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Séries iniciais: novas configurações para velhas práticas

Posted in Cidadania, Educação, Educação Especial, Política & Políticos, Sociedade with tags , , , , , , , , , , , , , on dezembro 15, 2011 by projetomuquecababys

By Luis Carlos “Rapper” Archanjo

O campo de estágio é uma forma de observar o cotidiano escolar e prestar atenção nele, fazer registro, discutir ou selecionar situações-problema interessantes para serem analisadas. “Vale a pena fazer esse exercício de reflexão porque nem sempre o que vivemos em sala de aula está escrito nos livros” (MACEDO, 2005, p. 115). Em continuidade com as observações colhidas quando em estágio na Educação Infantil, a proposta desta nova fase do processo de formação dentro da perspectiva da Universidade Estácio de Sá – UNESA  em formar o futuro Pedagogo com habilidades e competências adquiridas em processos de formação pautado na busca reflexivo-investigatória para se entender e processar a junção de teoria e prática necessários a uma práxis emancipatória e libertária do fazer docente. A tarefa desta fase da formação é contextualizar teoricamente as observações da rotina escolar das séries iniciais de ensino fundamental com a implantação do ensino de nove anos, Lei 11.274/2006 e as novas configurações série/idade, com atenção especial para as classes de primeiro ano, já que estas recebe as crianças recém-chegados da educação infantil, como também é objeto de averiguação o encontro dessas crianças com aquelas recebidas pelo imperativo da lei configurando uma sobreposição de demandas sociais que a condição redentora da escola não consegue resolver por n fatores da sua condição dualística, que nunca frequentaram o espaço da educação formal, portanto desconhecem a rotina escolar para uma postura com os pré-requisitos de processos cognitivos, sociais e afetivos de seus pares com a bagagem de condicionamentos da preparação para essa etapa acadêmica. Porquanto, ser a sala de aula espaço de vários tipos de trocas e lugar, primeiramente, de encontro como também de desencontro para experiências vividas e não vividas diante dos procedimentos adotados pelo (a) professor (a) para desenvolver competências e habilidades cognoscentes nas séries iniciais do Ensino Fundamental de nove anos de duração com a inclusão de crianças de seis anos de idade com a entrada em vigor da lei. Dentro do prescrito pelos Parâmetros Curriculares  Nacionais – PCN´s para a educação básica temos um norte para a busca de literatura educacional para complementação didática de uma atenção individualizada ou diferenciada capaz de aproximar o déficit em questão quando diz:

(…) na medida em que o princípio da equidade reconhece a diferença e a necessidade de haver condições diferenciadas para o processo educacional, tendo em vista a garantia de uma formação de qualidade para todos, o que se apresenta é a necessidade de um referencial comum para a formação escolar no Brasil, capaz de indicar aquilo que deve ser garantido para todos, numa realidade de características tão diferenciadas, sem promover uma uniformização que descaracterize e desvalirize peculiaridades culturais e regionais (Brasília: MEC/SEF, 1997, p. 28)..

Segundo Macedo, a escola por ser para todos deve provir os instrumentos fundamentais para sua vida em sociedade, ou seja, o autor quer enfatizar que autonomia, envolvimento e cooperação são competências que possibilitam a uma escola, a um professor praticar algo na direção dessa pedagogia diferenciada, que trabalha múltiplos encaixes e posições em favor da inclusão das crianças com suas diferenças e suas singularidades pedagógicas (Ibdem, p. 75).

Uma criança saudável não é apenas aquela que tem o corpo nutrido e limpo, mas aquele que pode utilizar e desenvolver o seu potencial biológico, emocional e cognitivo” (Vol. 2, p. 50 apud CASTRO E OLIVEIRA, 2003, p. 11). A frase de Luriere, citada no livro “Educando para o pensar” nos remete ao pensamento de Lipman, verificável, também,  nos objetivos do primeiro volume dos Parâmetros Curriculares para o Ensino Fundamental e do quanto se pede que a escola cuide do pensar. O mesmo ocorre nas Diretrizes Curriculares para o Ensino Médio e no Referencial Curricular para a Educação Infantil, de onde foi tirada a afirmação que vale para todas as faixas etárias: “(…) pensar é fazer associações e pensar criativamente é fazer associações novas e diferentes (Ibidem, p. 16).

Da associação entre educação formal e não formal, entre prática e teoria amealhada ao longo dos anos de observação do fazer pedagógico de propostas educativas levadas a termo para crianças em áreas conflagradas pela “violência do descaso” do poder público e suas ações socioeducativas pontuais de cunho mais circunscritivo do que como projeto de investimento no capital humano. Das considerações que alimentaram o interesse em buscar o diploma para legitimar pontos de vista da experiência como educador social e as proposições epistemológicas das várias ciências que compõem o material teórico-metodológico de uma IES transformado em postagens próprias, como também da rede de pessoas com objetivos a fins, socializadas no Projeto Muqueca Babys Blog, onde, desde a postagem “As Artes e o Desenvolvimento Humano”, de 13/09/2009, busco trazer informações significativas para a construção de uma práxis educativa com outras percepções para as relações que se fazem nas trocas entre os vários sujeitos do processo educativo a qual chamo de “Minha Hipótese de Educação”, ou seja, minha concepção sobre a transmissão do conhecimento associado à valores humanos, principalmente, àqueles que participam na educação não formal e informal dos processos socioeducativos de projetos sociais e para os que cuidam da educação formal intramuros das escolas da rede pública de ensino para jovens e adolescentes de escolas encravadas em comunidades carentes nos grandes centros urbanos do nosso país pela intrínseca relação de objetivos comuns ao desenvolvimento humano segundo concepção holística e, ao mesmo tempo, sofrendo os malefícios de ações extracurriculares caminhando equidistantemente pela falta de ludicidade na apresentação dos conteúdos que, somando-se aos aspectos de clausura na formalidade de leis e diretrizes educacionais, acabam regulamentando as relações interpessoais no âmbito escolar; assim como o  “currículo oculto” atua nos processos da correlação de forças entre abordagens didático-pedagógicas, político-filosóficas que estimulem ou inibem os mecanismos cognitivos necessários à identificação com determinantes subjetivas trazidas no bojo do convite ao partilhamento do saber, isto é, aprendizagem significativa nascida da interação de novos conceitos e informações com conceitos relevantes existentes na estrutura cognitiva do aluno. 

Com o titulo: Séries iniciais: novas configurações para velhas práticas, em continuidade com a proposta de registro das experiências com a transmissão de conhecimento em processos formativos formal e não formal com crianças e adolescentes em  vulnerabilidade social, ora na sequência iniciada na observação da rotina de espaços não formais de educação na condição de amigo da escola, voluntário e oficineiro de musicalização. Atualmente contextualizando os espaços do saber  sistematizado a partir de metodologias de pesquisa da condição  de licenciando em uma proposta reflexivo-investigatória necessário ao papel do professor de realizar interações e intercâmbios entre linguagens, espaços, tempos e conhecimento (pontes temporais, sociais, tecnológicas) diferenciadas da sua condição de agente de memória; aquele que influencia os comportamentos e atitudes de seus alunos, estimula a identidade (individual e grupal) e a sociabilidade com e entre seus alunos, da sua condição de agente de valores; e, da condição de ser agente de inovações tem um importante papel na utilização, aplicação e avaliação crítica das inovações surgidas em todas as épocas, requeridas ou incorporadas à cultura escolar. A memória educativa caracteriza-se pelo conjunto de conhecimentos, informações e posicionamentos teóricos que constituem os acervos e as particularidades de uma determinada instituição de ensino. Utiliza-se do conhecimento científico e da memória social geral para oferecer um corpo específico de informações, de acordo com os objetivos e o projeto da escola. Na busca de como se processa os conhecimentos teóricos, técnicas, habilidades, atitudes, ritos pedagógicos (como avaliação, por exemplo), etc. ensinados e praticados nos diversos níveis de ensino, constituem o acervos valorizados pelo sistema educacional e pela sociedade. Variam de acordo com os objetivos e especificidades de cada instituição, de cada época. Espelham como cada grupo identifica o que seriam os conhecimentos básicos para serem ensinados/aprendidos em cada estágio da civilização. “Reflete maneiras específicas de pensar, sentir, agir. São também formas particulares de classificar, identificar e valorizar socialmente o aluno bom e o ruim, o que sabe e o que não sabe, o que vai ser aprovado e o reprovado” (CASTRO e CARVALHO, 2002, p. 96-106).

Da junção de prática do educador social com a teoria do saber sistematizado busco a práxis necessária ao saber fazer e o saber ser de um profissional de educação; com  ponto de partida no cumprimento das horas de estágio na Educação Infantil que, transformado em postagem com o título: Escola Pública: Nenhum a Menos ou Menos Um?” , tem no seu desenvolvimento a transcrição de resultado de Enquete com o título: As causas do Fracasso Escolar , ou seja, de um total de 12 perguntas para a escolha de três opções que melhor traduza  como se processam as relações sociais entre os vários sujeitos da educação. Apesar dos números  apresentarem-se díspares  quanto ao resultado de participação direta ou indireta na postagem segundo o registro  de usuários que fizeram a escolha de uma até três interrogações entre 12 opções e aquele usuário que foi registrado pelo motor de busca ou outra forma qualquer de consulta que o tenha levado à página do Projeto Muqueca Babys Blog. Como consta nos dados estatísticos dos quadros com os números de registros, dentre as questões apresentadas, a interrogação: “O olhar do professor sobre o aluno pode construir e determinar a sua trajetória escolar positiva ou negativa?”  recebeu o maior número de consenso daqueles que quiseram participar mais diretamente e dar a sua contribuição para as questões do fracasso escolar pelo que este tipo pesquisa pode substanciar o discurso contra-hegemônico que, naturalmente, nos leva ao pensamento popperiano para uma análise crítica à verdades da literatura eurocêntrica  tidas como absolutas até bem pouco tempo, pela nossa eterna defasagem com as questões educacionais do primeiro mundo, nos processos prescritivos do proceder acadêmico segundo um projeto de concepção  de ser humano quando na busca de embasamento teórico-metodológicos e didático-pedagógicos  para intervir na  realidade de desigualdades sociais da nossa escola dualística. Por conseguinte, o único caminho possível para uma política educacional para todos parece estar no questionamento radical de como se faz a compreensão de como educar os “outros” , dos  direitos negados,  pelo que as políticas públicas se processam em estruturas de “herdeiros” para a execução de tarefas educativas e, que, mudança nesse contexto significaria transferi-las  para  formadores de opinião orgânicos com capacidade de fazer da própria história, biografização,  conceito de transgressão  à olhos míopes da capacidade humana de superação ao determinismo socioeconômico, principalmente, como fator de impedimento à projetos pessoais egressos de realidades sem os pré-requisitos ou filtros do DNA de herdeiros ou  “inteligência resiliente” na representativa do “outro” com intencionalidade além de processos cooperativos, ou seja, agente do colóquio entre os seus para realidades distintas na busca de novas trocas sociais no espaço educativo como lugar de política social, e não de velhas  práticas de antagonismo de classe na contramão da inteligência coletiva que se faz nas diferenças e, assim,  desconstruir verdades absolutas  que sustentam  grupos dominantes em detrimento àqueles setores sociais fora das esferas de poder e,  que estes possam ser motivados através das tarefas imprescindíveis do estímulo, acompanhamento, financiamento, definição de padrões e avaliação de políticas públicas norteadas pela “ética da alteridade”.

O pensamento de Moacir Gadotti traduz  muito bem os questionamentos do  parágrafo acima quando diz:

“Ao novo educador compete refazer a educação, reinventá-la, criar as condições objetivas para que uma educação realmente democrática seja possível, criar uma alternativa pedagógica que favoreça o aparecimento de um novo tipo de pessoas, solidárias, preocupadas em superar o individualismo criado pela exploração do trabalho. Esse novo projeto, essa nova alternativa, não poderá ser elaborado nos gabinetes dos tecnoburocratas da educação.”        (Gadotti, 1998, p. 90 apud MIRANDA, 2001, p.)

