As estratégias de convivência relacionam-se a um processo de aprendizagem social, através de um novo olhar sobre o semiárido, considerando suas particularidades e potencialidades. Elas possibilitam que a escola seja, efetivamente, um espaço de construção/distribuição de conhecimentos, de produção de novos valores, de divulgação/utilização de tecnologias sociais e ampla convivência. Há a construção de uma nova ética no relacionamento dos homens e mulheres, visando a tornar a escola um espaço mais humano e de experiências mais significativas que contribuam para a melhoria da qualidade de vida do homem/mulher sertanejo (a).

Essa ideia, além de humanizar a escola, na perspectiva de garantir às crianças, aos jovens e aos adultos, o direito de aprender entre si e com a natureza, contribui para a formação de pessoas mais propositivas e humanas, na perspectiva da alteridade. Em tese, a estratégia de convivência ajudará os alunos, os professores e as famílias a compreenderem a importância do meio ambiente, partindo para uma visão crítica em relação à preservação da natureza, à valorização do trabalho agrícola e sua cultura. O objetivo é que haja uma melhor convivência com o semiárido, além de o desenvolvimento da comunidade e de sua qualidade de vida. Para que a escola possa desempenhar sua função pedagógica, social e política, o instrumento, por excelência, de planificação/execução/avaliação é o currículo, uma vez que se constitui na espinha dorsal da educação escolar. A assunção dessa premissa significa ter a percepção de que a escola é palco de permanentes disputas, confrontando-se, desde a construção à execução e avaliação curriculares, as forças conservadoras com as forças do progresso. Porque há a clareza da insuficiência das propostas educacionais mais conservadoras, emergiram, nos últimos anos, novas abordagens e categorias centradas em novos paradigmas; assim desenvolvem-se diversas perspectivas analíticas e teóricas como: feminismo; estudos sobre gênero, raça e etnia; estudos culturais; pós-modernismo; pós-estruturalismo; pós-colonialismo; diversidade e contextualização, dentre outras.

Há uma nova concepção de currículo contextualizado, que reconhece as diferenças e busca abordagens mais integradas e ecossistêmicas, considerando especialmente a obsoletização dos antigos formatos territoriais e a produção de novos territórios (inclusive existenciais), proporcionados pelos novos meios técnicos e por aquilo que Santos (2001a, 2001b) chama de novas verticalidades. Trata-se de um desafio que posiciona a escola entre os instrumentos mais importantes para a promoção do desenvolvimento e da cidadania. Esta perspectiva é, atualmente, qualificada como desenvolvimento sustentável, embora já sejam reconhecidos os desvios dessa nova prática quando a reduz à perspectiva ecológica e a aspectos meramente instrumentais e periféricos, como oficinas de reciclagem de papel.

A Educação Contextualizada, entendida como política pública, é um convite à construção pedagógica; com um campo curricular desafiador, cujo eixo é o “ambi-ente” onde vivem e se desenvolvem as novas gerações, a alteridade e a articulação nas escolas do semiárido brasileiro para além da dicotomia urbano – rural.

A preocupação atual com a sustentabilidade da agricultura no semiárido brasileiro e nordestino, em particular, insere-se no contexto das preocupações das diversas nações. Existe a necessidade de ampliação da agricultura e da sustentabilidade de práticas agrícolas, em ambientes semiáridos, considerando que áreas agricultáveis, em regiões de clima ameno, solos férteis e produtivos e com água em boas quantidade e qualidade tornam-se mais raras. “Agricultura sustentável é o manejo bem sucedido de recursos para a agricultura, de modo a satisfazer as necessidades humanas em transformação, mantendo ou melhorando, ao mesmo tempo, a qualidade do ambiente e conservando os recursos naturais” (GUEDES, 2007, não paginado).

Os investimentos destinados ao Nordeste resultaram no crescimento econômico mais rápido da região, nas últimas décadas, embora não tenha alcançado um nível de desenvolvimento que ofereça à sua população melhores condições e possibilidades de vida. Ocorreu uma considerável redução da mortalidade infantil e dos níveis de pobreza; entretanto, os benefícios não chegaram ao alcance de todos. A chamada “indústria da seca” serviu aos interesses de políticos e empresários, sem que fossem solucionados os desequilíbrios sociais com a alta concentração de renda e os problemas infraestruturais (O NORDESTE…, 2002, p. 9). De acordo com Albuquerque (1999), as políticas governamentais mais conhecidas para resolver os problemas do Nordeste giraram em torno da “emergência”, como o combate à seca e políticas assistenciais. Tais políticas públicas pautavam-se na lógica de que a seca exigia medidas de combate e de que a miséria era gerada por ela, concentrando-se nas cestas básicas, frentes de serviços e oferta da água, via carro-pipa. Todas essas ações, caracterizadas pela emergência e pelo clientelismo, constituem-se na prática em instrumentos eleitoreiros e de manipulação política, nunca tendo suprido verdadeiramente as necessidades da região, firmando nas populações uma dependência cada dia maior dessas ações que não dão sustentabilidade às comunidades, as colocam à mercê da manipulação dos que detêm tais benefícios. Assim, não se registraram , nos planos, metas e ações do governo brasileiro, ao longo dos anos, uma preocupação centrada no semiárido que possa estar implementando políticas sociais que refletissem em resultados significativos para toda a população.

Essa concepção de convivência com o semiárido implica a reconstrução de valores, princípios e prioridades que orientem novas concepções de desenvolvimento sustentável, que dependem, em grande parte, de mudanças de conhecimentos e atitudes por parte da população e, principalmente, dos governantes, construindo e implementando políticas de educação inclusiva e contextualizada que garantam acesso, qualidade e respeito às diversidades do semiárido. É nesse espaço que a escola/educação adquire uma importância significativa: a de estar colaborando com a formação desses valores e o estabelecimento de prioridades para a região semi-árida.

 Considerações finais

Como resultados parciais da investigação já se identificam na política pública estudada na área da educação do campo e, especialmente, nas práticas e representações dos professores das escolas do campo, sinais da alteridade (um dos elementos imprescindíveis à superação da dicotomia cidade/campo e garantia da educação como direito humano, de modo a contribuir para o desenvolvimento científico, tecnológico e social do estado, da região e do país em favor do sujeito de direitos) no seu âmbito embora sem eco nas demais instâncias.

Concluímos, a título provisório, que foram constatados entre a política de educação que serviu de objeto de investigação e o processo de reestruturação produtiva local e regional, uma insuficiente sistematização da experiência de política educacional alternativa, bem como ausente esteve o processo de planejamento estratégico no âmbito municipal/ regional/estadual que pudesse nortear e testemunhar o esforço desenvolvido no período de 1996 a 2004, em um dos municípios do semiárido sergipano.

Certas dos limites da pesquisa e do seu caráter não conclusivo, até pela inviabilidade de contemplar todos os questionamentos que o desenvolvimento do tema tem feito emergir, pretendemos que seja ela um referencial modesto, mas significativo que possa vir a representar ponto de partida para outras investigações, no sentido de elucidar as questões pertinentes à educação inclusiva, especialmente sobre a educação do campo, considerando sua função social e política, bem como as concepções político-pedagógicas vigentes nessa área.

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Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/ensaio/v19n70/v19n70a10.pdf
Acesso em 11/06/2012

O colonialismo que contamina toda nossa realidade, ou a incômoda atualidade de Frantz Fanon

Posted in Educação, Sociedade with tags , , , , , , , , , , , , , , , , on dezembro 11, 2011 by projetomuquecababys

By Maurício Campos

Tudo pode ser explicado ao povo, desde que se queira realmente que ele compreenda (Fanon, Os condenados da Terra)[1] No dia 6 de dezembro completaram-se exatamente 50 anos do falecimento de Frantz Fanon. Também neste ano (2011) celebra-se o cinqüentenário da publicação de seu livro mais importante e famoso, “Os condenados da Terra”, que lhe rendeu uma celebridade mundial póstuma impressionante, durante todo o restante da década de 60 e boa parte dos anos 70 do século passado. Passada essa fase pop, Fanon foi um tanto esquecido, e mesmo relegado como mais um ícone superestimado daquelas décadas rebeldes. Mas, na maior parte do mundo, foi sendo aos poucos redescoberto e estudado como uma importante referência de pensamento. Na área acadêmica, é bastante valorizado por pesquisadores e profissionais da psicologia e psiquiatria críticas e, principalmente, naquela área multidisciplinar que desde os anos 80 denomina-se pós-colonialismo: Homi Bhabha, talvez a figura atualmente mais relevante nesse campo, refere-se a ele direta e insistentemente. Contudo, o mais interessante (com certeza o próprio Fanon, com seu caráter militante, acharia mais interessante), é que a obra de Fanon (inseparável de seu exemplo pessoal enquanto profissional – psiquiatra – e militante revolucionário) vem sendo re-estudada, valorizada e utilizada por ativistas e militantes sociais de várias partes do mundo. Só para citar um exemplo muito significativo, Fanon é uma das referências de pensamento principais (se não a principal) do maior movimento urbano de base pós-apartheid na África do Sul, a Abahlali base Mjondolo[2]. Não é por acaso que por todo o mundo, na África, França, Cuba e outros lugares, eventos públicos e não simplesmente acadêmicos celebraram e celebram o cinqüentenário[3]. Isso é bastante impressionante, em se tratando de um militante que em vida não chegou a ser uma figura política muito pública, e de um intelectual que a leucemia levou antes dos 40 anos de idade, e do qual só foram publicados dois livros e duas coletâneas (uma póstuma)[4].

Aqui no Brasil, entretanto, os 50 anos da morte de Fanon têm passado quase desapercebidos: só consegui descobrir informações sobre duas atividades acadêmicas modestas[5], e nada sobre eventos organizados pelo movimento negro ou outros movimentos sociais, embora os dois livros de Fanon tenham recebido novas edições brasileiras recentemente[6]. Esse defasamento (para não falar atraso, que é o termo mais apropriado) do Brasil (isto é, de suas academias, seus movimentos sociais, etc) em relação a tendências políticas e intelectuais importantes que se verificam no mundo, não é exatamente uma surpresa para mim. Mas, para além da indigência e do desânimo culturais, no âmbito do pensamento e movimentos emancipatórios, em que nosso país está mergulhado há algum tempo (e que já está merecendo uma forte e urgente sacudidela), creio que, no caso específico de Fanon, a indiferença em relação ao seu cinqüentenário tem alguma continuidade com a fraca recepção de sua mensagem aqui no Brasil, mesmo na “fase pop”: num bem cuidado artigo de 2008[7], o professor da USP Antonio S. A. Guimarães mostra que, até o final da década de 60, conhecia-se de Fanon pouco mais que o prefácio de Sartre a Os condenados da Terra, e que só a partir do exílio pós AI-5 em outros países, acadêmicos (como Octávio Ianni) e militantes do movimento negro (como Abdias Nascimento) passaram a ter Fanon como importante referência. A situação melhorou nos anos 70, mas foi somente no movimento negro que Fanon tornou-se objeto de estudo e crítica coletivas, esforço que teve poucas repercussões mais amplas, já que a esquerda e a academia brasileiras sempre consideraram com desdém as contribuições desse movimento. Entretanto, mesmo esse esforço e interesse por parte do movimento negro não parece ter gerado contribuições significativas e eventos comemorativos sobre o cinqüentenário, e foi só por isso (e, na verdade, por ter sido forçado a um período de repouso em casa devido a uma recente cirurgia) que me aventurei a escrever o presente artigo. Fanon é demasiado importante, e o que ele tem a dizer interessa demais ao Brasil, para que deixemos passar totalmente “em branco” (em mais de um sentido dessa expressão) os 50 anos de sua morte e de publicação da sua obra mais influente.

Negro

Fanon nasceu em 1925 na Martinica, colônia francesa nas Antilhas, cuja população era (e continua sendo) formada em sua grande maioria por descendentes de escravos africanos. Mas Frantz pertencia à minoria dessa população negra com algum recurso para obter melhor educação e sonhar em ser uma elite afrancesada. O Caribe de língua francesa e inglesa era, desde a época de Marcus Garvey e George Padmore, pelo menos, berço de lideranças políticas e intelectuais que tiveram importância mundial para o desenvolvimento do pan-africanismo e das diversas correntes de resistência da Diáspora Africana. Fanon teve o privilégio de ter como professor e amigo Aimé Cesaire, criador do termo e pioneiro do movimento da Négritude. A influência de Cesaire sobre Fanon é sempre visível, não só em suas idéias, mas também em seu estilo literário, sua prosa vívida e até mesmo lírica, que não é uma parte menor da força de seus escritos. Foi como negro procurando encaixar-se no mundo branco e no suposto universalismo da cultura ocidental que Fanon teve suas primeiras iniciativas políticas (alistou-se para lutar contra os nazistas na Europa, por exemplo) e foi levado às primeiras reflexões críticas. Após ir à França mais uma vez, agora para estudar psiquiatria, escreveu em 1952 Pele negra, máscaras brancas[8], hoje considerada “obra clássica do pensamento sobre a Diáspora Africana, do pensamento psicológico, do pensamento da descolonização, da teoria das ciências humanas, da filosofia e da literatura caribenha”[9]. Mais especificamente, esse livro é considerado obrigatório como reflexão sobre a identidade negra e bastante valorizado pelos movimentos negros atuais, por ser uma reflexão profunda sobre como o racismo existe mesmo onde ele é negado, desde que perdure a subjugação social de uma etnia por outra, e sobre como a ideologia colonial em geral é interiorizada (ou, nos termos de Fanon, epidermizada; ao preço não só de aceitação da submissão social, mas de inúmeras patologias individuais) pelo indivíduo negro/colonizado.

 Pele negra foi um marco também na vida de Fanon, sinalizou o fim de suas tentativas de se ajustar à sociedade branca/colonial e o início de suas buscas por uma intervenção radical na realidade, que o levaria à militância revolucionária. Ele voltou a escrever várias vezes sobre racismo, mas cada vez mais visando um público mais amplo: Pele negra ainda é claramente dirigida àquela minoria negra capaz de sonhar (e neurotizar-se) em ascender/ajustar-se dentro da sociedade branca[10]. Mas, em todo o caso, seria um erro ver em Fanon um precursor de certa abordagem “identitária” pós-moderna, alguém que, mesmo tendo denunciado de forma radical o falso universalismo e humanismo do europeu/branco/ocidental, teria aberto mão de qualquer perspectiva humanista e universalista. Em Pele negra há várias passagens que apontam para as palavras seguintes, na conclusão do livro:

“Eu, homem de cor, só quero uma coisa:
Que jamais o instrumento domine o homem.
Que cesse para sempre a servidão do homem pelo homem.
Ou seja, de mim por um outro.
Que me seja permitido descobrir e querer bem ao homem, onde quer que ele se encontre.
O preto não é. Não mais do que o branco.

Todos os dois têm de se afastar das vozes desumanas de seus ancestrais respectivos, a fim de que nasça uma  autêntica  comunicação. Antes de se engajar na voz positiva, há a ser realizada uma tentativa de desalienação em prol da liberdade.”[11] O que poderia ser interpretado como uma vacilação, uma imaturidade, um resquício de “modernismo” em Fanon, é contudo desenvolvido de forma bem mais precisa, por exemplo, na importante intervenção (de 1956) Racismo e Cultura [12]: “O fim do racismo começa com uma súbita incompreensão. A cultura espasmada e rígida do ocupante, liberta, oferece-se finalmente à cultura do povo tornado realmente irmão. As duas culturas podem enfrentar-se, enriquecer-se. Em conclusão, a universalidade reside nesta decisão de assumir o relativismo recíproco de culturas diferentes, uma vez excluído irreversivelmente o estatuto colonial [13].” (grifo meu) Pois o problema está, primária e originalmente, no sistema colonial, que está tão entranhado no mercado mundial há mais de 500 anos, que o racismo que o acompanha parece existir independentemente, mas na realidade: Não é possível subjugar homens sem logicamente os inferiorizar de um lado a outro. E o racismo não é mais do que a explicação emocional, afetiva, algumas vezes intelectual, desta inferiorização[14].” Desde as revoluções anti-coloniais do século XX o racismo teve que metamorfosear-se, buscar outros discursos para justificação de desigualdades/submissões persistentes e às vezes crescentes, mas continua de pé[15] tanto quanto o também metamorfoseado colonialismo, e para a luta contra ele as indicações e o exemplo de Fanon continuam indispensáveis. 

Psiquiatra

Fanon escolheu a psiquiatria como profissão, e nos seus estudos na França teve sorte semelhante a que teve nas suas aulas com Cesaire na Martinica: foi aluno e orientando do psiquiatra catalão Francesc Tosquelles, um exilado da guerra civil espanhola militante do POUM, partido marxista que foi perseguido tanto por fascistas como por stalinistas. Tosquelles desenvolveu experiências revolucionárias e bem sucedidas na instituição em que trabalhou, defendendo o papel da cultura, ou seja, do ambiente social, no diagnóstico e terapia das patologias. Fanon dedicou-se apaixonadamente à psiquiatria, mas sempre pensando em utilizá-la em favor do negro/colonizado, não parece que em algum momento pensou em estabelecer-se permanentemente como clínico ou pesquisador na França, por exemplo. Certamente inspirado por sua convivência com Tosquelles, tentou implementar grandes mudanças no funcionamento do Hospital Psiquiátrico de Blida-Joinville, na Argélia, onde trabalhou como médico-chefe a partir de 1953. Sua experiência como negro e sua orientação profissional logo levaram-no a questionar os limites de uma ciência/terapêutica pensada para a realidade européia. Já em Pele negra, máscaras brancas questiona diversas vezes a psicanálise de Freud e Jung, uma vez que “a alienação do negro não é apenas uma questão individual. Ao lado da filogenia e da ontogenia, há a sociogenia. De certo modo, […] digamos que o que pretendemos aqui é estabelecer um sócio-diagnóstico[16].” Mas Fanon termina por concluir que seus esforços tinham resultados muito limitados na cruel realidade da guerra colonial que se travava na Argélia, e decidiu trabalhar em tempo integral como militante da Frente de Libertação Nacional (FLN), junto a qual já atuava clandestinamente desde 1954, comunicando publicamente sua decisão através da divulgação de sua carta de demissão em 1956[17]. Antes disso, entretanto, trabalhou no hospital tanto com torturadores como com suas vítimas, bem como com combatentes de ambos lados e com a população civil vítima das confrontações e da “pacificação” dos colonialistas. Reuniu um material que divulgou em publicações especializadas, buscando chamar a “atenção dos psiquiatras franceses e internacionais, desde 1954, sobre a dificuldade de ‘curar’ corretamente o colonizado, isto é, torná-lo totalmente homogêneo em um meio social de tipo colonial[18]”.

Parte desse material utilizou também para a redação do 5o capítulo de Os condenados da Terra intitulado “Guerra colonial e transtornos mentais”. Aí apresenta e analisa alguns casos, em relação aos quais afirma que “o acontecimento que desencadeia tudo é principalmente a atmosfera sanguinária, desapiedada, a generalização de práticas desumanas, a impressão tenaz que os indivíduos têm de assistir a um verdadeiro apocalipse[19]”. Impossível deixar de pensar, quando lemos estas palavras, na realidade igualmente violenta, sanguinária, desapiedada e apocalíptica das periferias e favelas das cidades brasileiras, bem como de algumas partes do campo, como no Pará, Rondônia, etc. Existe uma semelhança perturbadora entre este capítulo de Fanon e o atordoante estudo de Luís Mir[20] sobre violência endêmica e trauma no Brasil, por exemplo. Militantes do Brasil todo que percorrem diariamente as favelas e periferias ouvindo os casos brutais, observando as sequelas nas vítimas, sobreviventes e familiares, enfim, submergindo nesse mundo de sofrimento e desequilíbrio[21], também já chegamos à conclusão, como Fanon, que não há “cura” completa possível para tantos transtornos “em um meio social” de tipo….colonial! Também aqui, para nós, Fanon indica caminhos quando usou sua experiência e sua sensibilidade de psiquiatra em sua reflexão e ação política, o que é provavelmente um caso único na história. Antes dele a psicologia e a psiquiatria, e especialmente a psicanálise de Freud e Lacan, influenciaram vários pensadores identificados com a busca da mudança social profunda, como Sartre, Marcuse ou Althusser, mas quase todos eram filósofos e acadêmicos. Profissionais da área que contribuíram para reflexões políticas, Wilhelm Reich e Erich Fromm nunca chegaram ao nível de comprometimento militante de Fanon, que consegue imprimir em seus escritos uma empatia com o sofrimento humano realmente admirável.

 Guerreiro

 Cesaire chamou Fanon de “guerreiro-sílex” num poema em sua homenagem[22]. É muito mais que uma analogia poética. A ideia de comprometimento militante de Fanon é exemplificada e defendida em palavras sempre com imagens de combate, físicas, “musculares”. Quando ele descreve e defende o tipo de dirigente revolucionário capaz de inaugurar uma “nova política”, distante das “manobras demagógicas e reformistas dos dirigentes (anteriores)”, ele fala de militantes “inseridos na história que assumem com seus músculos e seus cérebros e direção da luta de libertação[23]”(grifo meu). Nisso, como em outros aspectos, Fanon assemelha-se inteiramente a Che Guevara. A experiência de combate que Fanon teve tempo de adquirir não foi tanto na guerra colonial. Foi surpreendido pela descoberta da leucemia quando estava na África Ocidental, oficialmente como “diplomata” da FLN em Gana, mas entre suas tarefas estava organizar a abertura de uma nova frente guerrilheira a partir do sul do Saara. Durante a 2a Guerra Mundial, entretanto, lutou como voluntário nas forças francesas livres de De Gaulle contra o nazismo, tendo sido condecorado mas também discriminado, como aliás todos os soldados vindos de regiões coloniais. A Martinica estava na época sob controle do governo colaboracionista de Vichy, e ele teve que ir clandestinamente a Dominica, colônia britânica, para juntar-se deliberadamente às forças anti-fascistas. Fanon, portanto, não era um diletante quando desenvolveu suas famosas reflexões sobre a violência em Os condenados. Essas são até hoje as passagens mais polêmicas do livro, que foram inclusive utilizadas para se tentar apresentar Fanon como um irresponsável ou mesmo alucinado apologista da violência. A maioria das defesas de Fanon quanto a este aspecto destacam, com razão, que ele apresenta a violência dos oprimidos como uma reação necessária, proporcional embora às vezes descontrolada, contra a violência dos opressores colonialistas, pois segundo ele “o colonialismo não é uma máquina de pensar, não é um corpo dotado de razão. É a violência em estado de natureza e não pode inclinar-se senão diante uma violência maior”[24]. Fanon estava, dessa maneira, do mesmo lado de Malcom X e Che, e do lado oposto de Gandhi e Luther King, no longo e sempre inconcluso debate “de princípio”, sobre o uso de táticas violentas e não-violentas na luta contra a opressão, inclusive a opressão colonialista.

 Nesse aspecto da questão, Fanon não traria muitos argumentos novos, e é evidente que, como membro com responsabilidades na FLN, sempre teve em mente a importância de por limites e “regras” na aplicação necessária da violência durante a guerra colonial. Assim, na introdução de Sociologia de uma Revolução, ele lembra: “Nos momentos em que o povo sofria o assalto massivo do colonialismo, a Frente de Libertação Nacional não vacilou em proibir algumas formas de ação, e recordou constantemente às unidades as leis internacionais da guerra, porque em uma guerra de libertação, o povo colonizado deve triunfar, mas a vitória deve ser obtida sem ‘barbárie’.”[25] Mas não é só isso. Fanon defende um caráter reabilitador ou mesmo terapêutico da violência que parece realmente irresponsável se lido fora do contexto do conjunto do argumento: No plano dos indivíduos, a violência desintoxica. Livra o colonizado de seu complexo de inferioridade, de suas atitudes contemplativas ou desesperadas. O torna intrépido, o reabilita ante seus próprios olhos.”[26] Em um artigo em vários aspectos bastante interessante, David Austin, educador e pesquisador independente de Montreal, sugere que tais palavras refletiriam não uma prescrição da violência como “remédio” para os complexos do colonizado, mas simplesmente as observações de Fanon a partir de sua experiência clínica[27]. Na verdade, lidas ligeiramente, essas palavras parecem na verdade contraditórias com as conseqüências  patológicas da “atmosfera sanguinária” que ele mesmo registrou e estudou em Blida-Joinville e nos trabalhos de campo como psiquiatra, conforme já vimos. Por outro lado, em várias passagens de Os condenados, Fanon defende que o ódio e a violência desenfreados, mesmo se orientados contra o colonizador, terão que ser superados com o amadurecimento da luta: “Mas não se sustenta uma guerra, não se sofre uma enorme repressão, não se assiste ao desaparecimento de toda a família para fazer triunfar o ódio ou o racismo. O racismo, o ódio, o ressentimento, ‘o desejo legítimo de vingança’ não podem alimentar uma guerra de libertação. […] É verdade que as intermináveis exações das forças colonialistas reintroduzem os elementos emocionais na luta, dão ao militante novos motivos de ódio, novas razões para sair em busca do colono ‘para matá-lo’. Mas o dirigente compreende dia após dia que o ódio não poderá constituir um programa.”[28]

Entretanto, a “função terapêutica” da violência adquire um significado mais conseqüente se a ligarmos aos trechos de Os condenados que mostram como a violência revolucionária da guerra de libertação permite ao colonizado liberta-se e superar a violência fratricida em que se consome a si próprio devido à alienação causada pelo jugo colonial: “Autodestruição muito concreta nas lutas tribais, eis um dos caminhos por onde se libera a tensão muscular do colonizado. […] Temos visto que durante todo o período colonial esta violência, ainda que a flor da pele, gira no vazio. Temo-la visto canalizada pelas descargas emocionais da dança ou do transe. Temo-la visto esgotar-se em lutas fratricidas. Agora se coloca o problema de captar essa violência em vias de reorientá-la. […] Esse povo deserdado, habituado a viver no círculo estreito das lutas e das rivalidades, passa a proceder em uma atmosfera solene à limpeza e purificação do semblante local da nação. Em um verdadeiro êxtase coletivo, famílias inimigas decidem apagar tudo, esquecer tudo. As reconciliações se multiplicam. […] Assumir a nação faz avançar a consciência.”[29]

Sociólogo” do colonialismo

A maior parte do capítulo “A violência”, o primeiro capítulo de Os condenados, não é na realidade dedicada à justificação da escolha e das táticas da guerra de libertação, mas à polêmica contra o que Fanon chama burguesia nacional, e sua tendência em entrar em acordos com o colonialismo agonizante, para obter para si alguns dos cargos e privilégios antes reservados à população de origem européia, sem alterar entretanto os fundamentos da estrutura social do colonialismo, com toda sua desigualdade e submissão social/cultural em todos os aspectos da realidade. Nesse esforço polêmico, Fanon desenvolveu uma caracterização das sociedades coloniais que, em seus traços gerais, é igualmente válida para as sociedades pós-coloniais. Aliás, parece mais válida ainda para as sociedades pós-coloniais onde a hierarquia social confunde-se com a hierarquia étnica, como é o caso da América Latina[30], do que para aquela parte do “Terceiro Mundo” onde há grande homogeneidade étnica (maior parte das atuais África e Ásia): “O mundo colonizado é um mundo cortado em dois. A linha divisória, a fronteira está indicada pelos quartéis e as delegacias de polícia.

 […] Nos países capitalistas[31], entre o explorado e o poder interpõem-se uma variedade de professores de moral, de conselheiros, de a imediataicil e o soldado, por sua presenconselheiros, de o, como a Europa Ocidental.taresponseira a partir do sul do Saara‘desorientadores’. Nas regiões coloniais, pelo contrario, o policial e o soldado, por sua presença imediata, suas intervenções diretas e freqüentes, mantêm o contato com o colonizado e lhe aconselham, a coronhadas ou incendiando seus povoados, a não se mover.”[32] “Por isso as análises marxistas devem modificar-se ligeiramente sempre que se aborda o sistema colonial. Até o conceito de sociedade pré-capitalista, bem estudado por Marx, teria que ser reformulado. O servo é de uma essência distinta do senhor, mas é necessária uma referencia ao direito divino para legitimar essa diferença de classes. Nas colônias, o estrangeiro que veio de fora se impôs com a ajuda de seus canhões e de suas máquinas.

 […] Não são nem as fábricas, nem as propriedades, nem a conta no banco que caracteriza principalmente a ‘classe dirigente’. A espécie dirigente é, acima de tudo,  a que vem de fora, a que não se parece com os autóctones, com ‘os outros’.”[33] Claro que não se trata de uma subjugação baseada exclusivamente na violência, mas mesmo o aspecto cultural (ou simbólico) da dominação não se assemelha muito ao que se observa na sociedade capitalista desenvolvida típica (ou ideal). Retomando o que já desenvolvera em Pele negra, Fanon descreve o processo de inferiorização/desumanização característico do colonialismo: “O mundo colonial é um mundo maniqueísta. Não basta ao colono[34] limitar fisicamente, isto é, com ajuda de sua polícia e seus soldados, o espaço do colonizado. Como para ilustrar o caráter totalitário da exploração colonial, o colono faz do colonizado uma espécie de quinta-essência do mal.

[…] O indígena é declarado impermeável à ética; ausência de valores, mas também negação dos valores. […] Elemento corrosivo, destruidor de tudo que está próximo, elemento deformador, capaz de desfigurar tudo o que se refere à estética ou a moral […] Às vezes esse maniqueísmo chega aos extremos de sua lógica e desumaniza ao colonizado. Propriamente falando, o animaliza.”[35]

A distinção entre regiões metropolitanas (“capitalistas”, nos termos de Fanon) e regiões coloniais, Fanon bem o sabe, aplica-se também muito bem às diferentes zonas, ocupadas por populações de “colonos” ou de “colonizados”, das cidades (pós)coloniais, e na verdade a grande parte das cidades do mundo atual, onde a desigualdade e a segregação são ao mesmo tempo econômicas, sociais, culturais e étnicas: “A zona habitada pelos colonizados não é complementar à zona habitada pelos colonos. […] A cidade do colono é uma cidade dura, toda de concreto e aço. É uma cidade iluminada, asfaltada, onde as lixeiras estão sempre cheias de restos desconhecidos, nunca vistos, nem mesmo sonhados. […] A cidade do colono é uma cidade farta, preguiçosa, seu ventre está permanentemente cheio de boas coisas. […] A cidade do colonizado, ou ao menos a cidade indígena, a cidade negra, a ‘medina’ ou bairro árabe, a reserva, é um lugar de má fama, povoado por homens de má fama […]. É um mundo sem intervalos, os homens estão uns sobre os outros, os casebres uns sobre os outros. A cidade do colonizado é uma cidade faminta, faminta de pão, de carne, de sapatos, de carvão, de luz.” Em um texto recente, Mireille Fanon-Mendès France, filha de Frantz Fanon e diretora da Fundação que traz seu nome, afirma que “hoje a ordem colonial contaminou o território dos colonizadores.

[…] o ‘indígena’ está onipresente não só em seu lugar de origem, mas igualmente nisso que Fanon chamava as ‘cidades proibidas’, onde são exercidas formas renovadas de discriminação”[36]. Ela refere-se, é claro, aos bairros e periferias habitados por imigrantes nas cidades da Europa e América do Norte, mas podemos incluir no raciocínio as regiões rurais do “Primeiro Mundo” que os imigrantes povoam periodicamente realizando os trabalhos mais duros e mal-pagos. Então podemos com segurança generalizar e afirmar, que o colonialismo, com suas características descritas de forma tão vívida e incômoda por Fanon, contaminou toda a realidade social e cultural de grande parte do mundo atual, borrando as antigas fronteiras entre “metrópole” e “colônia”.