 Primeiramente, pensando na pesquisa de campo que fosse a complementaridade das observações coletadas quando no estágio com as crianças da educação infantil como foco principal, como também buscar uma segunda turma com a presença de alunos portadores de deficiência visual (DV), pois desde a época do Projeto Integrador fiz a opção de trabalho com Educação Especial como objetivo da licenciatura em Pedagogia. A opção pelo 1º ano das iniciais do primeiro ciclo do EF deu-se por ser lugar de transição para as crianças saídas da EI, momento de construção das primeiras hipóteses da escrita e da leitura, construção de simbologias,  formação dos conceitos de número, etc.. Na escolha de uma segunda turma com alunos DV prevaleceu o desejo de colocar em prática o aprendizado de linguagem tátil em curso realizado no Instituto Benjamin Constant (IBC). Depois de entrevistas e conversas com a equipe técnico-pedagógica, principalmente com a professora responsável Atendimento Educacional Especializado (AEE) sobre as demandas no atendimento aos casos categorizados como DV, DI e TGD (Transtorno Global do Desenvolvimento)ainda em evolução na sala de recursos e aqueles integrados e, tutelados por estagiários remunerados em acompanhamento diário na rotina de uma classe normal. Das conversas com o corpo técnico pedagógico organizei um cronograma para acompanhar uma turma de 1º ano e outra de 3º ano. A turma de 1º ano é bem diversificada pela presença de crianças classe média baixa, abrigadas, do entorno, uma autista com DV e dois que não frequentaram a EI, com presença de estagiária em atendimento exclusivo da criança autista e dentro das possibilidades atenção individualizada para as dificuldades daqueles que não passaram pela EI. Na turma de 3º ano há a presença de dois DV e um TGD, porém a turma é quase homogênea no conhecimento, sendo que os três têm acompanhamento diferenciado de uma estágiária ou colegas de turma partilhando a construção de conhecimento.

Na primeira semana na escola fui convidado para participar da reunião do Centro de Estudo, espaço para as primeiras considerações do trabalho pedagógico do corpo técnico como um todo e registro da fala da Coordenadora Pedagógica, principalmente, nas orientações procedimentais a respeito das notas de final de ano e lisura nos critérios avaliativos quando no cruzamento dos dados colhidos ao longo do ano: conceitos, leitura de relatórios, observação do aluno em sala de aula e nos espaços da escola, discussão dos casos de alunos sinalizados como fatores a serem avaliados na hora de atribuição da nota final do aluno, como também a ressalta do equilíbrio profissional diante das questões sociais do nosso tempo diante da postura de pais e mães nos casos de reprovação de alunos. Isto é, assumir a avaliação como princípio processual, diagnóstica, participativa, formativa e redimensionadora da ação pedagógica feita através de instrumento e procedimentos de observação, de registro e de reflexão constante do processo de ensino aprendizagem.

Na classe de 1º ano a estagiária acompanha a aluna com necessidades especiais administra momentos de letargia, estabilidade para um trabalho pedagógico e gritos coléricos. Mesmo em tal contexto a professora faz com maestria o manejo de classe ao estabelecer os níveis suportáveis de externação emocional da aluna “integrada” segundo a percepção da turma quanto a incomodar ou não a presença desta em momentos de crise. Na turma de 3º ano, devido a estarem em faixas etárias em que as troca interpessoais se realizam através de brincadeiras, existe uma troca harmoniosa entre todos da classe e, quando na ausência das estagiárias os portadores de necessidades especiais são assistidos por alunas com algum conhecimento de leitura e escrita da linguagem tátil para transmissão das matérias e condução para as atividades entre os vários espaços da escola marcado pela presença de escada ligando os andares. Na turma do 1º ano observei um aluno que transitava pela sala alheio a solicitação de uma menor mobilidade pela professora. Posteriormente, fui informado de tratar-se de uma das crianças que não passara pela EI e caso com histórico de tutela em instituição da rede de apoio ao cumprimento do ECA. A percepção da procura de uma mão amiga para cruzar o fosso que o separa dos demais coleguinhas levou-me a intervir questionando-o do comportamento dissonante no espaço de ensino/prendizagem e, depois de alguns minutos de conversação este solicitou que a professora usasse meu bloco de anotações como seu caderno de dever, e este ao ver seu desejo cumprido realizou com esmero o que lhe foi solicitado da proposta de construção de leitura.

Na aula de inglês houve queixa de um dos alunos DV quanto a conversação da turma atrapalhando-o na audição da aula gravada em CD, ficando acordado que numa próxima aula o aluno deveria deslocar-se para as primeiras filas da classe. Diferenciando da aula de inglês apenas no uso de aulas com audio, as outras matérias são realizada em material didático apostilado fornecido pela SME. Nas aulas de educação física dei atenção a relação que os portadores de DV têm com a educação física pelo que a atenção desse profissional da educação com os portadores de necessidades especial integrados é nova, assim como faz pouco tempo que a sociedade como um todo começou a encarar a questão. No acompanhamento da turma de 3º é possível perceber a naturalização da presença de DV participando ativamente de todas as atividades de Ed. Física, onde os processo de integração e cooperação dá lugar ao companheirismo. Os cursos de graduação ainda estão formando sua base teórica, porém uma série de acontecimentos espelha e vem produzindo uma mudança gradativa na maneira de encarar e tratar o portador de deficiência, para o qual a atividade física pode significar melhores condições de vida e maior inserção social.

Uma das preocupações com as séries iniciais é o trabalho com projetos, como o que instrumentaliza a UE na tentativa de amenizar as dificuldades percebidas na sistematização da alfabetização ao longo dos anos de escolaridade de um grupo de alunos através de projetos cujo objetivo é repensar e criar diferenciadas formas de escrita e leitura, pelo que conseguir o êxito no desempenho em leitura e escrita é uma  competência complexa e envolve a articulação de uma série de habilidades, pois nessa construção tem-se que levar em conta que, são comparadas, também, as representações das crianças a respeito de seus próprios conhecimentos;  das funções sociais da leitura e da escrita e das atividades que realizam dentro e fora da escola para que a aprendizagem não cumpra somente uma função propedêutica. Assim sendo, diante de uma realidade não favorável ao desenvolvimentos destas habilidades com os alunos (ausência de acompanhamento familiar; mudança de professor; metodologia de trabalho, entre outros fatores da clientela atendida) de uma preocupante e estagnada aprendizagem face ao desencontro destes com as abordagens de convite ao saber sistematizado  da escola procurar formas de intervenção ao mobilizar outras possibilidades de convite ao partilhamento, de comunicação e expressão – diferentes das vivenciadas em suas salas de aula, através de um trabalho com diferentes tipos de texto (orais e escritos) e de incentivo à leitura de forma lúdica, criativa e com significado. Através desse trabalho de recriar um novo sentido de apropriação da leitura e da escrita num mundo movido pela tecnologia da comunicação e da informação, o que significa fazer dos projetos um caminho para o gosto pelo ato intelectual de aprender exercer o direito à palavra, pelo que dos seus objetivos da educação é a formação de seres críticos, pensantes e atuantes. A escola tem como uma das suas mais importantes funções a de favorecer e incentivar o acesso ao uso da palavra, oral, mas sobretudo, escrita. “A aprendizagem da língua representa a apropriação de um instrumento pelo qual o aluno se relaciona com o mundo“. A escrita está, de resto, onipresente em todos os atos escolares, isto é, como sujeitos e agentes da aprendizagem” (CANÁRIO, 2006, p. 33).

O acompanhamento da rotina diária das crianças das séries iniciais da U.E com o olhar do pesquisador segundo o embasamento teórico-metodológico do Projeto Político Pedagógico – PPP que orienta o curso de formação da Universidade Estácio de Sá – Unesa, onde consta literatura educacional com enfoques na pesquisa em ciências sociais para uma leitura de mundo fundada em princípios e diretrizes acadêmicas para confronto com realidades próximas àquelas em que as hipóteses se faziam segundo referências do senso comum do educador social de outrora e, dessa confrontação re-significar conhecimentos que traduzam a missão de uma Instituição de Ensino Superior comprometida com a verdade, como pluralismo cultural do bem comum sobre os interesses individuais e o desenvolvimento do espírito de solidariedade quando foca o papel da pesquisa educacional para os desafios que se apresentam para as múltiplas dimensões da formação – Fundamentos Teóricos-Metodológicos do Curso de Pedagogia da Unesa – dos profissionais de uma educação que seja transformadora e libertária. Assim sendo, esse futuro profissional da educação possui um papel fundamental na constituição de sujeito e de sociedade como intelectual orgânico que atua nas instituições escolares e não escolares, ou seja, pensar em uma educação com vistas à inclusão plena dos segmentos historicamente excluídos dos direitos sociais, culturais, econômicos e políticos. Como suporte para uma concepção de mundo a partir de um quadro geral das ideias principais que caracterizam cada uma das correntes do pensamento contemporâneo que, segundo o ponto de vista de Triviños (2004), mais têm orientado, em nossa época a educação e a pesquisa em ciências sociais. Além do positivismo, da fenomenologia e do marxismo, mesmo que categorizados pelo autor como esquemas teóricos de pesquisa, fixos, que se aplicam, sem maior analise, em nosso ambiente, já que os problemas da nossa desiguladade social são essencialmente sociais, econômicos e políticos. De acordo com Lefbvre, a dialética “é a ciência que mostra como as contradições podem ser concretamente idênticas, como passam uma na outra, mostrando também porque a razão não deve tomar as contradições, como coisas mortas, petrificadas, mas como coisas vivas, móveis, lutando uma contra em e através de sua luta” (COUTINHO tradução Lefbvre, 1972, p. 192).  Sendo assim, a inclusão mesmo que na ambivalência ou contradição nos leva  à ideia central do materialismo dialético lefbvreniano de que não existe nada eterno, fixo, como querem aqueles das verdades absolutas,  pois tudo esta em transformação, ou seja, tudo está sujeito ao contexto histórico do dinâmico e da transformação. Além disso, postula a ideia de totalidade como sendo a percepção da realidade social como um todo que está relacionado entre si. Só agora começamos a privilegiar, novamente, os estudos de natureza sociológica e filosófica, ou seja: singularizamos, talvez com demasiada ênfase, os problemas de natureza psicológica, próprios dos povos desenvolvidos, em prejuízo evidente das deficiências sociais, facilmente perceptíveis. Estamos conscientes de que não queremos estabelecer “hierarquias de disciplinas” culturais. Mas é um fato que muitos conteúdos teóricos de algumas disciplinas foram usados em nossa realidade sem maior estudo e quase mecanicamente, falseando” nossas interpretações dos fenômenos.

No seu livro Educação e Construção do Conhecimento, Becker (2001, p.36-37) diz: “na pedagogia freireana ou uma pedagogia construída a partir da epistemologia genética, construtivista, o conhecimento não está no sujeito, quando o indivíduo nasce, o conhecimento não está no objeto, ou seja, no meio físico ou social, não está na cabeça do professor com relação ao aluno, nem na cabeça do aluno em relação ao professor; o conhecimento se dá por um processo de interação radical entre sujeito e objeto, entre indivíduo e sociedade, entre organismo e meio”. Essa radicalidade manifesta-se da seguinte maneira: o sujeito progressivamente se torna objeto, se faz objeto e é exatamente nessa medida que ele se subjetiva, é nessa medida que ele constrói o mundo, que ele transforma o mundo, que ele se faz sujeito. essa medida depende estritamente das possibilidades que o meio social lhe dá, que o meio social lhe proporciona, dessa relação entre sujeito e objeto, pedagogia relacional, na ação recíproca do sujeito sobre o objeto e do objeto sobre o sujeito, a ação é a ponte que liga o sujeito ao objeto.Quando o sábio cientificamente investiga, ele se desinteressa das consequências práticas. Ele diz o que é; verifica o que são as coisas, e fica nessa verificação. Não de preocupa em saber se as verdades que descobre são agradáveis ou desconsertantes, se convém que as relações que estabelece fiquem como foram descobertas, ou se valeria a pena que fossem outras. Seu papel e exprimir a realidade, não julgá-la. Este ponto de vista, o de ser o conhecimento científico neutro, foi combatido, primeiro, no mundo dos cientistas sociais que não podiam conceber que a ciência humana pudesse ficar à margem da influência do ser humano que investigava, cujos focos mais fortes partiam do neo-marxismo representado pela denominada Escola de Frankfurt (Horkheimer, Adorno, Marcuse, Fromm etc.) e da fenomenologia, com raízes em Husserl, Marleau-Ponty, Heidegger etc. E que se concretiza no pensamento sociológico de Young, Esland, Keddie, Mills etc. Continua Triviños sobre a fenomelogia de Husserl:

[…] Tudo que sei do mundo, mesmo devido à ciência, o sei a partir de minha visão pessoal ou de uma experiência do mundo sem a qual os símbolos da ciência nada significariam. Todo universo da ciência é construído sobre o mundo vivido e, se quisermos pensar na própria ciência com rigor, apreciar exatamente seu sentido e seu alcance, convém despertamos primeiramente esta experiência do mundo qual ela é a expressão segunda (MERLEAU-PONT, Maurice, 1986, p. 5-6 apud TRIVIÑOS, 2004, p. 43)..

A frase a seguir pode servir como máxima da proposta de formação de um pedagogo reflexivo investigador: “Nas ciências sociais, existe uma identidade entre sujeito e objeto de estudo. Por conseguinte é verdadeira a afirmação: “Numa ciência, onde o observador é da mesma natureza que o objeto, e o observador é, ele próprio, uma parte de sua observação” (Minayo, 2007 apud BORGES e LUZIO, 2010, p. 17). Nas considerações de Borges e Luzio destacam-se dois posicionamentos principais que se referem ao homem que vive em uma comunidade e, que esta comunidade é que possibilita o progresso da humanidade, ou seja, é nas relações com os outros e com ele mesmo que o homem se constrói enquanto um sujeito social e histórico. Dentro destas perspectivas é que emerge a Pedagogia Social, que ocorre a partir da Educação Social. Podemos destacar as contribuições de Caliman (2006, p. 5) a respeito da Pedagogia Social e sua diferenciação da Pedagogia Escolar na realidade brasileira. Logicamente, que não podemos esquecer que dentro da formação existe um embasamento para compreensão da sociedade e dos sujeitos tendo outras ciências compondo a formação, como a Sociologia, Filosofia, Psicologia, etc.. Segundo os autores Paula e Machado o que é interessante no texto de Caliman quando ele se refere à Pedagogia Social e descreve que “é chegado o momento no qual precisamos sistematizar toda essa gama de conhecimentos pedagógicos para compreender melhor e interpretar a realidade e projetar intervenções educativas efetivas”. Continuam os autores:

Os sujeitos envolvidos nesse processo têm produzido, muito criativamente formas e estratégias de atuação, que segundo o autor é necessário organizar para que o trabalho ocorra efetivamente. Poderíamos refletir a respeito do que o autor descreve e pensarmos em quem estaria organizando e sistematizando todo esse trabalho, dando um direcionamento. A  Pedagogia Escolar não tem uma formação específica para atuar em espaço não formais de educação (Ibidem, p. 233)..

Na caracterização da U.E observada temos um retrato do entrecruzamento de realidades sociais distintas, onde algumas particularidades descritas, turma de 1º ano, dizem do quanto é complexo o papel da escola enquanto lugar de encontro de questões sociais e educacionais para que o profissional de educação crie a ambientação necessária para uma prática pedagógica aberta á construção de uma interpretação acolhedora das diferenças e promotora de relações humanas fundadas no respeito e na tolerância. Em acordo com o seu PPP e, reafirmado nas falas do Centro de Estudo dá a dimensão do quanto a U.E busca na parceria com os pais posicionar a escola diante das novas configurações socias familiares.

Na literatura educacional a divisão de classes é pontuadas pelas particularidades do histórico de vida de crianças marcadas pelo repertório da vulnerabilidade social, que por si só diz que o caminho para superar o fosso da defasagem escolar é a aprendizagem pela diferenciação até chegar-se a homogenização que harmoniza o ambiente da sala de aula que, infelizmente, ainda, se realiza na semelhança. Logicamente que o fantasma do fracasso escolar já se caracteriza na desfasagem escolar daquelas crianças que não passaram pela educação infantil se levado em conta apenas o aspecto legal do cumprimento de medidas ao rigor dos olhos da lei, ficando num segundo plano as causas e efeitos da idiossincrasia com seus pares porque não desenvolveram a prontidão necessária para a aquisição de leitura e escrita que, acaba em distorção no desenvolvimento geral e por isso não conseguem acompanhar a metodologia tradicional. Por não acompanharem são rotulados de incapazes desde muito pequenos e acabam estacionando no seu desenvolvimento, demorando cada vez mais para interiorizar determinado conhecimento, como também incompatibiliza-se com o ambiente escolar. Infelizmente, a escola, como um todo, ainda não consegue perceber essa diferença como algo positivo. Por não saber lidar com as diferenças, oprime todas as manifestações das crianças, querendo formatá-la dentro de um determinado modelo. Segundo as Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Pedagogia (CNE, 2006) a docência pode ser entendida como ação educativa e processo pedagógico e intencional, constituído em relações sociais, étnico-raciais e produtivas, as quais influenciam conceitos, princípios e objetivos da pedagogia. Segundo Ribas (2007): “A aprendizagem do aluno realiza, principalmente, pelo tipo de interação com o professor e não apenas com o conteúdo transmitido. Ele apreende não mais por esse vínculo do que pelo programa”.

Na lógica da inclusão, cada vez mais exigida na escola de hoje, tudo se relaciona com tudo na precaridade, na complexidade e na ambivalência nisso implicadas. Ao atender o que preceitua o ECA e as Diretrizes de Base da Educação escolar compulsória para todas as crianças, as quais têm direito de entrar no sistema escolar correspondente à educação básica e percorrê-la sem ameaça da repetência ou da exclusão da proposta de escolas para todos em que transformou-se a escola seletiva de ontem significa perguntar:

  •  Como garantir não apenas o acesso à escola como, igualmente, um aproveitamento significativo sem se poder usar as conhecidas estratégias de eliminação dos alunos com dificuldades de aprendizagem?
  • Será que elas desejam aprender nessa escola, com esse (a) professor (a) que o estado lhes oferece?
  • Será que elas podem aprender de modo significativo, mantido o currículo, o espaço, os recursos pedagógicos e o tempo didáticos, o grande número de alunos em uma mesma sala?
  • O professor está preparado para ensinar a todas as crianças levando em conta as características de sua origem, famílias e de seus hábitos?
  • Ele tem condição de praticar uma pedagogia diferenciada, abrindo mão do mesmo livro, das mesmas aulas e provas, do mesmo discurso, como se as possibilidades e os interesses de aprendizagem das crianças fossem equivalentes?
  • Ele sabe pôr os procedimentos de atualização a serviço da aprendizagem escolar?
  • Ele sabe ou pode tornar inclusiva a educação compulsória, ou seja, tem condições de mudar as formas de ensino em favor de crianças tão diferentes?
  • Ele sabe complementar a ênfase no ensino de conteúdos disciplinares com o desenvolvimento de competências de aprendizagem nos alunos?
  • Como envolver a família e a comunidade nos problemas da escola, já que agora somos partes de um mesmo todo como o acordado no PPP da escola?
  • Como convencer professores e profissionais de uma escola que há problemas comuns, que uma forma solidária e interdependente de convivência talvez seja mais eficiente do que o antigo raciocínio da exclusão?
  • Como tratar os segmentos escolares como partes complementares de um mesmo todo, ainda que cada qual com sua especificidade?
  • Como acolher na escola pessoas cuja vida pessoal ou familiar só pode ser expressa na violência, na miséria, na prostituição, na pobreza, na droga, no sem-sentido, na depressão, na indiferença, na indisciplina, na inconviniência?
  • E, por último, a interrogação que engloba todas as anteriores: “Como não repetir na escola toda a exclusão que estas pessoas sofrem na sociedade em que vivem?” (MACEDO, 2005, p. 31-52).

Desde a muito a escola perdeu o seu papel de último refúgio para as causas e efeito do determinismo da vulnerabilidade, do darwinismo social de nossa sociedade desigual submetendo diuturnamente os filhos daqueles na base da pirâmide aos processos degradantes da possibilidade de mobilidade social. Desde décadas passadas a pedagogia crítica questiona o papel da escola, com destaque pessoal para Bordieu e o questionamento da violência simbólica que se pratica na escola. Na sua literatura educacional palavras como “herdeiros”, “currículo oculto”, “habitus” e “ capital social”, que definem a escola seletiva como instrumento da classe dominante ao maquiar procedimentos de transferência de responsabilidade à própria vítima pelos processos de exclusão promovido pelo fracasso escolar. Segundo Macedo (2003b apud MACEDO 2005, p. 59), no seu desenvolvimento sobre competências em uma visão construtivista do conhecimento, não piagetiana, que nos torna competentes, quando a escola desenvolve competências escolares na infância. Piaget tinha o interesse, por exemplo, em estudar o desenvolvimento de noções e operações lógicas e matemáticas em crianças e não em alunos. Em outras palavras, o desafio proposto por ele era observar os modos de raciocínio e de explicações das crianças não influenciadas ou induzidas pela cultura da escola. Sua questão era portanto, verificar em um contexto de situação-problema como a criança tinha assimilado, tornando seu, ou então, como criava ou construía formas próprias de compreensão e de realização dos desafios que lhe eram propostos. Quando analisamos a questão da competência nos nossos dias o problema é outro: Como transformamos todas as crianças em alunos, quaisquer que sejam suas condições sociais, físicas ou biológicas? Na escola, a criança é um aluno, com suas responsabilidades e tarefas. Uma criança não tem competências, tem capacidades, esquemas de ação e sentimentos, mas como aluno espera-se que tenha ou desenvolva competências escolares. Não basta neste sentido, oferecermos, escola para todas as crianças, se não soubermos prepará-las para se tornarem alunos. Não basta porque muitas famílias não podem ou não puderam, pela injustiça e desiguladade social ou por seus valores e tradições culturais, cultivar tais capacidades favoráveis à vida escolar de seus filhos. Como assumir esse desenvolvimento na própria escola como uma condição fundamental para a aprendizagem das crianças? “Em uma escola que se quer para todos é necessário o enfrentamento dessa questão, é fundamental a utilização de boas estratégias a seu favor” (Ibidem, p. 60). As interrogações que pontuam boa parte do texto apontam para as possíveis “causas do fracasso escolar” e, ao mesmo tempo, nos leva ao questionamento das realções estabelecidas na escola em que as configurações sociais da sala de aula se faz também no cumprimento do ECA em parceria com as instituições da rede de apoio. Então fica a questão: Como achar uma identidade com significado de competência acadêmica nesse caldierão multicultural resultante do jogo entre semelhanças e diferenças. Sem antes de algumas respostas: Como nos relacionamos com as diferenças na condição docente de “herdeiros” de possibilidades culturais e educativas configuradas na hereditariedade de um histórico-social em que as palavras-chave são: converção, dominação, subjugação, escravidão. Como impor ao outro ou subordiná-lo ao que é valorizado por mim? O papel da docência não é excluir ou reter, ao contrário é de mediação para ações emancipatórias e libertárias, isto é, ajudar crianças a se tornarem protagonista de sua história escolar (Escamez e Ramon, 2001/2003 apud MACEDO, 2005, p.15) ou, então excluí-las no interior da própria escola repetindo dentro da mesma o que já pratica-se em nome de uma cultura de semelhanças. 

Aos olhos de um observador inexperiente e, sem as referências da estreita relação entre o movimento corporal (Gaiarsa) e o tempo de retenção relativo a cada idade (Piaget), somando-se a presença de integrados, possivelmente, se perguntará como as professoras consegue lidar com a classe de forma competente e eficiente, demonstrando ter um repertório com boas estratégias de manejo de turma, ao mesmo tempo que abre espaço para que os estagiários desenvolvam uma pedagogia diferenciada, porém convergentes, dentro de uma mesma sala de aula; no meu caso, com o menino que não passou pela educação infantil. Meu ponto de partida é a “pedagogia diferenciada” da escola para todos da escola democrática, da escola que cumpre uma obrigação social de respeitar a educação como um direito de todas as crianças – pobres, ricas, com dificuldades de aprendizagem ou não, de qualquer cor raça, condição física e social, concebida por Perrenoud (1996/2001). O que isto tem a ver com pedagogia diferenciada? A pedagogia diferenciada opõe-se à pedagogia frontal; a pedagogia seletiva; a pedagogia da escola tradicional, portanto, da nossa escola ainda atual, pois age como como se todos da sala fossem equivalentes, tivessem interesses iguais, ou seja, dispusessem dos mesmos recursos para entender o que o professor está ensinando. No caso em questão fica a ressalva do tratamento diferenciado dispensado pela professora na tentativa de resgatar o aluno de sua indiferença ao saber sistematizado, assim como o trabalho da estagiária.