Em 2005, num artigo sobre os levantes da juventude pobre (a maioria descendente de imigrantes) nas banlieue das cidades francesas, em outubro e novembro daquele ano, desenvolvi da seguinte maneira essa constatação: “hoje não há propriamente ‘Primeiro Mundo’ e ‘Terceiro Mundo’ […]; ou melhor, cada país tem sua própria parcela de ‘Primeiro’ e ‘Terceiro’ mundos dentro de suas próprias fronteiras, só que em proporções bem diferentes. França, EUA, Alemanha, etc; são países onde o ‘Terceiro Mundo’ é uma ilha cercada pelo ‘Primeiro Mundo’, e a separação não é apenas de renda: é cultural e racial. Já em países como o Brasil, México e África do Sul, por exemplo, o ‘Primeiro Mundo’ está cercado por um oceano miserável e violento de ‘Terceiro Mundo’, mestiço, negro e indígena. O ‘Primeiro Mundo’ explora e oprime o ‘Terceiro Mundo’, mas hoje o significado disso não é mais Estados dominando Estados; mas classes mundiais confundindo-se com nações (ou culturas) mundiais em uma luta cultural-social-de classes mundial. A fronteira entre o ‘Primeiro’ e o ‘Terceiro’ mundos hoje pouco lembra as fronteiras nacionais; ela é complicada e passa por dentro das cidades. Ela separa, por exemplo, de um lado os condomínios burgueses cariocas e paulistas e a Paris francesa; e de outro as banlieue árabe-africanas, as favelas do Rio e a periferia de São Paulo.”[37] Esse reconhecimento do colonialismo em nossa realidade, deve nos auxiliar a identificar o caráter colonial de nossos inimigos, e por conseguinte o caráter anti-colonial de nossas lutas: “os pobres urbanos de hoje sofrem uma opressão e ataques aproximadamente coloniais, bem pouco semelhante à opressão e exploração tradicional do trabalho pelo capital. O pobre urbano de hoje raramente se defronta com a figura do patrão capitalista que explora diretamente seu trabalho, mas sim com inimigos mais impessoais, ainda que evidentemente capitalistas: empreendedores imobiliários, indústria do turismo, conglomerados poluidores, máfias internacionais, Estados policiais militarizados, classe média ideologicamente submetida à burguesia. Correspondem, grosso modo às companhias de colonização, traficantes de escravos, Estados imperialistas e colonos europeus que em passado tão recente infernizaram a vida dos povos colonizados do mundo. Foi e é uma luta de classes, porém bastante diferente das formas que essa expressão normalmente evoca.”[38]

Nacionalista”

 Libertação nacional, construção da nação e nacionalismo eram os conceitos chaves da luta anti-colonial no século XX, e Fanon os assume inteiramente, porém a seu modo. Ao lado da defesa do nacionalismo, há, conforme já vimos, a critica implacável à burguesia nacional, à sua “preguiça […] sua limitação, […] a formação profundamente cosmopolita de seu espírito.”[39] Mas esta burguesia também reivindicava o “nacionalismo”, de maneira que Fanon tem que esclarecer cada vez melhor os diferentes pontos de vista abrigados sob o mesmo rótulo: “para ela [burguesia nacional], nacionalizar não significa por a totalidade da economia a serviço da nação, decidir a satisfação de todas as necessidades da nação. Para ela, nacionalizar não significa ordenar o Estado em função de relações sociais novas cuja eclosão se decide facilitar. Nacionalização significa para ela, exatamente, transferência para os autóctones dos privilégios herdados da etapa colonial.”[40] Não obstante Fanon exorta a “burguesia nacional”, ou melhor, a elite da nação melhor educada, a cumprir um papel libertador, a cometer um autêntico “suicídio de classe”, embora com poucas esperanças: Em um país subdesenvolvido, uma burguesia nacional autêntica deve converter em dever imperioso a traição da vocação a que estava destinada, ir à escola do povo, isto é, por à disposição do povo o capital intelectual e técnico que extraiu por sua vez das universidades coloniais. Veremos como, desgraçadamente, a burguesia nacional se desvia freqüentemente desse caminho heróico e positivo, fecundo e justo para empreender, com a alma tranqüila, o caminho terrível, por anti-nacional, de uma burguesia clássica, de uma burguesia burguesa, lisa, estúpida e cinicamente burguesa.”[41] Aprofundando  a descrição dessa rota catastrófica imposta pela burguesia nacional aos processos de independência, Fanon mostra, por um lado, como ela leva a cruéis ditaduras de partido único (com a “transformação progressiva do partido [nacionalista] em um serviço de informação”[42]), ou estruturadas em torno de um “líder”[43], e por outro como o nacionalismo degenera em chauvinismo e tribalismo: “Quando a exigência de negrificação ou arabização dos quadros colocada pela burguesia não procede de uma empresa autêntica de nacionalização, senão que corresponde simplesmente ao desejo de confiar à burguesia o poder até então nas mãos do estrangeiro, as massas colocam ao seu nível a mesma reivindicação, mas restringindo aos limites territoriais a noção de negro ou de árabe. […] onde quer que essa burguesia nacional tenha se mostrado incapaz de dilatar suficientemente sua visão de mundo, assistimos a um refluxo às posições tribalistas; assistimos, contrariados, ao triunfo exacerbado das diferenças raciais. Como a única consigna da burguesia é: há que substituir os estrangeiros, […] os demais nacionais, menos elevados – taxistas, vendedores de rua, engraxates – exigirão igualmente que os daomeanos voltem ao seu país ou, indo mais longe, que os fulanis e os peuls voltem à sua selva ou à suas montanhas.”[44]

Fanon, dessa maneira, e com clarividência profética, antecipou a ressurgência do tribalismo nos processos de independência africanos hegemonizados pela burguesia nacional, que hoje manifesta-se em cruéis guerras civis e massacres. Mas, haveria alternativa dentro do nacionalismo? Fanon acreditava que sim, sob determinadas condições. Em primeiro lugar, acreditava que a repressão colonialista levava à diferenciação de uma classe de militantes nacionalistas, que era obrigada a se refugiar junto às massas populares, e isso conduzia a um amadurecimento recíproco na escola da insurgência: “Rechaçados nas cidades, esses homens […] retrocedem até o campo, até a montanha, até as massas campesinas. […] Verdadeiros exilados no interior, separados do meio urbano onde haviam desenvolvido as noções de nação e luta política, esses homens convertem-se de fato em guerrilheiros. […] o encontro desses militantes maltratados pela polícia e dessas massas agitadas e de espírito rebelde pode produzir uma mistura explosiva de força inusitada. Os homens procedentes das cidades vão à escola do povo e, ao mesmo tempo, o preparam em formação política e militar.”[45] Desse encontro nasceriam verdadeiros partidos nacionalistas revolucionários e “o esforço conjugado das massas enquadradas em um partido e dos intelectuais altamente conscientes e armados de princípios revolucionários deve cerrar o caminho dessa burguesia nociva.”[46] Se a hegemonia da burguesia leva ao racismo e ao tribalismo, nesse movimento conseqüente de libertação, por seu lado, “o nível racial e racista é superado nos dois sentidos. Já não se entrega uma patente de autenticidade a todos os negros ou a todos os muçulmanos. Já não se busca o fuzil ou o machete diante da aparição de qualquer colono. A consciência descobre laboriosamente verdades parciais, limitadas, instáveis.”[47] Mas Fanon também sabia que uma relação radicalmente nova era necessária no interior do partido assim nascido, bem como na relação entre o partido e o povo, para que o processo fosse frutífero. Relações tendentes à descentralização e à não hierarquização: Para o povo, o partido não é a autoridade, e sim o organismo através do qual exerce sua autoridade e sua vontade como povo. […] Se o partido se confunde com o poder, ser militante do partido equivale a tomar o caminho mais curto para atingir fins egoístas, para ter um posto na administração, para subir de grau, mudar de escalão, fazer carreira.”[48]

 “[…] Politizar é abrir o espírito, despertar o espírito, dar luz ao espírito. Como dizia Cesaire: ‘inventar almas’. Politizar as massas não é, não pode ser fazer um discurso político. É dedicar-se com todas as forças a fazer compreender às massas que tudo depende delas, […] que não há demiurgo, que não há homem ilustre e responsável por tudo, que o demiurgo é o povo e que as mãos mágicas definitivamente não são senão as mãos do povo. Para realizar essas coisas, para encarná-las verdadeiramente, […] é necessário descentralizar ao extremo. A circulação da cúpula à base e da base à cúpula deve ser um princípio rígido, não por preocupação de formalismo, mas porque simplesmente o respeito a esse princípio é a garantia da salvação. É da base que sobem as forças que dinamizam a direção e lhe permitem dialeticamente dar um novo passo à frente.”[49] Fanon parecia crer sinceramente que tais condições sociais, culturais e organizacionais estavam presentes na FLN argelina, por exemplo. Entretanto mesmo a revolução argelina, sem desconsiderar suas conquistas (e a ampla elevação do status da mulher num país profundamente muçulmano não foi a menor delas), degenerou em autoritarismo e corrupção. Uma parte da militância da FLN, precisamente aquela que se forjara no contato estreito com o povo ao longo da luta armada, reagiu a essa degeneração, mas não tomou como referência um nacionalismo revolucionário e renovado como propunha Fanon, mas um islamismo político cada vez mais rígido e sectário que enfrentou-se com a FLN e o exército na sangrenta guerra civil  dos anos 90 do século passado[50]. As revoluções anti-coloniais e anti-imperialistas do século XX ainda estão por merecer um balanço histórico abrangente, que certamente reconhecerá importantes conquistas, mas de um modo geral está claro que as expectativas de superação radical das desigualdades provenientes da estrutura colonial, elevação generalizada do bem estar das populações e desenvolvimento sócio-cultural em direção ao “homem novo”, como propunham por exemplo Fanon e Che, não foram atendidas. Claro que a situação não é melhor, e na maioria das vezes é bem pior, naquelas regiões onde a descolonização não seguiu um caminho revolucionário e esteve sob firme hegemonia da burguesia nacional, como é o caso da maior parte da África.

Seja como for, tais resultados evidenciam uma limitação grave do nacionalismo que iluminou todos aqueles processos, mesmo aquele de caráter revolucionário. Fanon parecia ter, aliás, uma consciência aguda dessa limitação: “O nacionalismo não é uma doutrina política, não é um programa. Caso se queira evitar realmente ao país esse retrocesso, essas interrupções, essas falhas, é preciso passar rapidamente da consciência nacional à consciência política e social. A nação não existe em nenhuma parte, se não for um programa elaborado por uma direção revolucionária e recolhido lucidamente e com entusiasmo pelas massas. […] Programa econômico, mas também doutrina sobre a distribuição de riquezas e sobre as relações sociais. Na realidade, faz falta uma concepção do homem, uma concepção do futuro da humanidade. […] O nacionalismo, se não se faz explícito, se não se enriquece e se aprofunda, se não se transforma rapidamente em consciência política e social, em humanismo, conduz a um beco sem saída.”[51] Fanon coloca as coisas de forma bastante aberta e indeterminada, e talvez não houvesse outra maneira mesmo de colocá-las, mas ao propugnar uma “concepção do futuro da humanidade”, ele indiretamente chama a atenção para o fato do destino dos povos coloniais não poder ser definido de maneira isolada do destino da humanidade como um todo. Neste aspecto é que ganha enorme relevância as considerações que ele desenvolve no final do primeiro capítulo, na seção intitulada “A violência no contexto internacional”. Fanon de maneira nenhuma compartilhava da crença ou ilusão voluntarista de que os povos colonizados, saqueados e empobrecidos durante séculos, pudessem superar seu subdesenvolvimento rapidamente apenas com o apelo a esforços e sacrifícios, em campanhas de produção onde “homens e mulheres, jovens e velhos, se entregam com entusiasmo a um verdadeiro trabalho forçado e se proclamam escravos da nação. […] É preciso dizê-lo: acreditamos que o esforço colossal a que são instados os povos subdesenvolvidos pelos seus dirigentes não dará os resultados previstos. Se as condições de trabalho não se modificam, passarão séculos para se humanizar esse mundo animalizado pelas forças imperialistas.[52]” Fanon localiza corretamente o problema na inexistência de uma real reparação, por parte das metrópoles, às áreas e povos colonizados: “O colonialismo e o imperialismo não saldaram suas contas conosco quando retiraram de nossos territórios suas bandeiras e suas forças policiais. Durante séculos, os capitalistas comportaram-se no mundo subdesenvolvido como verdadeiros criminosos de guerra. As deportações, as matanças, o trabalho forçado, a escravidão têm sido os principais meios utilizados pelo capitalismo para aumentar suas reservas em ouro e em diamantes, suas riquezas e para estabelecer seu poder.”[53]

 “A reparação moral da independência nacional não nos cega, não nos satisfaz. A riqueza dos países imperialistas é também nossa riqueza. No plano do universal, esta afirmação não significa absolutamente que nos sintamos afetados pelas criações da técnica ou das artes ocidentais. Muito concretamente, a Europa tem se inflado de maneira desmesurada com o ouro e as matérias primas dos países coloniais; America Latina, China, África. […] Não aceitaremos que a ajuda aos países subdesenvolvidos seja um programa de ‘Irmãs da Caridade’. Essa ajuda deve ser a consagração de uma dupla tomada de consciência, tomada de consciência para os colonizados de que as potências capitalistas lhes devem e, para estas, de que efetivamente têm que pagar.”[54] Num primeiro raciocínio, bastante ingênuo na verdade, Fanon argumenta que os capitalistas dos países imperialistas teriam de fato algum interesse em realizar as reparações, mas logo reconhece que “nossa ingenuidade não chega  a crer que isto vai acontecer com a cooperação e a boa vontade dos governos europeus[55]”. Os povos colonizados, entretanto, não têm meios diretos de agir sobre os capitalistas das metrópoles, é preciso contar com a solidariedade ativa dos povos do “Primeiro Mundo”: “O Terceiro Mundo não pretende organizar uma imensa cruzada da fome contra toda Europa. O que espera de quem o tem mantido na escravidão durante séculos é que o ajudem a reabilitar o homem, a fazer triunfar o homem em todas partes, de uma vez por todas. […] Esse trabalho colossal que consiste em reintroduzir ao homem no mundo, ao homem total, se fará com a ajuda decisiva das massas europeias que, é necessário que reconheçam, têm se alinhado quanto aos problemas coloniais com as posições de nossos amos comuns. Para isso, será necessário primeiro que as massas europeias decidam despertar-se, sacudam a poeira do cérebro e abandonem a brincadeira irresponsável de bela adormecida do bosque.”[56] Ainda não houve, ao menos nas proporções que seriam necessárias, esse despertar solidário dos povos dos países imperialistas, e assim, nos limites, fracassos e degenerações das revoluções anti-colonialistas, os movimentos operários, socialistas e populares do “Primeiro Mundo” têm pelo menos tanta responsabilidade, quanto os nacionalistas do “Terceiro Mundo”.

 Socialista?

As críticas de Fanon às contradições e limites do nacionalismo, bem como sua compreensão da necessidade da construção de novas relações sociais tendentes a criar as condições necessárias para a emergência do “homem novo”, permitem a sua classificação como aderente a certa concepção de socialismo, mas é sintomático que ele mesmo tenha sido muito cauteloso em se classificar desta maneira. Fanon estudou na França numa época em que a influência do Partido Comunista sobre intelectuais do porte de Merleau-Ponty e Sartre era ainda muito grande, e fez a campanha comunista de seu amigo Aimé Cesaire na Martinica, mas jamais ligou-se por fidelidade ao movimento comunista. Também não aproximou-se de correntes partidárias francesas adeptas de outras versões do socialismo. O centro de suas reflexões sempre foi o colonialismo e suas conseqüências sobre a sociedade e os indivíduos, e as correntes socialistas tradicionais que ele conhecia tinham pouco a oferecer-lhe sobre isso. Por outro lado, as críticas que faz aos regimes de partido único nascidos das revoluções anti-coloniais, bem como suas propostas de partidos “descentralizados ao extremo” e de uma dinâmica radicalmente democrática envolvendo Estado e povo, podem muito bem ser lidas também como uma crítica aos regimes socialistas de tipo estatal. Em Os condenados Fanon por diversas vezes demonstra simpatia pela União Soviética e outros países de socialismo estatal, por seu apoio aos movimentos de libertação nacional, e manifesta um entusiasmo genuíno pela Revolução Cubana, que recentemente havia proclamado seu caráter socialista, mas nada disso o leva, teoricamente, a se enquadrar em posições ortodoxas do marxismo-leninismo ou mesmo do marxismo em geral. É portanto, forçar a barra classificá-lo, como freqüentemente se faz, como marxista. Embora ele estudasse e valorizasse o marxismo, Fanon defendeu claramente posições que só podem ser consideradas distantes de qualquer interpretação do marxismo, pelo menos do marxismo que prevalecia em sua época. Antes de tudo, Fanon coloca o “Terceiro Mundo” como centro da transformação revolucionária do mundo, enquanto o marxismo, pelo menos até meados do século XX, sempre considerou que a dinâmica revolucionária mundial estava centrada e dependente das lutas de classes nos países capitalistas mais desenvolvidos. Não é sem uma certa ironia que Fanon escolheu para título de seu livro mais importante e “testamento político”, uma expressão (damnés de La Terre) tirada dos primeiro versos da Internacional, o principal hino do proletariado europeu.

 Como já vimos, isso estava longe de significar que Fanon desprezava completamente as lutas dos trabalhadores nas metrópoles ou nas “cidades dos colonos”. Numa passagem realmente pequena mas muito densa e fundamental de Os condenados, que destaquei linhas atrás, ele praticamente liga o futuro das revoluções anti-colonialistas ao levante das “massas européias”. Mas também isso é diferente da visão de um processo mundial de revoluções que a grande maioria dos marxistas defendiam, segundo a qual a derrocada do capitalismo poderia acontecer nos centros metropolitanos, independentemente do que acontecesse nas colônias (que seriam, deste ponto de vista, “regiões sem história independente”), as quais receberiam sua emancipação como um “presente” da revolução proletária européia. Ironicamente, pouco depois da morte de Fanon, essa sua visão da centralidade (mas, é preciso não esquecer, não auto-suficiência) do Terceiro Mundo na transformação revolucionária do mundo começa a ser adotada e pregada pelos revolucionários cubanos e, principalmente, pelo Partido Comunista da China, ou seja, por correntes do próprio movimento comunista mundial[57]. Cerca de uma década depois, economistas, historiadores e sociólogos de declarada afiliação marxista dão contornos mais precisos a uma abordagem do capitalismo e das lutas de classes, normalmente referida como “teoria do sistema-mundo”, onde a referência conceitual ou a unidade de análise não é mais a sociedade/economia nacional capitalista típica desenvolvida, mas todo o sistema mundial inaugurado com a expansão do mercado mundial há cerca de meio milênio. Do ponto de vista do sistema-mundo, não há regiões “sem história”, porque todas as regiões (centro, periferia e “semi-periferia”) compartilham um mesmo processo histórico inseparável[58]. Fanon aproximou-se do marxismo ou o marxismo aproximou-se de Fanon?

Mas, enquanto a avaliação empírica de Fanon se aprofunda em relação aos camponeses, cujas debilidades são consideradas a tal ponto que somente a interação com os “intelectuais revolucionários” seria capaz de liberar seu potencial revolucionário, a condenação dos trabalhadores urbanos (considerados uma massa só com a classe média urbana indígena) não admite matiz ou exceção: “Esses operários, esses professores, esses pequenos artesãos e comerciantes que tem começado – em um nível pequeno, é claro – a aproveitar a situação colonial, têm interesses particulares. O que esses partidários reclamam é o melhoramento de sua situação, o aumento de seus salários. O dialogo entre esses partidos políticos e o colonialismo não se rompe jamais. […] Esses indígenas lutam por um lema abstrato: ‘o poder para o proletariado’, esquecendo que, em sua região, há que basear o combate principalmente em lemas de caráter nacionalista.”[59] A hostilidade de Fanon à classe operária urbana estende-se, portanto, à sua ideologia emancipatória tradicional, o socialismo. Hoje em dia é bastante difícil imaginar processos revolucionários baseados principalmente no campesinato, pelo simples fato dos camponeses serem cada vez mais uma minoria nas populações, seja no “centro” ou na “periferia” do capitalismo. Mas em seu lugar não tem surgido em geral um proletariado urbano tradicional, mas, principalmente mas não somente nas regiões periféricas, uma nova e grande classe de pobres urbanos, mal empregados, sub-empregados ou desempregados, vivendo no limite entre a precariedade e a marginalidade. Fanon também defende o potencial de insurgência desses pobres: “A insurreição, surgida no campo, penetra nas cidades pela fração do campesinato bloqueada na periferia urbana, a qual não tem podido encontrar ainda um osso para roer no sistema colonial. Os homens obrigados pela crescente população do campo e pela expropriação colonial a abandonar a terra familiar, giram incansavelmente em torno das distintas cidades, esperando que um dia ou outro lhes permitam entrar. É nessa massa, nesse povo dos cinturões de miséria, das casas ‘de lata’, no seio do lumpenproletariado, onde a insurreição vai encontrar sua ponta de lança urbana. O lumpenproletariado, coorte de famintos destribalizados, declanizados, constitui uma das forças mais espontânea e radicalmente revolucionárias de um povo colonizado.”[60]

Uma das principais críticas a essas (e outras) opiniões de Fanon foi feita por ninguém menos que Pierre Bourdieu, que vivera na Argélia (como pesquisador) mais ou menos na mesma época que Fanon, e que era então um jovem e promissor sociólogo, longe ainda de começar a construir seus inovadores conceitos que o tornaram célebre, embora eles tenham nascido precisamente de suas pesquisas de campo entre os cabilas argelinos[61]. Bourdieu não só discorda da avaliação do potencial revolucionário do campesinato e de suas frações “desenraizadas” empurradas para as áreas mais miseráveis das cidades, como defende uma suposta capacidade dos trabalhadores urbanos desenvolverem uma consciência transformadora mais conseqüente. Por terem uma relação mais estável com as atividades produtivas, desfrutariam “daquele mínimo de garantias e de seguranças que possibilitam que as aspirações e opiniões estejam sempre no horizonte da possibilidade[62]”. O que Fanon via como motivo de acomodação e tendência para acordos com o colonialismo, Bourdieu via como virtude. Já o campesinato “desenraizado” e o sub proletariado urbano, por viverem deslocados e sempre precarizados, por não terem essa relação estável com o trabalho industrial moderno, seriam levados “à rendição resignada ou à impaciência supersticiosa – própria daqueles que são tão oprimidos pelo presente que não conseguem vislumbrar outra coisa além do futuro utópico, da negação mágica e imediata do presente”[63]. Ao depositar nestes setores sociais suas esperanças, Fanon (e Sartre, eterno adversário de Bourdieu) estariam cometendo um erro muito grave e perigoso para a revolução argelina, e Bourdieu não economiza impropérios ao mostrar sua irritação: irresponsáveis, especulativos, megalomaníacos, propagadores de ilusões e de “imbecilidades”. Uma crítica mais equilibrada e fundamentada de Bourdieu a Fanon, foi sobre a subestimação desse último dos fortes sentimentos religiosos (muçulmanos) presentes na luta de libertação argelina, principalmente entre os camponeses[64]. De fato, Fanon parece considerar que séculos de islamismo seriam culturalmente ultrapassados em poucos anos como conseqüência do processo violento e radical da revolução nacional, o que foi um erro grande e evidente. Mas também é fato que o atual ressurgimento político do islamismo no mundo árabe e em outras partes do mundo, é em grande medida fruto dos descaminhos e degenerações do nacionalismo, que Fanon com grande precisão antecipou e explicou.

No final das contas, as posições de Fanon mostraram-se mais acertadas que as de Bourdieu do ponto de vista político e a curto prazo, mas Bourdieu não estava totalmente errado ao mostrar as limitações culturais de uma revolução baseada no campesinato. Fanon claramente errou ao analisar que a classe operária em geral (nas metróples e nas colônias) era histórica e absolutamente incapaz de novos levantes e atitudes revolucionárias. E Bourdieu foi desmentido pela história mais recente das lutas sociais em todo o mundo, quando multiplicam-se os exemplos de movimentos bem organizados e culturalmente progressistas baseados nos sem-terra, sem-teto, desempregados, moradores de favelas e periferias, refugiados, etc. Mas, para além daquela polêmica localizada no tempo e no espaço, as posições divergentes dos dois ainda servem para iluminar algumas questões importantes da atualidade, se não deixarmos nos levar por concepções unilaterais e “essencialistas” sobre as classes e suas potencialidades/vícios. Um aspecto da polêmica de Bourdieu contra Fanon pode surpreender a muitos. Bourdieu tornou-se conhecido a partir dos anos 90 do século passado como um intelectual público atuante, participante assíduo de mobilizações ao lado de imigrantes e trabalhadores, combatente ferrenho da globalização, do neoliberalismo e da mídia massificante representada principalmente pela televisão, e com isso esquece-se facilmente que durante anos ele foi uma espécie de ideólogo do não-engajamento direto dos intelectuais “de esquerda” nas lutas políticas[65]. Manteve-se à margem dos grandes combates dos anos 60 e 70, sua carreira acadêmica não sofreu o mínimo abalo ou interrupção no maio de 1968. Conseqüentemente: “Onde Bourdieu divergiu mais de Fanon foi sobre a relação entre teoria e prática. Como um sociólogo acadêmico praticante, Bourdieu acreditava que uma coisa era analisar uma situação objetiva, e outra coisa completamente diferente era se engajar em especulação revolucionária, mascarando isso como análise sociológica, como Fanon constantemente reivindicava que estava fazendo.”[66]

O argumento de Bourdieu contra a intervenção militante dos intelectuais é entretanto mais sutil que a simples afirmação da pretensa objetividade do saber acadêmico: “[…] Bourdieu condenou ao desprezo a idéia do intelectual orgânico. Para ele, os intelectuais enganavam-se a si mesmos e àqueles que pretendiam representar quando imaginavam poder cruzar o profundo abismo que separa seuhabitus do habitus dos indivíduos dominados. Quer admitam isso ou não, os intelectuais que se autoproclamam os representantes dos interesses do povo estão, na verdade, manipulando o povo e advogando em causa própria – enquanto mera fração dominada da classe dominante. […] O que aparece aí é a postura do intelectual tradicional que se mantém distante das lutas de massa…”[67]

Os condenados da Terra, em especial, com seu lirismo, suas amplas generalizações, seu tom profético e sua redação fragmentada e até descuidada, feita por um homem que contava os dias enquanto a leucemia o consumia, deve ter parecido a Bourdieu um exemplo extremo de má sociologia feita por um intelectual que se aventurara a ser revolucionário. Má sociologia que ao invés de ajudar, confundia e atrapalhava as verdadeiras tarefas políticas da revolução argelina.

Mas ao contrário, conforme vimos, o estilo de “manifesto” de Fanon, longe de mascarar especulações e confundir a percepção da realidade, serviu antes de tudo para ressaltar as urgentes conclusões práticas sobre a dramática realidade colonial, tão bem caracterizada que as lições e mensagens de Fanon permanecem válidas, levando obviamente em conta as modificações históricas já assinaladas, e que devem ser objeto de estudo e aprofundamento, por parte tanto de intelectuais profissionais comprometidos com a busca da verdade como, principalmente, de militantes envolvidos nas lutas por emancipação. Os anos em que Fanon viveu como combatente e nos quais produziu suas obras marcantes podem até ser vistos como uma época ingênua, radical e utópica, na qual teorias generosas porém pretensiosas surgiram uma após outra e deixaram pouca contribuição duradoura. Mas, se assim foi em geral, Fanon foi uma notável e memorável exceção.

De: Maurício Campos dos Santos < mauricio_campos@riseup.net >
Para: Rede contra a Violencia < redecontraviolencia@lists.riseup.net >
Dezembro de 2011

[1]Fanon; Los condenados de La >Tierra,México, de Cultura Económica, 1986, p. 172. Todas as citações do livro no restante do texto são traduções desta edição.
2] Literalmente, “movimento de moradores de barracos”. Ver o seu site: http://abahlali.org.
[3] Para uma lista parcial desses eventos, pode-se consultar a página da Fundação FrantzFanon: http://frantzfanonfoundation-fondationfrantzfanon.com.
[4] Livros: Pele negra, máscaras brancas (1952), Os condenados da Terra (1961); Coletâneas de artigos e ensaios: O ano V da revolução argelina (publicado em outras línguas que não o francês com o título Sociologia de uma revolução, 1959), Pela revolução africana (1964).
[5] Uma na USP, sobre psicologia crítica, e outra no CPDOC, aqui no Rio.
[6] Mas, sintomaticamente, elas foram feitas por feitas por editoras universitárias fora do eixo cultural dominante Rio-São Paulo: Os condenados da Terra foram reeditados pela Universidade Federal de Juiz de Fora em 2007, e Pele negra, máscaras brancas pela Universidade Federal da Bahia em 2008.
[7]A Recepção de Fanon no Brasil e a Identidade Negra, Revista Novos Estudos, CEBRAP, n. 81, julho/2008.
[8] Deveria ser sua tese de doutorado, mas foi rejeitada pela academia (Universidade de Lyon). Ironicamente, é hoje leitura quase obrigatória em muitos cursos de psicologia e psiquiatria…
[9]Prefácio de Lewis R. Gordon em Pele negra, máscaras brancas, Salvador, Editora da Universidade Federal da Bahia, 2008, p. 13.
[10] Apenas um exemplo: o livro traz dois extensos capítulos sobre relações sexuais e conjugais entre negra(o)s e branco(a)s, algo que estava totalmente fora da realidade e das perspectivas da imensa maioria da população da Martinica e das colônias africanas, da população negra dos EUA, etc.
[11]Fanon; Pele negra, máscaras brancas, citado, p. 190-191.
[12] Incluída como capítulo em Pela Revolução Africana; foi lida por Fanon no I Congresso dos Escritores e Artistas Negros em Paris, em setembro de 1956.
[13]Fanon; TowardtheAfricanRevolution, New York, GrovePress, 1988, p. 44.
[14]Fanon; TowardtheAfricanRevolution, citado, p. 40.
[15] A propósito, Pierre Bourdieumuito apropriadamente chama de “racismo da inteligência” as idéias/crenças justificadoras das classes dominantes que buscam legitimar seu domínio baseado na apropriação e transmissão do “capital cultural”. Ver O racismo da inteligência, em Bourdieu; Questões de sociologia, Rio de Janeiro, Marco Zero, 1983, p. 205-208. E também Bourdieu; O mito da “mundialização” e o Estado social europeu, em Contrafogos, Rio de Janeiro, Zahar, 2011, p. 42-61.
[16]Fanon; Pele negra, máscaras brancas, citado, p. 28.
[17] Incluída como capítulo em Pela Revolução Africana. Ver Fanon; TowardtheAfricanRevolution, citado, p. 52-54.
[18]
Fanon;
Los condenados de La Tierra, citado, p. 228.
[19]Fanon; Los condenados de La Tierra, citado, p. 230.
[20]Mir; Guerra Civil: Estado e Trauma, São Paulo, Geração Editorial, 2004.
[21] Ver, por exemplo, Cidade, experiência traumática e saúde: o caso dos familiares de vítimas de violência, artigo de Fábio Araújo publicado inicialmente no Jornal do Brasil e que pode ser consultado na página da Rede de Comunidades e Movimentos contra a Violência: http://www.redecontraviolencia.org/Artigos/455.html.
[22] O poema chama-se Par tousmotsguerrier-silex(Com todas as palavras guerreiro-sílex), e pode ser lido (em francês e espanhol) no link: http://laventana.casa.cult.cu/modules.php?name=News&file=print&sid=6491.
[23]Fanon; Los condenados de La Tierra, citado, p. 135.
[24]Fanon; Los condenados de La Tierra, citado, p. 54.
[25]Fanon; Sociología de una revolución, México, Ediciones Era, 1976, p. 10.
[26]Fanon; Los condenados de La Tierra, citado, p. 86.
[27] Austin; FrantzFanon’sdiagnosis, link: http://www.zcommunications.org/frantz-fanons-diagnosis-by-david-austin.
[28]
Fanon;
Los condenados de La Tierra, citado, p. 127-128.
[29]Fanon; Los condenados de La Tierra, citado, p. 49,51,121.
[30] Em Os condenados, Fanon repetidas vezes aponta a América Latina como um exemplo negativo para os movimentos anti-colonialistas da sua época, pois os estados e sociedades da América Latina e do Caribe eram uma prova viva do tipo de realidade perversa que nasceria de uma “independência” incompleta e inconseqüente, liderada por uma elite nacional espelhada na burguesia metropolitana: “… a burguesia nacional de alguns países subdesenvolvidos não aprendeu nada nos livros. Se houvesse observado melhor aos países da América Latina, haveria identificado sem dúvida os perigos que a espreitam.” Fanon; Los condenados de La Tierra, citado, p. 159.
[31]Fanon refere-se evidentemente aos países capitalistas metropolitanos, aos centros do imperialismo, como a Europa Ocidental.
[32]Fanon; Los condenados de La Tierra, citado, p. 32-33.
[33]Fanon; Los condenados de La Tierra, citado, p. 34-35.
[34] Ou seja, o morador europeu o euro-descendente das regiões coloniais.
[35]Fanon; Los condenados de La Tierra, citado, p. 36-37.
[36]MireilleFanon-Mendès France; El aporte de FrantzFanon dentro delproceso de liberación de lospueblos, link: http://frantzfanonfoundation-fondationfrantzfanon.com/?p=1039.
[37] Campos; A resposta da ralé, 2005, link: http://ccl.yoll.net/resposta.htm.
[38] Campos; Irão as favelas se tornar as vedetes do urbanismo pós-moderno?, 2010, link: http://www.diarioliberdade.org/index.php?option=com_content&view=article&id=1155:irao-as-favelas-se-tornar-as-vedetes-do-urbanismo-pos-moderno&catid=64:consumo-e-meio-natural&Itemid=79.
[39]Fanon; Los condenados de La Tierra, citado, p. 136-137.
[40]Fanon; Los condenados de La Tierra, citado, p. 139.
[41]Fanon; Los condenados de La Tierra, citado, p. 137-138.
[42]Fanon; Los condenados de La Tierra, citado, p. 166.
[43] Na África, nas últimas décadas, acompanhando a derrocada dos regimes de socialismo de Estado na URSS e Leste Europeu, e o pretenso triunfo do modelo “democrático” ocidental, as ditaduras de partido único cederam lugar a regimes pluripartidários que, não obstante, imediatamente mergulharam na hecatombe dos golpes de Estado e guerras civis, o que, junto com a aplicação draconiana dos “planos de ajuste estruturais” das agências internacionais (FMI, Banco Mundial, etc) tornaram “a África Subsaariana […] a única parte do mundo em desenvolvimento em que a expectativa de vida recuou para o nível registrado no início da década de 1970 e continua abaixo dos 50 anos”. Anne-Cécile Robert;  A África sonha com a “segunda independência”, em Le Monde Diplomatique Brasil (dossiê 05 – África: Desafios da democracia e do desenvolvimento), maio/junho 2011, p. 89.
[44]Fanon; Los condenados de La Tierra, citado, p. 144-145. Daomeanos foram perseguidos na Costa do Marfim em conflitos étnicos; fulanis e peuls são povos originalmente pastores nômades, que constituem importantes minorias étnicas em vários países da África Ocidental e Central.
[45]Fanon; Los condenados de La Tierra, citado, p. 116-117.
[46]Fanon; Los condenados de La Tierra, citado, p. 160.
[47]Fanon; Los condenados de La Tierra, citado, p. 134.
48]Fanon; Los condenados de La Tierra, citado, p. 169.
[49]Fanon; Los condenados de La Tierra, citado, p. 180.
[50] A origem da oposição islâmica a partir de militantes históricos da FLN é narrada por Robert Fisk, no capítulo 14 de sua monumental A grande guerra pela civilização – a conquista do Oriente Médio. Fisk; A grande guerra pela civilização, São Paulo, Editora Planeta, 2007, p. 706-800.
[51]Fanon; Los condenados de La Tierra, citado, p. 185-186.
[52]Fanon; Los condenados de La Tierra, citado, p. 91-92.
[53]Fanon; Los condenados de La Tierra, citado, p. 92-93.
[54]Fanon; Los condenados de La Tierra, citado, p. 94.
[55]Fanon; Los condenados de La Tierra, citado, p. 97-98.
[56]Fanon; Los condenados de La Tierra, citado, p. 97-98.
[57] Ver sobre isso Márek; Teorias da revolução e fases de transição (mais especificamente a seção 2, “’Terceiro mundo’, subdesenvolvimento e revolução violenta”) em História do Marxismo, volume 11, Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1989, p. 76-86.
[58] Os principais precursores e representantes da teoria do sistema-mundo vieram tanto de regiões “metropolitanas” (Immanuel Wallerstein – que conheceu Fanon pessoalmente, Giovanni Arrighi, André Gunder Frank, etc) como de regiões periféricas/coloniais (Samir Amin, Theotonio dos Santos, etc). Uma abordagem resumida dos principais temas da escola de pensamento pode ser lida em Wallerstein; Capitalismo histórico e Civilização capitalista, Rio de Janeiro, Contraponto, 2001.
[59]Fanon; Los condenados de La Tierra, citado, p. 53. A própria FLN não tinha uma posição tão absoluta como Fanon: a constituição da Argélia libertada incluía os trabalhadores urbanos no conjunto das classes em que se baseava a Revolução, junto com os camponeses e os “intelectuais revolucionários”. Ver o já citado ensaio de Franz Marék em História do Marxismo, citado, p. 81.
[60]Fanon; Los condenados de La Tierra, citado, p. 118-119.
[61] O confronto entre as idéias de Fanon e Bourdieu é descrito e analisado por Michael Burawoy no 4o capítulo de seu O marxismo encontra Bourdieu (Campinas, Editora da Unicamp, 2010, p. 107-129). Embora a análise de Burawoy seja penetrante, ela é um exemplo de se tentar apresentar Fanon como marxista e nitidamente socialista sem base real para tal. Na verdade, na polêmica sobre a Argélia, Bourdieu, que como Fanon nunca assumiu-se marxista, parece entretanto muito mais próximo das posições ortodoxas do marxismo que o “herege” Fanon.
[62] Citado por Burawoy, O marxismo encontra Bourdieu, citado, p. 116.
[63] Citado por Burawoy, O marxismo encontra Bourdieu, citado, p. 117.
[64] James D. Le Sueur; UncivilWar: IntellectualsandIdentityPoliticsDuringtheDecolonizationofAlgeria, Philadelphia, UniversityofPennsylvaniaPress, 2001, p. 252.
[65] Um dos grandes méritos do livro citado de Michael Burawoy é por em destaque esses aspecto do pensamento de Bourdieu, e depois mostrar como ele foi levado a assumir uma postura contraditória com sua concepção do papel dos intelectuais no final da vida.
[66]Sueur; UncivilWar: IntellectualsandIdentityPoliticsDuringtheDecolonizationofAlgeria, citado, p. 252.
[67]Burawoy, O marxismo encontra Bourdieu