Segundo Macedo, pedagogia diferenciada não quer dizer ensino diferenciado. Porém no caso em análise foi acordado um trabalho individualizado que levasse em conta, primeiramente, questões socioafetiva pelas características do seu histórico social. A similaridade com a experiência de educador social em educação não formal e todo um repertório de situações de erros e acertos no trabalho voluntário de reforço escolar para as sérires iniciais do EF com crianças abrigadas que frequentavam a rede pública de ensino em parceria com os profissionais de suporte psicológico, social e pedagógico faz parte do processo de aquisição de teoria/prática, agora  adiconando a educação formal na busca de uma  práxis formativa necessária às formulações de um compromisso ético para ser e estar no mundo em nome de ojetivos das dimensões político-pedagógica, ético-política, epistemológica e estético-cultural da “Minha Hipótese de Educação”, ora confrontada pelo desafio de aplicabilidade do aprendizado amealhado da observação docente no estágio em EI, das professoras das séries iniciais do U.E e da teoria de embasamento para a construção de situações de aprendizagem com objetivos, conteúdos e estratégias que promovam e provoquem trocas significativas entre os saberes do aluno e aqueles sistematizados do instrumental de recursos didáticos da junção de planejamentos complementados pelo acervo de materias da escola, segundo orientações didático-pedagógicas desta faixa etária, como: tv/vídeo; bloco mágico; material Cuisenaire; letras soltas; jogos de encaixes com letras e números; material impresso de revistas especializadas em brincar e aprender para trabalhar-se conceitos espontâneos pré-existentes através de exercícios para ligar o numeral ao seu conjunto representado por figuras; jogo dos erros como estímulo à percepção, associação e abstração tomando o real como ponto de partida; leitura de mundo significativa advinda da abstração de uma sequência númerica desvelando uma complementaridade de um pedaço do real através de liga-pontos, por exemplo; pintura de desenhos de sua escolha; contação de história com uso de livros em forma de quebra-cabeça; colagens diversas. Ou seja, a partir do seu nível de desenvolvimento real estabelecer conexões entre os diferentes tipos de saberes necessários ao percurso da defasagem até a zona proximal de domínio e emprego competente de habilidades cognitivas que este poderá desenvolver ou aprimorar através de mediação educacional na interação com outras pessoas, conforme os observa, imitando, trocando ideias, ouvindo suas explicações, sendo desafiado ou contrapondo-se a elas, sejam essas pessoas o professor ou seus colegas de percurso na construção de conceitos científicos.

A falta da primeira etapa da Educação Básica no seu percurso nos remete ao artigo 29º do Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil, sobre o desenvolvimento integral da criança (RCNEI, 1998), onde a identidade “é um conceito do qual faz parte a ideia de distinção, de uma marca de diferença entre as pessoas, a começar pelo nome, seguido de todas as características física, modo de agir e de pensar e da história pessoal”, Como o aluno escreve o primeiro nome e conhece as vogais, a partir do seu nome está sendo apresentado ao alfabeto, com o uso de letras de fôrma, para a construção referencial sonoro das letras. Segundo Cagliare (2010, p.170-171): “ (…) o nome das letras, pode-se descifrar a escrita de uma palavra, sem grandes dificuldades. Continua o autror: “(…) é sempre muito importante estar atento para o fato de o resultado da decifração ter de revelar uma palavra conhecida, cujo significado seja evidente, e não apenas sons”. O que o aluno mais gosta é de copiar palavras. É perceptível o efeito da carência de estímulo precoce para a prontidão com a grafia na construção das primeiras letras do ciclo de apropriação do sistema alfabético-ortográfico devido a carência de exercícios comuns aos seus pares no desenvolvimento da coordenação motora fina; o tempo de retenção, mesmo na pintura de desenho, é abaixo da média das outras crianças com 6 anos. Como, então, percorrer a distância que o separa dos demais? Com bases em pesquisas e experiências práticas, constrói-se uma representação envolvendo algumas características das crianças de seis anos que as distinguem das de outras faixas etárias, sobretudo pela imaginação, a curiosidade, o movimento e o desejo de aprender aliados à sua forma de conhecer o mundo por meio do brincar. Nesta idade a criança estabelece laços sociais e afetivos e constrói seus conhecimentos na interação com outra crianças da mesma faixa etária, bem como com adultos com os quais se relaciona; onde no perfil do profissional educador exige-se: “Para o professor desta fase é indispensável o desenvolvimento de atitudes investigativas, de alternativas pedagógicas e metodológicas na busca da educação” (CENAP/SMEC – Salvador, 2006, p. 13-15). Diante da relutância com números, como também o olhar na perspectiva do socioafetivo, conjuntamente com situações de aprendizagem, com situações-problemas, vi no jogo com blocos de encaixe de números um caminho sociointeracionista pelo que Macedo diz: “jogos e desafios em um contexto de realização de situações-problema, são recursos que promovem o desenvolvimento de competências fundamentais às crianças” (MACEDO, 2005, p. 74-75). O exemplo acima explicita a defasagem entre a instituição escolar e a diversidade de expectativas e lógicas de ação presentes em um público escolar cada vez mais diferenciado. Ou seja, o dilema do professor neste contexto é providenciar recursos pedagógicos de sentido que tornem a aprendizagem possível para todos sem exceção. No mundo de hoje, o planejamento é cada vez mais uma peça fundamental. Por que planejar? Para poder, no cotidiano da sala de aula, observar, regular e antecipar aquilo que queremos que nossos alunos se tornem, aquilo que queremos que eles aprendam. Quando planejar? Antes, depois e durante nossas aulas.

No acompanhamento da turma do 3º ano atentei-me para a rotina do modo de construção algorítima para a resolução mais apropriada de situações-problema do material customizado de matemática usado como norte para a aprendizagem dos conceitos de matemática necessários à resolução de problemas com uso de operações  matemáticas deu para perceber que alguns não assimilaram a construção dos algorítimos com as operações numéricas da divisão não exata, segundo os caminhos da professora diante de uma turma num misto de passividade e dúvidas, também pela falta de domínio da tabuada como elemento articulador dos objetivos do seu planejamento;  onde o aluno DV, com histórico de educação infantil no Instituto Benjamin Constant,  se destaca pela forma ativa de participação em resposta às colocações da professora no processo de construção de conceito,  situações problema e toda uma linguagem carregada de símbolos técnicos muito específicos e com uma elevada carga de abstração que é superada pela concretude da manipulação do Soroban como ferramenta para a compreensão das quatro operações básicas dos números naturais, uma vez que o seu uso como instrumento de cálculo significa a transposição do contexto concreto para a representação com símbolos escritos, deixando clara a estrutura posicional do sitema de numeração decimal, e não apenas por meios de técnicas operatórias decoradas, pois segundo ( Imenes, 1999 apud AZEVEDO, 2006), “entre as quatro operações básicas de números naturais, o algorítimo da divisão e,  sem dúvida, o mais complexo, frustando,  muitas vezes, professores e educandos”.  Uma aprendizagem significativa obriga o aluno a observar, perguntar, formular hipóteses, relacionar conhecimentos novos com o que já possui, tirar conclusões lógicas a partir dos dados obtidos até que ocorra no sujeito um processo psicológico de transformação para o raciocínio lógico e que a matemática contribua de modo significativo, para essa mudança por meio de um método de raciocínio excepcional: o dedutivo. O próprio Piaget afirma que as estruturas mais gerais da matemática moderna, são, ao mesmo tempo, as mais abstratas, só representadas na mente das crianças na forma de manipulações concretas, materiais ou verbais. A promoção de certas atitudes torna-se um princípio psicopedagógico que orienta a atividade docente nesse sentido, destacando os mais importantes: conduzir o aluno à formação de noções que descubra por si mesmo a natureza da matemática, experimentar os objetivos matemáticos antes de introduzí-los no raciocínio educativo, sendo a manipulação um excelente caminho; estudar os erros dos alunos para detectar como formalizam a matemática; conhecer as ideias prévias e os preconceitos é o melhor posicionamento para se chegar aos erros (BRAVO e HUETE, 2010, p.32). “Enfim, exige que construa paralelamente fatos, conceitos, princípios, procedimentos e estratégias relativas ao conhecimento matemático”. É importante distinguir esses elementos se quisermos conhecer o entendimento que os sujeitos têm de matemática, ou seja, “a elaboração e construção  de conceito de número, por parte das crianças com deficiência visual depende da sua interação com o mundo concreto, o que permite construir conceitos e se apropriar das informações mais elementares; as quais, no entanto, embasam todo o conhecimento matemático” (Brasil. A Construção do Conceito de Número e o Pré-Soroban. MEC/SEESP, 2006, p. 13). Observando a forma de manejo da turma pode-se perceber a rotina de explicações de conceitos matemáticos existe todo um planejamento, muitas das vezes partilhado com a docente do 1º ano, levado a termo em aulas expositivas intercortadas pela lembrança condicionante da associação resultante entre postura em sala de aula, quando no não cumprimento dos combinados, e o resultado concomitante em avaliações de apreensão da matéria como estratégia do seu perfil disciplinador. 

O foco na disciplina talvez seja motivo de temor em alguns alunos quanto a externar dúvidas na construção do algorítimo quando na explicação do livro ou em exercícios de reforço para a consecução de operação de divisão de números com vários dígitos, divisão não exata, com números altos no divisor e resto para juntar com o número da ordem imediatamente inferiror até que tenha abaixado o algarismo da unidade da aula expositiva. Na aplicação da prova final ficou evidente as interrogações quanto a construção dos algorítimos, diante da postura de algumas criança, ao alcance de observação, dada a transparente insegurança na comunicação não-verbal quanto a realização de todas questões da prova a partir de uma primeira análise do conteúdo de situações-problema da metodologia de avaliação. Para Bravo e Huete, o processo de ensino e aprendizagem da matemática inicia a partir da intuição e progressivamente paroxima-se da dedução. Essa forma de construir o conhecimento matemático relega, em parte, qualquer tentativa de se apropriar de modo mecânico de procedimentos e algorítimos para a resolução de problemas reais. Por outro lado, vincula tal procedimento a um planejamento de seu ensino e aprendizagem fundamentados no nível de cognição dos alunos. A criança pode resolver os problemas que lhes são apresentados sobre a base de dados concretos e acessíveis a uma lógica que ainda não é abstrata e reflexiva já que alguns por n motivos da falta de ajuste entre as estruturas espontâneas do aluno com a metodologia seguida na instrução matemática, pela intrínseca relação da inteligência que atravessa uma fase intermediária entre a forma de raciocinar intuitiva e a hipotético-dedutiva. Sua mente funciona conforme as características de raciocínio verbal concreto, sincretismo do raciocínio e subjetivismo intelectual, ou seja, no ensino da matemática “é necessário considerar quais são as diferentes fases do desenvolvimento do psiquismo durante o período da “terceira infância” (dos 7 anos até a puberdade)” (Ibidem, p. 23). 

A professora da turma de 1º ano tem uma relação com os seus alunos que leva em conta que alguns procedimento por mim observados quando em estágio na EI, já que aqueles agora no ensino fundamental ainda trazem toda uma bagagem formativa de conduta e postura da fase anterior quanto aos combinados, trocas interpessoais, descontração com música mecânica no fim do dia, etc.. Além de questões pontuadas na caracterizacão da turma observada quanto aos vários sujeitos em atividades na classe, pautada por dinâmicas interacionais sadias da relação aluno/professor, aluno/aluno, estagiário/aluno. 

CONSIDERAÇÕES FINAIS 

Quando a criança muito pobre chega à escola, aos 6 ou 7 anos e traz consigo as marcas do déficit cultural de sua condição social de desigualdade e exclusão dos estímulos do universo letrado ao qual pertence a escola as marcas ainda não são indeléveis e a escola teria possibilidades de integrar esta criança à cultura letrada e ao universo da informação escrita e eletrônica e do saber acumulado pela humanidade. À medida que a criança vai avançando na sua trajetória escolar, ela vai, em muitos casos, perdendo as possibilidades de integração, e as marcas de sua exclusão “por dentro” da escola vão ficando mais profundas, as desigualdades vão se agravando. Quando chegam à adolescência, muitas destas crianças, escolarizadas há anos, mas não alfabetizada plenamente, totalmente excluídas do letramento, estão de tal modo traumatizadas por um processo escolar de fracasso e pela exclusão social, que têm poucas possibilidades de assimilar qualquer coisa que lembre a escola e seu fracasso. Esses jovens chegam ao limiar da vida adulta sem as condições socioculturais mínimas para a vida em sociedade, sem a devida preparação profissional, por exemplo, mas não somente. estão despreparados para a cidadania, para conhecerem e exercerem seus direitos e deveres, e agirem como cidadãos responsáveis. São os “excluídos por dentro” (Bourdieau, 1993), muitas  vezes ignorados pelos professores, que não sabem como lidar com estes alunos. Sua presença é as vezes percebida pelo professor como signo de fracasso da escola e, pelos colegas, como diferente, incongruente, pois destas crianças não se exige o mesmo que para todas as outras.

Sobre formular hipóteses Lipman diz:

Saber formular hipóteses é o mesmo que saber pensar repostas possíveis às questões que temos ou que os outros nos propõem. E ser capaz de supor possíveis respostas, saber pensar respostas possíveis e plausíveis quer dizer ser capaz de pensar respostas ou soluções que tenham alguma possibilidade de ser respostas que irão mesmo resolver as questões ou problemas postos. Essas repostas porque têm algo a ver com o contexto, com os dados de que se dispões, com os resultados que são desejados, etc. “Para que alguém seja capaz de formular boas hipóteses é necessário que seja capaz de supor, criar alternativas, inventar, etc.” (CASTRO e OLIVEIRA, 2003, p. 22). .

Tudo isso está diretamente ligado ao comportamento criativo, uma das competências muito exigidas atualmente de todos nós para podermos nos orientar melhor numa época de tantas mudanças, de tantos novos desafios para os quais não temos receitas prontas nem regras definitivas. Brincadeiras, jogos, atividades as mais diversas que provoquem o uso de todas essas habilidades e que permitam ao educador observar o emprego, avaliá-lo e “intervir educacionalmente”, objetivando favorecer o desenvolvimento das mesmas, podem ser excelentes recursos no contexto educacional. A vida na escola, nos termos em que se configura hoje, supõe saber enfrentar e resolver situações-problema cada vez mais complexas e para as quais as respostas tradicionais são cada vez mais insuficientes, obsoletas ou inaplicáveis. Para isso, temos de nos tornar profissionais e superar a crítica vazia e externa, a queixa, a culpa, a ingenuidade e o amadorismo. Diante da “crise da escola”, que é uma criação humana, muito tem-se falado que a escola pode ser reinventada. Para CANÁRIO (2006, p.86), essa possibilidade passou a ser desejável na medida em que o funcionamento dos sistemas escolares veio progressivamente a ser percebido com algo profundamente insatisfatório e, portanto, objeto de críticas e campanhas, vindas de todos os quadrantes. Esta insatisfação é o resultado convergente de vários fatores como: a inflação dos diplomas que, diante e um mercado restrito  competitivo, os torna ao mesmo tempo mais necessários e menos rentáveis, frustando expectativas de grande parte do público que mantém uma relação sobretudo instrumental com a escola; a incapacidade da escola de massa lidar com a tensão entre princípio de igualdade e princípio do mérito, porém prevalece o mérito individual, o que responsabiliza cada um, direta e pessoalmente, pelo seu fracasso; a crise de identidade dos professores que vivem vivem o sentimento de ter pela frente uma missão impossível de cumprir; a rejeição da escola por parte de grandes grupos de alunos para quem ela faz cada vez menos sentido, externado nos fenômenos de absenteísmo e de abandono escolar precoce, fenômenos de contestação (violência e indisciplina), formas de recusa de aprender (na origem de níveis alarmantes de iliteracia ou iletrismo) e o desenvolvimento, por parte dos alunos, de meras estratégias de sobrevivência na escola.

O estudo de algumas reflexões do “corpus teórico” de Bourdieu exige de nós ações transformadoras e propiciam novas construções do saber humano e da convivência ética na sociedade. Por tudo isso, queremos crer e assumir que o ensino da Filosofia dialogando com outros componentes curriculares, com outras áreas do conhecimento, possa romper com alguns obstáculos e práticas não educativas do sistema escolar e da sociedade em geral, que têm obscurecido as nossas visões, e arbitrariamente reproduzem a dominação, a hipocrisia, a fragilidade, dificultando outras leituras que deem novos vôos para o ser humano. O lançar-se para novos vôos, que não serão mágicos, fáceis, ou de pseudo idealismo, mas acontecerão no exercício constante de reavivar a nossa alma, de construções sólidas pelo e no diálogo, de enfrentamento das estruturas em nome de ideais que, mesmo diante das nossas desigualdades possamos através da educação, da arte, da cultura, e da ciência, no aprendizado pela Filosofia – “amor à sabedoria” – , ” no convívio com o outro face a face na construção da cidadania, alcançar a possibilidade de um mundo menos injusto, menos desigual, menos miserável e de possível integridade humana” (JUNIOR, 2010, p. 112).

Assim sendo, o trabalho reflexivo-investigatório no campo de estágio nas séries inicias do EF do licenciando em pedagogia da proposta do PPP da Unesa é trazer à luz de teoria e prática os erros e acertos observados na realidade concreta da sala de aula em nome de outros sentidos para os processos de “desescolarização” que marcam a contemporaneidade de configurações explicitadas pelo autor, para os possíveis ajustes em nome de uma práxis que que ultrapasse o discurso sobre a lógica da inclusão, pois o futuro que agora chamamos presente seria marcado pela centralidade da pessoa que aprende, o que implica repensar nos modos de trabalho dos educadores, porquanto do que é praticado na sala de aula se resume no paradigma: “Se os alunos não aprendem, o professor ensinou e os alunos não aprenderam, ou seja, a atividade ou qualidade da ação do professor é independente dos seus resultados ou objetivos em relação aos alunos, diferentemente da relação complementar, irredutível e indissociável de sua condição relacional a partir de uma pedagogia diferenciada e uma avaliação formativa necessária a saber enfrentar e resolver situações-problema em uma sociedade tecnológica que exige domínio múltiplos”.

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A escola como organização complexa – por Maurício Tragtenberg

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By Antônio Ozaí

A ocidentalização da cultura caminha a par com o desenvolvimento urbano, comercial e a necessidade de “letrados” para darem andamento burocrático às estruturas de poder formadas em torno da Igreja e do Estado Moderno. De um lado, o intelectual é domesticado no contexto das universidades ligadas à Santa Sé, de outro, com a emergência do jesuitismo, seu aprendizado passará pelo processo de organização e planejamento de estudos num espírito de obediência – é o sentido da ratio studiorum de 1586.

No século XIX a expansão da técnica e a ampliação da divisão do trabalho, com o desenvolvimento do capitalismo, levam à necessidade da universalização do saber ler, escrever e contar. A educação já não constitui ocupação ociosa e sim fábrica de homens utilizáveis e adaptáveis.[1]Hoje em dia a preocupação maior da educação consiste em formar indivíduos cada vez mais adaptados ao seu local de trabalho, capacitados porém, a modificar seu comportamento em função das mutações sociais. Não interessa, pelo menos nos países industrialmente desenvolvidos, operários embrutecidos, mas seres conscientes de sua responsabilidade na empresa e perante a sociedade global.[2] Para tal constitui um sistema de ensino que se apresenta com finalidades definidas e expressas.

Se esse, porém, é o objetivo do sistema de ensino, insere-se no mesmo corpo professoral encarregado de transmitir o saber e mais preocupado ainda em inserir-se na sociedade, ter reconhecimento oficial, êxito no magistério enquanto “carreira”, utilizando para isso os diplomas reconhecidos possíveis, numa sociedade onde, segundo Max Weber, o diploma substitui o direito de nascença. A realização de tais objetivos pressupõe a existência de uma “burocracia pedagógica” com objetivos definidos ante a sociedade global, porém, nem sempre os predominantes. O sistema burocrático estrutura-se nas formas da empresa capitalista como também na área da administração pública e seu papel essencial é organização, planejamento e estímulo. O sistema burocrático estrutura-se em nível de cargos, que por sua vez articulam-se me forma de “carreira”, onde o diploma reconhecido, tempo de serviço e conformidade às regras constituem pré- condições de ascensão. Seu modo de recrutamento e sistema de promoção são definidos por ela como o mecanismo de comunicação intraburocrático, diluído nas diversas áreas de competência. Um dos aspectos estruturais do sistema de educação burocrático é que os usuários não controlam de modo algum a gestão dos fundos que dedicam à coletividade. A estrutura burocrática do ensino em nível nacional desenvolve-se em três níveis:

– Organização do pessoal
– Programas e trabalho
– Inspeções e exames

No que se refere a pessoal, o burocrata da educação está separado dos meios de administração como o operário dos meios de produção, o oficial dos meios de guerra e o cientista dos meios de pesquisa. O pessoal docente no sistema burocrático pode ser recrutado por concurso, de títulos e provas, contratado a título precário cujo nível de vencimento dependerá do número de aulas atribuídas por escolha fundada em pontos obtidos, a critério das Secretarias de Educação. Pode-se dar o caso do docente contratado a título precário e estabilizado no cargo por decreto em obediência a exigência constitucional. A ascensão do docente na carreira não depende da verificação dos resultados obtidos a longo prazo sobre seus alunos; portanto, os critérios da eficácia ou valor são desprezados e o de conformidade (aprovação nos exames, provas) supervalorizados.[3]

O exame, mais que o programa, define a pedagogia do docente. O objetivo que a pedagogia burocrática lhe propõe não é o enriquecimento intelectual do aluno, mas seu êxito no sistema de exames. O melhor meio para passar nos exames consiste então em desenvolver o conformismo, submeter-se: isto é chamado de “ordem”. Portanto, colocam-se três objetivos ao docente: conformidade ao programa, obtenção da obediência e o êxito nos exames. A escola conduz a um condicionamento mais longo num quadro uniforme e máxima divisão do saber que não visa à formação de algo, mas sim, a uma acumulação mecânica de noções ou informações mal digeridas. Se na Europa ou América Latina, o professor tende cada vez mais a responder a controles burocráticos, nos EUA as associações de pais, indústrias e grupos exercem pressões para que se ensinem determinadas coisas com um tipo de orientação definida. Essa interiorização da burocracia, Alexis de Tocqueville no século XVIII e Riesman no século XX consideram uma das características da cultura norte-americana.

A comunidade de pais encontra no controle burocrático a melhor garantia contra quaisquer tendências desviantes do professor ao saber que é severamente controlado, julgado e regulamentado. É nos níveis mais inferiores de ensino que a comunidade de pais tem maior peso. Quanto mais pobre é a origem social dos alunos, o controle do vértice sobre a escola mais será ligado ao controle pela base na forma de Conselho ou Comunidade de Pais. Quanto mais alta for a origem social dos alunos e professores, também em nível universitário, o controle burocrático mais satisfará às necessidades de controle. Há uma ambivalência em relação à figura do professor: de um lado é desprezado como “servidor da comunidade”, de outro, encarado como portador do saber absoluto. É criticado por não fazer sentir todo o peso de sua autoridade sobre o aluno. O público gosta da burocracia, quer ver seus alunos enquadrados, condicionados, como única condição de atingir a fase adulta.

Uma escola fundada na memorização do conhecimento, num sistema de exames que mede a eficácia da preparação ao mesmo, nada provando quanto à formação durável do indivíduo, desenvolve uma pedagogia paranóica, estranha ao concreto, ao seu fim. Quando falha, interpreta este evento como responsabilidade do educando. Uma minoria de jovens pertencentes a camadas superiores da classe trabalhadora ou pequenos funcionários não freqüenta o secundário e se realiza em profissões que exigem formação profissional específica. Assemelha-se à alta burguesia, que não se preocupa com a promoção social de seus filhos, oferecendo-lhes mais lazeres e liberdade, condições de apreensão de um autêntico conhecimento. Enquanto isso, a pequena burguesia quer subir e os trabalhadores estão determinados a suportar uma escola que não toma em conta suas aspirações. Esse contingente às vezes perfaz 80% da população.