As questões Étnico-raciais e a Escola Inclusiva

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By Luis Carlos “Rapper” Archanjo

Todas as escolas têm dificuldades no exercício de suas funções. Uma das principais são os “alunos que não conseguem acompanhar o processo de aprendizagem”. Esses jovens são assim considerados pela própria família, além de professores e colegas. Muito importante saber, em cada caso, se são dificuldades momentâneas ou não, os fatores capazes de bloquear a capacidade de aprender podem ser orgânicos ou emocionais, podem significar um acidente traumático que faz com que a criança rejeite o ambiente da escola ou tudo que remete a ela. Durante a primeira metade do séc. XX, o conceito de deficiência, diminuição do handicap incluía as características de inatismo e de estabilidade ao longo do tempo. As pessoas eram deficientes por causas fundamentalmente orgânicas, que se produziam no início do desenvolvimento e cuja modificação posterior era difícil. Tal concepção impulsionou um grande número de trabalhos que procuraram resumir em diferentes categorias todos os possíveis transtornos que poderiam ser detectados, que mesmo com a modificação das categorias conservaram o traço comum de que o transtorno era um problema inerente à criança, com poucas possibilidades de intervenção educativas e de mudança. Sob tal perspectiva pulsava uma concepção determinista do desenvolvimento, sobre a qual se baseava qualquer tipo de aprendizagem. É importante descobrir o que desmotiva o aluno a prender a fim de auxiliar o desenvolvimento. Muito se diz, hoje em dia, da dislexia, discalculia, disgrafia, disotorgrafia, TDAH, dislalia; problemas menos graves ou menos permanentes e, normalmente, recebem alguma forma forma de ajuda específica nas classes de ensino comum.

Nesse grupo encontram-se os alunos cujas necessidades especiais manifestam-se em problemas de linguagem, em conflitos emocionais, em dificuldades na leitura e na escrita, em atrasos na aprendizagem de diferentes matérias ou no absenteísmo escolar. O caráter relativo e contextual das necessidades menos permanentes detectado na avaliação dos problemas dos alunos na classificação anterior é prova cabal de que os processos avaliativos não devem centrar-se unicamente neles mesmos, mas levar em conta o contexto no qual se produz aprendizagem: o funcionamento da escola, os recursos disponíveis, a flexibilidade do ensino, a metodologia empregada e os critérios de avaliação utilizados. Os problemas de aprendizagem  dos alunos são determinados, em grande medida, por seu ambiente familiar e social e pelas características da própria escola.  O aluno com dificuldades de aprendizado deve ter seu problema diagnosticado o quanto antes, porque a tendência é ele se sentir rejeitado pelos colegas e professores, desvinculado dos processos de aprendizagem e manifestem, por isso, mais dificuldade, agravando a sua condição. A escola como espaço de reprodução da sociedade nos leva aos problemas de aprendizagem e as objeções da Sociologia da Educação (Tomlinson, 1982 em MARCHESI;, COLL;  PALACIOS, 2004, p. 21′). Sua formulação, baseada nos trabalhos de Bordieu e Passeron (1964) e na teoria da reprodução na escola da estrutura de classes sociais, sustenta que a denominação “alunos com necessidades especiais” é uma categoria socialmente construída que se emprega para situar determinados alunos em opções  educativas segregadoras. As famílias de tais alunos não possuem o “capital cultural” necessário para transmiti-lo  a seus filhos e , por isso, não poderão adaptar-se às exigências acadêmicas do sistema escolar. A  maioria das crianças que são categorizadas dentro da educação especial normalmente provém da classe trabalhadora e de minorias étnicas e, assim, o desenvolvimento do sistema de ensino segregado cumpre a função de manter um clima estimulante nas escolas regulares ao desviar os alunos com problemas a escolas ou classes de educação especial.

Uma pesquisa realizada pela Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe) em 501 escolas públicas do país, e divulgadas em junho deste ano, revelou dados preocupantes sobre o preconceito no ambiente escolar brasileiro. Das 18,5 mil pessoas entrevistadas, entre alunos, professores, funcionários e pais, 99,3% demonstram algum tipo de preconceito – étnico-racial, socioeconômico, de gênero, geração, orientação sexual ou territorial ou em relação a pessoas com algum tipo de necessidade especial. “De acordo com a pesquisa, os tipos de preconceito que apresentaram maior abrangência são aqueles relacionados a pessoas com necessidades especiais (96,5%)    , seguido por diferenças étnico-raciais (94,2%), e aqueles relativos a diferenças de gênero (93,5%). Além disso, assim como o preconceito, percebeu-se entre todos os públicos-alvo da pesquisa uma predisposição em manter menor proximidade em relação a determinados grupos sociais, como homossexuais, pessoas com necessidades especiais de natureza mental.”  

Os dados acima apontam para a implantação de propostas com vista à construção de uma educação inclusiva requer mudanças nos processos de gestão, na formação de professores e nas metodologias educacionais, com ações compartilhadas e práticas colaborativas que respondam às necessidades de todos os alunos. Dentre estas propostas destaco a da SEPPIR e da Professora Reinaldo. Ambas que nos dá um panorama das questões étnico-raciais, principalmente, e toda uma subjetividade atuando paralelamente de forma incapacitante, “comorbidade social”, pelo que esta tem de oculto nas questões dos processos discriminatórios do ambiente escolar. A primeira, da Professora REINALDO, autora da “Proposta Metodológica Para o Ensino da História da África na Educação Básica” (Ensino Fundamental maior), sobre aplicação de pesquisa com professores e alunos em diversas escolas (municipais e estaduais) do Ensino Fundamental do Maranhão, na qual se constatou que 80% do corpo docente desconhecem a Lei 10.639/03, e por consequência não abordam a temática na sala de aula, abro esta postagem sobre o tão controverso tema das questões étnico-raciais. Vislumbrando a necessidade de incorporar a lei nos currículos escolares trago à apreciação da rede telemática as “propostas” da Prof.ª Reinaldo; fundamentada nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN´s, 2000), que contempla especificamente o Ensino Fundamental Maior a partir da eminente aspiração de avaliação, discussão e reafirmação da imagem (positiva) da África e dos afro-descendentes em livros didáticos e da historicidade do continente africano, que ao longo da historiografia brasileira foi recontada de forma deturpada, preconceituosa e em pouquíssimas páginas, a partir da incidência do sistema escravista. Para propiciar uma educação a serviço da diversidade étnica e da pluralidade cultural é necessário quebrar o ciclo da exclusão educacional, dessa forma sugerimos objetivos, conteúdos, metodologias, recursos, avaliação e referências bibliográficas focando a equidade étnica racial nos estabelecimentos de ensino. Almejamos que tais proposições sirvam para facilitar o trabalho de professores e alunos em sala de aula, contribua para equilibrar a desigualdade entre os saberes escolares e a realidade social brasileira e que sirva como interlocução entre os educandos e a sociedade na luta contra as injustiças sociais. A segunda são proposições da Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (SEPPIR) no final da postagem.

Falar das demandas sociais no âmbito escolar significa estabelecer uma relação dialógica com todos os sujeitos envolvidos com o espaço de construção do conhecimento sistematizado que se tornou a escola ao longo do histórico-social da humanidade. Na maioria dos casos, os professores nem se dão conta de que o país é pluriétnico e que a escola é o lugar ideal para discutir  as diferentes culturas, e  suas contribuições  na formação do nosso povo.  Eles também ignoram que muitas vezes as dificuldades do aluno advêm do processo  que está relacionado à sua cultura, tão desrespeitada ou até ignorada pelos professores. Assim sendo, contextualização sobre educação inclusiva a partir de uma concepção britânica como forma de abordar o problema brasileiro, que a uma primeira vista se apresenta paradoxal ao senso comum pelo pouco que s sabe de historicidade da criança negra nas instituições de ensino do país enquanto Estado constituído. As primeiras creches na terra do pau-brasil surgiram em 1870, e de certa forma acompanha a história dessa área do mundo, havendo, claro, características que lhe são próprias (PARDAL, 2005). No meio rural, onde residia maior parte da população do país na época, famílias de fazendeiros assumiam o cuidado de inúmeras crianças órfãs ou abandonadas, geralmente fruto de exploração sexual da mulher negra e índia pelo senhor branco. Na zona urbana, bebês abandonados pelas mães, por vezes filhos legítimos de moças pertencentes a famílias com prestígio social, eram recolhidos nas “rodas de expostos” das Santas Casas de Misericórdia existentes em algumas cidades desde o início do séc. XVIII (DORIGO; NASCIMENTO. 2007, p. 15-32).

O triste espetáculo que se abria aos olhos inconformados dos humanistas no final do séc. XVI e no início do séc. XVIII era, em síntese, o seguinte: “A produção no campo mudara. Até então fundamentalmente agrícola, transformou-os em campo para caça e criação de ovelha” […] A cidade, consequentemente, também sofrera transformações profundas. Homens, mulheres e crianças, expulsos da terra, se ajuntavam nas periferias das cidades e, para sobreviverem, vendiam sua força de trabalho nas manufaturas e nas primeiras indústrias. Trata-se do fenômeno posteriormente chamado por Marx de “acumulação primitiva” do capital, quando nem se quer a escravidão de homens e crianças eram poupados. De certa forma, a importante função que a criança exerce na inicial articulação do capital faz com que a sociedade, pela primeira vez, a tome a sério, mesmo que fosse, infelizmente, para explorá-la como força produtiva barata. Ao ler a obra de Philippe Ariés, História Social da Criança(1978), entende-se perfeitamente esse tipo de afirmação (LEAL, 1990). A Europa, na condição de berço da revolução industrial, onde países como a Inglaterra e a França ao perceberem a infância abandonada devido à ocupação fabril dos seus pais, criaram as primeiras creches ou “refúgios” em 1777 e, posteriormente, no final do Séc. XVIII, a guarda e a educação das crianças tornou-se assunto principal no debate político, na legislação social e nas reformas escolares com o intuito de afastar as crianças do trabalho servil que o sistema capitalista em expansão lhes impunha, além de servirem como guardiãs de crianças órfãs e filhas de trabalhadores (KRAMER, 1984, p.29). Nesse contexto, desenvolveu-se o fenômeno cultural do Iluminismo. O nome de Jean-Jacques Rousseau, pioneiro absoluto do pensamento contemporâneo voltado para a educação crítica da criança, é a grande estrela do momento de uso indiscriminado de mão de obra infantil e famílias impedidas da educação de seus filhos, nasce, assim, as instituições escolares que tomam para si algumas responsabilidades que até então cabiam à velha instituição familiar pré-industrial, agora desintegrada (LEAL, 1990, p.34).

A valorização e o sentimento atribuídos à criança pequena nem sempre existiram da forma como é concebida atualmente, foram modificadas pelas mudanças econômicas, políticas e na estrutura social, que nem sempre existiu da mesma forma. Os seis modos de relação com a infância seriam: o Infanticídio, da Antiguidade ao século IV d.C: o Abandono, do século IV ao XIII; a Ambivalência, do século XIV ao XVII; a Intrusão, do século XVIII, a Socialização, do século XIX a meados do XX; e o Apoio ou Amparo […], iniciado em meados do século XX.” (Kuhlmann, 1978, p. 20 apud DORIGO; NASCIMENTO, 2007, p. 17). Outro ponto comum da influência britânica no nosso sistema de ensino é a publicação no Reino Unido do Relatório de Warnock Report, em 1978, que introduziu o conceito de NEE – Necessidades Educativas Especiais -, adotado em nosso país como Necessidades Educacionais Especiais. Resultado de um estudo considerável realizado em trabalho de campo, esse conceito veio transformar perspectivas pedagógico-educativas relativas aos alunos com problemas de aprendizagem. Para Wedell, “(…) o termo NEE refere-se ao defasamento entre o nível de comportamento ou de realização da criança e o que dela se espera em função da sua idade cronológica (BAIRRÃO, 1998, p. 23)”.

“(…) há uma necessidade educativa especial, quando o problema (físico, sensorial, intelectual, emocional, social ou qualquer combinação dessas problemáticas) afeta a aprendizagem ao ponto de serem necessários acessos especiais ao currículo, ao currículo especial ou modificado, ou a condições de aprendizagem especialmente adaptadas para que o aluno possa receber uma educação apropriada. Tal necessidade educativa pode classificar-se de ligeira a severa, e pode ser permanente ou manifestar-se durante uma fase do desenvolvimento do aluno (CORREIA, 1997, p. 48.

Estude o passado se queres prever o futuro

                                                       Confúcio

A frase acima serve de mote para  traçar-se uma trajetória de educação inclusiva inspirada em modelos europeu e americano do passado, e a defasagem destas para a atualidade do glossário de experiências brasileiras levadas a termo por pressupostos que embasam a literatura de consulta para o corpo técnico-pedagógico na consecução de rumos para a educação inclusiva. Nos anos de 1940 e 1950, iniciam-se mudanças importantes. Começa-se a questionar mais amplamente a origem constitutiva e a incurabilidade do transtorno, e as posições ambientalistas e behavioristas, que eram dominantes no campo da psicologia, abrem caminho com mais força no campo da deficiência. Ainda que continuem plenamente vigentes os dados quantitativos proporcionados pelos testes de inteligência, escalas de inteligência encomendada, em 1904, pelo ministro de Instrução Pública francesa, Binet, que foi professor de Piaget, já se levam em conta as influências sociais que podem determinar um funcionamento intelectual deficitário. Abre-se espaço à concepção de que a deficiência pode ser motivada por falta de estímulo adequado ou por processos de aprendizagem incorretos (MARCHESI; COLL; PALÁCIOS, 2004, 15 – 17).

Alguns dos primeiros testes de inteligência ou psicométricos foram elaborados justamente para poderem diferenciar as crianças capazes e os supostamente incapazes de beneficiar-se da escola pública ao se generalizar na Europa a obrigatoriedade da escolarização. Na psicometria e na avaliação tradicional, tratou-se de avaliar tipicamente a “inteligência”, seja uma inteligência “geral”, sejam as chamadas “aptidões intelectuais básicas”. As críticas habituais à psicometria e à “testologia” – ou a alguns de seus usos – são perfeitamente compatíveis com uma utilização prudente e bem-orientada dos clássicos testes de inteligência geral ou aptidões concretas, com os quais habitualmente se tentou medir – o hipotético quociente intelectual ou, de maneira geral, o nível de capacidades básicas de ordem diversa: de discriminação, de associação, de abstração, de raciocínio, etc. Inclusive as variáveis e os constructos introduzidos posteriormente para substituir os testes de QI, como potencial de aprendizagem e potencial de desenvolvimento, são difíceis de avaliar se não for com tarefas totalmente idênticas às das provas clássicas de aptidão intelectual. É por essa razão que em séries de provas, como as de Wechsler, que são ordenadas por idades – para adultos, para crianças e para menores, e salvo casos de deficiência leve, o mais aconselhável é aplicar a versão correspondente a uma idade inferior à do sujeito com deficiência que se vai avaliar. Em geral, todos os testes ou provas de capacidade intelectual e/ou de aptidões específicas são aptos para avaliar a deficiência mental. Em princípio os mais apropriados seriam, consequentemente, os mais “livres de influências culturais” , portanto, mais livres de influências educativas. São úteis, portanto, as provas clássicas de capacidade, ou repertórios cognitivos, como as escalas de Wechsler, o Teste de Aptidões Primárias (PMA), de Thurstone, as matrizes de Raven; ou as mais recentes, como o Teste de habilidades , de Sternberg, que responde a um modelo triádico de inteligência; ou também as que, um pouco à margem da tradição psicométrica dominante, como por exemplo, aquelas inspiradas no modelo evolutivo de Piaget, são integradas por tarefas correspondentes a estágios desse modelo. As mais recentes provas de inteligência – ou de repertórios cognitivos – costumam consistir de fato em baterias de provas ou escalas anteriores e são compostas de itens, tarefas ou tipos de tarefas dos testes mais clássicos. Dessa natureza é a Bateria de Kaufmann para crianças (K-ABC), muito útil para a avaliação de DM; o SOMPA (Sistema de Avaliação Multicultural Pluralista), de Mercer, que também compreende uma bateria de testes que coletam informações nos âmbitos médico, perceptor-motor, cognitivo e de adaptação, para a faixa etária de 5 e 12 anos; e o Inventário de desenvolvimento de Battelle, criado a fim de avaliar programas de intervenção precoce em crianças com déficit. (MARCHESI; COLL; PALACIOS, 2004, p. 194-204)

O tratamento estadunidense para as questões dessa modalidade de educação nos séculos anteriores serve como a grande referência para uma análise entre as ações adotadas aqui e lá, mesmo na defasagem temporal de cada proposta educativa. Segundo Susan e William Staincack, no capítulo 2 – Visão Geral Histórica da Inclusão, do livro Inclusão – Um guia para educadores, assim descrevem os caminhos do movimento social americano rumo à educação inclusiva:

Desde o período colonial e os primórdios de Nação, a formação das escolas públicas e das instituições especializadas e a grande ameaça do início do séc. XX, até o movimento dos direitos civis da década de 1970, a promulgação do “Ato de educação para Todas as Crianças Portadoras de Deficiência” (PL 94-142), o recente desenvolvimento do apoio aos sistemas fundidos de educação regular e especial e o impacto disso nas escolas atuais. No fim da guerra americana de independência, em 1873, grupos de cidadãos ricos estabeleceram várias sociedades filantrópicas cuja principal preocupação era garantir que grupos marginais não ameaçassem a república e os valores norte americanos vigentes na época. A maior parte dos indivíduos colocados em instituições de reabilitação era considerada como integrante de grupos justapostos: indigentes, pessoas com deficiência visível, minorias e muitos imigrantes recém- chegados. No final do séc. XIX e até as décadas de 1950 e 1960 houve um crescimento das instituições para pessoas com deficiência, ao mesmo tempo em que outra tendência se desenvolvia: a criação das “escolas comuns” públicas, onde a maioria das crianças era educada. Entretanto, vários grupos de crianças foram excluídos das escolas públicas regulares. Os afro-americanos e os nativos americanos eram em grande parte educados em sistemas escolares separados. Da mesma forma que os alunos com deficiência visível e importantes continuaram, em sua maioria, sendo segregados. O currículo escolar baseado nas necessidades ou nos níveis de habilidades acadêmicas do aluno era usado rotineiramente para delegar as crianças pobres e em condições de desvantagem a ambientes inferiores, não acadêmicos (Chapman, 1988). Eram feitas exceções à educação obrigatória, que afetava, principalmente, as crianças dos grupos socioeconômicos inferiores. As classes especiais na extremidade inferior da esteira tornaram-se uma das características básicas das escolas públicas. Para Chaves (1977), as classes especiais “não surgiram por razões humanitárias”, mas porque essas crianças eram indesejáveis na sala de aula da escola pública regular. Isso não significa sugerir falta de motivo humanitário de muitos indivíduos que trabalhavam em classes especiais e em educação especial nesse período.

Em 1954, a Brown v. Board of Education abre um novo capítulo para o tratamento dado ao currículo escolar baseado nas necessidades ou nas habilidades do aluno e as classes especiais foi o sistema preferido de prestação de serviços educacionais para a maior parte dos alunos com deficiência nas décadas de 50 e 60. A ação Brown contra a Board of Education (1954), na qual determina que o aluno segregado não fosse igual aos demais, proporcionou um poderoso rechaço das opções segregacionistas para a educação dos alunos pertencentes às minorias. À parte o desafio das políticas educacionais excludentes para os afro-americanos, esta nova regulamentação também mudou o caminho rumo a uma avaliação mais minuciosa da segregação de alunos com deficiência. Os movimentos da década de 1970 que culminaram na PL 94-145 nas na sequela natural da ação Brown contra a Board of Education, iniciando o giro da roda de mudança para as restrições impostas pelas instituições segregadas, pelas escolas especiais e pelas classes especiais, ora apresentadas como problemáticas. No final da década de 1970 e no início da de 80, muitos alunos com deficiência começaram a ser integrados em classes regulares, pelo menos por meio turno. Até mesmo muitos alunos com deficiência importantes que não haviam sido recebidos no passado, começaram a receber serviços educacionais nas escolas públicas (STAINBACK, 1999, p. 34 – 40).

A experiência britânica (MITTLER, 2003, p. 23-24), para esta modalidade de ensino é referendada no capítulo 1 com o título da Exclusão à Inclusão, do livro Educação Inclusiva – Contextos Sociais, onde o autor inglês nos remete aos mesmos dilemas do fracasso escolar brasileiro da atualidade:

Crianças com habilidades abaixo da média são muito mal servidas. Por nosso sistema educacional. Aquele que é menos capaz academicamente continua a sofrer as consequências de quaisquer que sejam os problemas agudos ou crônicos que afetam o sistema educacional. (Departamento of Educacion and Science – DES, 1991, p. 2).

Essas palavras, foram ditas pelo Chefe dos Inspetores das Escolas da Sua majestade no período de 1989 a 1990, iluminaram o fracasso do sistema educacional para responder ás necessidades de crianças cujas aquisições e habilidades educacionais estão abaixo da média. Apesar de essa análise ainda apresentar um cunho de verdade após uma década, ela não faz referência ao fato de que a maioria das crianças é menos capaz academicamente são aqueles que vivem nas áreas em desvantagens social e econômica. Estamos muito aquém de entender por que e como crianças com histórias de pobreza, com tanta frequência, fracassam nas escolas e muito menos ainda o que pode ser feito para reduzir ou eliminar tais disparidades. Não há uma explicação simples ou uma única para isso. Alguns culpam as crianças por serem menos inteligentes ou estarem menos “prontas” para aprender. Outros criticam os pais pelo fracasso como consequência do fato de não se interessarem pelo desenvolvimento de seus filhos e de não oferecerem um ambiente que conduza ao desenvolvimento e á aprendizagem. As escolas são culpadas por terem baixa expectativa quanto ao aproveitamento dos alunos e, além disso, por aceitarem com facilidade que as crianças pobres serão aquelas que mais provavelmente não terão um bom desempenho na escola, Quase todos nós culpamos o governo por não gastar o suficiente com as crianças ou por gastá-lo de maneira errada.

Uma coisa é clara: as escolas e o sistema educacional não funcionam de modo isolado. O que acontece nas escolas é um reflexo da sociedade em que elas funcionam. Os valores, as crenças e as prioridades das sociedades permearão a vida e o trabalho nas escolas e não pararão nos seus portões. Aqueles que trabalham nas instituições de ensino são cidadãos da sua sociedade e da comunidade local; portanto, possuem a mesma gama de crenças e atitudes com qualquer outro grupo de pessoas; também o são aqueles que administram o sistema educacional como um todo, incluindo os que são designados para o posto, os membros eleitos do governo local, os diretores de escola e os administradores. A partir do tratamento dado ao fracasso educacional britânico, saindo um pouco o modelo americano, podemos tomar como nosso o desafio da desigualdade social e educacional quando o autor escreve:

O governo britânico tem expressado um forte compromisso com uma sociedade mais inclusiva e com um sistema educacional mais inclusivo. Será que isso pode ser reconciliado com o sistema educacional desigual dividido que eles herdaram? Em que medida a sociedade e o sistema educacional pode apoiar tal compromisso? Será que essa questão pode ser resolvida? Será que esta questão está sendo de fato encarada? Por exemplo, é possível trabalhar em direção a um sistema educacional mais inclusivo quando milhões de alunos são excluídos das escolas a cada ano porque eles têm um comportamento inaceitável?

No campo da educação, a inclusão envolve um processo de reforma e de reestruturação das escolas como um todo, com o objetivo de assegurar que todos os alunos possam ter acesso a toda a gama de oportunidades educacionais e sociais oferecidas pela escola. Isto inclui o currículo corrente, a avaliação, os registros e os relatórios de aquisições acadêmicas dos alunos, as decisões que estão sendo tomadas sobre o agrupamento de alunos nas escolas ou nas salas de aula, a pedagogia e as práticas de sala de aula, bem como as oportunidades de esporte, lazer e recreação. O objetivo de tal reforma é garantir o acesso e a participação de todas as crianças em todas as possibilidades de oportunidades oferecidas pela escola e impedir a segregação e o isolamento. Essa política foi planejada para beneficiar todos os alunos, incluindo aqueles pertencentes às minorias linguísticas e étnicas, aqueles com deficiência ou dificuldades de aprendizagem, aqueles que se ausentam constantemente das aulas e aqueles que estão sob o risco de exclusão.

Ajudar esta criança significa conhecer tanto quanto for possível a natureza das suas dificuldades por meio de avaliações globais dos seus pontos fracos e fortes para fazer um diagnóstico, quando possível, e para planejar um programa de intervenção e apoio baseado em tal análise. O objetivo é auxiliar a criança a se encaixar no sistema educacional e beneficiá-la com o que a escola possa oferecer-lhe. Nesse caso, não se assume que a escola precisa mudar de qualquer forma para acomodar uma criança em particular ou pata responder a uma maior gama de diversidade na população estudantil. Mudar o paradigma da educação inclusiva a partir da visão do defeito ao modelo social envolve um repensar radical da política e da prática e reflete um jeito de pensar fundamentalmente diferente sobre as origens da aprendizagem e as dificuldades de comportamento. Em termos formais, estamos falando sobre uma mudança da ideia de “defeito” para um “modelo social”. Por muitos anos, os referidos modelos têm sido amplamente discutidos por escritores e ativistas no campo da deficiência de adultos, mas raras vezes têm sido aplicados de modo direto à educação, apesar da proximidade e de similaridades dos dois campos. As tecnologias de informação e comunicação -TICs –  favorecem a aprendizagem cooperativa/colaborativa, além de instrumento para potencializar projetos de acessibilidade para portadores de deficiências motoras ou perceptivas  porque ampliam as possibilidades de interação entre aluno/professor, numa rede de relações que engendra conflitos sócio-cognitivos e facilita a percepção por parte dos alunos de seus próprios processos cognitivos.

Alguns aspectos do modelo “na criança” são claramente relevantes, sobretudo para crianças cujas dificuldades nascem em grande medida como consequência de impedimentos significativos de órgãos sensoriais ou do sistema nervoso central. Porém os impedimentos, mesmo que graves, de forma alguma explicam todas as suas dificuldades, e há muitas possibilidades para intervenções nos contextos em vários níveis: ensino, criação familiar, apoio dos colegas e amizade, atitudes positivas, relação com os vizinhos e remoção de barreiras de todo os tipos. Somando-se ás crianças com evidências claras de comprometimento específico, a década passada viu uma inundação de novas categorias e de novos diagnósticos, nos quais uma etiologia orgânica não foi estabelecida com clareza, apesar de que as pesquisas devem em tempo devido identificar tal vínculo Exemplos óbvios incluem dislexia, transtorno do déficit de atenção (com ou sem comportamento hiperativo), autismo  ¹ e Síndrome de Asperger. Até agora, há poucas evidências convincentes de que diagnósticos precisos dos impedimentos específicos ou de condições similares necessariamente requeiram um tipo de intervenção educacional específica para a síndrome. Da mesma forma, embora já tenhamos um número muito maior de informação sobre as características e os estilos de aprendizagem das crianças com Síndrome de Down [1], Síndrome do X-Frágil ou esclerose tuberosa, outra vez elas não se referem apenas a essas crianças. Com o que todos concordam é que todas as crianças precisam de um bom ensino que leve em conta os padrões individuais de aprendizagem.

Na Inglaterra, o Código de Prática da Identificação e Avaliação das Necessidades Educacional Especial (DFE 1994), criticado como um instrumento que poderia isolar e segregar fornece orientação sobre alunos com dificuldades moderadas de aprendizagem, com dificuldades específicas de aprendizagem, com dificuldades emocionais e comportamentais e com comprometimento sensorial, embora a orientação dada nessas seções reflita mais a sobreposição de tais dificuldades do que a sua especificidade. Apesar do elemento categorizador, a essência do código de prática também reflete um modelo social, porque ele propõe modificações significativas no ambiente e nas mudanças no papel profissional, com o objetivo de fazer com que as crianças com necessidades educacionais sejam capazes de permanecer nas escolas regulares.

Assim como as questões da educação de portadores de necessidades especiais, a dimensão pedagógica com pouco investimento em material didático, a falta de hábitos de leituras permanentes e pesquisa, as questões étnico-raciais são pouco discutidas pelos especialistas em educação, ou seja, as condições objetivas da docência, aparentemente não relacionadas com a questão racial, mas que interferem na predisposição da grande maioria dos professores de enfrentarem a discussão para a busca de caminhos para uma melhor compreensão e desconstrução das várias teorias deterministas que permeia o quadro de vidas precárias da intergeracionalidade histórica atuando direta ou indiretamente nos processos biopsicossociais necessários ao desenvolvimento cognitivo de seus alunos. Por exemplo, a conexão estreita entre segregação residencial e segregação educacional demonstra o grau em que as oportunidades na escola estão ligadas às existentes na sociedade. As diferenças de classe marcantes exercem influência venenosa na sociedade, pois estimulam os sentimentos de superioridade, arrogância, esnobismo, inveja e ressentimento, entravam o desenvolvimento de uma ampla simpatia humana, de preocupações e interesses comuns, do sentimento de unidade (NASH, Paul. 1968, p. 207).