No âmbito microescolar encontramos na escola uma burocracia de staff (diretor, professores, secretário) e de linha (serventes, escriturários, bedéis). O relacionamento staff e linha varia muito com o grau de escola, se médio ou superior. Efetuou-se atualmente no Brasil uma conjunção do nível primário e médio, tendendo à escola unificada, que não deixou de criar problemas de “áreas de competência” entre o staff: quem dirige a escola unificada, o diretor do antigo primário ou do secundário?

Em suma, na escola como organização complexa articulam-se várias instâncias burocráticas acima enunciadas, incluindo a inevitável Associação de Pais e Mestres e o aluno, objeto supremo da instituição, conforme o tom dos discursos solenes em épocas não menos solenes. O corpo de professores procura manter sua legítima esfera de autoridade sem intromissões estranhas. É unânime na recusa à interferência dos pais no seu trabalho, pois isso pode prejudicar sua posição de autoridade e sujeitá-lo a controle por elementos estranhos.[4]Nas suas relações com o diretor a expectativa de comportamento dos professores é que recebam apoio do mesmo, seja em relação a alunos ou pais de alunos. Funciona o princípio de que nenhum professor deve criticar colega antes terceiros, especialmente alunos.

O diretor por sua vez funciona como mediador entre o poder burocrático do quadro administrativo e a escola, como conjunto, sofre pressão dos professores no sentido de alinhar-se com eles, dos alunos para satisfazer reclamos racionais ou não, e dos pais, para manter a escola ao nível desejado pela comunidade. Tem de possuir as qualidades de um político, algum senso administrativo e ser especialista em relações humanas e relatórios oficiais. O pessoal de linha obedece-o diretamente, pode ser utilizado como meio do corpo professoral pelo controle das conversas de corredor e da sala dos professores. Se o diretor for do tipo ausente, pode ter em suas mãos o controle da docilidade dos alunos por meios informais, assegurando o bom andamento da instituição. O pessoal administrativo de linha enfatiza algumas singularidades do comportamento burocrático, evita a discussão pública de suas técnicas, os despachos de processo são sonegados ao interessado enquanto não se der o chamado despacho final no citado processo. Burocracia administrativa entende-se como uma certa adesão a regras – atividades-meios – tendo em vista fins determinados. No entanto, a disciplina, definida como adaptação a regulamentos, não é encarada como adaptação a finalidades precisas, mas constitui-se num valor básico na estrutura burocrática. Este deslocamento das finalidades originais se dá no processo burocrático determinar alto nível de rigidez e incapacidade de ajustamento a situações novas. Daí a ênfase no formalismo e o exagero no ritualismo burocrático nos estabelecimentos de ensino, no nível administrativo.

A estrutura de “carreira” leva o funcionário a adaptar seus pensamentos, sentimentos e ações nesta perspectiva, o que induz à timidez, conservadorismo rotineiro e tecnicismo. A burocratização desenvolve a despersonalização de relações entre burocracia e público, funcionários de secretaria escolar e o estudante. Ela desenvolve a tendência do burocrata concentrar-se nessa norma de impessoalidade e a formar categorias abstratas – isso tende a conflitar suas relações com o público. Pois, os casos peculiares individuais são ignorados, o interessado convicto das peculiaridades de seu problema opõe-se a um tratamento impessoal e categórico. O comportamento estereotipado do burocrata não se adapta às exigências dos problemas individuais. O tratamento impessoal que ele confere a assuntos de grande significado pessoal para a parte interessada (aluno, professor) o leva a ser visto como arrogante e insolente.

Tudo isso é coberto por uma grande capa de dramaturgia. Que significa isso? A dramaturgia, o culto da aparência, dos gestos, tem um valor legitimador na estrutura burocrática. Da mesma maneira que a bata branca do médico ou do professor mostra que ali há alguém de limpeza irrepreensível, a régua de calculo do engenheiro mostra alguém altamente especializado e preciso. O talento dramático tem cada vez mais importância na função hierárquica, qual seja, do diretor severo, porém, benevolente, o inspetor rígido e ao mesmo tempo assíduo tomador de cafezinhos na diretoria, alem de assinante regular do célebre Livro de Termo de Visitas da Escola, como comprovante que passou por lá. Há um conceito, segundo o qual os ocupantes de posições hierárquicas são os mais capacitados, mais trabalhadores, os mais indispensáveis, os mais leais, fidedignos e os mais autocontrolados, em suma os mais justos, honestos e imparciais. Também visualiza-se que uma pessoa muito ocupada é de importância incalculável para a burocracia e encara suas tarefas de maneira mas séria que outras pessoas. É aconselhável para aqueles que querem vencer na estrutura burocrática carregarem as pastas debaixo do braço, mesmo quando saiam à noite ou pensem folgar nos fins de semana.

Acresce nas burocracias educacionais, escolares ou ministrais, que o sistema de status tem seu próprio dispositivo dramatúrgico que inclui insígnias, títulos e deferências e símbolos da grandeza material como salas forradas de tapetes ou mobiliário luxuoso, ainda ditos filosóficos profundos como vê quem adentra na sala de um administrador universitário, por sinal também professor: “Quem sabe faz, quem não sabe ensina”. Em suma, a conduta burocrática implica uma exagerada dependência dos regulamentos e padrões quantitativos, impessoalidade exagerada nas relações intra e extragrupo, resistências à mudança e configura os padrões de comportamento na escola encarada como organização complexa. Em suma, o administrativo tem precedência sobre o pedagógico.

Escola como centro de reprodução das relações de produção

Não há escola única. Há graus de ensino onde alguns têm acesso em nível decrescente quanto mais alto for o escalão acadêmico. A partir do primário opera-se a divisão de duas redes de escolarização de classes, na medida em que o ensino primário:

a) garante uma distribuição material, repartição dos indivíduos nos dois pólos da sociedade
b) garante uma função política e ideológica de inculcação.

A separação dos alunos em duas redes no ensino primário é o meio e principio do funcionamento. Esta separação se efetua no interior da escola primária, uma em direção acadêmica, outra em direção profissional. Uma rede é primária profissional e outra secundária superior. O prolongamento da escolaridade obrigatória reforça o processo. A generalização da escolaridade obrigatória única é a generalização da divisão. A inculcação ideológica dá-se através das várias formas de saber, verdade, cultura, gosto.[5]

Na rede escolar o culto da arte, ciência pura, profundidade filosófica, sutilezas psicológicas, são formas de inculcação vinculadas a orientar a ação do educando conforme as normas de direito, políticas hegemônicas, sendo representadas enquanto deveres. A inculcação não se dá pelo discurso mas através de práticas de exercícios escolares onde a nota equivale ao salário, recompensa pelo trabalho realizado. Da mesma maneira que o mercado do trabalho é regulado pela competição, no interior da escola ela é cultuada nos sistemas de promoção seletivos. O aluno é obrigado a estar na escola e é livre para decidir se quer ou não, ter êxito ou não, como o indivíduo é livre ante o mercado de trabalho.

As práticas do ritualismo escolar, deveres, disciplinas, punições e recompensas, constituem o universo pedagógico. A escola realiza com êxito o processo de recalcamento de pontos de vista opostos aos hegemônicos e essa sujeição condiciona a inculcação. O trabalho é vagamente valorizado, enquanto artesanato, o processo histórico é reduzido a um conjunto de guerras, datas e nomes cuja finalidade principal é reduzir à insignificância o significativo: dimensões sociais do histórico ou sua temporalidade. Veja-se a dificuldade em convencer os historiadores de que o presente também é história. O aparelho escolar contribui para a reprodução da qualidade da força de trabalho, na medida em que transmite saber e regras de conduta (ler, escrever e contar), que têm um destino produtivo.

Os alunos da rede escolar recebem também conteúdo científico. Eis que o processo de escolarização contribui para a reprodução das condições materiais de produção na medida em que a produção social é uma transformação material da natureza, supondo o conhecimento objetivo sob as mais variadas formas. Todas as práticas escolares estão a serviço da inculcação, que pressupõe técnicas e métodos apropriados. A técnica escolar formaliza os conteúdos de inculcação e os de saber positivo – as disciplinas escolares – homogeneizando-as na medida em que são ensinadas como regras escolares. O conhecimento escolar é usado no quadro de problemas surgidos da prática escolar com objetivos definidos: dar notas, classificar e punir ou premiar os indivíduos. Isso porque há uma separação entre as práticas escolares e as práticas produtivas em geral. A separação escolar é a chave na determinação do papel no conjunto das relações da sociedade atual. Toda escolarização é, por sua natureza, conservadora, pois é quem legitima a separação entre consciência e a prática. A escola é regida pelo princípio da contradição e não são categorias como psicologia do escolar, normal/anormal e, sim, categorias como inculcação, submissão, recalcamento, que podem explicar alguns fenômenos que ocorrem nas estruturas escolares. Como Aparelho Ideológico, a escola primária reflete uma unidade contraditória de duas redes de escolarização. A escola favorece os favorecidos e desfavorece os desfavorecidos e o princípio disso está na diferença social da família.

Trata-se de perguntar a cada indivíduo como ele passou sua infância pré-escolar, como determinante de sua escolaridade individual ulterior. As classes sociais não podem ser pensadas como a partir dos indivíduos. Elas não se reduzem a propriedades sociais características de cada indivíduo. Essa visão atribui importância à família, lugar material da primeira educação. A explicação é regressiva, cronológica, individual.

Essa cronologia – família, escola primária, ginásio ou não – só existe do ponto de vista do indivíduo. Na realidade, família, escola primária, ginásio etc.

1) preexistem ao próprio indivíduo
2) coexistem simultaneamente
3) mantém relações necessárias uns com os outros.

O professor está a serviço do aparelho escolar, não de sua classe. À falta de base, um nível de ensino remete ao imediatamente inferior e este à família, esquecendo que há duas redes devido à relação social de produção. Se há famílias providas e desprovidas é porque há duas classes. O funcionamento do conjunto do aparelho escolar e o lugar da escola primária no interior do aparelho escolar são definidos na sua função de reprodução das relações de produção.

Para Marx, as relações de produção são a combinação social das forças produtivas, a maneira pela qual os instrumentos de produção e o próprio trabalho produtivo se repartem socialmente entre os vários agentes sociais da produção. O essencial é a relação de propriedade. Daí, as relações sociais da produção capitalista se definirem pela separação entre o trabalho produtivo e os meios de produção, exploração do trabalho pelo capital. O operário reproduz-se enquanto tal na medida em que não tem elementos de acumular e sim, somente, reproduzir sua força de trabalho. Essa reprodução pode originar-se a partir da industrialização da agricultura e empobrecimento das classes médias. O aparelho escolar tem seu papel na reprodução das relações sociais de produção quando:

a) contribui para formar a força de trabalho
b) contribui para inculcar a ideologia hegemônica, tudo isso pelo mecanismo das práticas escolares
c) contribui para reprodução material da divisão de classes
d) contribui para manter as condições ideológicas das relações de dominação.