Outro ponto muito importante é que a temática seja levada à sala de aula para as considerações de todos os sujeitos, já que o assunto é cercado de tabus pelo histórico de falas e relatos que não saem do discurso de iguais para o consenso ou dissenso do outro, pelo que exteriorizam o medo de estabelecer uma situação de conflito, geralmente vem acompanhado de um instrumento de defesa subjetivo por parte de alguns docentes, ou seja, se não há referenciais ou modelo de enfrentamento dessas situações, ou se o modelo que há é aquele de que os conflitos raciais no Brasil são localizados ou individualizados, não resta outro mecanismo senão a culpabilização do outro: o desencontro da população afro descendente com os projetos educacionais para os despossuídos ao longo da nossa história, marcada pelo analfabetismo que anula aspirações que levam ao empoderamento para as reivindicações no plano das oportunidades segundo requisitos de escolaridade. Queiram ou não queiram aqueles que questionam as ações afirmativas afro-americanas como modelo para uma melhora no quadro de acessibilidade e permanência nas salas de aula consequente de processos inclusivos de políticas públicas para aqueles na base da pirâmide. Portanto, são referenciais para outros da Diáspora Africana em ajustes que venham compensar a disparidade educacional advinda de práticas segregacionistas desde que a educação chegou ao Brasil pela Companhia de Jesus, e referendada na Carta Magna como um direito universal de todo cidadãos brasileiros.

A Constituição Federal de 1988, assim como a Lei nº 9.394/1996 – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional e mais recentemente, o Estatuto da Igualdade Racial, Lei nº 12.288, de 20 de julho de 2010, asseguram em seus artigos o direito à igualdade de condições de vida e cidadania. Todos esses dispositivos legais garantem igual direito às histórias e culturas dos povos que compõem a nação brasileira e o acesso às diferentes fontes da cultura nacional a todos os brasileiros. No entanto nossa realidade apresenta desigualdades persistentes e insustentáveis que só se justificam pela exclusão histórica e sistemática de elementos de promoção da igualdade étnico-racial, seja na formação educacional, seja na formação cultural de nossa sociedade, com maior prejuízo para a população negra. Desde que foi excluída do projeto modernizador da sociedade brasileira na primeira metade do Século XX a população negra, assim como a população indígena, ao longo dos últimos 122 anos, vêm padecendo de uma precária inserção social. Para contribuir com a superação dessa situação a Lei nº 10.639, que altera a Lei nº 9394/96 e foi sancionada em 9 de janeiro de 2003, inclui no currículo oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade da temática História e Cultura Afro-brasileira. Posteriormente, a Lei nº 11.645, sancionada em 10 de março de 2008, dá a mesma orientação à temática indígena, e inclui a obrigatoriedade da temática História e Cultura Afro-brasileira e Indígena.

Para regulamentar a Lei nº 10.639/03, o Conselho Nacional de Educação por meio da Resolução nº 01, de 17 de junho de 2004, baseado no Parecer do Conselho Pleno nº 03/2004, de 10 de março de 2004, instituiu as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-brasileira e Africana para todos os níveis e modalidades da Educação no Brasil. Os agentes envolvidos na produção da Educação e toda a comunidade escolar são chamados à responsabilidade, por meio de uma série de ações e metas a serem cumpridas para fazer valer essas leis. Assim será possível que a Educação brasileira venha a ser coerente com a nossa nação e, tal qual escreveu a Conselheira Petronília Beatriz Gonçalves e Silva, relatora do parecer homologado pela Resolução CNE/CP nº 01/2004:

(…) que o Brasil seja um país multiétnico e pluricultural, de organizações escolares em que todos se vejam incluídos, em que seja garantido o direito de aprender e de ampliar conhecimentos, sem ser obrigado a negar a si mesmo, ao grupo étnico-racial a que pertencem e a adotar costumes, ideias e comportamento que lhe são adversos. E estes, certamente, serão indicadores da qualidade da Educação que estará sendo oferecida pelos estabelecimentos de ensino de diferentes níveis.

O Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE) condicionou o apoio técnico e financeiro do Ministério da Educação à assinatura, pelos estados, Distrito Federal e municípios, do plano de metas Compromisso Todos pela Educação. Depois da adesão ao Compromisso, os entes federativos elaboraram o Plano de Ações Articuladas (PAR) de acordo com os seus dados demográficos e o censo escolar. Nesse conjunto de ações a SEPPIR está oferecendo um reconhecimento de mérito pela implementação da Lei nº 10.639/03 para Unidades Escolares de Educação Básica, Secretarias Estaduais de Educação e Secretarias Municipais de Educação que tenham produzido, veiculado conhecimento necessários ao Selo de Educação para a Igualdade Racial. Cem instituições serão credenciadas pela excelência na aplicação da Lei no período 2009/2010 e receberão um diploma, um estandarte e um conjunto de broches para a equipe executora das ações. Além desses elementos simbólicos as experiências serão divulgadas pela SEPPIR por meio de uma publicação impressa que será disponibilizada também pela Internet e receberão um conjunto de livros sobre a temática das relações étnico-raciais produzidos pelos parceiros da SEPPIR na realização do Selo: Ministério da Educação; Unicef; Unesco; Undime e Consed.   

Da página não virada da nossa historicidade nasce o compromisso de cada brasileiro (a), “juntos e misturados” em nome de objetivos de trocas sociais sadias, do “Todos pela Educação”, como elemento norteador das “Metas do Plano Nacional das Diretrizes Curriculares Para Educação das relações Étnico-raciais e Para Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana” através de um Projeto Político Pedagógico que englobe todos os níveis e modalidades de ensino, adequando seu currículo ao ensino de História e Cultura Afro-brasileira e Africana, conforme Parecer CNE/CP 03/2004 e as regulamentações dos seus Conselhos de Educação. Atualizar e inserir nos manuais, diretrizes 277ge demais documentos norteadores dos currículos da Educação Básica as alterações necessárias para o ensino das Relações Étnico-raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-brasileira e Africana através de incentivo ao corpo docente na busca de formação continuada para o desenvolvimento do ensino das Relações Étnico-raciais. A seguir algumas ações a serem implementadas para o efetivo cumprimento das leis:

  • Solicitação ao órgão superior de gestão educacional ao qual estiver subordinada para fornecimento por material didático e paradidático específico para o ensino da temática;
  • Programar ações de aquisição de materiais didático-pedagógicos que respeitem e promovam a diversidade, tais como: filmes, jogos, livros, brinquedos, especialmente bonecas/os com diferentes características étnico-raciais, de gênero e portadoras de deficiência;
  • Manter permanente diálogo com instituições de ensino, gestores educacionais, movimento negro e sociedade civil organizada para a implementação das Leis 10.639/03 e 11.645/08.
  • Construir coletivamente alternativas pedagógicas para Educação das Relações Étnico-raciais com suporte de recursos didáticos adequados;
  • Incentivar a relação escola/comunidade no intuito de proporcionar maior interação da população com a educação, fazendo com que o espaço escolar passe a ser fator de integração comunitária nas comunidades remanescentes de quilombos.

Consoante a proposta da SEPPIR  trouxe audiovisual de uma interessante experiência documental de maquiagem em um programa da TV francesa, de 2007, ‘Dans la peau d’un Noir” (Sob a pele de um negro), qual há a transformação de uma família negra em “branca” e outra branca em “negra”. O objetivo é acompanhar o dia a dia de situações concretas de experiências comuns às relações étnico-raciais cujos voluntários vivenciam por uma semana. A troca de identidade étnica para experiências como buscar um apartamento para alugar, ida a shoppings caros, etc. Mais do que mostrar a incrível capacidade de modificação estética pela maquiagem, a experiência vislumbra mostrar o quanto a aparência (meramente superficial) pode influenciar nas interações sociais.

A seguir algumas interrogações para as devidas considerações por aqueles ligados direta ou indiretamente às questões socioeducativas intramuros das escolas, como também fica a sugestão do uso do espaço de comentário da postagem como lugar de inferências para os novos e velhos formadores de opinião da grande rede que tenham interesse em participar com o conhecimento embasado ou o ponto de vista na condição de ser humano preocupado com os rumos da educação das novas gerações, ou mesmo os sujeitos da comunidade escolar no exercício da liberdade de expressão. A seguir algumas interrogações sobre as questões étnico-raciais nas escolas:

1-    A escola desenvolve práticas pedagógicas relativas à implementação das Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação das Relações Étnico-raciais e do Ensino da História e Cultura Afro-brasileira e Africana?

2-      A escola elaborou um Projeto Político Pedagógico que contemple a orientação para implementação da educação de relações étnico-raciais e o ensino da História e Cultura Afro-brasileira e Africana?

3-      A escola atualizou outros manuais internos, programas e/ou documentos orientadores dos currículos e conteúdos a serem trabalhados na escola, de modo a inserir educação das relações étnico-raciais e o ensino da História e Cultura Afro-brasileira e Africana?

4-      A escola participou ou participa de alguma iniciativa especificamente, voltada para a qualificação de seu pessoal, sejam professores, gestores e/ou funcionários da unidade escolar, visando o combate ao racismo, à discriminação e o ensino de relações étnico-raciais?

5-      A escola conta com professores que participam ou participaram de alguma iniciativa de formação continuada em relação à diversidade, direitos humanos ou educação para as relações étnico-raciais, ainda que sejam iniciativas individuais?

6-      A escola utilizou ou utiliza livros didáticos específicos para o ensino da temática da Educação das Relações Étnico-raciais e o Ensino da História e Cultura Afro-brasileira e Africana?

7-      A escola adquiriu e/ou construiu, além dos livros didáticos, outros materiais didático-pedagógicos que respeitem e promova à diversidade étnico-racial, e/ou de gênero, e/ou a inclusão de pessoas com deficiências, tais como filmes, jogos, livros, brinquedos, instrumentos musicais, programas de computadores?

8-      A escola constrói coletivamente, reproduz e/ou adquiriu, alternativas pedagógicas para educação das relações étnico-raciais, e o ensino da História e Cultura Afro-brasileira e Africana, tais como jogos, dinâmicas, passeios, atividades extracurriculares, metodologias inovadoras, etc.?

9-      A escola manteve algum tipo de diálogo e trocam com outras instituições de ensino, gestores públicos, instituições da sociedade civil organizada como, por exemplo, organizações não governamentais, movimento negro e/ou outros movimentos sociais, de modo a contribuir com a implementação da Lei 10639/03 e 11.645/08?

10-  A escola promove e/ou apoia atividades com participação comunitária de maneira a proporcionar maior integração da população com a Educação e com o espaço escolar?

11-  A escola tem conhecimento de como se autodeclaram seus funcionários, professores e/ou estudantes em relação à raça/cor/etnia, de acordo com as categorias utilizadas pelo IBGE (branco, preto, pardo, amarelo e indígena)?

12-  A escola promove alguma forma de avaliação e/ou acompanhamento a respeito das ações de implementação das Diretrizes Curriculares para a Educação das Relações Étnico-raciais e para o Ensino de História e Cultura Africana e Afro-brasileira.

13-  A escola promove alguma iniciativa seja em relação à melhoria das instalações físicas da escola, seja a aquisição de equipamentos, seja a ampliação das vagas oferecidas, ou do número de turmas, seja da organização dos espaços (murais, biblioteca, horta, jardim, etc.) para melhor assistir a educação para comunidades remanescentes de quilombos, ou a educação infantil, ou a educação de jovens e adultos, ou a alfabetização de jovens e adultos?

14-  A escola apoia projetos e/ou iniciativas próprias dos estudantes em que a temática das relações étnico-raciais e da cultura africana e afro-brasileira tenha sido abordada, inclusive aquelas desenvolvidas fora do horário regular das aulas ou aquelas em que os estudantes tenham sido responsáveis pela organização e/ou realização?

15-  Foram realizadas iniciativas de recuperação, registro e/ou pesquisa, referente às atividades vivenciadas pela comunidade escolar, ou em relação à história e cultura locais, que guardem quaisquer relações com a história e cultura africana e /ou afro-brasileira (como por exemplo, reprodução, fotografia, gravação, filmagem, descrição, pesquisas de visitas, palestras, apresentações artísticas, projetos escolares, depoimentos de familiares, edificações e objetos históricos, etc.)?

Falar em Educação Inclusiva implica em providenciar e programar todos os ajustes que se fizerem necessários para garantir que as pessoas com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades, possam se matricular, frequentar e participar de escola regular, em todos os níveis de ensino e modalidade de educação. A inclusão localiza na estrutura escolar o alvo de mudança. Não é mais o aluno que deve se adaptar à escola, mas é a escola que deve se adaptar ao seu aluno. A escola tem que ressignificar as suas práticas, o que implica: mudanças de atitudes, constante reflexão sobre procedimentos didático-pedagógicos, modificação e adaptação do espaço físico e temporal, do currículo, da organização dos alunos, dos objetivos e conteúdos, das formas de avaliação. Desta forma o Paradigma de Suporte  traz a ideia de que todo cidadão com deficiência tem direito a receber todo e qualquer apoio que seja necessário para o desenvolvimento do seu potencial, para obter uma vida de qualidade e para ter uma real participação em todas as áreas de sua existência familiar, escolar, social, profissional e econômica. Porém, sabemos que as leis não tomam as escolas inclusivas, pois a inclusão não se decreta, vai-se construindo. Construir uma escola inclusiva e assegurar um ensino de qualidade para todos, implica uma profunda reforma das escolas, principalmente, de sua mentalidade e atitude

O fundamento ideológico das escolas inclusivas não procede principalmente das vantagens que pode ter para os alunos com problemas de aprendizagem em uma educação comum, nem na necessidade de uma reforma da educação especial. Sua base situa-se na declaração universal dos direitos humanos: os poderes públicos têm a obrigação de garantir um ensino não-segregador, que se prolongue posteriormente na integração á sociedade, a todos os alunos, sejam quais forem suas condições físicas, sociais ou culturais. Dessa perspectiva, o problema não está em analisar em que condições os alunos com necessidades educativas especiais podem ser escolarizadas na escola regular; o compromisso é garantir uma educação de qualidade para todos eles e realizar as transformações que sejam necessárias para se conseguir isso. Essa proposição foi incluída de forma explícita na declaração final da Conferência Mundial sobre Necessidades Educativas Especiais, realizada em Salamanca (Espanha) de 7 a 10 de junho de 1994 (UNESCO e MINISTÉRIO DA CIÊNCIA E DA EDUCAÇÃO, 1995). Um dos seus compromissos é formulado nos seguintes termos:

               Acreditamos que:

    • Todas as crianças de ambos os sexos têm um direito fundamental à educação e deve-se dar a elas a oportunidade de alcançar e manter um nível aceitável de conhecimentos;
    • Cada criança tem características, interesses e necessidades de aprendizagem que lhes são próprios;
    • Os sistemas educacionais devem ser projetados, e os programas aplicados de modo a levarem em conta toda essa gama de diferentes características e necessidades;
    • As pessoas com necessidades educativas especiais devem ter acesso às escolas regulares, que deverão integrá-las em uma pedagogia centrada na criança, capaz de satisfazer essas necessidades;
    • As escolas regulares com orientação integradora representam o meio mais eficaz para combater as atitudes discriminatórias, criar comunidades de acolhimento, construir uma sociedade integradora e obter educação para todos; além disso, proporcionam uma educação efetiva para a maioria das crianças e melhoram a eficiência e, em suma, a relação custo-eficácia de todo o sistema educacional (MARCHESI; COLL; PALACIOS & Colaboradores, 2004, p. 26)

Comungando com o pensamento de Vygotsky, o psicólogo israelense Reuven Feuerstein também destaca a importância da mediação no ensino e acredita que nem fatores genéticos, orgânicos, ambientais ou outros quaisquer, podem produzir um deterioramento irreversível no desenvolvimento cognitivo do indivíduo. Seu programa de modificabilidade cognitiva estrutural e aprendizagem mediada e o programa de enriquecimento instrumental pressupõe que sempre há um potencial de aprendizagem disponível no ser humano, independente da raça, grau de instrução, classe social, e que podemos contradizer todo determinismo genético, pois nada no ser humano está definitivamente escrito. A pedagogia da infância inicial tem alguns princípios distintos que se refletem no discurso e debate a respeito do profissionalismo na educação infantil. Eles incluem reflexão, inclusão, responsividade, afetuosidade, extrema consciência, envolvimento empático e pessoal com as crianças, suas famílias e comunidade, crenças, sentimentos e comprometimento firma com a proteção e apoio as crianças, diferentemente daquele impulsionado pelos processos burocráticos, assume uma dimensão ontológica e passa a ser centrada na pessoa. Ela reconhece, considera e critica o conhecimento existente (matérias e a aprendizagem de teorias específicas), reflete sobre a experiência e teorias populares ou senso comum, investe em relacionamentos dialéticos e reconhece os contextos cultural, social e estrutural em que ocorrem esses relacionamentos (MOYLES, 2009, p. 61-62). Pensar na escola de educação inclusiva e buscar nas brincadeiras infantis a prática  das teorias socioculturais, principalmente, pelo que elas têm de entendimento da capacidade de assimilar o outro sem o reducionismo de objetivos na intencionalidade que permeia as relações no espaço formativo. O filme “Vermelho como o Céu“, é uma verdadeira aula de educação inclusiva quando demonstra, claramente, que quando as pessoas recebem o mesmo status e facilidades para cooperar e criar relacionamentos interpessoais por meio de contato pessoal mudam as relações, os entendimentos, as atitudes e os possíveis preconceitos entre grupos (Allport, 1954; Bailey, 1998; Ainscow, 1988 apud MOYLESs, 2009, p.57-58).

Num momento em que a frase “celebrar a diversidade” tenha se tornado o novo mantra, implicando educação equitativa para todos os alunos, independentemente de sua origem e suas experiências. Assim sendo, o reconhecimento e a identificação da diferença na educação podem ter uma força poderosa e incisiva, emancipatória ou discriminatória (O´Brian, 2005), como também ser compreendidas em níveis variados e múltiplos, isto é, em nível ideológico e político, institucional, estrutural e subcultural.No nível ideológico e político, a diferença é definida em políticas internacionais e nacionais que, por exemplo, tratam de direitos da criança, antirracismo, multiculturalismo e inclusão. Nesse nível, o reconhecimento da diferença se justifica em nome de ideias de tratamento imparcial e justiça social para todos. No nível institucional, a diferença é promovida   sancionando    e difundindo-se    normas  e  diretrizes   que  refletem  essas  ideias. No  nível  estrutural     e procedural, a diferença é reconhecida pelo estabelecimento de estruturas e procedimentos que identificam e desafiam as relações de poder. No nível subcultural, a diferença é usada para identificar e contestar sistemas sociais amplos e coesos que solapam a igualdade de tratamento e oportunidade (Troyna e Hatcher, 1992; Gordon, 2005, Irwin, 2005 apud MOYLES, p. 57-58)

“O homem que atinge o estado moral não é aquele que se adapta a sociedade, mas aquele   que colabora na construção de uma sociedade digna e  justa”.                                                              Pestalozzi

 

 BIBLIOGRAFIA

CORREIA, L. de M. Alunos com necessidades educativas especiais nas classes regulares. Porto: Porto Ed., 1997.

COLL, César; MARCHESI, ALVARO, PALACIOS, Jesús. Desenvolvimento psicológico e educação – Transtornos de desenvoovimento e necessidades educativas especiais. Tradução: Fátima Murad, 2ª Ed. São Paulo: Artmed, 2004.

DORIGO, Maria Helena Girotto e NASCIMENTO, Maria Isabel Moura. A Concepção Histórica Sobre as Crianças Pequenas: Subsídios para Pensar o Futuro. Revista da Educação. Vol 2, nº 3, Paraná. jan/jun 2007, p. 15-32. Disponível em <http://e-revista.unioeste.br/index.php/educereeteducare/article/view/652 >

FEUERSTEIN, Reuven. Website: Wikipédia. Disponível em < http://pt.wikipedia.org/wiki/Reuven_Feuerstein >        Acesso em: 11 de novembro de 2010.

KRAMER, Sonia, e ABRAMOVAY, Mirian. O rei está nu: um debate sobre as funções da pré-escola. Cadernos Cedes. São Paulo, Cortez, (9): 1984, 27-38.

LEAL, Lopes Leane. Educação pré-escolar: subversão ou recomposição da ordem? Dissertação de Mestrado.  UFSCar-PPGE. São Carlos, 1990MARCHESI, Álvaro, COLL, César, PALÁCIOS, Jesús & Colaboradores. Desenvolvimento Psicológico e Educação – V. 3, Artmed: Porto Alegre, 2004.

MITTLER, Peter. Educação Inclusiva. Porto Alegre, Artmed: 2003.

MOYLES, Janet  & Colaboradores. Fundamentos da Educação Infantil – Enfrentando o Desafio. Artmed: Porto Alegre, 2009.

NASH, Paul. Autoridade e Liberdade na Educação.  Rio de Janeiro,  Edições  Bloch: 1968

PARDAL, M. O cuidado às crianças pequenas no Brasil escravista. In: VASCONCELLOS, V.. Educação da Infância: história e política. Rio de Janeiro: DP&A, 2005.

 REINALDO, Telma Bonifácio dos Santos. Proposta Metodológica para o Ensino de História da África na Educação Básica (Ensino Fundamental Maior), Disponível em: http://www.redem.org/boletin/boletin310110g.php

SILVA, Maria Odete Emygidio. Necessidades Educativas Especiais (NEE): Identificação e Intervenção Pedagógica. Modalidade: Curso de Formação. Universidade Lusófona  de Humanidades e Tecnologias. Lisboa

Disponível em < http://www.scribd.com/doc/2671208/NECESSIDADES-EDUCATIVAS-ESPECIAIS-DA-IDENTIFICACAO-A >.

SEPPIR (Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial). Selo de Educação para a Igualdade Racial 2010. Brasília, até 20 de novembro. Disponível em < Selo de Educação para a Igualdade Racial 2010 — Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial >

STAINBACK, Susan e STAINBACK, William. Inclusão, Porto Alegre: Artmed, 1999.

 

LEITURA COMPLEMENTAR

BRAGA, Alexandre Francisco. Educação Afro Indígena: caminhos para a construção de uma sociedade igualitária. Revista FACED,  n. 15, Salvador, jan,/jul. 2009, p. 127-141  Disponível em < http://www.portalseer.ufba.br/index.php/rfaced/article/view/3257/3523>

BOLETIM FAMALIÁ –  O Boletim Famaliá é uma iniciativa da Famaliá Produções LTDA. que objetiva divulgar as principais notícias relativas ao universo das culturas populares e dos povos e comunidades tradicionais. As notícias são captadas através de uma grande rede de informantes e serão atualizadas frequentemente no sítio http://www.famalia.com.br/?cat=3 Informações poderão ser obtidas e colaborações poderão ser feitas através do endereço famalia@terra.com.br. Literatura infantil afro-brasileira: https://projetomuquecababys.wordpress.com/2010/12/08/mau-preparo-de-professor-atrapalha-ensino-de-literatura-afro/

Filmes Educativos – Direcionado a professores  de classes integradas, de educação especial, pais e pessoas interessados no tema. Disponível em:: http://www.filmeseducativos.com/filmoteca_20.php

HOSPITAL SARAH RIO, especializado em neuro reabilitação, inaugurado no dia 01 de maio de 2009, na  Barra da Tijuca, já está cadastrando para atendimento, novos pacientes adultos e crianças com as seguintes patologias:

· Paralisia cerebral · Crianças com atraso do desenvolvimento motor · Sequela de traumatismo craniano · Sequela de AVC · Sequelas de hipóxia cerebral · Má-formação cerebral · Sequela de traumatismo medular · Doenças medulares não traumáticas como mielites e mielopatias · Doenças neuromusculares como miopatias, neuropatias periféricas hereditárias e adquiridas, amiotrofia espinhal · Doença de Parkinson e Parkinsonismo · Ataxias · Doença de Alzeihmer e demências em estágio inicial · Esclerose múltipla · Esclerose lateral amiotrófica em estágio inicial · Mielomeningocele · Espinha bífida · Paralisia facial O atendimento é totalmente gratuito. O cadastro para atendimento de novos pacientes é feito exclusivamente pelos telefones: 21 3543-7600 21 3543-7600 e 21 3543-7601/2, das 08 às 17 horas,  de segunda a sexta-feira.

Endereço: Embaixador Abelardo Bueno, nº 1.500 Barra da Tijuca 22775-040 – Rio de Janeiro – RJ  http://www.sarah.br/

Parecer  CNE/CEB Nº 15/210. Disponível em < http://ead.sitescola.com.br/arquivo/documento/Parecer%20Lobato.pdf>

Projeto de Lei nº 455/2007 do deputado Alessandro Molon Dispõe sobre medidas para identificação e tratamento da dislexia na rede estadual de educação e dá outras providências. Disponível em <http://www.apad-dislexia.org.br/projetos.shtml >

Salloma Salomão – Aruanda Mundi

http://aruandamundi.ning.com/?xg_source=msg_mes_network

 

UNICEF – Por uma Infância sem Racismo

OLIVEIRA, Eliana. Identidade, intolerância e as diferenças no espaço escolar: questões para debate, Revista Espaço Acadêmico, Ano I,  nº 07, Dezembro/2001. Disponível em <http://www.espacoacademico.com.br/007/07oliveira.htm  > 

As causas do Fracasso Escolar

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Luis Carlos “Rapper” Archanjo

O tema fracasso escolar encontra-se constantemente em pauta nas discussões dos órgãos oficiais e dos especialistas responsáveis pela educação. Medidas político-administrativas e pedagógicas são debatidas, elaboradas, adotadas e, da mesma forma, pesquisas e exames nacionais vêm sendo realizados com o intuito de solucionar problemas referentes ao grande número de crianças em idade escolar fora da escola, seja porque nela nunca ingressaram ou porque sofreram o processo de evasão ou repetência. Esses estudos e medidas, quase sempre, são elaborados a partir de uma perspectiva calcada nos interesses da classe dominante, baseado num modelo liberal e colocam a escola e a educação formal como redentores e equalizadores das desigualdades sociais. Segundo Patto (1996) foram teorias baseadas num discurso pedagógico liberal  [1] que serviram de pano de fundo às explicações do fracasso escolar durante o percurso da pesquisa da política educacional no país. (SIRINO, 2002)

Em princípio marcadas por um discurso biológico em que as causas do fracasso escolar estavam relacionadas a fatores genéticos, raciais e hereditários dos indivíduos. Nos anos 70 um novo discurso passa a ser buscado na proveniência cultural dos alunos, dando origem histórias de carência cultural. Recentemente pesquisas como as de Patto (1996, apud GRACIANO, 2007: 4, 50-60); Cruz (1987), Machado (1994); Souza, M (1991) e outros procuram mudar o eixo da discussão sobre o fracasso escolar, buscando contextuar o problema dentro de um pensamento histórico brasileiro, empenhando-se em desvelar como se constroem as idéias de desvalorização e os preconceitos em relação aos indivíduos da classe trabalhadora e, muitas vezes legitimados sob um discurso cientificista. Essas pesquisas recentes revelam que a escola se constitui como reprodutora das desigualdades sociais e da dominação, por outro lado revelam que no interior da escola, assim como na sociedade, surgem contradições que favorecem um embate de idéias e atitudes que poderão provocar rupturas nos discursos e práticas cristalizadas que ali se processam.

Como o dito popular que diz: “A corda sempre arrebenta para o lado mais fraco”, continua persistindo a tendência em vincular o fracasso escolar, muitas vezes, às crianças; que tratadas como incompetentes, não tendo direito de se expressarem, cabendo ao professor incutir-lhes o saber “conta bancária”. A não adaptação a esse saber é um problema da criança-aluno, quer por razões pessoais, emocionais, culturais, familiares, biológicas, etc., não consegue ter aproveitamento a contento. Duas conseqüências, no plano pedagógico, decorrem desse papel dominador da escola: a submissão ou a agressividade. Ambas dificultam a aprendizagem porque atingem a autoestima da criança. Dessa forma a escola assume uma função estigmatizadora, criando o estereótipo do aluno marginalizado, que é, na maioria das vezes aquele proveniente das camadas populares.

A sociologia da educação de Bourdieu nos dá uma síntese dos clássicos da sociologia quanto a relação histórico-dialética entre condutas individuais propelidas por disposições socialmente adquiridas e integradas em um habitus, de um lado, e estruturas objetivas ou “campos”  de relação entre agentes diferencialmente posicionados e empoderados de outro e, assim, nos dá a explicação dos simbolismos que permeiam o acordo tácito entre antagônicos para que não se instale uma anomia hobbesiana, mesmo que no caos das nossas desigualdades sociais, onde a escola cumpre o seu papel ideológico quando seleciona os conteúdos escolares em função dos conhecimentos, dos valores, e dos interesses das classes dominantes e se dissimula aos questionamentos ao inculcar o objetivismo das teorias estruturalistas, criticadas  por Bourdieu pelo que estas descreveriam a experiência subjetiva como diretamente subordinada às relações objetivas (normalmente, de natureza linguística e econômica).  A transmissão dos conhecimentos seguiria o que Bourdieu chama de “pedagogia do implícito”, o pleno aproveitamento da mensagem pedagógica suporia implicitamente, a posse de uma capital cultural anterior que apenas os alunos provenientes das classes dominantes apresentam. Bourdieu afirma, em primeiro lugar, que a ação das estruturas sociais sobre o comportamento do individuo se dá de dentro para fora e não o inverso. A partir de sua formação inicial em um ambiente social e familiar que corresponde a uma posição específica na estrutura social, os indivíduos incorporam um conjunto de disposições para a ação típica dessa posição (“habitus” familiar ou de classe) e que passaria a conduzi-los ao longo do tempo e nos mais variados ambientes de ação. A escola e o processo de representação das desigualdades apontam para um mesmo princípio de inteligibilidade: o “das relações entre o sistema de ensino e a estrutura das relações simbólicas”.

O  ponto de partida do raciocínio de Bourdieu talvez se encontre na noção de arbitrário cultural, ou seja, nenhuma cultura pode ser objetivamente definida como superior a nenhuma outra, portanto a cultura escolar socialmente reconhecida como cultura legítima, como única universalmente válida, seria arbitrária ou uma violência simbólica imposta pelas classes dominantes. A partir dos processos alienantes da autoridade pedagógica, isto é, a legitimidade da instituição escolar e da ação pedagógica que nela se exerce, só pode ser garantida na mediada em que o caráter arbitrário e socialmente imposto da cultura e dissimulado quando esta se omite na neutralidade de conteúdos proporcionais à sua capacidade de se apresentar como não arbitrária e não vinculada a nenhuma classe social através do discurso da equidade formal entre todos os alunos, mesmo nas questões do domínio prévio de um conjunto de habilidades e referências culturais  e linguísticas da vitaliciedade da bagagem cultural de professores na busca daqueles com instrumentos decodificadores para realidades afins, pelo que estes receberam de herança cultural desde muito cedo e de modo difuso, insensível, teriam dificuldade de se reconhecer como “herdeiros“. O autor observa que o efeito de legitimação provocado pela dissimulação das bases sociais do sucesso escolar é duplo: manifestar-se em relação tanto aos filho  das camadas dominantes quanto dominadas. Os primeiros, suas disposições e aptidões culturais e linguísticas pareceriam ser naturais, fazer parte de sua própria personalidade. O segundo grupo, por outro lado, sendo incapaz de perceber o caráter arbitrário e impositivo da violência simbólica da cultura escolar, tenderia a atribuir suas dificuldades escolares a uma inferioridade que lhe seria inerente, definidas em termos intelectuais (falta de inteligência) ou morais (fraqueza de vontade) (NOGUEIRA, 2002, p. 26-30)

“Atribui-se ao próprio sujeito marginalizado a culpa pela sua exclusão.” (TEIXEIRA, 1992). Apesar do volume de pesquisas sobre o tema investigado, poucos abordam o problema a partir da ótica da criança-aluno e sua família. Investigar o fracasso escolar a partir do ponto de vista do excluído é, a nosso ver relevante, por explicar através da fala dos próprios alunos os efeitos produzidos pelo rótulo de fracassado escolar, ao considerar as diferentes versões que elas produzem sobre sua condição escolar e, os efeitos na imputação do estigma de fracasso em sua subjetividade. Todas essas questões envolvem preconceito, estereótipo, formação de identidade e processos de diferenciação enquanto construção social e cultural. Avaliações de senso comum sobre os alunos da escola pública são uma forma em que nomes, justificativas e rótulos usados para os números altamente elevados de retenção, exclusão e encaminhamentos de alunos nos meios escolares do tipo: não presta atenção em nada, não aprendia porque tinha algum comprometimento cognitivo, imaturo, vítima de família desestruturada, fome, falta de estímulo, trabalho infantildificuldades de aprendizagem entre outros de um vasto repertório de transferência da problematização para a não valorização dos saberes e interesse da criança-aluno [2].

Autonomia, empreendedorismo, tecnologia , competitividade, abstração  na empregabilidade, autodidaxia, raciocínio lógico-formal são algumas das palavras-chave de um novo princípio educativo para atender as demandas de complexidade da realidade social do nosso tempo; onde a sociologia compreensiva, pela intrínseca relação entre ação social, gestão e estudos qualitativas e quantificativos, pode auxiliar na compreensão dos fenômenos sociais surgidos de trocas interpessoais entre os atores contemporâneos dos processos reflexivo-investigatórios em que o universo educativo é  cena e  seio do dinamismo da vida individual e coletiva com toda a riqueza de significados dela transbordantes. Essa mesma realidade é mais rica que qualquer teoria, qualquer pensamento e qualquer discurso que possamos elaborar sobre ela. Portanto, os códigos das ciências que por  sua natureza são sempre referidos, recortados e   incapazes de conter a totalidade da vida social.  No entanto, possuem instrumentos e teorias capazes de fazer uma aproximação da suntuosidade da existência dos seres humanos em sociedade, ainda que de forma incompleta, imperfeita e insatisfatória. Para isso, elas abordam o conjunto de expressões humanas constantes nas estruturas, nos processos, nas representações sociais, nas expressões da subjetividade, nos símbolos e significados. Entre as teorias qualitativas  para  investigação dos fenômenos sociais  segue algumas considerações  sobre a influência da  Sociologia Compreensiva  de Max Weber  em pesquisas qualitativas pelo que esta corrente sociológica coloca como tarefa mais importante das Ciências Sociais a compreensão da realidade humana com suas transformações e mudanças na forma de vida, nas formas de existência segundo rupturas emergentes com as novas tradições científicas. Em suas diferentes manifestações – fenomenologia, etnometodologia, interacionismo simbólico – significado é o conceito central da investigação. Num embate direto com o positivismo, a Sociologia Compreensiva  propõe a subjetividade como fundamento do sentido da vida social e defende-a como constitutiva do social inerente à construção da objetividade na Ciências Sociais. Os autores compreensivistas não se preocupam em quantificar e em explicar, e sim em compreender: este é o verbo da pesquisa qualitativa. Compreender relações, valores, atitudes, crenças, hábitos e representações a partir desses conjuntos de fenômenos humanos gerados socialmente, compreender e interpretar a realidade.   “O pesquisador que trabalha com estratégias qualitativas atua com matéria-prima das vivências, das experiências, da cotidianeidade e também analisa as estruturas, instituições, mas entendem-nas como ação humana objetivada” X(MINAYO; GOMES, 2010, p. 14-24).  Ou seja, para esses pensadores e pesquisadores, a linguagem, os símbolos, as práticas, as relações e as coisas são inseparáveis [3]. Se partimos de um desses elementos, temos temos que chegar aos outros, mas todos passam pela subjetividade humana.

O filósofo Edgar Morin critica, por exemplo, que nas escolas e nas universidades não existe um ensino sobre o próprio saber, ou seja, sobre os enganos,  ilusões e erros que partem do próprio conhecimento, defendendo a necessidade de criar cursos de conhecimento sobre o próprio conhecimento. O autor de “Os Sete  saberes para a Educação do Futuro, Educar para a Era Planetária lamenta, igualmente, que a condição humana está totalmente ausente do ensino: Perguntas como o que significa ser humano? Não são ensinadas, critica. Por outro lado, Morin acredita que a “excessiva especialização” no ensino e nas profissões produz um conhecimento incapaz de gerar uma visão global da realidade, uma inteligência cega. “Conhecer apenas fragmentos desagregados da realidade faz de nós cegos e impede-nos de enfrentar e compreender problemas fundamentais do nosso mundo enquanto  humanos e cidadãos, e isto é uma ameaça para a nossa sobrevivência, defende”. O que proponho é fornecer aos alunos as ferramentas de conhecimento para serem capazes de ligar os saberes dispersos, explica.  Souza (2008, apud SUANNO 2010) apresenta seis aspectos que contribuem para construírem práticas pedagógicas inovadoras e emancipadoras e saberes docentes, sendo eles: considerar os conhecimentos prévios dos alunos; aprendizagem cooperativa; metacognição; motivação; autonomia; criticidade e criatividade como atitudes interdependentes e relações dialéticas entre pensamento e emoção.

“Situados em categoria limitrofe da escala Stanford-Binet, ou ‘deficiente circunstancial’, para alunos que apresentam distúrbios de aprendizagem, mas não deficientes, e que também são excluídos, rotulados e encaminhados para a educação especial” (MANTOAN, 1996). Essas crianças apresentam problemas de aprendizagem não vinculados a uma causa orgânica específica, mas sim, em consequência de inúmeros determinantes secundários como a intergeracionalidade de vidas precárias, a violência urbana e o déficit cultural, por exemplo. A versão do déficit cultural baseia-se na ideia de que o ambiente carente gera deficiências pessoais, motoras, perceptivas, afetivo-emocionais ou de linguagem. Segundo alguns estudiosos o fracasso escolar pode ser analisado a partir de quatro eixos principais:

1-     O fracasso escolar como um problema psíquico: culpabilização das crianças e dos pais; 2-     O fracasso escolar como um problema técnico: não se localiza nos problemas individuais dos alunos, mas na técnica de ensino do professor. O ser humano relaciona-se com o outro, com o mundo e com ele mesmo através do movimento. Ou seja, somos seres de relação que, agindo, entramos em contato com o mundo. “É a partir das referências do corpo que os seres humanos fazem cultura.” (Tiriba, 2001 apud CRUZ, 2005); 3-     O fracasso escolar como uma questão institucional : A lógica excludente da educação escolar parte do princípio que o fracasso escolar é um fenômeno presente desde o início da instituição da rede de ensino público no Brasil; 4-     O fracasso escolar como uma questão política: a escola é um modelo em miniatura regido pela mesma lógica constitutiva da sociedade de classes.

Pais inferiorizados pelo mal-desempenho escolar de seus filhos, conseqüente do não enquadramento nos padrões determinados pela escola, acabam se sentindo como os grandes culpados pelo mau rendimento do aluno. A frustração, diante das dificuldades dos filhos na escola, leva as famílias a procurarem explicação nas próprias crianças. As explicações mais comuns são de natureza médica, falta de interesse. Os pais introjetam a culpa pelo fracasso do filho e este é naturalizado como se fosse uma doença ou um problema próprio do caráter da criança. Mas os mesmos pais trazem também outras opiniões a respeito das dificuldades escolares dos filhos. A enquete a seguir tem o objetivo de buscar algumas respostas para o fracasso escolar. Foram enumeradas algumas interrogações do repertório das queixas de práticas de ensino-aprendizado que não conseguem cumprir o papel da escolarização como intermediador da emancipação pessoal para uma parcela da população e, pelo contrário, deixa que ao fracasso escolar conforme a geografia da desescolarização e a conseqüente exclusão dos processos de cidadania, nascida desde a precoce introjeção da naturalização das mazelas do dia a dia da criança-aluno no espaço intra e extra-muro da escola pública com suas diretrizes e resultados em constante questionamento pela pedagogia crítico-reprodutivistas e a sua orientação para uma práxis educativa voltada para a compreensão da nossa realidade histórico-social, por exemplo, já que não existe educação neutra  [4], já que toda educação não se isola do contexto social e político e, por isso, os pólos educação e política são complementares e indissociáveis.

Num mundo de discurso entre iguais da educação fica o registro de que o que identifica o outro é o seu rosto, e é muitas vezes no rosto do outro que eu encontro a minha própria identificação. Cada rosto é diferente, mas me dá o sentido do respeito, face a face, olho no olho, eu me vejo no outro, pois há uma interpelação quando estamos diante do rosto do outro. Quando o professor aprender a olhar no rosto de seus alunos e não apenas no diário de classe, quando permitir o ser olhado, o senso de respeito ao outro e ao que é diferente, surgirá. Este senso surge quando identificamos o rosto e permitimos ser identificados. Aprender o sentido e o infinito no rosto do outro é a “ética da alteridade”. O ensinar deve traduzir o respeito ao outro, como linguagem do seu modo de ser, sem possuí-lo. Muitas vezes para ver o rosto do outro é preciso olhar com outras lentes, que não sejam as dos míopes, de preferência com a lente do outro, e procurar ver como o outro vê. Isso nos provoca e convoca a análise dos discursos que nos levam à princípios de verdades que são excludentes, ou seja, que não promovem a solidariedade e o respeito ao diferente, ao outro.

 “Já li muitos livros sobre psicologia da educação, sociologia da educação, filosofia da educação – mas, por mais que eu me esforce, não consigo me lembrar de qualquer referência à educação do olhar ou à importância  do olhar na educação, em qualquer um deles.” (Rubens Alves)

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[1] – Conhecimentos e competências no trabalho e na escola – Enfim, adentramos no campo movediço das ideologias, onde a  concepção de competência fundada no trabalho concreto vai se tornando anacrônica do ponto de vista da produção do valor, passando a assumir um novo significado a partir da ampliação  do trabalho abstrato e do trabalho não material, embora a lógica da reestruturação produtiva no regime de acumulação flexível repouse sobre a integração de todas as formas de trabalho, das mais precárias às mais qualificadas, nas cadeias produtivas, do que depende a competitividade. Reforça-se, por este argumento, a afirmação feita acima, sobre o caráter parcial do novo conceito de competência, uma vez que, embora apresentado como universal, inclusive no discurso pedagógico oficial, refere-se a uma modalidade específica de trabalho: o reestruturado, que demanda forte articulação entre as dimensões psicomotora, cognitiva e afetiva ( fazer, saber e ser ), para o que o domínio dos conhecimentos científico-tecnológicos e sócio-históricos, adquirido através de extensa, continuada e bem qualificada escolaridade é fundamental.

[2] – Pro Dia Nascer Feliz – É um documentário que tenta traçar o que pensam os adolescentes de hoje sem uma visão preconceituosa, seja contra alunos de colégios públicos ou particulares ou entre moradores da capital e do interior. Sem generalizar e tentando manter a parcialidade, o filme revela as semelhanças e diferenças entre os jovens, mostrando suas expectativas de futuro.

Pro dia Nascer Feliz – Part 1.2 Pro dia Nascer Feliz – Part 04 Pro dia Nascer Feliz – Part 03 Pro dia Nascer Feliz

[3] Princípio da contextualização: Contribuição de Paulo Freire (1996, p. 33-34), Pedagogia do Oprimido (1) (2), e orientação na formação de um professor crítico, reflexivo-investigador da e na sua práxis, no sentido de uma intervenção na realidade contribuindo para a mudança de valores e atitudes dos alunos, e não apenas no sentido de lhes mostrar o que se passa a sua volta, tanto quanto questões deterministas do lugar social desses alunos suscitam posturas de educação como ato político, como no princípio freireano, para realidade tão desfavorável.  Portanto, a construção de uma sociedade justa, equânime, igualitária passa pela formação de professores pautada na ética, na sensibilidade afetiva e na estética, que se materializa no fortalecimento da comunicação entre as pessoas, do entendimento das subjetividades e do respeito à verdade do outro. Ou seja, a contextualização de temas da realidade concreta do aluno na sala de aula  como caminho para a construção de um conhecimento pessoal significativo e relevante.

Por que não discutir com os alunos a realidade concreta a que se deva associar a disciplina cujo conteúdo se ensina, a realidade agressiva em que a violência é a constante e a convivência das pessoas é muito maior com a morte do que com a vida?

Por que não estabelecer uma necessária “intimidade” entre os saberes curriculares fundamental aos alunos e a experiência social que eles têm como indivíduos?

Por que não discutir as implicações políticas e ideológicas de um tal descaso dos dominantes pelas áreas dos pobres da cidade?

Para Ivani Fazenda (1999, p. 17), a interdisciplinaridade é entendida, como uma nova racionalidade: “O que com isso queremos dizer é que o pensar interdisciplinar parte do princípio de que nenhuma forma de conhecimento é em si mesma racional.” Tenta, pois, o diálogo com outras formas de conhecimento, deixando-se inter-penetrar-se por elas. Aceita o conhecimento do senso comum como válido, pois é através do cotidiano que damos sentido às nossas vidas. Ampliando através do diálogo com o conhecimento científico, tende a uma dimensão utópica e libertadora, porque permite enriquecer nossa relação com o outro e com o mundo. E ainda: “No projeto interdisciplinar não se ensina, nem se aprende: vive-se, exerce-se”.

A desconstrução da autoimagem da docência como lugar de transmissão do pensamento dominante em nome de olhares que contemplem formas de se estar no mundo, mais justo e igualitário, mais humano, menos segregadores dos coletivos que chegam na diversidade dos processos de universalização da educação básica pública seria uma alternativa para superar racionalidade científico-técnica imposta de forma acrítica aos profissionais da educação. Para Arroyo (2011, p. 58), a presença de coletivos docentes preocupados com as dimensões que contra argumentam com a cientificidade, a neutralidade e a impessoalidade em nome da subjetividade e objetividade necessárias a dialogicidade de intersubjetividade representativa de suas existências humanas, seus valores, saberes, culturas, saberes, identidades, lutas por terra, teto, território, saúde, educação, direitos, provoca intencionalidades educacionais universalizantes em nome de formação superior capaz de articular princípios como o do pensamento contra  hegemônico gramsciano, por exemplo, materializado em projeto pedagógico com missão de formar intelectuais orgânicos com sustentação em bases teóricas e pressupostos conceituais  comprometidos em dar vez e voz às  minorias. Ou seja, embasar formadores de opinião capazes de exigir suas condições de sujeito de história, memórias, modos de pensar.

Para que possamos caminhar no enfrentamento dos desafios inerentes à pluralidade cultural presente na escola, o primeiro passo será olhar para nossas próprias identidades culturais. “Esse processo de conscientização do que somos, este mergulho pessoal nas culturas que nos constituíram como sujeitos, é um ponto de partida importante para nos conectarmos com os processos socioculturais do contexto em que vivemos, da história do nosso país” (CANDAU, 2008). A autora sugere que este exercício de reconhecimento de identidade seja feito tanto nos processos de formação docente, para que os professores entrem em contato com suas origens culturais, como com os alunos, desde os anos iniciais do ensino fundamental. Porém, para uma ultrapassagem da “visão romântica” ao estágio de reconhecimento de nossas identidades, Candau evidencia a necessidade de uma nova postura na relação pedagógica.  A “nova postura” proposta pela autora envolve a superação de um “daltonismo cultural“, que impede que se enxergue a diversidade de “matizes” culturais presentes na sala de aula, no contexto sociocultural dos alunos, fechando nossos olhos não só para as diferenças, mas para reconhecer a importância de discuti-las, de problematizá-las, de não naturalizá-las. “Isto implica um olhar mais acurado para as evidências empíricas ao investigar-se a riqueza cultural dos alunos e de seu grupo social, como também da dificuldade de se  lidar nas práticas educativas com diversas manifestações da diferença: de gênero, étnicas, de orientação sexual, ritmo de aprendizagem,  geracional, sensório-motoras, cognitivas, entre outras” (CANDAU, 2008, p. 248).

Nas suas considerações sobre o papel do currículo como um dos mecanismos para a permanência de determinações e relações  sociais injustas que caracteriza a nossa sociedade de classes e, ao mesmo tempo, lugar para ascultar o que há de mais positivo, de ético e para reagir ao que não é ético, Arroyo (Ibidem, p. 77-78) cita, por exemplo, os livros de textos que ainda chegam às escolas carregados de preconceitos sexistas, racistas, inferiorizante. Ou seja, currículos e livros são pensados como espaços de saberes, de conhecimentos e de concepções descoladas de vivências da concretude social e política. Estes aparecem em um vazio social, produzidos e reproduzidos, ensinados e aprendidos sem referência a sujeitos, contextos e experiências concretas. Consequentemente as didáticas de seu ensino/aprendizagem são abstratas, válidas para todo conhecimento e para todo aluno ou coletivo. Portanto, sem distinção de vivências e experiências tão humanas e tão desumanas que convergem aos processos de universalização da educação básica pública, primeiramente. Esse caráter  abstrato,  geral, único do conhecimento curricular de alguma forma está consagrado na clássica dicotomia que estrutura o ordenamento curricular de educação básica: núcleo comum e parte diversificada.

O núcleo comum ou aquelas verdades, conhecimentos que não trazem marcas das diversidades regionais ou da diversidade de contextos concretos de lugar, classe, raça, gênero, etnia. Comum a um suposto ser humano, cidadão, genérico, universal, por cima dos sujeitos concretos, “contextualizados”, diversos. A parte diversificada é o outro, os outros, não universal. Consequentemente os saberes, conhecimentos, valores, culturas dos outros, dos diversos não são componentes do núcleo comum, não são obrigatórios. Nesta lógica serão secundarizados. Por essa lógica, conclui-se que toda a produção cultural, intelectual, ética, estética dos coletivos diversos em região, gênero, raça, etnia, classe, campo, periferia seja desconhecida no sistema escolar, nos currículos, desde a educação da infância à universidade. A parte diversificada é optativa às escolas, logo não direito do ser humano universal. Um lógica segregadora estruturante dos ordenamentos, das diretrizes e dos conhecimentos curriculares. Esses  critérios de definição do conhecimento se enreda com o padrão de poder, de dominação/subordinação nas sociedades.

A sociologia crítica dos currículos avançou explicitando as relações políticas entre currículo/conhecimento/poder. Não apenas de apropriação/negação do saber, mas de legitimação de um saber e deslegitimação/negação de outros saberes nos currículos. A luta contra a injustiça cognitiva nos leva para além da distribuição mais equitativa do saber científico e reconhecer que toda experiência produz conhecimento. Que todos os conhecimentos sustentam práticas e constituem sujeitos. Quando as experiências sociais são ignoradas se ignora o trabalho humano, a experiência mais determinante do conhecimento. Enquanto as experiências sociais, humanas, de vida e trabalho não forem reconhecidas como conformantes do conhecimento, das ciências e dos saberes e dos processos de ensino/aprendizagem não serão reconhecidas e valorizadas as experiências sociais, humanas, de luta, de trabalho e de vida dos profissionais do conhecimento e dos seus aprendizes. “Boaventura de Souza Santos nos adverte que a injustiça social assenta na injustiça cognitiva” (Ibidem, p. 117).

Portanto, pensar em educação transformadora no quadro de práticas e rituais coercitivos, antidemocráticos, instituídos e reproduzidos como rotinas escolares e docentes assumidos acriticamente; nos processos de desescolarização produzidos pela retenção, reprovação, não adaptação consequente da naturalização de desigualdades culturais na contramão do conhecimento e respeito ao princípio de igualdade, significa o questionamento de modelos fechados e abstratos que não incorporam as diferenças, não superam as formas de classificação, segregação e  todos os resquícios de crença nas desigualdades comuns à relação pedagógica,  consubstanciada em teorias da aprendizagem, para com os filhos (as) das classes populares ao não reconhecer que todo educando (a) são iguais na capacidade pensar, raciocinar e aprender. Nesse sentido, Arroyo (2011, p. 360) sugere provocar nas redes e nas escolas intervenções corajosas nos critérios e práticas de agrupar os educandos na busca de formas mais radicais e mais duradouras de inovar estilos e concepções, culturas e valores democráticos e igualitários como caminho para mexer nos velhos critérios classificatórios e, consequentemente nas bases democráticas ou antidemocráticas. Ou seja, mexer fundo nas crenças, valores e culturas em nome de outra lógica temporal  para a aprendizagem de cada um e da diversidade dos educandos. O Brasil fez a opção de um sistema escolar inclusivo ao concordar com a Declaração Mundial de Educação para Todos, firmada em Jomtien, na Tailândia, em 1990, e ao mostrar consonância com os postulados produzidos em Salamanca, na Espanha, em 1994, na Conferência Mundial Sobre Necessidades Educacionais Especiais (NEE): Acesso e Qualidade, conforme  texto transcrito do documento: “[…] cada criança tem características, interesses, capacidades e necessidades de aprendizagem que lhes são próprios.”

Transformações retóricas evidenciam que o discurso democrático vem sendo negado a milhões de cidadãos, por décadas, em nome dessa lógica temporal. Tais considerações nos convocam e provocam  a correlação entre as Diretrizes Curriculares Nacionais – DCN´s para o curso de de Pedagogia e o currículo a partir de considerações de Apple quanto o ato subversivo das ideias, por exemplo. No seu Art. 5º consta que  o egresso da Pedagogia quando em atividade docente, com vistas à ultrapassagens ao repertório de exclusões sofridos pelos filhos das classes populares, por exemplo, nas suas relações individuais e coletivas, necessita estar apto em reconhecer e respeitar as  manifestações e necessidades físicas, cognitivas, emocionais, afetivas dos educandos; relacionar as linguagens dos meios de comunicação à educação, nos processos didático-pedagógicos, demonstrando domínio das tecnologias de informação e comunicação adequadas ao desenvolvimento de aprendizagens significativas; relacionar e identificar problemas socioculturais e educacionais com postura investigativa, integrativa e propositiva em face de realidades complexas que, naturalmente, nos leva à concretude de experiências e vivências produzidas pelo processo de  universalização da educação básica e o desencontro com a educação formal, transformado em fracasso escolar, para certos grupos. “O  respeito às especificidades  dos tempos dos educandos tem que ser pensado como uma precondição para o respeito a seu direito ao conhecimento, à cultura e á formação plena” (Ibidem, p. 378-379).

[4] O velho, o novo e o diferente – Desde muito tempo a escola perdeu a função de formar cidadãos críticos e, cada vez mais através da mídia somos informados do curso do mundo. Assim, as redes sociais cumprem o papel de ensinar aqueles que se complementam das suas informações, como também sensibilizar aqueles dos vários níveis de conhecimento que partilham interesses afins em torno de temas que deveriam estar no epicentro do fluxo e refluxo do micro universo escolar e o seu papel de mediar as interações sociais dos tantos segmentos ali representados na diversidade de futuros adultos cidadãos, no exercício da possibilidade de questionar, refutar, de mudar suas próprias decisões e de tomar distância em relação às autoridades institucionais, quando embasados dos conhecimentos de deveres e direitos sistematizados ao longo da construção e reconstrução da trajetória histórico-social da humanidade.

Brasil sem Grades – Escola do Crime

Diversos

A escola serve pra que? Binho Freitas – Racismo! Observar e Absorver – Eduardo Marinho

[5] Monografia ou Trabalho de Conclusão de Curso – TCC (*)
Tabulação e quadro com o quantitativo de acesso anual e mensal de usuários com interesses afins em educação que  fizeram a escolha de até três interrogações que direta ou indiretamente atuam na produção do fracasso escolar, principalmente para meninos negros nos anos iniciais do ensino fundamental. Ao longo de aprendizagens cumulativas transcritas à postagem e o necessário reordenamento  do texto, espero ter cumprido os caminhos a dar a credibilidade acadêmica necessária às considerações desenvolvidas para justificar, problematizar, compreender, evidenciar, aproximar, contextualizar, convocar, provocar outros olhares para as questões étnico-raciais, na injustiça cognitiva, na formação de professores; na desqualificação e despersonalização midiática que provoca polarizações e defecções no tecido social; na garantia de direitos da criança e do adolescente; nas políticas para a juventude; nos coletivos docentes com históricos correlatos, nas políticas afirmativas. Ter como principal objetivo  suscitar outros olhares para os desdobramentos da desescolarização na qualidade de vida desses meninos, sempre à eminência da violência gratuita ou torpe, como também sensibilizar outros atores sociais conscientes de que mudanças só acontecem no plano das ideias, é me sentir parte da inteligência coletiva por experiências e vivências representativas da contra hegemonia de formadores de opinião sustentados em estatuto de cientificidade capaz de transitar nos espaços de proposições educativas incorporando o vivido e o teórico do ponto de vista do “outro”.  Espero ter conseguido dar minha contribuição social quando na escolha da problemática e a sua consecução segundo normas, procedimentos, metodologias que dão credibilidade necessária a abordagem de realidade tão humana e desumana quais são submetidos. Assim sendo, a pergunta 3: O OLHAR DO PROFESSOR SOBRE O ALUNO PODE CONSTRUIR OU DETERMINAR A SUA TRAJETÓRIA ESCOLAR POSITIVA OU NEGATIVA?, é o ponto de partida para dar título ao texto monográfico e, ao mesmo tempo, lugar de agradecimento a todos que abriram está página por qualquer que seja o motivo. O registro de acessos da pesquisa netnográfica, ao longo dos anos e períodos, transcritos aos Anexos da Monografia ou Trabalho de Conclusão do Curso de Pedagogia modalidade EAD, por si só dizem de quanto um trabalho de pesquisa não é um fim em si mesmo ou nas considerações finais porquanto respostas e explicações de estudos relacionados à condição humana ser sempre um tema inconcluso.

(* ) Aguardando assinaturas para disponibilizá-lo.


Acesso em:
  02/12/2014

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jan fev mar abr mai jun jul ago set out nov dez Total
2010 193 153 54 91 165 157 212 91 1.116
2011 84 163 254 152 176 137 110 175 240  347 353 144 2.335
2012 81 137 472 372 369 323 215 190 261  269 282 88 3.059
2013 75 78 188 75 56 92  48 73 119  104 165 43 1.148
2014 49 53 187 191 153 128 75 92 150 118 117 5 1.318

MÉDIA POR DIA

jan fev mar abr mai jun jul ago set out nov dez Comtudo
2010 7 5 2 3 6 5 7 3

5

2011 3 6 8 5 6 5 4 6 8   11    12     5

6

2012 3 5 15 12 12 11  7  6 9  9  9  3

8

2013 2 3  6 3 2  3  2  2  4  3  6  2

3

2014  2  2 6 6  5 4  2   3  5  4  4  2 4

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  LEITURA COMPLEMENTAR

ANDI e Instituto Alana. Infância e Consumo: estudos no campo da comunicação. Informação – Programa de Cooperação para Qualificação de Estudantes de Jornalismo, 4ª edição, 07 artigos. RedeGife Online. Brasil: 17 de dezembro/2010. Disponível em < http://www.alana.org.br/banco_arquivos/Arquivos/downloads/ebooks/infancia-&-consumo-2010.pdf   >

ARROYO, Miguel Gonzáles. Currículo, território em disputa. Petrópolis, RJ: Vozes, 2011.        ISBN   978-85-326-4083-3

_________________. Imagens quebradas – Trajetórias e tempos de alunos e mestres. 6ª Ed. Vozes, Petrópolis: 2011.
ISBN 978-85-326-3071-1

BELLONI, Maria Luiza e GOMES, Nilza Godoy. Infância, mídias e aprendizagem: autodidaxia e colaboração Educ. Soc. , Campinas, vol. 29, n. 104 – Especial, p. 717-746, out. 2008. Disponível em: < http://www.scielo.br/pdf/es/v29n104/a0529104.pdf >

BOLETIM FAMALIÁ –  O Boletim Famaliá é uma iniciativa da Famaliá Produções LTDA. que objetiva divulgar as principais notícias relativas ao universo das culturas populares e dos povos e comunidades tradicionais. As notícias são captadas através de uma grande rede de informantes e serão atualizadas frequentemente no sítio < http://www.famalia.com.br/?cat=3 >Informações poderão ser obtidas e colaborações poderão ser feitas através do endereço famalia@terra.com.br.

BRAGA, Alexandre Francisco. Educação Afro Indígena: caminhos para a construção de uma sociedade igualitária. Revista FACED,  n. 15, Salvador, jan,/jul. 2009, p. 127-141.  Disponível em < http://www.portalseer.ufba.br/index.php/entreideias/article/view/3257/3523%C2%A0&gt >

CANDAU, Vera Maria Ferrão. Diferenças culturais, cotidiano escolar e práticas pedagógicas. Currículo sem fronteiras, v. 11, n. 2, p. 240-255, Jul/Dez 2011.
Disponível em: <http://www.curriculosemfronteiras.org/vol11iss2articles/candau.pdf&gt;:
Acesso em: 15/07/2013.

CAMARGO, José Jorge Guedes de. Império e benevolência: Duas faces do egoísmo a partir de Emmanuel Lévinas. Primeira Versão, ano VII, nº 237, Universidade Federal de Rondônia, Porto Velho – Jan/Abril: 2009. Disponível em: < http://www.primeiraversao.unir.br/artigos_volumes/volume_xxiv.pdf  >    Acesso em: 14/06/2012.

CAVALLEIRO, Eliane. Por um Estado que proteja as crianças negras do apedrejamento moral no cotidiano escolar. Geledes Instituto da Mulher Negra, Portal Geledes. Disponível em: < http://www.geledes.org.br/em-debate/dia-da-consciencia-negra-por-um-estado-que-proteja-as-criancas-negras-do-apedrejamento-moral-no-cotidiano-escolar-20/11/2010.html >

CINELLI, Nair Pereira Figueiredo. A influência do vídeo no processo de aprendizagem. Florianópolis, 2003. 74 f  Dissertação, Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Produção.  Universidade de Santa Catarina, UFSC, Florianópolis,  2003.   Disponível em < http://www.ufsm.br/tielletcab/Nusi/HiperV/Biblio/PDF/8160.pdf  >

COLLUCI, Maria da Glória e  TONIN, Marta Marília. Direito Humano à Alimentação Adequada e a Segurança Alimentar e Nutricional da Criança e do Adolescente. Publicação do Conselho Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Direito, Curitiba. Disponível em: < http://www.bvsde.paho.org/texcom/nutricion/tonin.pdf >

COSTA, Marina Morena. Mau preparo do professor atrapalha o ensino de Literatura Afro. Portal Ig – São Paulo: 20/11/2010. Disponível em: < https://projetomuquecababys.wordpress.com/2010/12/08/mau-preparo-de-professor-atrapalha-ensino-de-literatura-afro/ >

CRUZ, Cristiane Bonfim. Discussões Sobre a Relação Professor/Aluno. PUC, Rio de Janeiro: 2005.

FAZENDA, Ivani. Práticas Interdisciplinares na Escola. 6. Ed. São Paulo: Cortez, 1999.

FOLENA, Jorge.  As crianças e a guerra declaradaRio de Janeiro: Tribuna da Imprensa Online, em 4 dezembro/2010. Disponível em < http://www.tribunadaimprensa.com.br/?p=13680 >

FREIRE, Paulo. Pedagogia dell’ Autonomia –  Saperi Necessari per la Pratica Educativa. Torino EGA: 2004. Obra digitalizada: UFMG – Coletivo Sabotagem: 2002. (www.sabotage.revolt.org)
Disponível em:  <http://www.letras.ufmg.br/espanhol/pdf%5Cpedagogia_da_autonomia_-_paulofreire.pdf&gt;
Acesso em: 10/10/2014.

_____________________. Pedagogia do Oprimido. 17ª ed. Rio deJaneiro: Paz e Terra, 1987.
Disponível em: <http://paulofreirefinland.org/wp-content/uploads/2007/02/pedagogia_do_oprimido.pdf&gt;
Acesso em: 10/10/2014.

GRACIANO, Sueli Cristina. Condições de (NÃO) Aprendizagem na Escola: Uma Discussão à Luz da Perspectiva Histórico-Cultural. Dissertação –  Universidade São francisco, Itatiba: 2007. Disponível em < http://webp.usf.edu.br/itatiba/mestrado/educacao/uploadAddress/Dissertacao_Sueli_Graciano%5B1557%5D.pdf >

JUNIOR, Leo Rodrigues. Karl Mannheim e os problemas epistemológicos da sociologia do conhecimento: É possível uma solução construtivista? Revista Episteme, nº 14, p. 115-138, Porto Alegre: jan./jul. 2002. Disponível em:  <http://epistemologia0910.files.wordpress.com/2010/01/problemas-epistemologicos-da-sociologia-paulo-campos-13-1-2010.pdf&gt;  Acesso em: 01/09/2014.

MARSIGLIA, Ana Carolina Galvão e OLIVEIRA, Celso Socorro. Aproximações Históricas e Teóricas com a Pedagogia Histórico-Crítica e sua Proposta Metodológica. Revista Educere/PUCPR: 2008. Disponível em: < http://www.pucpr.br/eventos/educere/educere2008/anais/pdf/486_560.pdf &gt;     Acesso em: 21/09/2010

MEIRA, Marisa Eugênio Milillo. A medicalização e a produção da exclusão na educação brasileira à luz da Psicologia Histórico-Cultural. XV Encontro Nacional  da ABRAPSO (Associação Brasileira de Psicologia Social) ,  Maceió: 2009. Disponível em: < http://www.abrapso.org.br/siteprincipal/index.php?option=com_content&task=view&id=342&Itemid=96 >  Acesso em: 04/10/2011

MINAYO, Maria Cecília de Souza; GOMES, Suely Ferreira Deslandes. Pesquisa Social – Teoria, método e criatividade. Editora Vozes: Petrópolis – RJ, 2010.

MORIN, Edgar. Os Sete  saberes para a Educação do Futuro, Educar para a Era Planetária. São Paulo: UNESCO/Cortez 2000.

NOGUEIRA, Claudio M. Martins e Maria Alice. A Sociologia da Educação de Pierre Bourdieu: Limites e Contribuições. Educação & Sociedade, ano XXIII, nº 78, Abril/2002. Disponível em: < http://www.scielo.br/pdf/es/v23n78/a03v2378.pdf >    Acesso em: 14/09/2011.