O aparelho escolar impõe a inculcação ideológica primária e é seguido pelos diversos aparelhos – televisão, publicidade, seitas etc. A escola inclui, na forma de rudimentos, técnicas indispensáveis à adaptação ao maquinismo, em gera na forma preparatória. Na família camponesa, fundada na exploração agrícola em comum, a escola é considerada tempo perdido, não há escola de agricultura. O que aparece com esse título é escola para a exploração agrícola capitalista. A escola pode ser aparelho ideológico segundo estágios do modo de produção capitalista na sua combinação concreta interior a cada formação social capitalista. A escola não cria a divisão em classes, mas contribui para esta divisão e reprodução ampliada. A reprodução ampliada das classes sociais comporta dois aspectos:

a) A reprodução ampliada dos lugares que ocupam os agentes. Estes lugares designam a determinação estrutural de classes, i. e., o modo de existência da determinação pela estrutura de produção, dominação, subordinação política e ideológica nas práticas de classe: é um efeito da estrutura sobre a divisão social do trabalho.

b) A reprodução/distribuição dos próprios agentes entre estes lugares. Os aparelhos ideológicos intervêm ativamente na reprodução dos lugares das classes sociais. Há uma reprodução inicial das classes sociais e pela oposição de classes, onde se move a reprodução ampliada da estrutura, inclusive das relações de produção que preside o funcionamento dos Aparelhos ideológicos. Os Aparelhos Ideológicos não criam a ideologia, mas inculcam a ideologia dominante. Não é a Igreja que cria a perpetuação da religião, é esta que cria e perpetua a Igreja, diferente do que pensava Max Weber.
A análise do fetichismo da mercadoria ultrapassa os Aparelhos Ideológicos. Uma empresa é um aparelho, no sentido de que pela divisão social do trabalho em seu interior, por exemplo, pela organização despótica do trabalho, são elementos que definem as relações políticas e ideológicas concernentes aos lugares das classes sociais no conjunto da estrutura. Há mecanismos para reprodução de lugares e agentes, daí a inanidade em falar de ascensão social ou mobilidade social.[6]Dá-se a reprodução dos agentes. A qualificação é uma qualificação-sujeição, não é somente qualificação técnica do trabalho. A empresa é um Aparelho distribuindo seus agentes no seu interior. As classes capitalistas não são castas escolares. A relação escola-aparelho econômico continua a exercer sua ação durante sua atividade econômica: isso se chama pudicamente formação permanente. Não é a escola que faz com que sejam principalmente camponeses a coparem os lugares suplementares de operários. É o êxodo dos campos, acompanhando a reprodução ampliada da classe operária, que desempenha o papel da escola.

c) Trata-se de uma distribuição inicial dos agentes ligada à reprodução inicial dos lugares das classes sociais: é ela que designa para este ou aquele aparelho, para esta ou aquela série entre eles, e segundo as etapas e as fases da formação social, o papel respectivo que eles assumem na distribuição dos agentes.[7]

As organizações complexas controlam e domesticam as forcas sociais. Elas codificam, centralizam. Essa apropriação pela organização da existência, sob todas as formas, é realizada também pela destruição e desintegração, destruindo as forças que se opõem à sua expansão. Atrás do discurso da racionalidade, nessa luta, a organização abriga-se para legitimar sua empreitada e desqualificar uma realidade que ela mutila.

Taylor, no que tange à organização industrial, Lenin, no que se refere à organização política e Clausewitz, pata a organização militar, são os fundadores de uma teoria que dominam a partir do status de chefes. A organização científica necessita de pais “místicos” para assegurar sua fundamentação. As organizações são, acima de tudo, produtos historicamente dados e não sistemas fechados a-históricos, como pensa Crozier. Pretendendo romper com o passado, criticando acerbamente as instituições tradicionais, a teoria organizacional procura uma ruptura “epistemológica”. Essa ruptura tem como função proibir quaisquer comparações entre instituições tradicionais e instituições modernas. Nessa imagem de organização encontram-se estocados mitos, fábulas e lendas, um universo fantasmagórico mais ou menos discretamente camuflado que subsiste na base do discurso organizacional.

As organizações políticas, como as industriais, reforçarão a área do imaginário. O tom será mais ou menos severo, pois, na iminência da tragédia, a traição ameaça o herói!

A escola tem um papel nessa mascarada organizacional, operando as variações mais amplas, a partir dos papéis de mestre, aluno, burocrata, administrador.

O que se esconde atrás da representação da racionalidade organizacional? Marx nos ensinara a ver que atrás do espetáculo da circulação de mercadorias escondia-se o trabalhador mutilado; o fetichismo mercantil esconde o sentido da organização. Ela é a base mais apropriada à imaginação moderna. Isso constitui uma das condições do desenvolvimento das organizações.

Centro da tensão é ao mesmo tempo da transferência: o tempo presente transcorre em função de satisfações futuras. A organização burocrática exerce a ditadura do signo, onde as palavras- chave que a designam são Contabilidade, Plano, Programa, Controle. A organização complexa apresenta-se como forma à qual tudo deve se submeter.[8]

Nos supermercados nenhum objeto é percebido na sua imediatez: tudo é empacotado, conservado, etiquetado. Do produto somente percebemos a representação fotográfica, legenda, desenho. Os corpos materiais dissolvem-se em corpos de signos, são elementos num único texto. Idêntico processo de coisificação se opera com o elemento humano. Dirigir homens é como mercadorias, manipular signos.

As organizações complexas traduzem o real numa linguagem simples, transcrevem os corpos em signos. As organizações complexas traduzem o corpo em signos. Realizada a operação, o que sobrou do corpo original? Ele desaparece na nova representação. A organização toma como interlocutor o corpo que ela produziu, ela define, para nós, o emprego do tempo e do nosso corpo. No fim do processo, o corpo nada mais é do que um signo num conjunto de signos que formam as malhas organizacionais. A organização apropria-se de nosso corpo, de tal forma que qualquer ruptura nos aprece como uma auto-ruptura. É aí que a adesão à organização encontra um de seus fundamentos; o corpo, que adere à organização visualizando a possibilidade de uma ruptura reage com alta carga de ansiedade. Controladores e controlados, engajados no mesmo processo, participam de uma comunidade de destino: a organização da racionalidade. A análise da violência e do sacrifício é inerente à estrutura organizacional.

A organização realiza um processo concomitante: destruição e unificação. O homem dividido na execução de suas tarefas parceladas, isolado no seio da grande metrópole, é reagrupado no interior das imagens organizacionais. O taylorismo é a fisiologia do corpo dividido. A organização significa um combate contra a entropia.

Mauss conta a história do mito tsimhiam onde uma princesa dá à luz uma “Petite Loutre” miraculosamente; dirige-se com a criança à cidade de sei pai, o chefe. Apresenta-se a todos e pede para não matá-la caso a reencontre pescando na sua forma animal. Mas ela esqueceu de convidar um chefe. O chefe e a tribo esquecidos encontram no mar “Petite Loutre”, que tinha na boca uma grande foca e matam-na. O Grande Chefe procura-a e encontra-a no seio da tribo esquecida. Seu chefe desculpa-se, pois não conhecia “Petite Loutre”. Sua mãe, a princesa, morre de melancolia e o chefe culpado involuntariamente encaminha ao Grande Chefe todos os tipos de presentes como expiação.

Os reis se esquecem de convidar outros chefes para seu casamento, os criminosos sempre deixam uma pista. Luta-se em todos os níveis contra a entropia: o mito tsimhiam mostra que uma perturbação no sistema conduz à morte! É o que, em linguagem moderna, é a sabotagem, a pane, que as organizações modernas tentam conjurar. O equilíbrio camufla o desequilíbrio.

As organizações mantêm-se pela transmissão e energia e sua conversão em trabalho: a reprodução a força de trabalho se dá em períodos de desequilíbrios sociais, pro exemplo, nas migrações rurais-urbanas, onde multidões sem trabalho concentram-se na periferia das grandes cidades; ou em migrações operárias de países estagnados para áreas de crescimento, como portugueses, espanhóis, argentinos e turcos na Europa. Como fonte de energia o trabalhador é vítima do processo de dilapidações e desgaste onde a organização que canaliza sua energia integra-o no movimento de deslocamento e desintegração. Daí verifica-se que a transformação da energia em trabalho só é possível através dos desequilíbrios provocados pelas organizações. A eficiência do esquema centralizador é simbólica. Nesse sentido cabe à organização a produção do que a diferencia do mundo. A sociedade consumista insere-se no campo da simulação diferencial. A organização unifica a produção, representação da diferença. A dramaturgia converte-se na finalidade principal das organizações: congressos, paradas, desfiles, delegações recebidas com grandes pompas, banquetes, publicidade intensiva. A organização produz o Espetáculo. A distinção entre produção e representação desaparece. A organização deve produzir diferenças simbólicas ou extinguir-se. Assim, o nazismo, pela representação de massas, desmoraliza os oposicionistas reais ou potenciais. Tanto o Tenessee Valley Authority, como as grandes obras sobre o rio Dnieper, não só justificam uma organização centralizada côo também criam condições para o lirismo organizacional. A estrutura de pirâmide impõe a sua ordem, a eficiência nasce da hierarquia, seja a pirâmide familiar, política educacional. A organização é o grande elemento mediador entre “eu” e o “outro”. O medo ao isolamento se dá na medida em que a estrutura piramidal tem os meios para assegurar o monopólio das relações entre os homens. A organização centralizada e unitária constitui o grande refúgio, ela domestica a energia sem direção: não é por acaso que as organizações mais eficientes são aquelas onde predominam um sexo só: por exemplo, a Igreja. Ela garante a vida de seus membros, nada é possível em ela. A autonomia inexiste, só há o dilema: inserir-se na organização ou desaparecer. Por isso ela acentua a retórica da integração. O Sindicato para Tannenbaum, a comunidade de Lloyd Warner e a corporação de Durkheim e Elton Mayo, aprecem como possíveis integracionistas num universo dividido.

Na realidade, a oposição segurança-inseguranca, integração-exclusão é artificial. Assim, a revolução industrial organiza o novo modo de produção, ao mesmo tempo que divide o homem num conjunto de tarefas parceladas.
Embora March e Simon argumentem que no bojo da teoria organizacional não há lugar para a coordenação, participam do delírio organizacional, racionalistas que não querem enxergar as organizações como instancias do imaginário também. A direção exclui, como os magos sacrificam. O centro funciona como um dado que deve ser “escotimizado”[9] – também na teoria dos sistemas isso se dá. No entanto, constitui-se em peça fundamental.

A organização burocrática complexa não explicita a necessidade do centro mas o não-necessário como pivô da organização. Tal estranheza faz parte também de certa concepção burocrática de socialismo, onde o Estado deve desaparecer progressivamente e, no entanto, ele domina em toda sua amplitude! O poder é apreendido como escândalo. A coordenação se apropria do espaço reservado ao fantasma piramidal. As relações instituídas apresentam uma sucessão de níveis hierárquicos em que cabe ao superior uma zona reservada e onde o subalterno não pode entrar.

O pai que é proprietário do corpo da mulher, interdito aos filhos, o senhor feudal que se apropria da terra, o professor que dispõe soberanamente de um campo de conhecimentos. O usufruto dessa situação pressupõe a aceitação do papel de pai, proprietário, chefe, professor. Da mesma maneira que o senhor exercia poder absoluto sobre suas terras, os detentores da informação instalam um domínio confortável como “na Régie Renault, com a introdução de uma nova máquina, só o contramestre pode compreender o funcionamento”.[10]

O sistema cultural assiste à ruptura entre apalavras sagrada e profana. Não é mais Deus que dispõe do monopólio do verbo nem a Igreja de sua interpretação. A ciência ocupa hoje o lugar do Verbo Divino. A casta dos cientistas substituiu a hierarquia eclesiástica como elemento mediador entre a palavra superior e a coletividade humana. O antagonismo “puro” e “impuro” encontra-se entre os chamados trabalhos “sujos” e “limpos” como nas relações entre o trabalho manual e intelectual. A organização através dos seus psicólogos industriais, afirma a possibilidade de vencer a impureza. Os esgotos podem ser transformados em matéria sã. A guerra limpa, tecnologicamente definida, coexiste com a suja, rústica. A eficiência da impureza consiste na delimitação das áreas do proibido. Os impuros são intocáveis, só podem ser destruídos. O nazismo significou a dominação totalitária dos puros sobre os impuros. Nas organizações altamente burocratizadas, instituições totais, o impuro é segregado por obstáculos como muros altos, florestas, portas de ferro.