OLIVEIRA, Eliana. Identidade, intolerância e as diferenças no espaço escolar: questões para debate, Revista Espaço Acadêmico, Ano I,  nº 07, Dezembro/2001. Disponível em < http://www.espacoacademico.com.br/007/07oliveira.htm >

OZAÍ,  Antonio  (*) A escola como uma organização complexa – Por Maurício Tragtenberg Disponível em < https://projetomuquecababys.wordpress.com/2009/07/01/a-escola-como-organizacao-complexa-por-mauricio-tragtenberg/ > (*) < http://www.blogger.com/profile/02416965999815066511 >

_______________________________. Mauricio Tragtenberg e a Pedagogia Libertária. Disponível em:
<https://projetomuquecababys.wordpress.com/2009/05/30/pedagogia-libertaria/ >

REINALDO, Telma Bonifácio dos Santos. Proposta Metodológica para o Ensino de História da África na Educação Básica (Ensino Fundamental Maior). Disponível em: < http://www.redem.org/boletin/boletin310110g.php >

SUANNO, Marilza VanessaRosa e MONTAGNINI, Marilza Luzia. Formação Pedagógica de professores Universitários: ressignificação da Ação Docente. IV EDIPE – Encontro Estadual de Didática e práticade Ensino, Goiás: 2011.

SIRINO, Marisa de Fátima.  Repensando o fracasso escolar: reflexões a partir dos discurso do aluno. Mestrado, Biblioteca Virtual/CDI/FAPESP, São Paulo: 2002.
Disponível em:  < http://www.bv.fapesp.br/pt/pesquisador/42744/marisa-de-fatima-sirino/ >    Acesso em: 26/06/2012

Unicef/UERJ (Laboratório de Análise da Violência da Universidade Estadual do Rio de Janeiro) – morte de 33 mil jovens de 2006 até 2012 por conta da violência urbana. Enquete sobre as possíveis causas da violência que tem como alvo principal   jovens afrodecescendentes com baixa escolaridade, moradores em comunidades carentes com idade entre 15 e 24 anos. Disponível em < https://projetomuquecababys.wordpress.com/2009/07/28/o-silencio-dos-justos/ >

YAMAUTI, Nilson Nobuaki. Algumas questões didático-pedagógicas envolvidas no ensino das Ciências Sociais. Revista Espaço Acadêmico, nº 23, abril/2003.
http://espacoacademico.wordpress.com/2010/04/10/algumas-questoes-didatico-pedagogicas-envolvidas-no-ensino-de-ciencias-sociais/ >  Acesso em: 01/09/2010.

Projeto de Lei nº 455/2007 do deputado Alessandro MolonDispõe sobre medidas para identificação e tratamento da dislexia na rede estadual de educação e dá outras providências.Disponível em < http://www.apad-dislexia.org.br/projetos.shtml  >

 Art.1º – O Estado adotará medidas para Identificação e Tratamento da Dislexia na Rede Estadual de Educação, objetivando a detecção precoce e acompanhamento dos estudantes com o distúrbio. Parágrafo único – A efetivação do previsto no caput deste artigo refere-se à realização de exame nos alunos matriculados no 1º ano do Ensino Fundamental, em alunos já matriculados na rede, com o advento desta Lei, e em estudantes de qualquer série admitidos por transferência de outras escolas que não pertençam à rede pública estadual. Art. 2º – As medidas previstas por esta Lei deverão abranger a capacitação permanente dos educadores para que tenham condições de identificar os sinais da dislexia e de outros distúrbios nos estudantes. Art.3º – Caberá ao Estado, através de seus órgãos de atuação setorial competentes, a formulação de diretrizes para viabilizar a plena execução das medidas ora asseguradas, criando equipes multidisciplinares com profissionais necessários à perfeita execução do trabalho de prevenção e tratamento. Parágrafo único – As equipes multidisciplinares responsáveis pelos diagnósticos deverão possuir em sua composição profissionais das áreas de Psicologia, Fonoaudiologia e Psicopedagogia. Art. 4º – As medidas de que trata esta Lei terão caráter preventivo e também promoverão o tratamento dos estudantes. Art. 5º – Caberá ao Poder Executivo regulamentar o disposto nesta Lei. Art. 6º – Esta lei entrará em vigor na data de sua publicação. JUSTIFICATIVA
A presente proposição baseia-se na Lei estadual nº 12.524, de 02 de janeiro de 2007, em vigor no estado de São Paulo, originada de iniciativa de semelhante teor de autoria da Deputada Maria Lucia Prandi, com a seguinte justificativa: Dislexia é derivada de dis = distúrbio e lexia que significa linguagem (grego) ou leitura (latim). Portanto, dislexia é um distúrbio da linguagem e/ou leitura. Talvez por soar como nomenclatura de uma doença, o termo dislexia causa medo especialmente entre os pais que, por falta de informações, muitas vezes acreditam ser o fim do mundo ter um filho disléxico. Pesquisas realizadas em vários países mostram que cerca de 10 a 15% da população mundial é disléxica. Ao contrário do que muitos acreditam, a dislexia não é o resultado de má alfabetização, desatenção, desmotivação, condição sócio-econômica ou baixa inteligência. É uma condição hereditária com alterações genéticas, apresentando ainda mudanças no padrão neurológico. Por tudo isso, a dislexia deve ser diagnosticada por uma equipe multidisciplinar. Esse tipo de avaliação dá condições de um acompanhamento pós-diagnóstico mais efetivo, direcionado às particularidades de cada indivíduo. Os sintomas que podem identificar a dislexia, antes de um diagnóstico multidisciplinar, só indicam um distúrbio de aprendizagem.

Identificado o problema de rendimento escolar ou sintomas isolados, que podem ser percebidos na escola ou mesmo em casa, deve-se procurar ajuda especializada. Cabe à uma equipe multidisciplinar, formada por psicóloga, fonoaudióloga e psicopedagoga clínica, iniciar uma minuciosa investigação. Essa equipe deve garantir maior abrangência do processo de avaliação, verificando a necessidade do parecer de outros profissionais, como oftalmologista e neurologista. A identificação do distúrbio não parte da dislexia. Ao contrário, chega-se a ela a partir da exclusão de qualquer outra possibilidade. Caso outro problema seja detectado, deve haver o encaminhamento para o tratamento adequado. Quando a dislexia é identificada começa, então, um acompanhamento cujos métodos irão variar de acordo com os diferentes graus do distúrbio (leve, moderado e severo), podendo levar até cinco anos. Crianças disléxicas que têm o distúrbio identificado precocemente e dão início ao tratamento, apresentam menor dificuldade ao aprender a ler. Isto evita problemas no rendimento escolar, que levam meninos e meninas a desgostarem de estudar, terem comportamento inadequado e atrasos na relação idade/série. Apesar do Poder Público permanecer de olhos fechados para esta realidade, a dislexia está diretamente relacionada à evasão escolar e à sensação de fracasso pessoal.

Atualmente, a imensa maioria da rede educacional pública e particular não está capacitada para este desafio. Daí a importância de criarmos em nossas escolas um programa efetivo, que capacite professores a identificar estes distúrbios, crie equipes multidisciplinares para realizar uma avaliação precisa e garanta o acompanhamento profissional necessário. Dessa forma, estaremos garantindo que milhões de crianças e jovens em idade escolar tenham condições de corrigir um distúrbio, que restringe sua capacidade de aprendizado. Estaremos abrindo as portas para que eles tenham um futuro sem traumas, de sucesso profissional e com qualidade de vida.

As Artes e o Desenvolvimento Humano

Posted in Cidadania, Educação, Intervenção Social with tags , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , on junho 13, 2009 by projetomuquecababys

Luis Carlos “Rapper” Archanjo

Para contextualizar o desenvolvimento da “Minha Hipótese de Educação”, ou seja, minha concepção  sobre a transmissão de conhecimento associado à valores humanos, principalmente, àqueles que participam na educação não formal e informal de processos socioeducativos em projetos sociais ou que cuidam da educação básica pública para crianças, adolescentes e  jovens em escolas encravadas em comunidades carentes nos grandes centros urbanos do nosso país. Pela intrínseca relação de objetivos comuns ao desenvolvimento humano segundo concepção holística e, ao mesmo tempo, sofrendo os malefícios de ações extracurriculares caminhando equidistantemente, pela falta de ludicidade na apresentação dos conteúdos que, somando-se aos aspectos de clausura  na formalidade de leis e diretrizes educacionais, acabam regulamentando as relações interpessoais no âmbito escolar. Assim como o malefício do “currículo oculto” atua nos processos da correlação de forças entre abordagens didático-pedagógicas, político-filosóficas que estimulem ou inibem  os  mecanismos cognitivos necessários à identificação com determinantes subjetivas trazidas no bojo do convite ao partilhamento do saber, isto é, aprendizagem significativa  nascida da interação de novos conceitos e informações com conceitos relevantes existentes na estrutura cognitiva do aluno. A musicalização e a informática musical serão o pano de fundo para a exposição das conjecturações dos objetivos envolvidos na construção do saber, onde leva-se em conta a singularidade das manifestações comunitárias e toda uma concepção dissociada de ressignificação para uma leitura mais universal, ou seja, ser produtor e disseminador de cultura  pelos vários caminhos de se estar no mundo globalizado ou à margem da infovia. Conciliar ensino-aprendizagem com as ferramentas do nosso tempo não pode soar como proposta educativa com contorno de situação atípica (como querem alguns) pelos vários fatores da evasão escolar e defasagens idade/série por n fatores da historicidade de segmentos da população excluídos das benesses da educação desde o descobrimento.

O Império não foi um momento efetivo da educação como direito universal de cidadania quando  na Constituição Imperial apenas faz menção explícita à educação escolar no art. 179, mas não aponta quem é esse cidadão brasileiro ao tratar das Disposições Gerais e das Garantias dos Direitos Civis e Políticos dos Cidadãos Brasileiros. Logo após veio a República, e somente após a Revolução de Trinta o poder do Estado Nacional se fortalece e ele vai se tornando intervencionista em vários campos da atividade social até chegar ao binômio gratuidade/obrigatoriedade da Constituição de 1934, depois dos debates pela educação na década de 20 até a revolução dos anos 30, o Manifesto dos Pioneiros da Educação de 1932 , a chegada de Getúlio ao poder e a redação da primeira Carta Magna que torna a educação  um direito de todos e obrigação dos poderes públicos . Por si só os desdobramentos da educação nas constituições brasileiras de 1824, 1891, 1934, 1937, 1946, 1967 e 1988 nos dá um panorama classista-partidário para a relação de ricos e pobres com a educação. Destaque para algumas biografias representativas da intelectualidade egressa das minorias  a partir de remotas experiências abolicionistas e seus aspectos da ação com maior ou menor humanismo daqueles pertencentes a grupos filantrópicos ou atitudes isoladas de partidários da causa abolicionista que detinham o poder da acessibilidade à informação para  transmissão aos seus pares e aos filhos bastardos do entorno da casa grande. Acessibilidade que se perpetuou na vitaliciedade do nosso tempo, cabendo sempre ao corpo docente hegemônico a imposição cultural pelos fatores multifacetados do acesso a graduação e as consequentes formulações preservadas ao longo dos anos em nome da permanência do saber nos espaços de poder, cabendo a este a inculcação de conhecimentos e valores humanos segundo práticas questionáveis de todos do processo educativo que leva ao fracasso das políticas públicas focadas na educação.  Em um universo onde prima a leitura da escola em detrimento a outros contextos subjetivos da interação humana de matrizes formadoras, distintas em todos os aspectos, mesmo que estratificadas pelo multiculturalismo da relação com o pluralismo étnico.

Parece inegável no Brasil a permanência de desigualdades estruturais sociais (de acesso a bens cultuais, materiais e técnico), mas também culturais e políticos: sentimento e percepção da cidadania fragilizados pela situação de pobreza e exclusão, dificultando o desenvolvimento de processos de autonomia e emancipação; níveis baixíssimos de informação e consciência política, especialmente entre os jovens de todas as classes sociais; baixa autoestima e bloqueios psicológicos, indisponibilizando muitas crianças e adolescentes carentes para as aprendizagens indispensáveis à vida social. A desigualdade e a exclusão são fenômenos determinantes para a compreensão da situação social da infância brasileira fora dos benefícios sociais mais fundamentais, inclusive aqueles legalmente garantidos na Constituição e no ECA: proteção, provisão, acesso à educação e à educação e à comunicação de qualidade – voz – (o que, teoricamente, asseguraria o terceiro “p”, de participação). tal situação gera mecanismos de desigualdade que se acumulam, se auto reproduzem e se reforçam, à medida que os sujeitos infantis e juvenis avançam em seus processos de socialização.

Assim, quando a criança muito pobre chega à escola, aos 6 ou 7 anos, ela traz consigo as marcas do déficit cultural de sua condição social de desigualdade e exclusão dos estímulos do universo letrado ao qual pertence a escola. Contudo, estas marcas ainda não são indeléveis e a escola teria possibilidades de integrar esta criança à cultura letrada e ao universo da informação escrita e eletrônica e do saber acumulado pela humanidade. À medida que a criança vai avançando na sua trajetória escolar, ela vai, em muitos casos, perdendo as possibilidades de integração, e as marcas de sua exclusão “por dentro” da escola vão ficando mais profundas, as desigualdades vão se agravando. Quando chegam à adolescência, muitas destas crianças, escolarizadas há anos, mas não alfabetizada plenamente, totalmente excluídas do letramento, estão de tal modo traumatizadas por um processo escolar de fracasso e pela exclusão social, que têm poucas possibilidades de assimilar qualquer coisa que lembre a escola e seu fracasso. Esses jovens chegam ao limiar da vida adulta sem as condições socioculturais mínimas para a vida em sociedade, sem a devida preparação profissional, por exemplo, mas não somente. estão despreparados para a cidadania, para conhecerem e exercerem seus direitos e deveres e agirem como cidadãos responsáveis. São os “excluídos por dentro”  (Bourdieau, 1993), muitas  vezes ignorados pelos professores, que não sabem como lidar com estes alunos. Sua presença é as vezes percebida pelo professor como signo de fracasso da escola e, pelos colegas, como diferente, incongruente, pois destas crianças não se exige o mesmo que para todas as outras.

Numa sociedade em que as oportunidades ainda estão num processo de desvinculação aos valores sociais e humanos do monoculturalismo eurocêntrico determinando as opções profissionais dos seus filhos pela estreita ligação entre formas tradicionais e  mão de obra desqualificada – executores -,   e num outro polo aqueles fora dos acordos internacionais e a equivalência da menor qualidade e tempo de ensino para atender a lógica neoliberal. Particularidades da realidade educacional de tempos da acessibilidade midiática, ocupações liberais e toda uma concepção de empregabilidade que alarga cada vez mais o fosso entre executores e pensadores pelo que a ocupação e escolaridade dos pais acaba influenciando o quadro de repetição para atividades correlatas ao ciclo familiar transmitido à gerações e que, mesmo  na contemporaneidade da globalização,  inviabilizado por mecanismos de políticas que representam interesses políticos não tão democráticos para princípios que amenizem o ciclo de vidas precárias, transmissão intergeracional,  na distância da equanimidade das faixas salariais entre os moradores das comunidades e os que não estão inseridos no contexto da formação histórica atuando na transferência vitalícia de oportunidades no mercado de trabalho cada dia mais tecnotrônico e excludente. Para tais disparidades sociais são vários os mecanismos criados com respaldo legal de leis que ajudam a instrumentalizar e otimizar a inserção social trazida pela maior escolaridade. Mas tal estágio da sociedade estendido as camadas populares implica em questões macrossociais que circunscrevem e limitam o alcance da cultura escolar que historicamente têm privilegiado os “saberes conceituais”  e o pensamento lógico-formal. Por ser assim, a escola institucionalizou-se como espaço para a reprodução de um modelo único (dominante) de linguagem e  de comunicação e que, portanto, corre o risco de ausentar-se de sua função junto ao projeto maior de formação de sujeitos conscientes e livres para a perpetuação das sociedades humanas. A reflexão que se reivindica à escola vai no sentido do convite ao partilhamento de outras linguagens no no seu interior.

É nesse novo espaço, a ser construído pelos sujeitos que dela participam, que se daria o destaque merecido ao lúdico, à arte, ao movimento corporal, às danças, às ginásticas, às lutas, ao circo, entre outras atividades corporais, ou seja, reivindicar tal reflexão por parte da escola significa inaugurar as condições efetivas para a ampliação de um novo espaço educativo pautado em novas significações para trocas socioculturais segundo a  práxis de um saber reflexivo-investigativo destinado à preparação  para a vida no seu sentido mais amplo de autonomia, de liberdade, de emancipação. Por certo, quando uma criança de quatro anos apanha uma prancheta e finge tomar notas a respeito de uma engenhoca armada por um dos seus iguais, e por tentar converter essa inocente imitação num momento de aprendizagem, de um modo geral, significam encorajar as crianças a tentar solucionar problema e a improvisar objetos por conta própria. Considera o autor, como um desenvolvimento positivo quando uma criança se exibe com um par de óculos adultos precariamente equilibrados em seu narizinho ou se a tarefa de experimentar em tudo é quanto fechadura uma chave que se destina a um único armário. Os ocidentais ganharam certa hegemonia no mundo contemporâneo explorando, ensaiando, experimentando e corrigindo; seja em tecnologia, ciência ou nas explorações do oceano ou do espaço exterior. Por outro lado, sem dúvidas, são influenciados pelas tradições orientais também querem preparar a criança para o mundo que irá encontrar. Tradicionalmente esse mundo, caracterizou-se pelo domínio de práticas consolidadas e pelo desempenho de papéis adultos consagrados de longa data; e, assim mais provável que sejam significativos e úteis os modelos precisos exibidos pelos adultos. Além disso, como há tanta coisa herdada do passado que é imprescindível aprender a fundo e dominar. Parece não haver grande vantagem em tomar o tempo das pessoas ou em confiar no acaso para as descobertas de práticas essenciais se já existe um modelo confiável ao alcance de todos, por que não transmiti-lo à criança, para que ela possa dar com desenvoltura o próximo passo e logo o passo seguinte? Pois se a criança fica entregue aos seus próprios esquemas, pode atrasar-se no domínio das práticas mais valorizadas ou, piorando, afastar-se na sua própria e improdutiva direção.

A abordagem acima pode ter o contra-argumento de pais e professores, o que, está de acordo com a proposta das vinhetas expostas pelo autor. Alguns endossarão totalmente o sistema ocidental de “experimente você mesmo”; outros são adeptos do “aprenda com modelos competentes”; e ainda outros, como o autor, enxergam valor em ambas as abordagens, sobretudo quando cada uma é realizada no seio de uma comunidade que nutre a mesma opinião. No ocidente conceituamos a criatividade como o resultado, em grande parte, da iniciativa individual e da solução “solo” de problemas: o Prêmio Nobel centrado no indivíduo sintetiza essa postura de explorador solitário. As sociedades orientais (confuncianas) adotam uma abordagem de colaboração com vistas à criação de novas tecnologias e, usando esse método foram notavelmente bem sucedidos em termos econômicos. O ocidente foi recentemente influenciado por modelos eficazes oriundos da sociedade do Leste Asiático. Muitas indústrias delegam agora a produção a pequenas e predominantemente autônoma equipes operacionais e o trabalho científico, também, acarretam cada vez mais, a colaboração entre dezenas ou mesmo centenas de trabalhadores. Informalmente, durante séculos, e de um modo mais formal em tempos recentes o ocidente aumentou o seu pendor exploratório numa nova direção: para o exame sistemático de outras culturas. A partir dessas considerações, os profissionais das ciências investigativas como: filosofia, linguística, psicologia, sociologia e antropologia, já que de dedicam ao estudo do desenvolvimento humano, concluíram que a pesquisa descontextualizada não pode ir além do ponto do estabelecimento das condições puras de laboratório que por muito tempo utilizou-se a psicologia, sem o experimento de quaisquer vestígios de familiaridades ou contexto. Essa abordagem, que remonta aos dias BEHAVIORISTAS, ainda é praticada em certas áreas da PSICOLOGIA e da CIÊNCIA COGNITIVA.

Muitos investigadores –sobretudo os que se dedicam ao estudo do desenvolvimento humano – concluíram que a pesquisa descontextualizada não pode ir além do seu ponto final de laboratório. Na verdade, diz o autor, desde o momento da concepção, os pais e sua progenitora estão envolvidos nos pressupostos, tendências e visões de determinadas culturas; e esses preconceitos emprestam necessariamente um colorido todo especial ao pensamento, emoções e modelos de desenvolvimento. Seria desnecessário dizer que as instituições educacionais também são significativamente afetadas pelos objetivos e pressupostos das culturas em que estão situadas. Com efeito, as escolas não têm outra escolha senão exprimir ou lutar contra os valores daquela cultura em que estão situadas. Na era digital a internet apresenta-se como a nova tecnologia da inteligência, capaz de aumentar a capacidade humana de aprender e compreender pelos multimeios de conexões interativas, estabelecendo uma lógica dinâmica e não-linear capaz de potencializar formas de aprendizado cada vez mais complexas, e que permite articular várias habilidades simultaneamente. A complexidade destas tarefas podem ampliar a cognição humana – autodidaxia -, propiciar novas possibilidades de aprendizagem, tendo em vista os processos de simulação, hipertextos e multimídia.

“Tutelados são aqueles que se encontram incapazes de fazer uso da própria razão independentemente da direção de outrem. É-se culpado da própria tutelagem quando esta resulta não de uma deficiência do entendimento, mas da falta de resolução e coragem no uso da sensibilidade e de conhecimento crítico necessário para superar determinismos da condição humana independentemente da direção de outrem.
(Kant)

Influenciados pelas ferramentas de trabalho dos sociólogos e antropólogos, muitos psicólogos deixaram agora o laboratório e buscam, nos padrões da vida cotidiana, características que tinham antes ignorado. Voltando suas atenções para as escolas, os psicólogos vêem a sala de aula como uma comunidade, onde valores específicos são transmitidos e várias interações são sancionadas ou proibidas; prestam especial atenção as relações de aconselhamento, na família e para além dela; investigam o papel da mídia na socialização dos jovens, examinam certas práticas na sala de aula, como a aprendizagem cooperativa;  os projetos em equipe, ou a comunicação via internet, para determinar o modo como as crianças constroem o partilham o conhecimento. As teorias de aprendizagem (Piaget, Vygotsky, Wallon) e as abordagens institucionais (que estudam a criança do ponto de vista da escola ou da família), embora não tenham de modo algum perdido sua validade, já não dão conta de toda a complexidade do tema que nos ocupa. A rapidez do avanço técnico é tal que as gerações adultas não conseguem acompanhar e perceber com clareza a naturalidade desta apropriação espontânea, isto é, sem a intervenção didática do adulto, que as crianças e jovens da Geração Y costumam realizar em contato com as TIC. Uma espécie nova de autodidaxia está desafiando a escola e, por conseguinte, todo o campo da educação, a produção de conhecimento (pesquisa) como a  formação de professores (Perrialt, 1966; Belloni, Gomes & Carraro, 2007).

Pensar-se na arte musical, sem perder-se do vínculo com a sua história rítmico sonora, como elemento das ações que norteiam as competências necessárias ao desenvolvimento humano, onde os seus aspectos subjetivos como: autodisciplina, autoestima, auto superação, flexibilidade, etc. possam contribuir nos aspectos da participação cidadã em nome da verdade, do belo e da solidariedade como princípios básicos por uma educação menos excludente e mais cooperativa. Indiferente a essa ou aquela linha de abordagem educacional que venha a tornar-se um delineador de ações para educar novas gerações prontas par enfrentar com êxito um mundo que já mudou espetacularmente e está mudando com rapidez cada vez maior, é crucial que se determine o que foi aprendido sobre seres humanos através da psicologia (o estudo da mente), na biologia (o estudo dos genes e do cérebro) e na antropologia (o estudo das diferentes culturas). No caso da educação não  formal praticada nos projetos sociais sérios busco nas justificativas de Libâneo para as práticas educativas que se realizam em sociedade como processos fundamentais da condição humana, onde a pedagogia, segundo o autor, serve para investigar a natureza, as finalidades e os processos necessários às práticas educativas com o objetivo de propor a realização desses processos nos vários contextos em que essas práticas ocorrem. Segundo Libâneo (2005, p. 513-514), as práticas educativas não se restringem à escola ou a família. Elas ocorrem em todos os contextos e âmbitos da existência individual e social humana, de modo institucionalizado ou não, sob várias modalidades. Entre essas práticas, há as que ocorrem de forma difusa e dispersa, são as que ocorrem nos processos de aquisição de saberes e modos de ação de moda não intencional e não institucionalizado, configurando a educação informal. Há, também, as práticas educativas realizadas em instituições não convencionais de educação, mas com certo nível de intencionalidade e sistematização, tais como as que se verificam nas organizações profissionais, nos meios de comunicação, nas agências formativas para grupos sociais específicos, caracterizando a educação não formal. Existem, ainda, as práticas educativas com elevados graus de intencionalidade, sistematização e institucionalização, como as que se realizam nas escolas ou em outras instituições de ensino, compreendendo o que o autor denomina educação formal. Para Libâneo, são esses processos que constituem o objeto de estudo da pedagogia, demarcando-lhe um campo próprio de investigação. Ela estuda as práticas educativas tendo em vista exolicitar finalidades, objetivos sociopolíticos e formas de intervenção pedagógica para a educação. O pedagógico da ação educativa se expressa, justamente, na intencionalidade e no direcionamento desta ação. Esse posicionamento  é necessário, defende o autor, porque as práticas educativas não se dão de forma isolada das relações sociais, políticas, culturais e econômicas da sociedade. Vivemos em uma sociedade desigual, baseada em relaçoes sociais de antagonismo e de esploração. Por isso a pedagogia não se pode eximir de se posicionar claramente sobre qual direção a ação educativa deve tomar, sobre que tipo de homem pretende-se formar, no nosso caso, na educaçã não formal dos projetos sociais.

A reflexão que consideramos atualmente é que, quando a pedagogia assume um caráter mais social, o curso formará profissionais que também atuarão com uma visão diferenciada de Educação e sociedade? Qual deverá ser essa visão? A partir da interrogação de Paula e Machado e a consciência da  nossa condição de ser social vivendo em comunidade   e que, é    esta comunidade  que possibilita o progresso da humanidade e que nas relações com os outros e consigo mesmo o homem se constitui enquanto  sujeito histórico e social. Para os autores de Pedagogia: concepções e práticas em transformação, a análise das concepções educacionais do curso de Pedagogia voltados para a formação  do Educador Social como instrumento da educação formal em atendimento a educação não formal para atender às novas demandas da sociedade e formar agentes de transformação na realidade de desigualdade da nossa contemporaneidade coaduna com as correntes de pensadores que veem a necessidade de proposições de um olhar diferenciado do academicismo reinante em questões epistemológicas e sociológicas de Educação e sociedade  da  nossa temporalidade. Graciani (2006) quando afirma que precisamos pensar em uma educação que seja transformadora e ao mesmo tempo libertária, e que os estudantes de Pedagogia sejam também formados para garantir a educação em qualquer contexto com vistas à inclusão plena dos segmentos historicamente excluídos dos direitos socias, culturais, econômicos e políticos, proporcionando-lhes os meios formativos necessários a alcançarem a consciência crítica perante o contexto em que estão inseridos e a partir de suas ações, conquistarem seus direitos como cidadãos. Dentro desta perspectiva é que emerge a Pedagogia Social, que ocorre a partir da Educação Social. Podemos destacar a contribuição de Caliman (2006, p. 5) a respeito da Pedagogia Social e sua diferenciação da Pedagogia Escolar na:

[…] diz respeito à diferença entre pedagogia escolar e pedagogia social. A primeira envolve o histórico-social que envolve didática, ciência ensinada nas universidades. A segunda, a pedagogia social, se desenvolve dentro de instituições não formais de educação. É uma disciplina mais recente que a anterior. Nasce e se desenvolve de modo particular no séc. XX como resposta às exigências da educação de crianças e adolescentes, principalmente, que vivem em condições de marginalidade, de pobreza, de dificuldade na área social. Mas não só: o objetivo da pedagogia social é o de agir sobre a prevenção e a recuperação das deficiências de socialização, e de modo especial lá onde as pessoas são vítimas da insastifação das necessidades fundamentais. O que é interessante destacar no texto de Caliman quando ele se refere à Pedagogia Social e descreve que “é chegado o momento no qual precisamos sistematizar toda essa gama de conhecimentos pedagógicos para compreender melhor e interpretar a realidade e projetar intrervenções educativa efetivas” a partir do trabalho de campo dos sujeitos envolvidos nesse processo, pois, muito criativamente, formas e estratégias de atuação, que segungo o autor é necessário organizar para que o trabalho ocorra efetivamente. (Coleman, 2006, P. 5  apud PAULA; MACHADO, 2009: 233-236)

Com efeitos, numa era de contínuos avanços científicos, seria criminoso não estar atento para todas essas fontes de informações, e igualmente criminoso dedicar-se a uma delas em detrimento das outras. Apesar das inúmeras variantes para justificar o fracasso no âmbito das escolas públicas, é senso comum entre os pesquisadores dos caminhos que motivam a evasão escolar, a prostração dos jovens para o saber, os caminhos do consumismo facilitado por uma cultura da aquisição de bens materiais  por meios que não sejam os dos valores socialmente aceitos, indiferentes às causas e efeitos dos desdobramentos com resultantes no aumento das estatísticas do quadro de morte de jovens afrodescendente, principalmente, pela inter-relação da baixa escolaridade entre os enumeram as estatísticas de mortes da nossa guerra urbana, por exemplo. Embora com isso muito se diga, muito ainda resta por dizer e por fazer sem se perder o vínculo com o progredir como ser humano na sua totalidade – o que significa mutação. Então se pergunta: como vamos progredir? O progresso intelectual faz-se de forma linear? Quais devem ser os critérios determinantes e ordenadores do nosso crescimento levando-se em conta tanto fatores do multiculturalismo do nosso passado? Se nosso crescimento deve ser orgânico; deverá ser determinado, em parte, por estes elementos tão significativos.

É exatamente numa época de rápidas transformações externas que precisamos reter, pelo estudo de nossas próprias tradições, um cerne de continuidade, do qual pode não surgir á ordem e o significado. Do outro modo, há o perigo de que a personalidade humana e a organização grupal se desagreguem no caos. Dentro do fluxo de transformação, uma importante parte de nós deve permanecer ligada ao passado, se quisermos preservar uma identidade segura e estável. Tomando como exemplo as nossas crianças, podemos observar que, lado a lado com seus desejos por novidades, experiências e mudanças, existe também uma profunda necessidade de repetição, familiaridade e rotina. Em todos os seres humanos é latente essa necessidade geminada (nem sempre satisfeita ou mesmo expressa) de criação e consolidação. Se a novidade é a mutação, significa a entrada em um novo estágio, onde cessam os aspectos da familiaridade e as variantes que se apresentam, ultrapassam as consolidações das experiências passadas, formam a incerteza, a insegurança, e ocorre talvez o colapso, momento em que cessa a criatividade e avulta-se a prostração, até que o passado seja recuperado. Se quisermos ser genuinamente criativos, será suicídio o alijamento das tradições que nos formaram. As formas tradicionais de conduta e pensamento incorporam, freqüentemente, uma certa sabedoria organicamente acumulada. É uma louca presunção de que podemos ignorar o passado, de que o cenário pós-moderno contém tudo do que necessitamos, que pode ser resumido na frase: a tradição é a democracia estendida pelo tempo; mesmo tendo que conviver com a grande ameaça do formalismo. 

Para o pai das inteligências múltiplas, as divisões sobre o que ensinar, quando ensinar e até como ensinar envolve juízos de valor. Tais decisões jamais podem ser ditadas por conhecimento específico da complexidade humana, e que a educação é importante demais para ser confiada a qualquer grupo específico. As decisões sobre metas e valores; elas são apropriadamente tomadas pela comunidade mais ampla e informada, e não por qualquer setor privilegiado, e mesmos àqueles que são afortunados o bastante para estar desvendando os mistérios da mente humana. Antes de existir um domínio explicado dos caminhos da educação, chamado de psicologia, a educação procedia na base do que poderíamos chamar psicologia “leiga” ou “popular”. Toda espécie de pressupostos está embutida nos sistemas educacional tradicionais; alguns parecem tão óbvios que dificilmente merecem discussão.

Foi geralmente suposto que os indivíduos mais velhos estão mais bem informados que do que os mais jovens; que as pessoas mais velhas devem falar e demonstrar, enquanto as mais novas devem ficar caladas e observar; que prêmios devem ser dados àqueles que aprendem bem e castigos aos que parecem lerdos e/ou indolentes; que os professores deveriam ser apenas indivíduos bem familiarizados com a metéria que lecionam, com sua profissão e com as normas da sua comunidade, mas também servir como exemplos morais e éticos.

Cada ser humano tem uma maneira própria de intercambiar-se com o mundo que o rodeia. Dessa relação com o outro se estabelece uma maior ou menor empatia para direcionar o seu potencial a partir dos fatores relevantes da subjetividade atuando nas causa e efeito motivacionais para resolver problemas ou criar produtos que são valorizados em um ou mais contextos culturais. As inteligências são identificadas por um conjunto de critérios que vão desde a representação em partes específicas do cérebro até a suscetibilidade para codificar sistemas simbólicos. Populações especiais como prodígios e sábios exibem com freqüência inteligência em esplêndido isolamento. Os testes de inteligência exploram tipicamente a inteligência linguística e a lógico matemática. As inteligências de maior importância nas escolas contemporâneas com, talvez, alguma amostragem de inteligência espacial também. Mas como espécie, possuímos ainda: inteligência musical, inteligência corporal-cinestésica, inteligência naturalista, inteligência interpessoal e inteligência intrapessoal. Colocando de uma maneira mais ampla os estudos de Gardner.  A análise do comportamento criativo ainda se encontra em lenta e laboriosa pesquisa. “Os fatores inerentes a esse tipo de comportamento não constituem uma mesma atividade intelectual, procura-se correlação entre fatores, e constituem-se como uma realidade que ainda escapa, em muitos aspectos,  à evidência experimental” (Cunha, 1977, p. 54 apud CASTANHO, 2005, p. 93).  A produção criativa depende da cognição e mais ainda das habilidades cognitivas, mas o alto potencial cognitivo, apenas, não faz o indivíduo criativo. Muitas pesquisas têm mostrado que o modo de funcionamento cognitivo desempenha papel importante na vida global da pessoa. Estudos piagetianos têm mostrado que as mudanças nas respostas criativas estão ligadas mais de que tudo ao desenvolvimento cognitivo. O campo da criatividade ainda apresenta dúvidas e resiste ao tratamento experimental por envolver muitos fatores, mas reforça o ponto de vista de que a “educação artística” deve ser um meio de informar o real ou, dito de outra forma, de ser uma atividade que envolve também a inteligência e não apenas as emoções e sentimentos (CASTANHO, 2005, p. 94)

Em qualquer âmbito da educação artística ou arte/educação a ligação com a sociedade é indispensável, seja ensinando apreciação ou orientando atividades. Fomentar o questionamento dos caminhos para a prática de uma aprendizagem que faça uma leitura da realidade local e a sua contextualização dentro de um mundo que está em mudando em vertiginosa velocidade, onde aqueles que não estão habilitando-se com as ferramentas necessárias ao ritmo das mudanças e a conseqüente leitura atualizada das suas proposições educacionais. A partir do exposto no objetivo geral, pensar-se nos pontos eqüidistantes que nos levam a ideais comuns de uma nova relação docente/discente para as ações do aprendizado formal e, ou informal do conjunto dos processos de aprendizagem em que se encontram inseridos crianças e adolescentes das áreas de vulnerabilidade social. Desse diálogo das partes envolvidas, que se formulem propostas dialógicas para novos caminhos que contra-argumentem com a desorganização social e definição como conceito inclusivo, que abrange fenômenos variados como o conflito de papéis, o conflito cultural e disjunção entre meios e fins socialmente sancionados e outras espécies de congruências ou contradições. Os grupos ou sujeitos da exposição às pressões geradas por essas formas de desorganização apresentam maior possibilidade de ignorar ou infringir as normas sociais. Suas reações dependem dos valores, expectativas e dificuldades criadas por suas circunstâncias. Tais contradições culturais, não raro, impõem escolhas difíceis, no decorrer da infância até a vida adulta. Quantos valores contraditórios são amplamente aceitos como válidos levando o indivíduo a incorpora-lo na sua cultura como norma de convivência que ajudam perpetuar valores incompatíveis em nome da massificação qual é exposto. Numa época de rápidas transformações, fica o questionamento se deve evitar ou não o ajustamento a qualquer aragem que sopre. As interpretações psicológicas do comportamento não convencional ou criminal dos protagonistas das estatísticas de mortalidade entre os jovens de 16 aos 24 anos de idade da nossa guerra urbana não precisam apoiar-se nos instintos ou tendências inatas dos estudos de Freud sobre a análise da dinâmica da personalidade. Porquê? Por que os indivíduos podem vir a ignorar os ditames culturais em virtude de sua experiência social particular. Jovens saídos de lares com a ausência de um ou ambos os pais, as exigências ou carências excessivas quais foram expostos, a autoridade rígida ou o conflito entre pais (biológicos ou substituto), e filhos o aliciamento pelo poder substabelecido nas comunidades, por exemplo, redundam às vezes, em tendências psicológicas que estimulam a rejeição ou o desprezo de prescrições culturais. Porque as primeiras experiências são particularmente importantes na formação da personalidade, a não conformidade parece refletir o malogro da socialização. A má vontade e a inabilidade para inculcar respeito pelos outros ou pelos valores sociais predominantes a estimulação de sentimentos agressivos ou hostis, ou mesmo a transmissão direta à criança de hábitos ou interesses socialmente objetáveis.

É fundamental  considerar  as  contribuições da arte no processo educativo individual ou coletivo e sua dimensão inclusiva possibilitando o desenvolvimento de trocas interpessoais não segregadoras, que tenham a arte como fio condutor enquanto forma de expressão e comunicação potencialmente aberta a todos os alunos, indiferentes de suas características ou necessidades especiais,  fundamentadas no paradigma da inclusão, cooperação e na concepção de que a relação estabelecida entre pessoa com e sem deficiência física, mental ou sensorial, assim como a relação dialética entre o social e o individual, entre o particular e o universal, devem ser considerados como referenciais básicos para a construção de uma sociedade menos discriminadora e excludente e de um sistema educacional inclusivo. Tais considerações nos levam ao pensamento do filósofo inglês Herbert Read, que resgata o pensamento de Platão e defende a tese de que a arte deve se constituir a base da educação para a formação integral  do ser humano. Assim como temos o pensamento do arte/educador austríaco Lowenfeld e a importância do desenvolvimento da sensibilidade perceptual no processo educativo. Defende a ideia de que o homem aprende através dos sentidos e a escola deve priorizar a experiência sensorial, ao invés de limitar os processo de aprendizagem ao domínio lógica de certas respostas definidas e preestabelecidas, descontextualizadas da experiência do aluno. Segundo o autor, a atividade artística mobiliza a capacidade de procurar e descobrir respostas, levando à descoberta de novas perspectivas e formas de compreensão de si mesmo, do outro e do meio. “Viver cooperativamente, como seres bem-ajustados, e contribuir, de forma criadora, para a sociedade tornar-se  um dos mais importantes objetivos da educação” (LOWENFELD, 1977).

“ESTUDE O PASSADO, SE QUERES PREVER O FUTURO”
Confúcio

Um pregador religioso  não é  considerado um discípulo se simplesmente repete as palavras do mestre. Um discípulo engrandece os ensinamentos de seu mestre, aplicando-os efetivamente em diferentes épocas e circunstâncias. A contextualização acima é o mote para falar-se do empreendedorismo a partir da essência de mais um modelo americano sobre conexões de negócios, desenvolvimento humano, onde os sucessores têm de ser melhores que seus predecessores. Isto quer dizer que só poderemos construir um futuro melhor moldando seu sucessor, seja ele estudante, subordinado ou qualquer indivíduo da nova geração, para que sejam todos melhores que você. Ao provocar mudanças nas questões que mais importam ao ser humano, esses novos empreendedores, usando esse ou aquele enfoque, sem esperar pelo poder público, principalmente, lançam projetos que podem transformar setores sociais e melhorarem a qualidade de vida dos seus iguais e de tantas outras pessoas, sem os adjetivos da caridade, mas em transformação, isto é, transcender a condição humana por questões de fatalidades do destino, falta de oportunidade ou qualquer outra colocação do repertório de justificativas que cercam as mazelas da nossa má distribuição de riquezas. Tão somente a consciência de todos envolvidos ou não nas ações do terceiro setor, da iniciativa privada e no aporte ao cumprimento das obrigações do poder público para o questionamento do real significado e contribuição de papéis em prol dos que aqui habitam e a vontade de fazer algo relevante, que de a contribuição necessária a partir da perspectiva de gerar mudanças em vidas e circunstâncias. No atual estágio da educação no nosso país, a busca de caminhos que ajudem a otimizar o quadro de caos ante a impotência para o restabelecimento do fluxo natural dos nossos jovens em direção ao saber, eliminando a evasão escolar, a violência intramuros e no entorno da escola, a defasagem entre idade e série, o déficit cultural, e outras colocações que suscitam o envolvimento não só dos educadores, sociólogos, antropólogos e outros profissionais que atuam na busca de respostas e soluções para as demandas do ambiente escolar, pois, além do capital humano de Throdore Schultz, também temos todo o processo necessário ao funcionamento estrutural da parte física e burocrática em atendimento ao que prescreve os deveres e direitos segundo as leis e diretrizes do ensino. É no espaço de interseção entre políticas educacionais, educação física, artes, desenvolvimento humano e parâmetros curriculares nacionais que faço a  proposta reflexiva baseada em princípios teórico-metodológicos de teorias críticas e as questões emancipatórias, principalmente, pelo que os espaços comunitários têm de identificação com o movimentar-se, diferentemente do engessar na subjetividade de formar pessoas enquadradas em contextos que as formas expressivo-comunicativas externadas pela expressão corporal são entendidas na maioria das vezes como descompostura para a cultura da docilidade reinante (RODRIGUEZ, 2002, p. 138).

“Num mundo em que se valoriza demasiadamente a obtenção de graduação, vale a pena uma pequena pausa: Se formos beber nas origens da educação, encontraremos que educar é a arte de ensinar a pensar. Entretanto, se analisarmos a educação com a que recebemos, veremos que a escolas estão mais preocupadas em passar conteúdos do que em desenvolver o pensamento. A COMISSÃO INTERNACIONAL SOBRES EDUCAÇÃO PARA O SEC. XXI, da UNESCO, definiu a nova educação como um conjunto de quatro aprenderes: aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a conviver e aprender a ser. O primeiro deles refere-se a saberes codificados, ou seja, aquilo que podemos encontrar nos livros, e, em geral, é passado pelos professores nas salas de aula. O aprender a fazer está ligado ao desenvolvimento de habilidades e competências, sem as quais o conhecimento perde o sentido. O aprender a conviver refere-se ao desenvolvimento do espírito de sociabilidade e da capacidade de comunicação, fundamental quando se percebe que atualmente tudo depende de parcerias. O aprender a ser está relacionado ao respeito à moral e à ética, o que complementa a formação de uma pessoa. Esses três últimos aprenderes podem ser recebidos da escola, mas com certeza, são tão ou mais desenvolvidos fora dela. Essa reflexão nos ajuda a entender alguns fatos intrigantes, como o fracasso pessoal e profissional de algumas pessoas estudadas, e o sucesso, às vezes espetacular, de pessoas que não estudaram. A colocação anterior analisada pela perspectiva da filosofia, diz que, quando nascemos, os costumes se apoderam de nós e nossa acompanham por toda vida. Os que transgridem serão punidos, e os que transcendem estarão autorizados a falar em nome das pessoas.”

Já foi mais que demonstrado que todos os gênios da história eram pessoas capazes de usar com a mesma proficiência o raciocínio lógico e artístico, o visual e o verbal. O estudo musical, por exemplo, melhora a aprendizagem da matemática. É preciso harmonia, não adianta ser bom em apenas uma coisa, pois uma habilidade depende outra. Música é matemática pura, apesar de não sentirmos dessa forma. Dizer que o raciocínio lógico não pode ser criativo é pura mistificação. Portanto, na educação os objetivos são conflitantes a partir de uma visão mais filosófica, o que suscita uma reflexão engajada de todos que utilizam a arte como instrumento de transformação a partir de olhares e práticas diferenciados que florescem nesse campo de atuação da criatividade humana em que implicações e possíveis tendências no encaminhamento de propostas e novas vias de intervenção política sobre a realidade social, pois são questões e preocupações que nos remetem a complexidade da situação social do país. Diante dos extremos desse quadro social, essas provocações buscam evitar a paralisia, a abstração e a impotência ou causar alienação. Assim sendo, a proposta de musicalização até a informática musical nas artes dos projetos sociais não vem em detrimento aos valores cultural musical da nossa formação histórica feita ao som dos tambores africanos, principalmente, e sim, estimular àqueles que participam dessa tradição secular a irem em encontro das ferramentas necessárias à atualização ou que os ajudem na interface com outras culturas onde a prática musical se faz através de técnicas que se universalizaram e, com isso dando uma leitura atualizada a sons e ritmos que caracterizam a pulsação rítmica da formação musical influenciada pelos sons do legado dos signos do passado, presente e futuro na costura do tecido social com sua pluralidade racial na busca de ressignificados para um mundo a cada mais uniforme. Tais perspectivas de educação musical somada aos bens culturais e a valorização do ser humano, e a conseqüente transformação do bem cultural em caminho da sustentabilidade, onde os produtos sociais desta poderão sair do espaço circunscrito da favela e, ou do preconceito para a visibilidade através do bem cultural, e assim, saindo para a visibilidade por caminhos que não pelos da violência que projeta e estigmatiza as ações na busca de fazer-se visível, e o conseqüente rompimento com a situação extrema que aprisiona a juventude e paralisa a sociedade. Quando Bourdieu  (1996, p. 33 apud CASTANHO, 2005, p. 94), fala da historicização dos produtos culturais mostrando que todos pretendem a universalidade, alerta para o fato de que historicizá-los não é apenas, como se crê, relativizá-los. É também “restituir-lhes sua necessidade arrancando-os `a indeterminação que resulta de uma falsa eternização e relacionando-os às condições sociais de sua gênese, verdadeira definição geradora”. Em qualquer âmbito da educação artística a ligação com a sociedade é indispensável, seja ensinando apreciação ou orientando atividades. o ensino da arte haverá de chamar a atenção do estudante para o permanente papel transformador que as criações artísticas desempenham na história humana. É preciso saber ver, como alertou Snyders (1974, p.340 apud CASTANHO, 2005, P. 94): as pessoas que determinam mudanças radiciais são as que assimilaram mais profundamente a cultura existente, penetrando até os elementos revolucionários inclusos. E, geralmente, são escamoteados esses elementos revolucionários contidos na obra de arte para apresentá-lo como ilustração dos períodos históricos, desprovida de sua força transformadora e fundamente arraigada na vida social. Isto se deve, entre outras causas, ao fato de que a formação da sensibilidade, a experiência de formas novas, a confrontação e a crítica de conteúdos diversos contribuem para o desenvolvimento da personalidade, tendo efeitos políticos (SNYDERS, op. cit., p. 340). Apontar a história humana como um constante movimento de transformação do aqui e agora. A concepçãode arte imbricada no concreto procura estabelecer a ligação entre arte e sociedade, vendo as manifestações artísticas como formas de especulação sobre a realidade em nada inferiores ou superiores, do ponto de vista gnosiológico, às outras formas mais estudadas e valorizadas tais como a matemática e as demais ciências.

Os projetos sociais dentro das comunidades pobres, com certeza são um dos instrumentos mais eficazes na veiculação de notícias animadoras oportunizando os nossos jovens na sua aquisição cultural a partir da consciência de profissionalização para atender as demandas da sua área de atuação, bem como, estarão difundindo cultura como canal de diálogo para enfrentamento as demandas locais em busca de novos horizontes para o imaginário coletivo, que prostrado pelo medo, não se sente convidado a participar na invenção de novas realidades, a redesenhar o mapa geográfico ou o xadrez territorial , agora configurado pela cromática ebony and ivory representando a presença do estado com as folhas de caderno, o lápis e a borracha, o jogo de xadrez, o arroz com feijão gostoso e novos números para as estatísticas de avaliações que nos permita acreditar ser possível reverter o quadro que não nos permite sonhar um futuro com novas leituras para realidades nascidas da escola que não ensina o vocabulário da cooperação e da paz, ou seja, cria a ambiência para os processos de defecção dos seus sujeitos quando no seu fazer pedagógico insisti em dividir a sala de aula em vermelhos e azuis, principalmente.

Que os novos objetivos da educação consiga trazer novo alento em áreas agora pacificadas e descortinadas para possibilidades harmônicas que um dia Paul McCartney e Stevie Wonder traduziram para o mundo, e que a nossa cidade maravilhosa possa mostrar em 2014 e 2016, também, que a desarmonia alvinegra do passado comunitário seja a lição de que morro e asfalto como um só corpo, “junto e misturados” no bom vivant do espírito carioca de ser, é que faz o diferencial da “Cidade Maravilhosa”. Não custa nada imaginarmos um passado recente de crianças nas calçadas, casas com varandas, da cerveja gelada na esquina, dos campos de várzea, de moleques com calça curta e pé no chão e sem armas na mão, num mundo onde todos serão vencedores pelos novos aspectos que não alimentem folhas de menos valia,  fragmentação na relação morro asfalto, e os jornais possam veicular notícias de vitórias ao pessimismo,  de resultados positivos das políticas públicas contra a barbárie, dando a sua contribuição  no enfoque com contornos menos estigmatizantes para o coletivo e menos  potencializadores dos aspectos da periculosidade como via de visibilidade, como se apontando esta via como o lugar comum para a aquisição de bem material e status social, para aqueles que trilham os caminhos da comunidade  e a circunscrição da pobreza associados à violência urbana, no descaso  de ações sociais do poder constituído e o seu papel de compartilhar com as demandas locais numa maior credibilidade para com aqueles capazes de dominar as ferramentas necessárias para romper as barreiras psicológicas na busca de empoderamento necessário para trilhar por caminhos onde o Estado não se faz com a devida presença. Seja através de parcerias com o poder público,  ou da proatividade de lideranças comunitárias em parcerias com empresários do setor privado na criação de espaços para a compartilhamento de empreendedorismo e responsabilidade social através da multiplicação de espaços de circulação de bens culturais e consequente impacto na qualidade de vida da comunidade, onde a classificação dos espaços de transformação social não sirva de impeditivo pelas denominações de mercado. Olhar para as experiências que nos chegam dos projetos sociais significa compreender que a arte e a cultura oferecem um espaço privilegiado para o jovem se expressar e se autogerir; além de exercer um enorme poder de atração, trazendo-o para processos educativos  de construção de identidade, fortalecimento nos processos de auto-regulação para uma leitura de mundo concomitante ao  exercício da cidadania, gerando caminhos para  inserção no mercado de trabalho e, principalmente, dando uma nova ressignificação para a relação morro/asfalto de uma cidade fragmentada por favelados e moradores do asfalto..

A mediação do processo de criação e produção de um espaço motivador e facilitador da reflexão, fluição, produção e conhecimento da linguagem artística deve ser o objetivo da escola. A prioridade não está na  formação de um artista ou apenas na formação técnica do aluno, mas na viabilização do acesso ao conhecimento do campo da arte e da experiência sensível da criação artística que possam contribuir para despertar e estimular a formação de um olhar mais inteligente, crítico e sensível sobre a realidade. Nesse sentido, tomamos a linguagem  artística explorando sua  potencialidade como prática mobilizadora de diferentes formas de olhar, revelar e compreender a realidade. Ou seja, sair da atitude de que as manifestações egressas da comunidade subentende externação simbólica da representatividade dos estratos sociais que a compõem, o que significa a folclorização na contramão do conhecimento embasado no histórico cultural   e suas significações do ponto de vista  da evolução  possibilitando a ampliação de seu universo de representação e fruição por caminhos mais conscientes da intervenção a partir do referencial teórico-metodológico, por exemplo, como forma de empoderamento da sua vocação artística e, assim, através da experiência de criação artística, consciente, viabilizar outras possibilidades de produção de significação, de criação de narrativas materializadas em diferentes suportes, de exploração da intertextualidade, de mobilização das relações humanas em que as linguagens artísticas signifiquem construção de conhecimento, ou ressignificação da história individual e  social, a comunicação e expressão, o sentimento à inteligência coletiva do seu mundo informal e em  áreas afins do conhecimento formal, diferentemente da percepção míope  do processo excludente vigente. Muitos são os caminhos para o empoderamento daqueles egressos da vida comunitária através da arte: seja por meio de políticas públicas ou de filosofia de vida, onde a busca de capacitação através do estudo, com a conseqüente profissionalização, ou outra máxima qualquer que mova as suas ações para  atingir objetivos muito mais ambiciosos do que pensam ser possível ante aos impedimentos por uma série de fatores circunstanciais – a maneira como fomos criados, nossa história familiar, nossa cultura, nossos meios de informação, nossa própria energia individual – colaborando para formar a percepção do quão longe podemos ir e do quanto podemos realizar. Aí está o xis da questão: Aqueles circunscritos no design econômico da favela não acreditam em si mesmo devido à sua história, ou a sua história é o resultante direto dessa crença? Culpamos a história da história das nossas matrizes formadoras? Ou o que interessa é aprender o quanto à crença na capacidade de traçar o próprio destino é importante para a construção de um país e do futuro de cada um?

Pensar-se nas indagações anteriores é abrir-se para novas considerações a respeito da culpabilidade do poder público nas esferas municipal, estadual ou federal pelo que está como está porque este não resolve. Tudo mesmo, desde a inflação, à seca do nordeste, incluindo à saúde, a educação pública, a violência e a miserabilidade de grande parte da população. Então, porque a sociedade civil não se organiza para a efetivação da sua presença junto à mesa de negociações para a discussão da qualidade das escolas, da busca de caminhos para os problemas da miséria que empurra as famílias das comunidades para as ações assistencialistas e em troca de se locupletam com as arbitrariedades do poder substabelecido, com o conseqüente impacto social dos subprodutos destas em suas vidas? Porque somos cidadãos hesitantes em organizarmos para irmos à luta e atacar de frente seus problemas, em vez de esperar sentados pelo poder público nas suas várias esferas, mesmo que diante da burocracia de fatores estruturais que só podem ser mudados por ações do estado. Atualmente fala-se muito em gestão compartilhada para as políticas públicas, onde à iniciativa privada é dado o aval de cumprir parte do papel do estado. Por que a sociedade civil organizada não poderia também se capacitar para a autogestão das demandas sociais mais emergentes e compartilhar objetivos com o estado?

Na falta da disciplina de Educação Musical na escola de origem, a iniciação musical propriamente dita  poderá ser vista como um elemento de interdisciplinaridade com  conceitos matemáticos, por exemplo, com toda ludicidade que caracteriza o processo educativo do contra turno. As aulas são levadas às crianças e adolescentes a partir de uma seqüência instrucional planejada para o encadeamento dos conhecimentos musicais desde o aprendizado do uso de linhas e espaços na construção da pauta ou pentagrama e a posterior distribuição das notas nos mesmos. Após o domínio da localização espacial das linhas e espaços são apresentadas as figuras rítmicas positivas e as respectivas negativas ou pausas a partir das partes que as compõem, a sua divisão proporcional e a sua utilização na métrica do compasso através de uma visão pormenorizada através do uso do ostinato, exercícios de coordenação motora em detrimento as dificuldades de localização das notas nas linhas e espaços. Nesse primeiro estágio,  são observados alguns elementos subjacentes ao estudo da música como: disciplina, autodisciplina, motivação, auto superação e flexibilidade. Para a transcrição do apreendido de teoria musical é feito o uso do corpo como extensão rítmico-sonora e instrumentos de percussão como: pandeiro, caxixis, pau de chuva, tamborim, praticado, baquetas (para estudo da técnica de baqueteamento), apitos imitando sons de pássaros, berimbau, xequere.

A atividade de musicalização leva em conta os desejos do aprendizado e dos conhecimentos musicais trazidos por aqueles que fizeram a opção musical. Primeiramente a partir de uma análise do contexto social em que está inserido criar-se a empatia necessária a uma abordagem da proposta do estudo e prática musical segundo caminhos a ser percorrido por qualquer pessoa que deseje superar os questionamentos secundários ao objetivo primeiro de desejar para si as competências necessárias para fazer através desta o seu caminho para a busca de valores da auto-superação e autodisciplina, principalmente, pelo que a arte exige àqueles que enveredam pelo seu caminho. A partir das observações diárias da participação, motivação e externação da musicalidade latente, delinear as abordagens necessárias à construção de uma consciência musical mais universalista para as possibilidades de novos questionamentos e direcionamentos da praticidade do aprendizado musical consciente, renovado para os clichês dos objetivos apenas da ocupação do tempo enquanto no período do trabalho sócio-educativo, visto estar-se levando em conta o esforço mental desprendido por aqueles que tenham cumprido a primeira jornada, configurando-os a valores incapacitantes da condição humana de subverter dinâmicas do histórico pessoal como sinônimo de  incapacidade para a autorrealização em metas onde se exija o uso da intelectualidade. Outrossim, esclareço, é necessário levar-se em conta as observações de abstração, cansaço, fatores pessoais que interferem no aprendizado, todavia, não se pode coloca-los como incapacitados para a exposição ao exercício mental por maior tempo que a média daqueles pertencentes a determinado grupo de pessoas, aqui no caso, as crianças na condição de vulnerabilidade social.  Através de uma visão consciente dos seus objetivos no estudo de música propriamente dito, criar-se os caminhos motivacionais necessários para que se torne uma coisa prazerosa a descoberta das figuras de ritmo, pausas e a divisão proporcional dos valores negativos e positivos. Na dinâmica das atividades são usados elementos que estimule a percepção de si e das possibilidades rítmico-sonoras naturais do mundo que os rodeia. No segundo estágio são levados aos instrumentos convencionais de percussão na aplicação do conhecimento musical apreendido e sua aplicabilidade na construção de um espaço sócio-educativo que considere a diversidade cultural e as habilidades e as competências a serem trabalhadas para inseri-lo nas políticas do aprendizado continuado, introduzindo-os aos processos da aquisição do conhecimento solidário para que este não se perca da sua história, isto é, conhecimento na perspectiva do desenvolvimento humano.

Após o primeiro contato com os elementos para a construção musical propriamente dita, são levados naturalmente ao entendimento da escrita musical e a sua conseqüente aplicação ao instrumento. Paralelo ao aprendizado musical, observa-se as deficiências em algumas habilidades ou competências necessárias à vida escolar. Das observações do instrutor quanto às questões que interferem no aprendizado, foi observado por este que: pela estreita ligação entre o emocional, o pessoal e o cognitivo, a leitura da escola não está atendendo as necessidades de um olhar mais atento para a realidade extracurricular inserida no bojo da postura no âmbito do espaço da sala de aula, o que suscita a autopercepção e a heteropercepção de quem está inserido no processo educativo formal ou informal dos que estão contextualizados ao olhar piegas das distinções socioculturais e econômicas das matrizes formadoras  e a conseqüente edição do ambiente em que o aprendiz não se sente inserido à proposta teórico-metodológico, já que esta por seus motivos incapacitadores, não o convida a participação efetiva pela construção prazerosa do saber e ao conseqüente aumento da autoestima, sentido de pertencimento, auto superação, autodisciplina abrindo para a busca do enfrentamento das dificuldades inerentes ao quadro social de origem, nascido de estímulos à percepção de ser parte de uma ótica mais humanizada das suas particularidades e potencialidades como ser humano único e não como alvo das questões pertinentes as mazelas sociais e o reflexo destas no cotidiano das pessoas, o que vai além da visão distorcida da associação de vulnerabilidade social e incapacidade para superar os apelos da abstração ante a necessidade de permanecer-se durante mais tempo fazendo o uso da intelectualidade. Tão somente a permissão deste ao conhecimento das suas possibilidades sem as restrições externas dos ruídos da interlocução cultural acionando os mecanismos da descontinuidade para os saberes da escola formal sem detrimento aos seus saberes de cidadão ou cidadã da comunidade pode-se formular os princípios básicos para uma nova educação a partir dos eixos da verdade, do belo e da bondade segundo o autor da TEORIA das INTELIGÊNCIAS MÚLTIPLAS.

São parceiros os professores de Educação Física, Psicomotricidade, Fonoaudiologia, Terapia Ocupacional, Psicologia e Expressão Corporal. A educação física contribui no registro dos alunos dispensados para as turmas de musicalização, hora atuando no estímulo a não descontinuidade     pela falta de elementos da multidisciplinaridade criando a ponte de correlação da atividade corporal da educação física com os elementos comuns à prática desportiva associada aos equipamentos e técnicas onde há toda uma conotação de preparação física, portanto, um apelo maior da participação na quadra ou no campo de futebol pela associação dessas práticas com as brincadeiras e com o jogo de bola, que por uma ordem natural mexe com o imaginário de meninos e meninas, levando-os algumas vezes ao questionamento da participação na atividade em que já estava inserido ou o abandono para as novas possibilidades trazidas no bojo do aprendizado musical associado à elementos da psicomotricidade pelo que as combinações rítmicas podem fazer no trabalho lúdico para pés e mãos, coordenação motora e tantas outras contribuições a partir do domínio da divisão rítmica aplicada ao corpo como extensão rítmico-sonora, por exemplo. Nas observações dos motivos da maior ou menor participação, detectei que as crianças do turno da tarde já trazem os reflexos do cumprimento da jornada na escola, sendo necessárias o uso de artifícios motivacionais complementares como estímulo para uma participação efetiva na elaboração dos caminhos para o desenvolvimento do conteúdo de teoria musical a ser apreendido em face da repetição de algumas habilidades correlatas as do ambiente escolar, porém, necessárias ao universo do musicista pela estreita ligação com leitura e a escrita do estudo formal, mesmo que já utilizado no período escolar da primeira jornada somado ao pensamento comum da ligação entre o estudo de música, o novo, o uso do raciocínio lógico (matemática), os clichês do universo das ações socioeducativas dissociadas da ação educativa para a continuidade divergem com a proposta do uso do teórico/prático da educação musical como elemento formador da cidadania, instrumento da interação pedagógica para demandas que suscitam a apreensão dos códigos sociais da acessibilidade,  que os torne empreendedores conscientes do potencial das mídias  com poder de formar opinião ante ao desestímulo de contratempos da condição socioeconômica do contexto onde estão inseridos e outros pontos que os deixam reticentes quanto à opção pela opção musical, sucumbindo-os a opção menos exigente nos aspectos da intelectualidade como algo a ser abominado em nome de um senso comum da prostração ante aos caminhos formais da escolaridade. Como caminho para otimizar a relação estudo/prática musical, tento partir da desconstrução dos clichês sem perder o vínculo com as suas realidades de comunidade e os instrumentos de percussão, como também os levando a descoberta do próprio corpo como extensão rítmico-sonora, dos sons naturais que ainda fazem parte dos locais mais recônditos das comunidades e das possibilidades da construção de instrumentos para a concepção e percepção de que o som é parte de uma informação rítmica que pode ser transformada segundo as vontades do processo criativo dos sons internos e da dinâmica do metrônomo interior de cada um a partir de objetivos traçados para a utilização dos primeiros ensinamentos da proposta filosófico e didático-pedagógica necessária a construção da opção consciente quanto ao uso da teoria e prática musical na formação do futuro musicista e posterior músico. Tais observações levaram-me a reflexão do quanto a musicalização pode cumprir o seu papel social ao atuar no processo do desenvolvimento humano (GARDNER, HOWARD) e nas atividades comuns à Educação Física quando na jornada anterior a do currículo escolar pela reciprocidade de que trás nos condicionamentos da transcrição da notação musical para a coordenação motora com o uso de membros inferiores e superiores, lateralidade, percepção somado aos elementos da ludicidade. A psicologia e a expressão corporal pelo seu trabalho conjunto utiliza-se do aspecto multifacetado da música para a construção de projetos onde o conhecimento musical dá a sua contribuição em objetivos comuns da relação multidisciplinar e interdisciplinar, ou transdisciplinar pela presença de meninos e meninas em aulas de musicalização somando-se à construção pedagógica de atividades parceiras onde a correlação didático-metodológica crie elos para a composição de idéias onde o conhecimento musical se faça de varias formas, seja através do conhecimento rítmico, associação entre objetivos pedagógicos e estilo musical, construção poética ou o acompanhamento instrumental se faça necessário.

A tensão permanente entre o esporte na escola e o esporte da escola no livro Educação Física e Aprendizagem Socia de Valter Bracht, busquei a reflexão acerca da contribuição da Educação Física no processo de socialização de criança e de adolescentes. No Capítulo 3 do livro, depois de salientar que existem diferentes valorizações desse processo decorrentes de diferentes visões de mundo e afirma que a socialização através do esporte escolar pode ser considerada uma forma de controle social, pela adaptação do praticante aos valores e normas dominantes como condição alegada para a funcionalidade e desenvolvimento da sociedade. Um dos papéis que cumpre o esporte escolar em nosso País, então, é o de reproduzir e reforçar a ideologia capitalista, que por sua vez visa fazer com que os valores e normas nela inseridos se apresentem como normais e desejáveis pelos vários discursos na subjetividade do sentido educativo do esporte. Em outra passagem o autor é ainda mais rigoroso e taxativo na análise sobre as possibilidades de o esporte ter um sentido educativo:

 … realmente o esporte educa. mas, educação aqui significa levar  o indivíduo a internalizar valores, normas de comportamento, que lhe possibilitarão adaptar-se à sociedade capitalista. Em suma, é uma educação que leva ao acomodamento e não ao questionamento. Uma educação que ofusca, ou lança uma cortina de fumaça sobre as contradições da sociedade capitalista. Uma educação que não leva à formação “do indivíduo consciente, crítico, sensível à realidade que o envolve [OLIVEIRA, 1993, p. 63)

Na área de Educação Física Escolar há muitas discussões sobre os conteúdos que devem ser trabalhados pelos professores, as abordagens e áreas de conhecimento que ela abrange, além disso, estuda-se o movimento com técnicas sofisticadas buscando a perfeição e adota como conteúdo da Educação Física conteúdos das áreas mais diversas como as médicas, a biológicas e humanas entre outras, esquecendo o ponto chave da questão: o ser humano historicamente criado e culturalmente desenvolvido de uma maneira integral e única, destacado pelo Coletivo de Autores (1998). Do histórico-social marcado pela formação com predominância na área biológica, os profissionais da Educação Física  não tiveram acesso às discussões socioculturais, haja visto a concepção de corpo como um conjunto de sistemas e não como cultura, o esporte era de alto rendimento ou passa tempo, não lidava com os fenômenos políticos e culturais da época, a Educação Física não tinha o caráter cultural, essa concepção nos chama a atenção para as atuais dificuldades do seu papel na escola do nosso tempo/espaço. O Coletivo de Autores vem reforçar a citação acima e nos mostra uma nova tentativa de inovar e buscar uma nova reflexão para a Educação Física quando destaca, no passado a perspectiva da E.F , tinha como objetivo o desenvolvimento da aptidão física do homem, onde a contribuição histórica é relativa aos interesses da classe dominante. mantendo uma estrutura capitalista, mas hoje essa área começou a ter uma nova reflexão, sob um aspecto lúdico buscando investigar a criatividade humana e a adoção de postura investigativa e produtora de cultura. Na sua condição de promotora da cultura corporal do movimento, isto é, na perspectiva que o movimento é o seu objeto de estudo, sem, entretanto, esquecer o caráter social e cultura que a E.F deve exercer em seus alunos não deve ser deixado de lado ao assumir, também, a responsabilidade dada aos professores quanto a transmissão e ensino de conhecimentos que transformem a realidade social. Segundo Medina (1948), o homem só pode evoluir, cada vez mais, através da percepção gradual que se dá em relação a si mesmo, em relação aos outros, em relação ao mundo, assim nosso papel como educadores é o de proporcionar essa interação e conhecimento cada vez maior do ser humano com o mundo e suas relações.