Os contatos com o exterior são monopolizados pela direção. O subalterno não tem contatos com os circuitos externos da empresa, só os responsáveis podem manter tais relacionamentos. Caso haja qualquer caso de espionagem industrial, os subalternos têm menor chance de sair-se bem que os elementos de staff privilegiados por seus contatos com o exterior, que ampliam as possibilidades de manobras dos mesmos. Na medida em que a organização burocrática delimita as zonas de impureza interna e externa, ela se assegura uma certa dinâmica energética. O funcionamento é assegurado – como em algumas organizações políticas – pela luta contra os sabotadores do interior e os inimigos do exterior. A empresa só evolui na luta contra as disfunções do mercado. Haverá relação entre o domínio do impuro pelas organizações e o grau de sua eficiência? O nazismo, que definia como fim explícito reduzir as raças impuras, constrói organizações burocraticamente estruturadas para atingir tais objetivos: AS, SS, KL. No entanto, o quotidiano mostra uma constante preocupação em jugular o impuro. A impureza constitui o centro do discurso das organizações industriais. É um dos temas favoritos da manipulação publicitária. Não há nenhum anuncio de detergente que não avalize suas qualidades na cruzada contra o impuro. O bom funcionamento organizacional implica a depuração periódica.

Paralelamente a este processo, se instaura o processo da construção de um imaginário, por mediação da organização, em direção a seus clientes. O campo publicitário organizacional apresenta um universo em que a organização se constitui como prestação de serviços e para a qual o cliente tem sempre razão e manda. A organização é atenciosa e asséptica, benevolente com os caprichos da clientela. O desejo se constitui em elemento fundante da conduta do cliente. Nada lhe é recusado, tudo é permitido; ele pode satisfazer-se na sua imediatez e plenitude. Ela substitui o espetáculo do lucro pela gratuidade. Para tal, constitui uma área onde o dom[11] tem cidadania, pequenos bônus anexos às mercadorias, que possuem uma importância básica na definição da marca. As adaptações ao mercado, inerente às organizações lucrativas, se dão ao lado de um processo de regeneração das mercadorias e serviços propostos à clientela. Quanto à mão-de-obra, o termo “participação” parece ter virtudes suficientes para ancorá-la à organização com muito mais firmeza que o servo à gleba.

A vida só é possível no processo organizacional. O imaginário enquadrado pela organização transforma-se num relutante apelo burocrático, com todo o “pathos” de um ofício de repartição pública, imaginem Sófocles amanuense!

O fato é que a mão-de-obra sai da empresa para entrar no sindicato burocratizado, ou freqüenta a Igreja ou freqüenta um partido, os dois estruturados em forma de pirâmide, com níveis de staff e linha, com dogmáticas rígidas interpretadas legitimamente por outros elementos treinados nesse mister, dispondo dos títulos reconhecidos. Em suma, o ritmo vital é regulado pela escola, exército, empresa, hospital, agência de viagens e, finalmente, o asilo. Nas instituições totais é o mesmo grupo de co-participantes que controla tudo sob a mesma autoridade, conforme um plano racional geral, seja ele elaborado pelo staff do presídio, do manicômio, do convento ou do colégio interno. Nessas instituições, há o grupo maior cuja atividade fica confinada aos limites da organização total e o pessoal staff que mantém horário de 8 horas de trabalho e contatos com o exterior. É característica a barreira linha/staff com estereótipos negativos ou agressivos. Há um grande hiato entre eles, grande distancia social.

Enquanto o operário recebe um salário e tem a liberdade de gastá-lo em qualquer ambiente, o mesmo não se dá com o interno das instituições totais que assumem a responsabilidade por ele e exigem algum ou pouco trabalho. Geralmente está incorporado a sistemas de pequenos pagamentos cerimoniosos como, por exemplo, a ração semanal de fumo ou presentes de Natal que motivam os doentes mentais a continuarem em suas ocupações. Em algumas prisões, navios, campos de cortes de árvores é possível alguma poupança forcada: o indivíduo recebe o que lhe é devido após cumprir a pena. As instituições totais desenvolvem mecanismos de despojamento e mortificação do ego: decisões autônomas são eliminadas mediante a programação coletiva das atividades diárias. A estrutura da sociedade é escalar, ela articula-se com o aspecto informal definido como regras do local que definem formalmente níveis de proibições. Em troca, o staff oferece recompensas e privilégios, que se constituem em modos peculiares às instituições totais. Receber visitas, fumar um cigarro,o dia da folga, sua negação por qualquer transgressão cometida aos regulamentos, assume um aspecto vital no quotidiano interno da instituição total.

No entanto, nas instituições totais é possível que se dê este processo: os guardas não comunicam infrações aos regulamentos, transmitem informações proibidas aos presidiários, negligenciam as exigências elementares de segurança e aliam aos presidiários em criticas francas aos funcionários da alta burocracia. Muitos podem ter em si uma ambivalência básica em relação aos detentos sob sua guarda: embora condenados, muitos criminosos representam sucesso, em termos de um sistema mundano de valores (alto prestígio, notoriedade e riqueza) e o guarda mal remunerado poderá sentir em associar-se a alguém tão famoso. Pode dar-se a corrupção pela instituição total através da reciprocidade no caso em que o controle da docilidade do presidiário resida menos nas sanções negativas – o que representa encargos para a administração da prisão – mas na consecução de um certo nível de cooperação voluntária do presidiário. Em troca, infrações secundárias aos regulamentos são ignoradas.

Conclusões

No interior o sistema social as instituições educacionais e seus sacerdotes, os professores, desenvolvem um trabalho contínuo e sutil para a conservação da estrutura de poder e, em geral, da desigualdade social existente. Duas são as principais funções conservadoras atribuídas à escola e aos professores: a exclusão do sistema de ensino dos alunos das classes inferiores e a que definimos como socialização à subordinação, isto é, a transmissão ao jovem de valores compatíveis com seu futuro papel subordinado.[12]

Examinemos a primeira conclusão. Uma frase repetida continuamente pelos sociólogos liberais é que a escola constitui o mais importante canal de ascensão social. Tal proposição é exata na medida em que “a atribuição da posição social é hoje cada vez mais ligada ao sistema de escolaridade”. Mas é errada e mistificadora, se se entender que a escola favoreça ou promova a mobilidade social. Eis que há fortíssimos obstáculos que impedem a inteligência e a capacidade de manifestar-se, privilegiando mais a cumplicidade com o sistema, com o critério de ascensão social.

É importante lambarmos que a família conserva grande parte de usa importância como base inicial da seleção social dos indivíduos, ela transmite ao herdeiro, ao filho, não somente o capital financeiro mas também o capital cultural. Esse capital cultural tem sua legitimidade definida através dos títulos escolares. O importante é que se desenvolve num sistema de ensino pré-universitário unificado, onde o sistema escolar convence o aluno de origem popular de que é necessário competir para atingir altos escalões, e que “seu destino social depende antes de mais nada de sua natureza individual”[13]. Paralelamente, a escola desenvolve o processo de socialização, ou seja, da aceitação do existente como o desejável. A dificuldade do corpo professoral em adaptar-se às mudanças sócio-culturais pode implicar na sua visualização, não como um corpo que reproduz valores dominantes, mas sim defensor de um patrimônio valorativo superado, qual seja, de vestal da classe média.

Bibliografia


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[1] O taylorismo tem como finalidade: eliminar o poder de decisão do operário e tornar o operário uma máquina. A organização moderna é a instituição onde se realiza a relação de produção que se constitui a característica de todo sistema social, é o mecanismo de exploração e se rege pela coerção e manipulação. A substância a organização não é um conjunto funcional, mas sim, a exploração, o boicote e a coerção.

[2] Para Simon, a hierarquia é necessária para alcançar um fim comum. Ela tende a tornar-se mais rígida quanto mais complexa é a organização. Sustenta que, da mesma maneira como no mecanismo de mercado, o fim de todos coincide com o de cada um. Acha-se como pressuposto um certo tipo de racionalidade que os utilitários do século passado sustentavam como universal. No entanto, os fins são formulados pela cúpula, a teoria da organização pretende não discutir o problema central do poder, o que explica também o êxito do estudo referente aos “pequenos grupos”, onde o conformismo constitui fonte de felicidade.

[3] O processo acima define a hegemonia do autoritarismo na escola, onde a palavra autorizada é a do mestre, enunciada pelo programa e pelas instruções sobressalentes. O caderno funciona como registro e permite a inspeção a inspeção e o controle da conformidade. Os dispositivos audiovisuais permitem difundir programas pré-fabricados que correspondem a um discurso escolar estritamente subordinado à organização! M. Lobrot C. A. Pedagogia Institucional, p. 161, Lisboa, Editora Iniciativas Editoriais.

[4] A convicção de que o prestígio profissional está progressivamente diminuindo é confirmado por pesquisas realizadas nos EUA, Itália, Alemanha, no que se refere a professores de nível ginasial, conforme G. SCHEFER, Das Geselleschaftsbild des Gymnasiallehrers, Frankfurt am Main, Suhrkamp Verlag, 1969, especialmente pp. 43-50.

[5] O discurso sobre a produção é reservado aos tecnocratas, o discurso sobre as relações sociais é reservado aos políticos, o discurso da mudança é reservado aos revolucionários profissionais, o discurso sobre o sexo é reservado para a Educação Sexual e o discurso sobre o corpo é de âmbito dos médicos.

[6] Muitas pesquisas desenvolvidas em diversos países demonstraram que o excessivo contingente de alunos por classe e uma das maiores fontes de insatisfação dos professores, conforme E. SCHUC, Der Volksschullehrer Strofakto en in Berufsleben und ihre Ruckwirkung auf die Einstellung im Berugf, Berlim, H. Schodel Verlag, 1962. Nessa pesquisa que envolveu 508 professores alemães, as maiores fontes de insatisfação provinham do excessivo número de alunos por classe, baixo prestígio social do ensino e escassa possibilidade de carreira. Resultados idênticos no que respeita à França foram colhidos por R. BENJAMIM, L’ Univers des Instituteurs, Les Editions de Minuit, 1964.

[7] A Europa caracteriza-se na educação por um sistema de mobilidade cooptativa. Os alunos das classes inferiores são eliminados de diversas formas. O simples fato da escola, cujo recrutamento de alunos estrutura-se na classe média e alta, estar próxima à habitação do aluno, formar classes pequenas e possuir material didático, coloca os alunos das classes pobres em situação desvantajosa, como ponto de partida. Há uma escola média para a formação da classe dirigente e outra técnica sem possibilidade de chegar ao nível superior, para a classe operária. Isso foi teorizado por Giuseppe BOTAI, La Carta della Scuola, Milão, 1941, p. 28, ed. reformulada.

[8] Pré-requisitos necessários ao professor inglês do século XVIII: “Ele deve ser: 1) Membro da Igreja da Inglaterra, de vida austera, idade não inferior a 25 anos; 2) Dedicado à Santa Comunhão; 3) Capaz de autodomínio de si e das paixões; 4) De caráter submisso e conduta humilde; 5) possuir bom talento didático; 6) Bem informado dos princípios e fundamentos da religião cristã com capacidade para enunciá-los ante o ministro da paróquia ou ao Bispo mediante exame escrito; 7) Possuir boa caligrafia e sólidos fundamentos nas Matemáticas; 8 ) Membro de uma família de ilibada conduta moral e 9) Contar com a aprovação do ministro da paróquia (sendo um fiel) antes de procurar autorização do Bispo.” A. TROPP, The School Teacher, Londres, Heinemann, 1957. MAUSS, M, Sociologie et Antropologie, Ed. PUF, França.

[9] Segundo o psicanalista Oto Fenichel – escotomizar significa não querer enxergar, não admitir, negar magicamente o real.

[10] D. MOTHÉ, Militant chez Renault, Ed. du Seuil, Paris, p. 10.

[11] “O uso contínuo do conceito do dom ou dos dotes intelectuais constitui um pretexto para desviar o discurso das causas sociais das menores possibilidades de instrução que têm na Alemanha os filhos de operários, remontando-as a pretensas causas naturais.” R. DAHRENDORF, Arbeitenkinder an deutschen Universitaten, (J. C. Mohr, Tubingen, 1965, p. 29).

[12] A insensibilidade ante a desigualdade social e seu papel no comportamento do aluno constitui também característica do ensino nos países desenvolvidos. Veja-se H. ULIBARRI, Teacher Awareness of Sociocultural Differences in Multicultural Classrooms, in E. T. Keach, R. Fulton, F. E. Gardner (eds.), Education and Social Crisis, Nova York, J. Willley, 1967, pp. 139-144.

[13] P. BOURDIEU, L’École Conservatrice”, p. 342, in Revue Française de Sociologie, VII, 1966, pp. 325-347.

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