Na perspectiva de Oliveira (2004) a E.F existe em função do homem, enquanto ser individual e social,  sendo assim temos que entender o indivíduo como um todo, nas suas várias formas de se relacionar com o mundo e a E.F como Cultura Corporal de Movimento têm que estar atenta as singularidades que formam o coletivo escolar. Pensar que a cultura de movimento envolve a relação entre corpo, natureza e cultura por meio de uma lógica recursiva é pensar que as técnicas corporais influenciadas pelo funcionamento orgânico e pelas trocas culturais, ao mesmo tempo em que criam e recriam os jogos, as danças, os esportes, as lutas ou as ginásticas, provocam mudanças tanto no organismo quanto na sociedade em que estão inseridas. Percebemos que os textos da cultura, como as danças, os jogos, os esportes, as lutas ou as ginásticas possuem uma relação constante com os códigos do funcionamento orgânico e com os códigos da linguagem. Ao reconhecer que os atos corporais são fenômenos biopsicossociais, Mauss (1974) já se empenhava em tecer relações entre a Biologia e a cultura,  uma vez que reconhecia que determinadas técnicas corporais influenciavam os fenômenos biológicos. Com relação a significação dessas práticas corporais possuem significados originais de acordo com o local em que foram produzidas, podendo mudar conforme o novo contexto e a interpretação das pessoas que a vivenciam ou apreciam. Nesse sentido as técnicas corporais são dinâmicas, isto é, varia conforme a educação, as diferentes experiências vividas e as trocas culturais. O corpo é o fundamento da E.F e ratifica a relevância da disciplina para uma melhor integração de saberes adquiridos e revela, a partir da sua memória, como estes saberes são inscritos na memória corporal e constituem sua participação social. Do ponto de vista pedagógico, pode-se dizer que a base para uma aprendizagem significativa está marcada na qualidade da comunicação corporal que vai revelar o sujeito da história. isso porque cada sujeito tem um tempo, uma modalidade de ser, de aprender e participar do mundo. O curso de E.F na pedagogia significa criar possibilidades para uma pedagogia que favoreça as manifestações corporais vinculadas à história da humanidade e ao papel social do ser humano como produtor da história da existência humana.

A aproximação e homogenização das mais  diferentes perspectivas pedagógicas a partir de um denominador comum: a expressão “cultura corporal” como base para a definição e elaboração  dos eixos de conhecimentos teórico-metodológicas, político-ideológicas, filosófico e didático-pedagógicas de que trata a Educação Física (dança, capoeira, luta, esporte, jogo, mímica, circo…) quando ao assumir a expressão cultura corporal, explicita suas fundamentações teóricas (filosóficas e pedagógicas), bem como a finalidade ou as intenções da prática pedagógica da E.F como fio condutor pelas vertentes do empoderamento advindo de intervenções com caráter inter e multidisciplinar para se compreender os valores de comunidade e através de aulas de transformação desde a pré-escola, ensino fundamental e médio, por exemplo, onde os sujeitos do processo educativo  possam colher frutos de uma ambiência cultural que valoriza a bagagem cultural  corporal de seus sujeitos e, esta possa ser produto intercâmbio com a concepção de motricidade da escola e o conseguente fortalecimento de todos os envolvidos em objetivos do desenvolvimento humano advindo de aulas de transformação trazida no bojo da identificação e articulação de indivíduos e grupos em prol de uma rede de cooperatividade cidadã em nome da dignidade do outro, mesmo que utópica aos olhos dos céticos, ante aos adjetivos de menos valia que estigmatiza aqueles que buscam a mobilidade social através da ação emancipatória da educação. Segundo pesquisadores na área da educação, atualmente temos um índice de reprovação e abandono de 10% a 15% no segundo grau conforme registro no censo escolar de 2005 – os mais altos em 10 anos. Para os estudiosos do assunto, será necessário repensar na educação como projeto sócio-político, onde se faça o uso da inter e multidisciplinaridade e a reedição das diretrizes curriculares aprovadas em década passada, que preveem ensino contextualizado, permeado por temas de interesse coletivo. Porém, no passado às escolas não aderiram à proposta, porque lhes faltaram meios ou há quem creia que a solução é soterrar os alunos com mais conteúdos, quando se deve pensar mais na qualidade. Sabe-se o quão é importante ao mesmo tempo crucial todo rito de passagem, por isso, não são diferentes os anseios dos nossos jovens diante das perspectivas que se apresentam ante ao cenário das oportunidades via ensino público e as suas defasagens na construção de caminhos de transformação através da descoberta de vocações, do aprendizado centrado na ambiência cultural advindo da entrada de profissionais com valores e conhecimentos filosóficos e antropológicos da inter-relação no convívio diário de pessoas com valores conflitantes pela coexistência de pessoas oriundas de universos distintos. Tão somente a superação dos entraves socioeconômicos resolveria os problemas do ensino? Tão somente uma educação continuada a partir da pré-escola, ensino fundamental, ensino médio através de links com a vida real e projeto sócio-político como as cotas podem mudar o quadro de entrada no terceiro grau pelos menos favorecidos? Que mecanismo do processo excludente para a manutenção do “status quo” que privilegia o acesso ao ensino superior para os formadores de opinião e seus pares deve ser abolido em nome de uma nova ordem social?

Muito se falou, porém, pouco tem sido feito, seja por falta de foco dos prejudicados, sabe-se Deus pelos desígnios, fatalidade ou aceitação passiva diante do quadro contextualizado acima, onde não cabe a interrogação, mas sim, uma reflexão do quanto a nossa história ainda é determinante do quadro da transmissão vitalícia das oportunidades no âmbito do conhecimento e do quanto o seu reflexo na coexistência salas de aula com sujeitos que não se sentem convidados a partilhar os conteúdos do saber em nome de valores de universos distintos no espaço intramuros das escolas públicas encravadas nas comunidades pobres, principalmente.

A arte, por si só, não opera transformações na educação, mas a experiência com os processos de criação pode reorientar o sentido de ensinar, o papel do professor, a imagem da escola, bem como o valor das práticas culturais nas comunidades e na vida pessoal e profissional dos professores e nas relações entre as escolas e as instituições que promovem ações sociais. “A escola formal, sendo o polo dessa ação, garante acesso e continuidade desse tipo de experiência a um grande número de crianças, jovens e adultos” (IAVELBERG, 2003, p. 23) . Uma corrente de pensadores prega que o homem deve ser educado para tornar-se o que; o outro, que o homem deve ser educado para tornar-se o que não é. O primeiro imprime ênfase as potencialidades valiosas existentes em cada indivíduo, desde o nascimento, e vê a função da educação como a de propiciar um ambiente que favoreça o desenvolvimento dessas potencialidades e ajude o indivíduo a alcançar por si mesmo as maiores alturas de que for capaz. A segunda vê a educação como tentativa para a formulação de um caráter ideal, na qual deve ser tentada a modelagem de cada indivíduo. O primeiro objetivo aplica a ênfase à liberdade de expressão, o segundo a disciplina. Infelizmente numa dicotomia: ou um ou outro, o que é desnecessária e improdutiva. O assunto é complicado pelo fato de que as palavras “liberdade de expressão” e “disciplina” ou autoridade são passíveis de variadas conotações. Será útil, portanto, a tentativa de exploração de alguns possíveis significados do termo disciplina.

A palavra disciplina tem origem na mesma raiz da palavra “discípulo”, significando seguidor, aluno ou aprendiz, derivada do latim “discere” (aprender). Tal sentido ao longo dos séculos foi perdendo o sentido militar da palavra, mas pelo menos, foi parcialmente retido em seu sentido pedagógico na educação, porém, a palavra desenvolveu uma variedade de distinções e nuances de significado. Isso leva-nos freqüentemente a erros e objetivação, pelo uso da palavra em sentido diferente daquele empregado pelos tempos modernos dos fenômenos da plasticidade do mundo globalizado. Segundo a pesquisadora Sonia Kramer, em matéria intitulada: A NECESSIDADE DE EDUCAR CONTRA A BARBÁRIE, não corremos o risco de chegar a barbárie, vivemos nela. Educar contra a barbárie significa recuperar a história e as histórias guardadas e esquecidas, estabelecendo uma outra relação com a tradição, significa colocar o presente numa situação crítica e compreender que o passado não precisaria ter sido o que foi, o presente pode ser diferente do que é e, que, portanto, é possível mudar o futuro.

Isso exige reconhecer a opressão, o preconceito, à imposição cultural através da perpetuação dos sujeitos para a transmissão de conhecimento e valores humanos nos principais pontos formadores de opinião, o desdém generalizado e, ao mesmo tempo, ter capacidade de resistência à utopia de uma sociedade justa e sem discriminação de nenhuma espécie. Parafraseando o grande brasileiro Darcy Ribeiro, tão somente o investimento em pessoas fortalecidas psicologicamente, socializadas a atitudes positivas e cognitivamente favorecidas poderemos combater a violência, a ignorância e, todas as condições adversas de uma sociedade justa, onde pessoas com responsabilidade, cooperatividade cidadã, profissionalização, com identidade própria para exercer o seu papel de ser humano na sua totalidade a partir da sua expressão legitimada para um mundo, que mesmo pós-moderno, não o intimida de defender os seus pontos de vista através das várias ferramentas de comunicação. Então, poderemos dizer que estamos nos aproximando ao ideal da tão sonhada utopia da igualdade racial a partir da consciência da necessidade de um trabalho desde a infância até o terceiro grau, onde a educação continuada com objetivos do desenvolvimento humano em nome de uma ordem social orientada no reconhecimento do outro e nas suas diferenças de cultura, etnia, religião, gênero, classe social, idade, superando a desigualdade: este é o maior objetivo da educação. Portanto, lutar por essa nova ordem social é preciso educar contra a barbárie da modernidade, do desdém generalizado que impera na nossa cultura sem ética, o que exige uma perspectiva de formação cultural que assegure sua dimensão de experiência crítica.

Essa análise provoca reflexões: É possível uma educação crítica dessa cultura em que não mais nos reconhecemos? Como pensar a formação do novo milênio numa direção em que repense o passado e os despojos da cultura? Como defender uma perspectiva de formação cultural crítica sem perder-se da visão que a cultura construiu e fortaleceu como monumento da barbárie. A partir das considerações da pesquisadora restam os questionamentos dos rumos do educar:

1-   A possibilidade do diálogo está se perdendo ou perdeu?
2-  Por que caminho recupera-lo?
3- Quais as ferramentas necessárias para uma ação político-pedagógica em nome do desenvolvimento humano?
4- Como achar o meio termo das tradições e uma releitura de realidades tão contraditórias?
5- A busca de um ideal de vida em nome de padrões do consumismo onde os questionamentos dos meios e fins fazem-se segundo critérios de valores que ultrapassam as perspectivas dos valores éticos.

As oportunidades sociais ampliam e multiplicam as oportunidades educacionais. Do contato com as novas possibilidades que não reproduzam os mecanismos que acionam as travas da motivação de crianças e adolescentes inseridos no contexto das demandas do ensino público, onde temos os questionamentos da evasão escolar, da prostração para o saber e outros itens estimulando aos educadores à busca de caminhos para melhora o desempenho na sala de aula do ensino fundamental, principalmente, onde as ações pontuais das políticas públicas com foco no combate a violência dentro e fora do espaço da escola podem mobilizar toda a sociedade para a participação nos questionamentos e na construção de pontes entre a comunidade e o poder constituído em busca de propostas que venham ao encontro das necessidades primárias para uma maioria de crianças e adolescentes que buscam nos projetos sociais o complemento educacional, social e pessoal que os seus pais não lhes pode oferecer. A atividade de musicalização prima por construir um espaço sócio-educativo que considere as diversidades sociais e culturais a partir das suas realidade, promovendo através do processo de identificação o estímulo e a motivação para a participação efetiva e a conseqüente apreensão de novas realidades às trazidas do contexto onde estão inseridas, para a composição da pessoa como um todo em nome do coletivo, indiferente a esse ou aquele questionamento da capacidade humana de auto-superação. Então fica o questionamento dos caminhos a serem percorrido na busca da dinâmica que estimule a aprendizagem e transforme a relação entorno da escola versus professor versus aluno a partir do que temos contextualizado no âmbito das escolas públicas encravadas nas comunidades, principalmente, já que o público alvo para os objetivos das aulas de musicalização é crianças e adolescentes oriundos destas. Levando-se em conta o quadro acima e os elementos subjacentes à música e a sua atuação no desenvolvimento humano segundo Gardner, temos nesse primeiro estágio de apresentação ao universo da notação musical algumas habilidades ou competências a serem desenvolvidas como:

1– Auto superação
Desde a opção para as aulas de musicalização as crianças e são participados dos caminhos de uma seqüência instrucional para apreensão do conhecimento necessário para a prática consciente dos instrumentos. No primeiro estágio da apresentação ao estudo de música propriamente dito, estes podem ser categorizados como possuidores de musicalidade latente, apreciadores ou influenciados pela presença de pessoa amiga na atividade. Levando-se em conta as várias percepções do estudo musical, tento construir a seqüência instrucional, segundo os compêndios de música, da forma mais prazerosa possível a partir sem perder o foco na seqüência tão necessária e os planejamentos segundo os seus desejos de praticar instrumentos e outras opções que são inseridas no processo de transversalidade pelo aspecto multifacetado do uso da música, tanto no aspecto da prática ou do estudo p. dito para que ocorra naturalmente e simultaneamente a interlocução cultural e o desenvolvimento humano através dos vários processos de estímulo a percepção musical (INTELIGÊNCIA MUSICAL).

2-Autodisciplina
A maneira como estas são convidadas a partilhar o conhecimento; onde o diálogo e a curiosidade são a mola mestra para a construção deste. Onde cada um envolvido no processo da aprendizagem sinta-se como o objetivo principal, mesmo que trazendo os condicionamentos da escola, onde este tem uma visão particular de como é visto (heteropercepção) segundo a sua menor ou maior capacidade de perceber e sintetizar de maneira correta o que lhe é ministrado pelo professor. Um dos objetivos da musicalização é recriar em alguns aspectos o ambiente da relação sala de aula x professor x aluno para trabalhar-se os pontos de fragilidade que estimulam o fracasso escolar pela sua estreita ligação com o emocional e o motivacional. Assim, criar um ambiente de respeito e crescimento mútuo favorável ao florescimento de novas perspectivas onde não haja espaço para as ameaças da palavra exclusão, onde admire e seja admirado e que respeite e sinta-se respeitado.

3- Flexibilidade
Da relação diária com a família, comunidade e escola, trazem nas suas ações todos os condicionamentos do exercício cotidiano com os adultos que os tutelam. Por isso tem que se estar perceptivo para a sua autopercepção e heteropercepção para trabalhar-se potencialidades e competências que precisem ser desconstruídas, redirecionadas ou fortalecidas. Por estarmos no universo de pessoas no processo de formação e transformação, portanto, suscetível às influências do meio em fiéis copiadores da leitura do mundo a que se encontram exposta, o que requere aos que os tutelam no período da jornada dos projetos sociais, uma leitura atualizada da escola para as realidades extracurriculares que diretamente ou indiretamente provocam ruídos na interlocução cultural da escola, como também se estendendo a outros espaços de concentração destes. No intercâmbio comunidade/escola, onde concepções distintas de aprendizagem não andem por caminhos equidistantes, como espaços para a aquisição de conhecimento formal e informal segundo princípios de trocas orgânicas que floresçam concepções menos lineares pela intrínseca relação entre  interlocutores de realidades que abissais, que num primeiro momento da atipicidade se vêem pela ótica da impessoalidade  como  proposta primeira  na  construção dos saberes segundo a concepção filosófico-pedagógica, didático-metodológica da formação em detrimento ao se estar no mundo para trocas que levem a ressiginificação do fazer docente que cumpre o seu papel de mudar percepções e sensações, ou seja, a desconstrução de valores até então inquestionáveis pela suposta ideia de neutralidade da educação quanto as demandas sociais dos seus alunos, e toda uma simbologia  de tutelagem estabelecendo a linha divisória entre a educação diretiva, tão somente,  do cumprimento do dever em detrimento ao tripé: autenticidade, respeito e empatia que caracteriza o humanismo cognoscente de Carl Rogers na relação ensino-aprendizagem. Assim sendo, flexibilidade é palavra-chave no universo de alteridade da escola  para os processos de aceitação  das idiossincrasias,  de ponto de encontro de concepções trazidas dos vários espaços da convivência humana em nome de objetivos  cuja resultante seja o processo natural de novos esquemas mentais modificando acepções pré-concebidas;  a incorporação de  pressupostos que tragam novos paradigmas para o questionamento de pontos de vista e demandas saídas de universos paralelos  convergindo para o consenso em objetivos comuns nascido da troca dos sujeitos da educação, e a conseqüente transformação da subjetividade a partir da constatação, aceitação e inclusão da diversidade cultural e social do outro.

4- Cooperação e Colaboração
Além das questões de que a atividade musical tem importantes consequências para o desenvolvimento emocional e cognitivo da pessoa, tocar um instrumento musical é uma das mais complexas atividades humanas pelo tipo de demanda que faz ao sistema de conhecimento como um todo. Envolve uma interdependência de aspectos cognitivos e emocionais realizados por meio de uma coordenação entre os sistemas auditivos e visuais, que se articulam com o controle motor fino (Galvão & Kemp; Pederiva, 2005). Tornar-se músico implica estudo individual deliberado de longo prazo e em exposição a variadas formas de experiência musical (ouvir música, tocar em grupo). O uso do computador para a aprendizagem musical – musicalização -´pode ser uma via de aproximação da escola e o numeroso contingente de jovens habitantes das periferias urbanas a partir da perspectiva arte educadora por meio da mídia-educação como ferramenta pedagógica. Segundo estudos (Belloni, 1994, 2004). Outras hipóteses que orientam o trabalho de pesquisa empírica podem ser assim resumidas (Belloni, 2008):

  • No uso de TIC, crianças e jovens desenvolvem modos novos de aprender e novas habilidades cognitivas desconhecidas ou ignorados dos professores (autodidaxia);
  • As crianças e jovens usam com habilidade e familiaridade  estas técnicas, desde que tenham acesso a elas, ou seja, seu uso tende a generalizar-se. Essa generalização é acelerada pela atração exercida por estás técnicas nas gerações que, desde pequenas, vivem entre mídias eletrônicas, especialmente a televisão;
  • As crianças e jovens desfavorecidos, que não têm acesso às TIC, podem desenvolver aquelas habilidades e modo de aprender, uma vez aue tenham acesso a ambientes ricos em tecnologias e a situações favoráveis de aprendizagem que tendem a estimular os processos psicológicos superiores, transformando-os em outros processos cognitivos.

A principio as palavras cooperação e colaboração são conceitos sinônimos para alguns, e, no entanto, ter significados diferentes  na  literatura  de  autores  como  a  gaúcha  Ana  Vilma Tijiboy et al. (1999, p. 19-28) no que diz  respeito  ao    envolvimento  de  cada p arte do grupo para  a resolução da tarefa. Segundo Tijiboy, o conceito de cooperação é mais complexo que o de interação  e  de colaboração, pois  além  de  pressupor ambos, requer relações de respeito mútuo e não hierárquicas entre os envolvidos,  uma postura  de  tolerância  e  convivência  com as diferenças e um processo de negociação constante. (…) a diferença fundamental  entre  os conceitos de colaboração e cooperação reside no fato de que  para  haver  colaboração  o  indivíduo  deve  interagir  com  o  outro, existindo  ajuda – mútua  ou  unilateral. Para existir cooperação deve haver interação, colaboração, mas também objetivos comuns, atividades e ações conjuntas e coordenadas.

As concepções iniciais de Piaget sobre a interação cooperativa como fator de desenvolvimento cognitivo fornecem um quadro teórico geral para estes estudos, que pretendiam verificar se a intensificação das interações entre pares e entre crianças e adultos poderia, em certas condições, compensar as deficiências de crianças de origem social desfavorecida frente à instituição escolar. Tratava-se de estudar “a anterioridade de uma forma de interação social que se refletirá na aquisição de novas competências individuais em operações cognitivas. Outra grande contribuição é dada por Vygotsky, quando a escritora e professora Maria Teresa de Assunção Freitas responde a pergunta: É possível compreender  o computador e a internet como instrumentos de aprendizagem? Segundo a autora de “A Perspectiva Vigotskyana e as Tecnologias” , para a Revista Educação, a pergunta pode ser respondida com base na teoria psicológica de Vygotsky, a partir dos sentidos que dá aos termos instrumento, cultura e aprendizagem. Baseada na concepção histórico-cultural, dialética Marxista, para qual o conhecimento não é adquirido, mas construído na relação com o outro. Uma relação dialética entre sujeito e objeto, isto é, entre o sujeito e o meio histórico. É uma questão de base social, de uma relação não só com objetos, mas principalmente uma relação entre pessoas, entre sujeitos, como lemos em  A dominação social da mente. A internet e o computador são de fato mediadores do conhecimento enquanto ferramenta material, mas, principalmente, são mediadores do conhecimento, enquanto um instrumento simbólico, e permitem a mediação com outro. Portanto, eles possibilitam a construção compartilhada de conhecimento, via interatividade, de que fala Vygotsky. Estimulam novas formas de pensamento no enfrentamento com hipertextualidade neles presente pela inter-relação de diversos gêneros textuais expressados por diversas linguagens (sons, imagens estáticas e dinãmicas, gráficos, textos). A plasticidade interativa própria das tecnologias digitais trazidas destes meio sociointerativista permite, ainda, a construção de diversos percursos de aprendizagem através da atividade do sujeito que interage com o outro e com o objeto do conhecimento.

Por tratar-se do desenvolvimento humano e a interação dos aspectos subjetivos e objetivos, da modificação e da continuidade, do universal e do individual, jovem e do velho e do passado, presente e futuro, o que nos leva as cinco características de desenvolvimento estabelecidas pela Psicologia do Desenvolvimento e da Aprendizagem pelo que esta ciência traz nos pressupostos que procuram não só conhecer e medir as modificações humanas por todos os estágios da vida, mas também utilizar seu conhecimento para ajudar todas as pessoas a desenvolverem seu  pleno potencial humano, examinados à luz dos sempre cambiantes contextos   social e cultural, ou seja, o desenvolvimento é:

  • Multidirecional: a modificação nem sempre é linear. Ganhos e perdas, compensações e déficits, crescimento previsível e transformações inesperadas fazem parte da experiência humana.
  • Multicontextual: cada vida humana deve ser entendida como pertencente a muitos contextos.
  • Multicultural: para conhecer os aspectos universais e específicos do desenvolvimento humano, muitas configurações culturais – cada qual com um conjunto distinto de valores, tradições e recursos para a vida – devem ser consideradas.
  • Multidisciplinar: muitas áreas acadêmicas – especialmente psicologia, biologia, educação e sociologia, mas também neurociência, medicina, antropologia, história e outras – fornecem dados e idéias ao estudo do desenvolvimento.
  • Plástico: cada indivíduo, e cada característica de cada indivíduo, podem ser alterados em qualquer ponto da vida. (BALTES et. al., 1998; SMITH & BALTES, 1991)

Esta última característica, a plasticidade, ou a capacidade de modificação, é uma das diretrizes mais animadoras da perspectiva da vida em estágios. O termo plasticidade denota dois aspectos complementares do desenvolvimento: as características humanas podem ser moldadas em diferentes formatos (também como o plástico), embora as pessoas (também como o plástico) mantenham uma certa durabilidade e substância de ano para ano. Quando se trata de uma vida humana, nada é esculpido em pedra para sempre. As pessoas estão sempre evoluindo, com taxas, graus, aspectos e rum,os específicos de sua evolução sendo muito mais variáveis do que os cientistas jamais puderam supor (Berger, 2003, p. 3). As relações interpessoais à luz dos aspectos biopsicossociais acima dizem do quanto é importante a prática de exercícios relacionais sadios, tanto quanto o desvelar das questões implícitas na subjetividade do currículo oculto, na diversidade cultural e social da sala de aula, pois retratam a realidade que os espera na vida adulta, conformada de contextos antagônicos pelos vários fatores da nossa formação histórica de cidadãs e cidadãos do nosso multiculturalismo interétnico pontuado pelas distinções culturais e sociais que os processos sócio-educativos trazem pela falta de foco numa visão em que os que estão inseridos na condição de dependentes sociais possam partilhar universos culturais  sem a imposição cultural daqueles que os tutelam sem o exercício da relativização;  onde floresça naturalmente ou sejam estimulados ao exercício da liberdade de expressão para a erradicação de valores ultrapassados da transmissão de conhecimento segundo fatores históricos do acesso ao saber para a reprodução no ambiente acadêmico etnocêntrico. Bracht busca em Kunz (1991) a concepção de movimento na perspectiva do corpo em constante diálogo com o mundo circundante. A proposta de Kunz parte de uma concepção de movimento que ele denomina de dialógica. Outro princípio importante em sua pedagogia é a noção de sujeito tomado numa perspectiva iluminista de sujeito capaz de crítica e de atuações autônomas, perspectivas estas influenciada pelos estudiosos da Escola de Frankfurt. A proposta aponta para a tematização dos elementos da cultura do movimento, de forma a desenvolver nos alunos, a capacidade de analisar e agir criticamente.

Tão somente na consciência contra-ideológica ou nos novos papéis para uma  educação que se faça segundo teorias progressistas da E.F (pedagogia crítico-superadora e crítico emancipatória) para as formas culturais do movimentar-se humano, desvelando, assim,  suas vinculações com os elementos da ordem neotecnicista  vigente  e toda uma falsa consciência corporal ao mesmo tempo que constrói  a criticidade necessária à saída de estágios alienantes de desinformação dos mecanismos sutis na subjetividade de ações citadinas incorporadas por todos do tecido social, onde os polos educação e política são complementares, indissociáveis, determinantes dos processos da exclusão social. Não estar atento a esse fato favorece a ideologia dominante, porque, sob a aparente neutralidade  de uma educação “apolítica”, sempre se esconde determinada política de educação que nem sempre se faz a partir do espírito de solidariedade e cooperação de todos envolvidos no processo político-pedagógico para a inclusão social, política e econômica como instrumento de empoderamento para se reverter o quadro das demandas que aprisionam o espírito carioca de ser, principalmente, pelas causas e efeito na qualidade de vida da maioria da sua população. Nessa interlocução cultural com as dificuldades de muitas pessoas com necessidades educacionais especiais no seu desenvolvimento e aprendizagem têm encontrado ajuda eficaz na utilização das TICs como ferramenta ou ambiente de aprendizagem. Finalmente as pessoas com grave comprometimento motor vêm podendo tornar-se cidadãs ativas e produtivas, em vários casos garantindo o seu sustento, através do uso das TICs (FILHO; DAMASCENO, 2009). Como também a arte, em especial a tomada de consciência de que o DV também pode trabalhar com a transcrição simbólica da notação musical e da linguagem tátil. Assim como a tecnologia assistiva cumpre o seu papel através de uma pedagogia social  no ambiente lógico-computacional potencializando a entrada de grupos apartados no universo da tecnologia e, ao mesmo tempo que convida a todos ao questionamento  da ação participativa em soluções de demandas sociais do nosso tempo onde o ambiente escolar é lugar de acolhimento e ressignificação da realidade social de todos que a procuram, necessitando escrever a educação inclusiva no seu Projeto Pedagógico de modo contextualizá-lo através de temas transversais como:

1- A tecnologia  assistiva para portadores de deficiência visual através da informática musical via softwares  como o

Máquina Perkins

 Musibraille, que através da tecla de função F11  possibilita o uso das letras S(3) ,D(2), F(1) – mão esquerda –  e  J(4), K(5),  L(6) – mão direita – como “Máquina  Perkis”  para  escrita braille de textos e notas    musicais   via    teclado   do computador.  Posteriormente o estudante deverá ter domínio da notação musical nas  clave de fá e a de dó. Para esse início na musicalização em Braille usaremos a mas a clave de sol  =e , que é  representada pela junção de três celas (ÂÓL) = ( >/l); depois a armadura de clave com o sustenido representado pelo sinal de porcentagem  (%) % que se repete para caracterizar até 3 sustenidos, e de 4 até 7 sustenidos é precedido pelo sinal de número e o número de sustenidos usados  ( sinal de número+cardinal 7+porcentagem – #g%)  ou,  na mesma ordem de colocação dos sustenidos, os bemóis representado pela letra ( Ê ) <; como também a fórmula de compasso é representada pelo sinal de número seguido do cardinal/numerador e do ordinal/denominador (sinal de número+cardinal 4+ ordinal 4 – #d4). 

 Depois das etapas anteriores é preciso estabelecer em que  oitava serão executadas as notas (Ex: 1ª`;  2ª^;  5ª.; 6ª ;, etc.). A nota DÓ correspondente as figuras de ritmo em um compasso 4/4 tem a seguinte representação na linguagem tátil:  y (Letra Y = w – DÓ semibreve/unidade de compasso) ou  ( s – DÓ semicolcheia/subdivisão da unidade de tempo);  n (Letra N = h– DÓ mínima);   ? (Letra Ô = q– DÓ semínima)  e  d (Letra D = e – DÓ colcheia). Na sequência de notas da escala de dó maior com valor de semibreve ou semicolcheia  temos:   Y), RÉ ( ⠵ Z), MIÇ),    É), SOL (Á), LA( È), SIÚ); com valor de mínima temos: N), RÉ ( O), MI P), Q), SOL (R), LAS), SIT); com valor de semínima temos: Ô), RÉ (    Ù), MI⠫   À), FÁ   Ï), SOL (Ü), LAÖ), SIW) e com valor de colcheia temos: D), RÉ ( E), MIF), (   G), SOL (H), LAI), SIJ). Estabelecido se o compasso é binário, ternário ou quaternário através da fração de compasso ou fórmula de compasso são feitas as várias combinações entre as figuras de ritmo  nos vários compassos, separados pela barra de compasso (tecla de espaço) ou travessão simples e no final o travessão duplo (Letras ÊK – <k), da obra musical; respeitando as convenções de  composição musical adaptada para a musicalização em Braille. Em acordo com a a teoria musical temos sequência que começa na escolha da clave, os acidentes de clave, a fração de compasso, a oitava e as combinações de figuras de ritmo com as respectivas cabeças de nota estabelecendo a duração e a posição no espaço ou linha do pentagrama separadas pela barra de compasso (tecla de espaço). Outras informações sobre notação musical podem ser acessadas através do menu “Utilitários” e depois clicar na opção “Dicionário ou F7”.

 Para a leitura de textos na tela temos no mercado  programas ou softwares para obter resposta do computador a medida que vão passando por textos e imagens e sintetizando a fala humana, como:  Braille Fácil, Dosvox, Braivox, Orca,  por exemplo. Para portadores de deficiência auditiva temos o BPM  Counter, para estabelecer o andamento e marcação de tempo, via mudança de cores (vermelho e azul) nos quadros negros;

2- Para portadores de deficiência grave, como a tetraplegia  e distrofia muscular  temos o software com comando de voz como o Motrix, por exemplo;

3- Questionamento da pluralidade étnica e a sua atuação nos valores  humanos através de uma política de atualização do corpo docente para os aspectos da percepção e heteropercepção na relação professor/aluno da rede pública de ensino;

4- A música nos vários aspectos de erudição, formação de público, apropriação do acervo musical da nossa historicidade e ferramenta cognitiva de um desenvolvimento global de crianças e adolescentes na proposta político-pedagógica dos projetos educacionais.

5- Como grande aliado dos processos de estímulo aos sentidos na inicialização musical de crianças vidente, a flauta doce adaptada para o deficiente visual vem para cumprir uma lacuna na aprendizagem musical desta parcela da população, ou seja, como o DV precisa fazer a leitura tátil com uma das mãos,  a flauta adaptada é executada pela outra mão e, assim, acontece a leitura de partitura e execução instrumental simultaneamente.


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